Intervenção de

Reunião dos Presidentes dos Parlamentos dos Países do Mediterrâneo Ocidental, em Tripoli<br />Intervenção do Deputado Lino de Carvalho

Senhor Secretário do Congresso Popular Geral da Líbia, Senhores Presidentes dos Parlamentos dos Países do Mediterrâneo Ocidental,Em nome da Assembleia da República de Portugal quero agradecer o convite que nos foi formulado para participarmos nesta reunião com uma agenda preenchida de temas actuais.Não tendo sido possível ao Senhor Presidente da Assembleia da República estar presente, como desejaria, por razões insuperáveis de agenda, não quer deixar de expressar por meu intermédio a oportunidade do debate que nos é proposto.Afirmou o Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, na mensagem por ocasião do Dia dos Direitos Humanos, em 10 de Dezembro passado, que “poucos períodos na História trouxeram uma reconfiguração das relações internacionais, tanto entre os Estados como entre os Povos, como aquela a que assistimos actualmente. A globalização, o espectro do terrorismo internacional e o reconhecimento cada vez mais generalizado da universalidade dos Direitos Humanos fazem parte dessa transformação, que só é possível gerir, se a nossa visão do mundo puder ajudar a encontrar um novo equilíbrio. Essa visão deve respeitar os Direitos Humanos, enfrentar a ameaça do terrorismo e assentar mais do que nunca nos recursos e na legitimidade da cooperação multilateral. Isso coloca perante nós um desafio complexo, a que devemos fazer face guiando-nos por um princípio claro e que precede todos os outros: o respeito pela legalidade internacional”.Neste quadro são de rejeitar todas as tentativas de impor unilateralmente e pela força soluções que a pretexto do importante e necessário combate ao terrorismo pretendem, antes de mais, construir uma nova ordem internacional dominada por uma única potência. Permitam, neste contexto e tendo presente que Portugal é membro da União Europeia afirmar em todo o caso que o conflito que envolve o Iraque não pode nem deve ser resolvido senão pela via do diálogo, no quadro da ONU e no respeito pela sua Carta. Foi esta mensagem, aliás, que as opiniões públicas transmitiram com os milhões de pessoas que em todo o mundo participaram, no dia 15 de Fevereiro passado, nas manifestações pela Paz.Constitui, sem dúvida, direito e dever inalienável dos Estados e dos Povos combater o terrorismo impedindo uma actividade que centra os seus alvos na instalação do terror e da violência atingindo, em muitos casos deliberadamente, vítimas inocentes. Esta actividade que muitas vezes se encobre por detrás de uma alegada solidariedade com aqueles que legitimamente combatem pelo reconhecimento dos seus direitos, pela sua liberdade e independência acaba por, ela própria, causar os maiores prejuízos exactamente aos povos que lutam pela sua dignidade.As acções terroristas de Bin Laden são responsáveis pelos prejuízos causados à imagem dos povos muçulmanos e, em particular, à luta do povo palestiniano e só deu pretexto para o avanço das teses conservadoras e erradas sobre o choque de civilizações ou para a guerra da ocupação levada a cabo por Israel.Mas, dito, isto, é necessário distinguir o terrorismo das acções legítimas daqueles que, consagrando a força de um Povo, utilizam a luta como objectivo de libertação nacional e cujos alvos são as forças de ocupação excluindo, em todo o caso, a utilização da violência sobre civis.Aliás, a Constituição da República Portuguesa, consagra no seu artigo 7º que “Portugal preconiza a abolição do imperialismo, do colonialismo e de quaisquer outras formas de agressão, domínio e exploração nas relações entre os povos” e “reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão”.Em todo o caso e como refere a Proposta de Resolução do Parlamento Europeu de 24 de Outubro de 2002, o combate contra o terrorismo não poderá jamais ser ganho se ele não for combinado, em larga escala, com acções visando erradicar a pobreza, terminar com a exploração dos recursos dos Povos, instaurar a democracia no respeito pelo Estado de Direito.E isto conduz-nos directamente ao conceito de Democracia, governo do Povo e para o Povo, que faz da liberdade, da democracia política, a sua pedra de toque. Mais liberdade e democracia política que são inseparáveis de outras dimensões, a democracia económica, social e cultural, em suma que faz da realização plena dos Direitos do Homem, na sua mais ampla formulação, a condição necessária para se poder dar efectividade à ideia de Democracia.É neste contexto que nos devemos posicionar face à questão da imigração ilegal e dos fluxos humanos a que dá origem.É evidente que a raiz da imigração económica, tantas vezes ilusória, multiplicada e acelerada por uma globalização neo-liberal e desregulamentadora das relações económicas e por uma troca desigual, designadamente entre as duas margens do Mediterrâneo, está nas condições e no modelo de desenvolvimento nos países de origem, da falta de oportunidades de emprego, na pobreza e na miséria que empurram milhões de pessoas para os caminhos da diáspora. Portanto o melhor caminho para se vencer esta batalha é a cooperação igualmente vantajosa entre Estados favorecendo, como recorda a Declaração de Tunes da Conferência Ministerial sobre a Migração no Mediterrâneo Ocidental, a instauração de políticas globais equilibradas que levem a um desenvolvimento socialmente justo.Por isso mesmo tem falhado a chamada política de imigração “zero” que, além do mais, proporciona o crescimento de redes de criminalidade organizada pondo em causa Direitos Humanos básicos.É sem dúvida necessário criarmos condições de paz para o desenvolvimento dos Países e dos Povos. Mas não há paz sem justiça social e sem liberdade, nem justiça social sem paz.Fazemos votos para que esta nossa reunião contribua para reforçar o diálogo e a cooperação na nossa região do Mediterrâneo Ocidental visando melhores condições de vida e de futuro para os nossos Países e para os nossos Povos.

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