Intervenção de

Reprogramação, redireccionamento e reengenharia do QREN

 

Recomenda ao Governo um conjunto de medidas de reprogramação, redireccionamento e reengenharia do QREN (projecto de resolução n.º 63/XI-1.ª)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:

«O que nasce torto, tarde ou nunca se endireita!» Assim nasceu o QREN - torto! - a que poderíamos juntar o PRODER e o PROMAR.

Mas pior foi a predisposição do Governo para ver direito o que, cada vez mais, se entortava, atrasava, complicava e errava. Estranhamente, foi preciso que a crise envolvesse, brutal e em cheio, o País, para que o Governo aceitasse que alguma coisa tinha de mudar, mas pouco e devagar! Era claro o que iria acontecer. Estava na cara do processo da elaboração do QREN, no seu conteúdo, nas suas opções estratégicas.

Em Novembro de 2006, apresentámos um projecto de resolução, nesta Câmara, debatido em 13 de Novembro e reprovado pelo PS, PSD e CDS-PP. Muitas das questões, estrangulamentos e problemas agora detectados na sua execução poderiam ter sido evitados se as recomendações do PCP tivessem sido seguidas!

A situação é bem conhecida: até final do 3.º trimestre de 2009 - e vou utilizar os últimos dados que tenho - estavam comprometidos cerca de 9 milhões de euros dos diferentes fundos, do total QREN de 21 412 milhões de euros. Deste valor global «comprometido», 8100 milhões de euros estavam alocados. A execução associada a este montante era, no entanto, de apenas 1411 milhões de euros, ou seja, apenas 17,3% dos fundos aprovados estavam «realizados».

Por outro lado, o referido montante de fundos, já validados e disponibilizados aos beneficiários, significava, apenas, cerca de 6,6% do total, ou seja, este era o valor da designada taxa de execução do QREN a 30 de Setembro de 2009.

Se descermos ao nível da taxa de pagamento, verificaremos que ela é apenas 20%! Se esta taxa de pagamento tivesse como referência o valor global do envelope financeiro do QREN, então, ela apresentaria um valor de apenas 7,6%. No final dos primeiros três anos do período de programação, tinham-se executado apenas cerca de 7% do total das verbas previstas no QREN.

Sem pôr em causa razões indicadas pelo Observatório QREN para os atrasos verificados na execução do QREN, na sua globalidade, existirão motivos bem mais amplos e perenes do que apenas a citada «conjuntura económica». E era bom que o Governo e o partido do Governo começassem por reconhecê-los.

Quais as razões que, globalmente, explicam o insucesso real da execução do QREN, até final de 2009? O sucesso aparente, em termos do nível de «compromissos» é grande; em termos reais, é curto.

Num quadro de centralização e governamentalização de todo o processo, entre outras razões, temos: um processo administrativo - já aqui foi referido - carregado de uma grande complicação regulamentar; actuações diversas, descoordenadas e, por vezes, «emperrantes» de Autoridades de Gestão e do IFDR (Instituto Financeiro para o Desenvolvimento Regional, IP), complicadas pelas «ordens» superiores para «cativações» e concursos com destinatários certos e predeterminados; as Comissões Intermunicipais (CIM), ainda insuficientemente capacitadas para desenvolverem o trabalho de uma forma adequada; as dificuldades financeiras dos municípios (e de institutos da administração central do Estado) para suportarem a sua contrapartida para a execução dos projectos aprovados.

Tornou-se bem visível que, em geral, as taxas de co-financiamento dos fundos eram demasiado baixas; idem, idem, para os projectos apresentados pela generalidade das empresas e, em particular, as micro, pequenas e médias empresas. Por um lado, milhares de contratos que foram aprovados para o financiamento de diversos projectos empresariais estão longe da correspondente concretização, quer porque as empresas estão descapitalizadas quer porque muitos dos «projectos» não passam de «ideias» pouco adequadas à realidade social e económica do País.

Esta febre cresceu pela deriva governamental que viveu, quase em contínuo, de acções de marketing político e económico.

Quem não se lembra das «iniciativas Manuel Pinho e do Primeiro-Ministro), por esse País fora...

O sistema QREN pretendeu, de uma maneira voluntariosa e pouco fundamentada, adoptar um modelo de «concursos» (outros países não o fizeram), através dos quais entidades, públicas e privadas seriam premiadas pelo «mérito» das suas candidaturas. De facto, verifica-se que toda a febre concursal, embora apresente uma enorme taxa de realização, de «decisões» e «compromissos», isto é, de «sucesso político imediato», está atrasadíssima na realidade.

Por todas estas razões (e outras que o tempo não permite desenvolver), parece ser indispensável que, entre outras medidas que podem ser decididas a nível nacional, no sentido de se aumentar a eficácia e a rapidez processual, o Governo se empenhe com urgência na renegociação, na União Europeia, entre outros aspectos, da taxa de comparticipação possível para os vários fundos, maximizando-a de forma a trazer as respectivas comparticipações nacionais para níveis comportáveis com a real situação económica e social do País e as Contas Públicas, que, desejavelmente, não deveria ser superior a 20%.

Não é difícil prever que, em 2010 e anos seguintes, tanto o Orçamento do Estado como os orçamentos municipais e as finanças das empresas não terão capacidade de alavancar os fundos europeus disponíveis, se forem mantidas as actuais taxas de esforço relativas.

Esta é uma questão crucial, como é crucial a criação de fundo financeiro para apoiar as necessidades dos municípios, no suporte das suas contrapartidas; como é obrigatória a rápida Reprogramação do QREN, o reforço financeiro dos Programas Operacionais Regionais, a prioridade às micro, pequenas e médias empresas, a simplificação dos procedimentos concursais, a revisão dos regulamentos específicos (uma regulamentação geral e única), prazos objectivos, metodologia de decisão de aceitação e aprovação de candidaturas, redução de consultas a entidades externas e a simplificação dos procedimentos de pagamentos, nomeadamente, o pagamento em 30 dias de tudo o que está completamente executado! - o que teria como base uma reorientação e reprogramação do QREN, em conformidade com uma estratégia de desenvolvimento nacional e regional, em torno de objectivos, visando, por um lado, a redução das disparidades regionais internas e externas e, por outro, a criação de emprego e combate às desigualdades sociais, a dinamização dos sectores produtivos nacionais e uma mais vantajosa inserção da economia nacional na divisão europeia e internacional do trabalho.

Valorizamos a oportunidade do debate do projecto de resolução apresentado pelo PSD; partilhamos, naturalmente, pelo que atrás referimos, muito do seu diagnóstico e preocupações; validamos, na generalidade, as recomendações feitas, mas julgamos que apresentam insuficiências e ausências, necessitando, por outro lado, de um maior desenvolvimento e concretização, sob o risco de serem completamente inúteis.

A título de exemplo, destacamos a necessidade, já referida, de uma renegociação com Bruxelas, nomeadamente sobre as taxas de comparticipação; a criação de disponibilidades financeiras às autarquias; ou para dar eficácia ao objectivo da coesão regional, o estabelecimento de compromissos quantitativos para as aplicações nas NUT III das regiões do interior.

É assim que, no quadro de uma resposta aos principais problemas económicos e sociais do País, julgamos que seria adequado que o projecto de resolução baixasse sem votação, às Comissões Parlamentares de Assuntos Económicos, Inovação e Energia e do Ambiente, Ordenamento do Território e Poder Local, para uma reformulação e melhoria das medidas propostas, com a participação dos diversos grupos parlamentares.

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