Projecto de Resolução N.º 547/XI-2ª

Recomenda a criação de uma rede de albergues para pessoas sem-abrigo e a criação do Plano de Alojamento Imediato

 Recomenda a criação de uma rede de albergues para pessoas sem-abrigo e a criação do Plano de Alojamento Imediato

A degradação da qualidade de vida das populações, o desemprego galopante e o empobrecimento generalizado das famílias e de quem vive do seu trabalho são resultados diretos das políticas de direita aplicadas ao longo de várias décadas. Ao arrepio do projeto constitucional, Governos do PSD ou do PS, com ou sem o CDS, têm vindo a aprofundar uma política de concentração de riqueza e de marginalização económica e social de cada vez mais amplas camadas da população. Direitos constitucionais, conquistados por duras e persistentes lutas do povo português e consagrados por força da Revolução de Abril de 1974 na Constituição de 1976, são frequentemente relegados para último plano das preocupações políticas ou mesmo abolidos pela prática política dos sucessivos governos.

O direito à Habitação, previsto no Artigo 65º da Constituição da República Portuguesa, comporta um comando constitucional que tem sido profundamente ignorado, senão mesmo combatido, pelas opções políticas dos Governos de PSD, PS e CDS. A política de total permissividade no âmbito da planificação urbana e de submissão aos interesses das construtoras e da banca, conjugada com uma política de ordenamento do território orientada cada vez mais para a hipercefalia e sobreconcentração demográfica nos centros urbanos, particularmente de Porto e Lisboa e com a deterioração dos direitos laborais e sociais das populações, contribuem em grande escala para a exclusão social de milhares de cidadãos.

Segundo dados de 2010, existem em Portugal mais de 2200 pessoas sem-abrigo, 90% dos quais concentrados nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, mas também com expressão em Braga, Setúbal, Coimbra e Faro. De acordo com os dados do Instituto de Segurança Social, um em cada quatro não auferem qualquer rendimento e os restantes auferem pensões baixas ou rendimento de inserção social e muitos têm problemas de saúde.

A resposta social a esta população é sobretudo municipal e muitas vezes através de Instituições Particulares de Solidariedade Social ou Associações.

Não colocando em causa, antes relevando, a urgência de uma resposta política adequada às necessidades das populações no âmbito da concretização do direito à habitação e de uma verdadeira política de habitação social e de promoção da construção económica e da autoconstrução, é cada vez mais evidente a necessidade de um reforço na resposta intermédia do Estado. Tendo em conta que os pedidos de habitação camarária e social excedem em muito a disponibilidade e a capacidade de resposta das Câmaras Municipais destas cidades mais afetadas, torna-se necessária a existência de uma solução que, ainda que transitória, assegure sem burocracias ou custos, o direito à sobrevivência destes cidadãos excluídos e marginalizados.

Além da resposta assistencialista de IPSS, do trabalho meritório de muitos voluntários ou de instituições de caridade, é importante criar uma infra-estrutura que assuma o papel de atuação permanente junto destas comunidades, particularmente no que toca à disponibilidade de guarida e alimentação.

Em momento algum pode o Estado assumir-se apenas como estrutura assistencialista, mas em momento algum pode igualmente o Estado deixar de fazer tudo ao seu alcance para que cidadãos e cidadãs excluídos social e economicamente possam viver sem direito a um teto. Em Fevereiro de 2012, uma vaga de frio tornou ainda mais evidente a necessidade de intervenção sobre esta população, quando a vida de muitos destes cidadãos foi ameaçada e até o Metro de Lisboa teve de abrir as portas para evitar a morte de muitos. A resposta pública não pode limitar-se a abrir as portas do Metro de Lisboa, nem a apoiar IPSS’s, nem mesmo a abrir casas de acolhimento, casas de transição ou albergues como os que o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português agora propõe. Só mesmo uma intervenção estratégica, estruturada e integrada sobre o combate à pobreza, ao desemprego, dedicada ao desenvolvimento económico e à valorização do trabalho, articulada com uma política de ordenamento do território e de Habitação orientada para a satisfação das necessidades das populações e não para dos interesses financeiros ou especulativos, poderá criar as condições para a superação das assimetrias e para o fim do seu agravamento.

No entanto, a criação de uma política estruturada de habitação e a disponibilidade de habitação social não são passíveis de dar resposta às necessidades nos prazos imediatos. Além disso, a criação de uma solução intermédia não é um obstáculo ao avanço de uma política nacional de médio e longo-prazo.

Assim, o PCP propõe a criação de uma resposta de transição, mas aponta no sentido da construção de uma resposta permanente através das soluções de alojamento imediato e permanente. O PCP propõe através deste Projecto de Resolução a elaboração de um Plano Nacional de Alojamento Imediato que, partindo do parque habitacional existente (estatal ou privado devoluto) garanta a resposta necessária à população sem-abrigo, assegurando o real cumprimento do direito à habitação para todos os cidadãos portugueses. Ao mesmo tempo, além do alojamento é importante criar uma resposta integrada que encaminhe e acompanhe esta população para a vida activa e que assim crie as condições para o seu bem-estar e para o cumprimento dos seus direitos, quer sejam no plano da saúde, quer no plano do emprego, quer no mais basilar plano da habitação condigna.

Nestes termos, ao abrigo das disposições regimentais e constitucionais aplicáveis, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista Português apresenta o presente Projeto de Resolução, através do qual, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

1. Crie uma rede de Albergues nas regiões urbanas cujo número de pessoas sem abrigo ultrapasse a capacidade de resposta das infra-estruturas já existentes, nomeadamente das pertencentes a IPSS’s.
2. Garanta o carácter universal e gratuito desses albergues através de legislação de enquadramento.
3. Garanta o acompanhamento da população regular de cada albergue por equipas de técnicos da Segurança Social, em articulação com o Serviço Nacional de Saúde, e a realização de planos de inserção social para os indivíduos cuja incapacidade não impeça uma vida activa.
4. Iniciar um “Plano de Alojamento Imediato”, com base na utilização do parque habitacional do Estado ou na recuperação de edifícios subaproveitados ou devolutos, que assegure a disponibilidade de casas para todos os sem-abrigo, até 2017.
5. Que crie, no âmbito da Segurança Social, equipas multi-disciplinares para o acompanhamento a todos os cidadãos que venham a participar no “Plano de Alojamento Imediato”, intervindo sobre os problemas de índole diversa (dependências, doenças mentais e físicas, dificuldade de inserção na vida ativa, etc.) que se abatem sobre esta população.

Assembleia da República, em 20 de Dezembro de 2012

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