Projecto de Resolução N.º 274/XII

Recomenda ao Governo que se desvincule e se afirme contra o Acordo Comercial Anti Contrafação - ACTA

Recomenda ao Governo que se desvincule e se afirme contra o Acordo Comercial Anti Contrafação - ACTA

Os interesses do país, nomeadamente através da proteção da produção nacional estão sob constante ameaça por força da aplicação indiscriminada dos preceitos do “mercado livre”. A própria União Europeia convive com a contrafação de produtos tradicionais portugueses como o Vinho do Porto, entre outros, sempre que isso beneficia as grandes potências económicas. Convivem de forma cúmplice com toneladas de artigos têxteis que sob o eufemismo do “aperfeiçoamento passivo” invadem o mercado europeu para enorme prejuízo das empresas portuguesas. Todavia, a pretexto do combate à contrafação, inúmeros estados europeus ponderam, tal como o Parlamento Europeu, subscrever o Acordo Comercial Anti Contrafação e o Estado Português acaba de o fazer por opção do Sr. Ministro dos Negócios Estrangeiros, nas costas da população portuguesa e sem qualquer discussão ou abordagem democrática.

O Acordo Comercial Anti Contrafação (ACTA – Anti-Counterfeiting Trade Agreement), subscrito pelo Estado Português, tem vindo a ser alvo de protestos em diversas esferas. Quer no plano da contestação popular, quer através de protestos de Grupos Parlamentares na Assembleia da República e no Parlamento Europeu, muitas têm sido as vozes que se levantam contra esse Acordo Internacional.

O Acordo, a pretexto do combate à contrafação, define um conjunto de normas a aplicar pelos Estados subscritores que vão desde a permissão de vigilância sobre transações de dados informáticos, através dos fornecedores de serviço, até à revista de bagagens pessoais. Não está em causa, da parte do PCP, o combate urgente à contrafação e até mesmo a defesa da melhoria e reforço dos mecanismos contra a contrafação em grande escala que tanto penaliza a produção nacional. Aliás, urge criar os mecanismos de fiscalização que, de forma equilibrada, garantam o respeito pelos direitos e privacidade dos cidadãos, mas penalizem a comercialização de produtos contrafeitos, tal como urge criar condições para que a entrada de produtos alimentares de países terceiros, nomeadamente em Portugal, seja feita em condições de higiene e salubridade que além de garantirem a segurança dos consumidores, não penalizem, por concorrência desleal, a produção nacional.

Apesar de o PCP defender o combate à contrafação, não pode deixar de se demarcar de um acordo que confunde direitos, com prevaricação, que confunde igualmente contrafação com pirataria ou partilha de ficheiros informáticos. Todos os produtos passíveis de estarem sujeitos a um regime de proteção de propriedade intelectual ou marcas, estão abrangidos pelo Acordo. Todavia, independentemente de existir utilização comercial ou não de produtos contrafeitos ou de obras e produtos protegidos, a possibilidade de vigilância sobre comunicações e bagagens afirma-se sempre que exista uma suspeita por parte de um suposto lesado.

Por todo o mundo e com forte expressão também em países europeus e Portugal, diversos movimentos de cidadãos assumiram o protesto e a denúncia da orientação securitária e hipervigilante que se afirma no texto do Acordo, bem como denunciaram, como aliás também denunciaram muitas vozes – de diversas forças políticas - no Parlamento Europeu, a forma pouco transparente, pouco debatida e maturada, como se tem vindo a precipitar o apoio de Estados e como se pretendia o apoio da União Europeia.

O próprio Deputado-Relator Kadir Arif criticou veementemente o processo e levantou inúmeras dúvidas sobre o conteúdo do Acordo, terminando por renunciar à responsabilidade de ser relator desta iniciativa.

Numa altura em que se avultam tendências políticas de promoção da vigilância constante da vida dos cidadãos, das suas atividades, como que numa deriva securitária para defender os interesses de grandes corporações ou de regimes políticos, tal como já sucede no chamado “combate ao terrorismo”, é urgente defender a privacidade e a liberdade de circulação e transmissão de dados. Acresce o facto de o Acordo Comercial em causa definir normas aplicáveis e a aplicar por todos os Estados subscritores de forma transversal ao conjunto de bens, produtos, marcas e obras, o que permite e favorece uma conceção confusa de matérias que devem ser distintas na abordagem.

É questionável a opção pela repressão e pela proibição no que toca à partilha de obras culturais e muito mais questionável é a opção de tratar da mesma forma essa matéria e a contrafação de têxteis ou medicamentos, essas sim, reais e penalizadoras formas de contrafação. Mas o mais importante neste momento, além da avaliação das políticas de contrafação até hoje utilizadas, é travar uma ofensiva que se vai desenhando contra os direitos dos cidadãos, através da imposição de sistemas de vigilância constantes, supressores da liberdade política e cultural, a pretexto da defesa de direitos comerciais ou de propriedade intelectual.

Nestes termos, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República os Deputados abaixo- assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que se desvincule do Acordo Comercial Anti Contrafação, conhecido como ACTA e que afirme a sua oposição ao avanço deste Acordo, particularmente na União Europeia, envidando esforços para a que a política de combate à contrafação, no respeito pelos direitos dos cidadãos, seja cada vez mais eficaz e salvaguarde a produção nacional.

Assembleia da República, em 29 de Março de 2012

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