Projecto de Resolução N.º 5/XVII/1.ª

Recomenda ao Governo que reconheça o Estado da Palestina

Exposição de motivos

O Grupo Parlamentar do PCP apresentou na Assembleia da República a 14 de setembro de 2011, a 29 de novembro de 2023 e a 26 de março de 2024, respetivamente, os Projetos de Resolução n.º 72/XII/1.ª, n.º 961/XV/2 e n.º 4/XVI/1.ª, recomendando a diversos Governos portugueses que reconhecessem o Estado da Palestina conforme estabelecido nas resoluções adotadas no âmbito da Organização das Nações Unidas.

A Constituição da República Portuguesa estabelece no seu artigo 7º que, nas suas relações internacionais, o Estado português se orienta, entre outros, pelos princípios do respeito pelos direitos dos povos, designadamente à autodeterminação, à independência e ao desenvolvimento.

O reconhecimento do Estado da Palestina é uma decisão soberana da exclusiva competência do Estado português. Tal reconhecimento, assim como o que este releva da importância e da necessidade do respeito dos princípios da Carta das Nações Unidas, bem como da solução política para o conflito que o direito internacional há muito determina, são tão mais relevantes no contexto atual de brutal agravamento do conflito, em que as autoridades de Israel assumem abertamente o objectivo de expulsar a população palestiniana da Faixa de Gaza e de continuar a expansão dos colonatos na Cisjordânia e em Jerusalém Leste.

Após 20 meses de uma brutal agressão à população palestiniana na Faixa de Gaza, os crimes de Israel atingem proporções inauditas, que configuram um autêntico genocídio, com: muitas dezenas de milhares de pessoas mortas e feridas pelos bombardeamentos e os constantes ataques militares israelitas; a imposição de um desumano bloqueio à entrada de água potável, alimentos, medicamentos e outros bens essenciais, e o uso da fome como forma de agressão contra a população; com a sistemática e total destruição de habitações, de hospitais e de outras infraestruturas básicas; com a proclamada intenção de ocupar militarmente todo o território da Faixa de Gaza e de expulsar o povo palestiniano da sua terra, a Palestina.

A 18 de março, Israel pôs fim ao cessar-fogo que havia sido acordado, que estava a permitir a libertação dos detidos por ambas as partes e que estabelecia um processo negocial com vista a uma solução política para o conflito, e retomou a via dos massacres, do bloqueio, da guerra contra o povo palestiniano.

É gritante a indiferença por parte dos EUA, da UE e da NATO, perante as atrocidades israelitas. Para além de não as condenarem de forma contundente e clara, pelo contrário vendem armas, atribuem financiamentos, prosseguem normais relações comerciais e dão cobertura política a Israel, constituindo-se cúmplices dos seus crimes. A agressão de Israel contra o povo palestiniano configura o maior crime do nosso tempo.

A dimensão da barbárie levada a cabo por Israel, a heróica resistência do povo palestiniano, a mobilização do movimento de solidariedade internacional, suscitam incómodos aos governos das grandes potências ocidentais que, no entanto, se recusam a implementar as decisões e ações que se impõem.

São urgentes ações imediatas e firmes que ponham fim às ações de Israel contra a população palestiniana, assegurem a entrada urgente e sem restrições de bens de primeira necessidade e de auxílio médico, implementem um cessar-fogo permanente, assegurem a total retirada das forças israelitas da Faixa de Gaza e o fim dos seus ataques na Cisjordânia e em Jerusalém Leste.

É urgente que se solucione a questão de fundo, criando o Estado da Palestina, determinado pela ONU há décadas, mas nunca concretizado dada a política de ocupação, colonização e agressão por parte de Israel – um Estado da Palestina independente, onde seja o povo palestiniano a decidir soberanamente do seu destino.

É urgente que o Governo português ponha fim ao seu silêncio perante o brutal desrespeito dos direitos humanos e do direito internacional por parte de Israel, e que de forma firme e clara condene a criminosa política de ocupação, colonização e agressão israelita, exija o fim imediato do genocídio e o cumprimento dos direitos nacionais do povo palestiniano, com a criação do Estado da Palestina e o respeito do direito de regresso dos refugiados palestinianos conforme determinam as resoluções da ONU.

O povo palestiniano aguarda há décadas pela concretização do seu legítimo e inalienável direito a um Estado soberano, independente e viável.

Desde 1947, com a Resolução 181, a Assembleia Geral das Nações Unidas estabeleceu o princípio da existência de dois Estados – o da Palestina e o de Israel –, princípio reafirmado por órgãos da Organização das Nações Unidas ao longo das mais de sete décadas que desde então decorreram, e que Israel se recusa a cumprir. A questão palestiniana foi objeto de decisões do Tribunal Internacional de Justiça, de que é exemplo o pronunciamento em 2004 sobre o muro ilegal construído por Israel, decisões que Israel se recusa a cumprir.

As Resoluções 242 e 338 do Conselho de Segurança da ONU – respetivamente adotadas em 22 de novembro de 1967 e 22 de outubro de 1973 – reafirmaram a concretização da justa aspiração do povo palestiniano à efetiva criação do Estado da Palestina. Em 1988, a Organização de Libertação da Palestina declarou o estabelecimento do Estado da Palestina, de acordo com as fronteiras anteriores a 1967, tal como preconizado pelas resoluções da Organização das Nações Unidas. Apesar de ser clara a determinação da criação do Estado da Palestina à luz dos princípios da Carta das Nações Unidas e das múltiplas resoluções adotadas no âmbito da ONU, esta determinação continua por cumprir.

Uma solução justa para o conflito passa pelo reconhecimento e criação do Estado da Palestina e pela efetivação do direito ao retorno dos refugiados palestinianos conforme determinado pelas resoluções pertinentes da ONU, assim como pelo desmantelamento dos colonatos, o fim dos bloqueios e a libertação dos detidos.

Atualmente, 146 Estados já reconheceram o Estado da Palestina, ou seja, mais de 70% dos Estados-membros da ONU, sendo que 11 dos quais são países que integram a União Europeia.

Portugal já devia ter reconhecido o Estado da Palestina.

Face ao anteriormente exposto e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:

Resolução

Nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a Assembleia da República recomenda ao Governo que:

  1. Reconheça o Estado da Palestina, nas fronteiras anteriores a 1967 e com capital em Jerusalém Oriental, conforme determinado pelas resoluções adotadas pela Organização das Nações Unidas;
  2. Assuma essa posição no âmbito da Organização das Nações Unidas e noutras instâncias internacionais em que está presente;
  3. Conduza a sua ação no plano das relações internacionais com vista à efetiva concretização de um Estado da Palestina soberano, independente e viável, nas fronteiras anteriores a 1967 e com capital em Jerusalém Oriental, e ao cumprimento do direito de retorno dos refugiados palestinianos, conforme determinado pelas resoluções da Organização das Nações Unidas.
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