Intervenção de Paula Santos na Assembleia de República

Recomenda ao Governo que analise a evolução dos impactos na saúde do consumo de cannabis, adote medidas para prevenir o seu consumo e estude a utilização de cannabis para fins terapêuticos

(projeto de resolução n.º 1435/XII/4.ª)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados

O consumo de cannabis tem evoluído de uma forma preocupante no nosso País.

Depois da redução generalizada do consumo em 2007, constatou-se, em 2012, uma inversão, tendo aumentado a prevalência do consumo na população em geral e com particular incidência na população escolar. Aliás, a prevalência do consumo de cannabis pelos mais jovens apresenta uma tendência de crescimento.

A isto, junta-se o aumento do consumo abusivo de cannabis e o aumento da população, que apresenta sintomas de dependência também do consumo de cannabis.

Noutro plano, há uma maior procura de tratamento por consumidores de cannabis: 49% dos novos utentes em tratamento em ambulatório são consumidores de cannabis e nas comunidades terapêuticas há já 24% de utentes.

As nossas preocupações avolumam-se quando olhamos para esta realidade, ao mesmo tempo que a capacidade de resposta dos serviços públicos na área da toxicodependência está comprometida, em resultado das opções políticas do Governo de desestruturação, de desintegração da estratégia de combate à toxicodependência e de desinvestimento público, que conduziu ao encerramento, à concentração de valências e à enorme falta de profissionais de saúde, estando hoje as equipas multidisciplinares totalmente depauperadas.

O que é urgente e necessário é reforçar o investimento público na prevenção, na redução de riscos e na minimização de danos, no tratamento e na reinserção, garantindo a capacidade de resposta pública adequada às exigências.

Para o PCP, a prioridade de intervenção passa pelo reforço na prevenção do consumo de cannabis, pela adoção de medidas concretas dirigidas especificamente a cada grupo populacional e pelo reforço da capacidade de resposta dos serviços públicos na área da toxicodependência, com a manutenção da autonomia dos centros de respostas integradas, das unidades de desabituação e das unidades de alcoologia, dotando-as dos meios financeiros, técnicos e humanos necessários e alargando as equipas de rua.

Propomos também que se atualize e se aprofunde o estudo científico relativo ao efeito do consumo de cannabis na saúde, porque, por um lado, a produção de cannabis tem vindo a aumentar os teores THC, a substância psicoativa responsável pelos efeitos nefastos na saúde, e, por outro lado, os estudos existentes demonstram que o consumo de cannabis conduz a um maior risco de sintomas psicóticos e de perturbações mentais.

Sr. Presidente,
Srs. Deputados

Neste debate, queremos afirmar que, perante a realidade do nosso País e perante as prioridades que aqui elencamos, não podemos acompanhar a proposta apresentada pelo Bloco de Esquerda.

Importa também clarificar o seguinte: não temos nada a obstar, quando há vantagens clínicas comprovadas cientificamente, em relação à utilização de cannabis para fins terapêuticos. Propomos, inclusivamente, que o Governo aprofunde esta questão e, havendo essa vantagem clínica comprovada, que ela seja incluída nas terapêuticas do Serviço Nacional de Saúde (SNS).

No entanto, não podemos aceitar que a apreciação da utilização de cannabis para fins terapêuticos seja misturada com a legalização do consumo de cannabis. Estas questões não têm nada em comum, pois uma coisa é a abordagem da utilização de cannabis como uma terapêutica — aliás, outras drogas são utilizadas com este fim — e outra coisa é a legalização de cannabis para fins recreativos, prejudiciais para a saúde.
(…)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

Muito brevemente, gostaria de dizer que as propostas que o PCP aqui trouxe de prevenção, de intervenção, de reforço da capacidade de respostas dos serviços públicos na área da toxicodependência não estão a ser implementadas pelo Governo, como PSD e CDS disseram.

Muito pelo contrário, este Governo foi o responsável pela desestruturação e pelo desmantelamento da resposta pública em relação a esta matéria.
Foi responsável pela redução das equipas na área do tratamento, foi responsável pela redução das equipas de rua e por termos hoje menos profissionais nesta área.

Por isso, as propostas que hoje aqui trazemos são, de facto, necessárias e, muito mais do que isto, prioritárias para combater e prevenir os consumos de cannabis, que os senhores também aqui colocaram como preocupante, que precisa de medidas imediatas, mas que, efetivamente, este Governo tudo fez para as destruir, mas não para prevenir o consumo de cannabis.

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