Projecto de Resolução N.º 574/XV/1.ª

Recomenda ao Governo a dissolução da empresa Águas do Alto-Minho e o retorno do controlo público dos serviços de água e saneamento para os municípios da região

Exposição de motivos

A empresa Águas do Alto-Minho (AdAM) iniciou atividade em janeiro de 2020, constituindo-se como uma sociedade anónima detida pelos acionistas Águas de Portugal SPGS (maioritário, com 51% da estrutura acionista) e os municípios de Arcos de Valdevez, Caminha, Paredes de Coura, Ponte de Lima, Valença, Viana do Castelo e Vila Nova de Cerveira, funcionando em modelo de delegação/parceria.

Foram transferidos para esta empresa os serviços municipalizados de águas e saneamento dos vários municípios. A agregação dos sistemas municipais de águas e saneamento, em vez de melhorar o serviço prestado, potenciando sinergias entre os sistemas municipais, veio antes provocar elevados aumentos das tarifas de água, originar o aparecimento de erros graves na atribuição de consumo de metros cúbicos de água e a constante sobrevalorização dos montantes a pagar por estimativa, gerando cobranças indevidas de taxas de saneamento.

Estes processos de agregação de sistemas de fornecimento de água e de saneamento em baixa (competência claramente municipal) em vários municípios de diversos distritos, têm conduzido a que as autarquias percam o controlo da gestão da água, e da sua entrega aos munícipes, assim como do sistema de saneamento, ao mesmo tempo que as populações perderam meios de controlo democrático sobre a política de água e visto os preços aumentar, como está também evidente neste caso.

Esta entidade tem disponível um serviço de atendimento ineficaz, que se comprova por um desempenho francamente deficiente na resposta às reclamações que são dirigidas à empresa, o que se afigura como inaceitável para os cidadãos que, quanto à constituição da empresa e respetiva delegação de competências, não tiveram qualquer responsabilidade.

A análise dos dados e indicadores relativos à qualidade do serviço mostram que em 2020, a empresa recebeu 5598 reclamações registadas e em 2021 recebeu 6208 reclamações, com uma grande parte a não ter resposta (em 2020 foram apresentadas 633 respostas a reclamações e em 2021 foram apresentadas 3017 respostas a reclamações). E destaca-se que a AdAM é a entidade que, de acordo com o regulador, tem mais queixas registadas.

Em 2020 foram registadas 2862 avarias em condutas e em 2021 foram registadas 2462 avarias em condutas que deram origem a 40 falhas de abastecimento.

A avaliação realizada à qualidade do serviço, quer em 2020, quer em 2021, mostra qualidade insatisfatória em matéria de reclamações e de avarias em condutas; e em adequação dos recursos humanos às necessidades do serviço a qualidade não ultrapassa a mediana.

A inação e ausência de respostas em matéria de qualidade do serviço e custos aceitáveis para os utentes, fragilizam a economia e a saúde familiar de quase 200 mil cidadãos que residem nestes municípios, situação que se revela absolutamente inaceitável.

Lembramos que os eleitos da CDU na região se opuseram ao processo de criação desta empresa, que não mereceu qualquer oposição de PS, PSD e CDS. Passados três anos sobre a criação da AdAM, todos os alertas e denúncias que o PCP fez sobre esta matéria confirmam-se hoje nos inúmeros prejuízos causados a centenas de milhares de famílias com erros de faturação, cobranças indevidas, preços exorbitantes no valor da água e saneamento.

No quadro actual que se vive, com o aumento especulativo dos preços de grande parte dos bens essenciais e da habitação, a cobrança de valores exagerados pelo acesso ao abastecimento de água e saneamento, vem ainda mais dificultar a vida das famílias.

Sendo a água um bem essencial à vida, sem a qual nenhum ser vivo pode viver, a acessibilidade à água constitui um direito universal que tem de ser assegurado a todos os cidadãos. A universalidade do acesso à água só se garante em toda a sua plenitude contrariando lógicas mercantilistas e exploradoras e assegurando o abastecimento de água e de saneamento, de qualidade e acessíveis a toda a população.

Assim, e tendo em consideração o acima exposto, ao abrigo da alínea b) do Artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do número 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo-assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de

Resolução

Nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição, a Assembleia da República resolve recomendar ao Governo que:

  1. Tome as medidas necessárias para a dissolução da empresa Águas do Alto Minho e para a reversão integral para os municípios dos serviços assegurados por esta empresa;
  2. Tome as medidas necessárias para assegurar o retorno de todos os montantes cobrados indevidamente e em excesso, a todos os consumidores;
  3. Promova, no âmbito das suas competências, medidas de apoio aos sistemas que favoreçam uma política de preços e tarifas que assegure a todos o acesso à água e saneamento, em condições de igualdade e que não penalize as famílias e as populações;
  4. Garanta que todos os trabalhadores da empresa Águas do Alto Minho mantêm os seus postos de trabalho e os direitos laborais associados;
  5. Assuma as devidas ilações deste processo e ponha fim a uma política de intrusão em área de competência das autarquias locais, assegurando, no âmbito dos instrumentos de financiamento disponíveis para o País, fundos para o Ciclo Urbano da Água, sem discriminação e sem qualquer imposição de modelo de organização ou agregação.