Projecto de Resolução N.º 198/XVII/1.ª

Recomenda ao Governo a criação da Empresa Nacional de Dragagens, E.P.E.

Exposição de Motivos

Uma das áreas em que é evidente a falta de investimento e o abandono do sector marítimo-portuário nacional é a manutenção da navegabilidade no acesso aos portos, em particular nos portos de pesca, o que põe em causa a segurança das embarcações e suas tripulações.

O assoreamento dos canais de acesso, das barras e dos próprios portos requer a definição de um plano de intervenção continuado e a realização atempada das indispensáveis operações de dragagem para manutenção da navegabilidade. Vila do Conde, Póvoa do Varzim, Esposende, Caminha, Tavira e todo o canal até Santa Luzia são exemplos de situações particularmente preocupantes.

Porém, a atuação dos sucessivos Governos tem deixado para trás estas intervenções, dificultando a atividade marítima, em particular nos portos de pesca, traduzindo-se em condicionamentos à navegação, obrigando a paragens forçadas da atividade da pesca e/ou pondo em causa a integridade das embarcações e a vida dos seus tripulantes.

O PCP tem vindo a intervir, ao longo dos anos, no sentido de reclamar a elaboração de planos plurianuais de dragagem de canais de acesso, barras e portos, que permitam conhecer e estimar as necessidades e assegurar que as operações de dragagem são realizadas de forma programada e eficaz, tendo em conta as necessidades locais. É fundamental a concretização atempada dos planos, o que não acontece atualmente, com os poucos existentes a serem executados sempre com anos de atraso, apesar das dezenas de anúncios e conferências de imprensa que cada um motiva.

Por exemplo, o Plano Plurianual de Dragagens Portuárias 2018-2022, abrangendo 20 portos de pesca e de recreio em Portugal Continental, sob jurisdição da

Docapesca

, S.A., distribuídos pelas regiões Norte (portos de Vila Praia de Âncora, Esposende, Póvoa de Varzim e Vila do Conde), Oeste (portos de Nazaré, São Martinho do Porto, Peniche e Ericeira) e Algarve (portos de Lagos, Alvor, Portimão, Albufeira, Quarteira, Faro, Olhão, Fuzeta, Santa Luzia, Tavira, Cabanas e Vila Real de Santo António), onde a realização de dragagens incumbe à Direção Geral de Recursos Naturais, Segurança e Serviços Marítimos, registou uma taxa de execução de zero nos primeiros dois anos, e ainda não se conhece um balanço à sua taxa de concretização, três anos depois da data da sua suposta concretização.

O mesmo está a acontecer com o Plano Plurianual de Dragagens do Algarve 2024-2026, cuja taxa de concretização continua a ser reduzida, apesar de já ter alimentado duas campanhas eleitorais.

Entretanto, indiferente aos atrasos do Governo, o mar vai fazendo o que sempre fez, sem atrasos. As dragagens são uma necessidade permanente em Portugal.

Cresce no sector a convicção de que a única solução para uma atividade regular de dragagem dos portos nacionais é a reconstrução da capacidade pública de dragagem, seja através de dragas adquiridas e operadas pelas administrações portuárias, seja através da criação de uma empresa pública dedicada a essa operação.

A resistência irracional da ideologia neoliberal tem travado essa possibilidade, não obstante estudos credíveis apontarem para uma redução dos custos operacionais públicos em cerca de 20 a 30% face aos atuais, pois cada draga pública poderia custar cerca de um milhão de euros por ano (pessoal, manutenção, despesas operacionais) quando hoje a sua subcontratação por igual período acarreta para o Estado encargos entre três milhões e cinco milhões de euros.

Desde a privatização da

Dragapor

, alienada por 3,1 milhões de euros e integrada na empresa

Royal

Boskalis

, o País tem recorrido cada vez mais a empresas privadas estrangeiras para a execução dos trabalhos de dragagem, contribuindo para acentuar a dependência do País face ao grande capital externo, levantando uma vez mais questões relacionadas com a soberania nacional.

O melhor caminho para o Estado reconstruir a sua capacidade de realização dos trabalhos de manutenção e garantia da navegabilidade em segurança, nos portos e barras nacionais, de acordo com as necessidades em cada momento e cumprindo um planeamento eficaz destas operações, é através da reconstituição de uma Empresa Nacional de Dragagens, dotada dos meios humanos, técnicos e financeiros suficientes para garantir a sua operacionalidade assegurando a resposta quer em situações correntes, como em situações de emergência.

Assim, nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte

Resolução

A Assembleia da República, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, resolve recomendar ao Governo que adote as seguintes medidas:

Crie a Empresa Nacional de Dragagens, E.P.E., com o objetivo de assegurar o desassoreamento, alargamento, desobstrução, remoção, derrocamento ou escavação de material do fundo de rios, baías e canais de acesso a portos comerciais, de pesca, de recreio ou de abrigo na costa portuguesa, permitindo preconizar uma gestão mais racional de recursos, a necessária intervenção programada e permanente e consequentemente o desenvolvimento da produção nacional, contribuindo para uma verdadeira economia do mar;

Apresente, no prazo de seis meses, um Plano Plurianual de Dragagens dos portos, barras e canais de navegação para todo o território nacional com indicação dos volumes a dragar, cronograma de execução dos trabalhos, estimativa de montantes envolvidos e prazo para que esteja reposta a segurança da navegabilidade em todos os portos.