O Nordeste Algarvio enfrenta, há algumas décadas, um processo acelerado de despovoamento e envelhecimento demográfico. Entre 2001 e 2011, o concelho de Alcoutim perdeu, de acordo com os resultados dos Censos 2011, quase 23% da sua população residente. Em 2001, este concelho tinha 3770 habitantes, passando para apenas 2.917 no ano de 2011. Em três das cinco freguesias deste concelho – Martim Longo, Pereiro e Vaqueiros – o decréscimo populacional ultrapassou 25%. O grupo etário com menos de 25 anos foi o que sofreu um maior decréscimo (-37%), enquanto os habitantes com 65 ou mais anos constituem o maior grupo etário (44% da população residente).
Também do ponto de vista económico, o concelho de Alcoutim tem sofrido um acentuado declínio, com o gradual abandono das atividades económicas tradicionais, sem que outras tenham surgido no seu lugar. A quase inexistência de ofertas de emprego, assim como a insuficiência de equipamentos sociais, tem também contribuído para o êxodo dos habitantes mais jovens. Em resultado, no concelho de Alcoutim há apenas 1,1 trabalhadores ativos por cada habitante com 65 ou mais anos de idade.
O processo de desertificação económica e demográfica do concelho de Alcoutim, assim como de outros concelhos da serra algarvia, acentuou-se nas últimas décadas em resultado do abandono a que as regiões do interior algarvio tem sido votadas por sucessivos governos e de um modelo de desenvolvimento regional que aposta quase exclusivamente no turismo de sol e praia, canalizando para o litoral algarvio a esmagadora maioria dos investimentos. Acresce ainda que a política de ataque às funções sociais do Estado – agravada agora pela aplicação do Memorando da Troica –, que se traduz no encerramento de escolas, de centros de saúde e de diversos serviços públicos, é particularmente nociva para as regiões do interior, contribuindo para a aceleração dos processos de desertificação económica e demográfica.
Nos últimos anos, alguns dos investimentos previstos para a região do Baixo Guadiana foram adiados sine die, como, por exemplo, a construção da ponte internacional entre Alcoutim e a localidade espanhola de Sanlúcar, a conclusão dos lanços do IC 27 ligando Alcoutim ao IP2 (em Albernoa, perto de Beja) ou o desassoreamento do Guadiana da foz até ao Pomarão, visando repor a navegabilidade desta importante via fluvial que num passado não muito distante fervilhava de atividade. Sem os necessários investimentos públicos, o concelho de Alcoutim, assim como os demais concelhos do interior serrano algarvio, não conseguirão travar o processo de desertificação e continuarão a definhar, económica e demograficamente.
A construção de uma ponte entre as localidades de Alcoutim e Sanlúcar tem sido uma reivindicação das populações de ambas as margens do rio Guadiana desde a reabertura da fronteira, em finais dos anos 70 do século passado. É unanimemente reconhecido que a construção dessa ponte teria um impacto importantíssimo na dinamização da economia local e na atração e fixação de novos habitantes. Contudo, devido à inação de sucessivos governos do PS, PSD e CDS, o processo para a construção da ponte Alcoutim-Sanlúcar vem-se arrastando penosamente.
Ao longo dos anos, o Grupo Parlamentar do PCP tem exigido a sucessivos governos a construção de uma ponte sobre o Guadiana, ligando Alcoutim e Sanlúcar. Alguns passos para iniciar o processo de construção desta ponte chegaram a ser dados no passado, como o lançamento pelo Instituto das Estradas de Portugal de um concurso público para a realização de um estudo prévio para a definição das características da ponte e sua localização (em 2001-2002) ou a inclusão de uma verba para a construção da ponte no quadro do programa comunitário INTERREG III (em 2003). Contudo, estes primeiros passos não tiveram o necessário seguimento e o projeto foi sendo sucessivamente adiado.
Mais recentemente, em fevereiro de 2012, o Grupo Parlamentar do PCP tornou a levantar esta questão junto do Ministério da Economia e Emprego, o qual, na sua resposta, informou que “a Ponte Internacional de Alcoutim-Sanlúcar é uma ligação de interesse local, pelo que não se encontra prevista no PRN2000 [Plano Rodoviário Nacional 2000]”, sendo que “a sua construção e financiamento competirá às autoridades locais e regionais dos respetivos países [Portugal e Espanha]”. Desta forma, o atual Governo manifestou o seu total desinteresse pelo projeto de construção da ponte entre Alcoutim e Sanlúcar, remetendo o seu financiamento para entidades locais e regionais nacionais que o Governo sabe perfeitamente não disporem de capacidade financeira para concretizarem este projeto.
O Estado deve assumir a responsabilidade pela condução do processo de construção da ponte internacional entre Alcoutim e Sanlúcar, desenvolvendo junto das autoridades espanholas e da Comunidade Autonómica da Andaluzia as necessárias diligências para assegurar o financiamento – incluindo apoios comunitários –, a realização dos estudos prévios e o lançamento e concretização da obra.
O atual Governo tem justificado a sua recusa em concretizar investimentos públicos em infraestruturas necessárias ao desenvolvimento económico e social do país com a alegada inexistência de disponibilidade financeira. Importa a este propósito, e antecipando desde já a estafada desculpa do “Não há dinheiro!” a que a maioria parlamentar PSD/CDS recorre amiúde, lembrar que o Governo pagou, entre março e junho deste ano, 1.008 milhões de euros a nove bancos estrangeiros pelo cancelamento de ruinosos contratos swap celebrados entre esses bancos e empresas públicas, ou ainda que o Governo disponibilizou, no ano passado, 1.033 milhões de euros para tapar o buraco do BPN e, no início deste ano, mais 1.100 milhões de euros para a recapitalização do Banif, além dos 7.200 milhões de euros anuais destinados ao pagamento dos juros de uma dívida pública em grande parte ilegítima. Enquanto os grandes grupos económicos e financeiros se apropriam de parcelas crescentes da riqueza nacional, o Governo abandona ou adia por tempo indeterminado investimentos necessários ao desenvolvimento económico e social do país.
O PCP não se conforma com a inação de sucessivos governos relativamente à ponte de Alcoutim-Sanlúcar, nem desiste de lutar pela concretização desta infraestrutura, vital para desenvolvimento económico e social do Nordeste Algarvio, pelo que, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo que assuma a Ponte Internacional do Guadiana entre Alcoutim e Sanlúcar como uma ligação de interesse regional e nacional, e desenvolva as necessárias diligências – incluindo os contactos com as autoridades espanholas e andaluzas – com vista à rápida concretização desta infraestrutura, vital para o desenvolvimento económico e social do Nordeste Algarvio.
Assembleia da República, em 10 de julho de 2013