&quot;Três notas&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Nesta semana após as eleições para o Parlamento Europeu, há três notas que gostaria de sublinhar: 1ª - Os resultados eleitorais que demonstraram o profundo desfasamento entre o País real e o poder político que nos (des)governa. A enorme derrota da coligação governamental PSD/CDS que, apenas com 33,2% dos votos, ou seja, pouco mais do que aquilo que o PSD conseguiu sozinho em 1999, perdeu dois deputados no Parlamento Europeu. O descontentamento da maioria da população com a política governamental, bem visível de norte a sul do País, fez-se sentir de forma muito forte nesta votação para o Parlamento Europeu. E não há abstenção que possa escamotear a dimensão deste enorme castigo. Até porque, como insistentemente ouvimos nas ruas, praças, mercados e à porta de empresas, muita desta abstenção é também um voto de protesto contra a política de direita. A vontade de mudança foi, a seguir ao descontentamento, o sentimento mais comum que as pessoas exprimiram nos milhares de contactos que realizámos. Há um cansaço generalizado com uma política que aumenta o desemprego, impede o emprego de milhares de jovens licenciados, agrava as condições de trabalho e de vida da maioria dos trabalhadores e asfixia a nossa débil estrutura produtiva e comercial. Hoje, há melhores condições para a luta contra este governo e esta política. A manutenção dos dois deputados da CDU e o aumento de dois pontos percentuais entre as últimas eleições legislativas de 2002 e estas eleições para o Parlamento Europeu (de 7% para 9,1%), mostrou que falhou a estratégia da comunicação social que há muito tinha decidido eleger um deputado do BE à custa da CDU, questão só parcialmente ultrapassada nas duas últimas semanas de uma campanha eleitoral intensa, que mobilizou milhares de pessoas. Vamos continuar a lutar pela mudança que se impõe na política portuguesa, para concretizar propostas e defender soluções na defesa do interesse nacional, numa posição patriótica que afirme a importância de Portugal, e numa estratégia negocial que promova os interesses portugueses nas políticas europeias, seja na defesa da produção e do emprego com direitos, seja por novas políticas sociais, por uma Europa mais justa, mais democrática e solidária, empenhada na cooperação e na paz e contra a dita constituição europeia. 2ª - No plano internacional, o agravamento da situação no Iraque e na Palestina exige uma atenção cada vez maior. A recente resolução 1546 do Conselho de Segurança da ONU, ao procurar dar cobertura à guerra e ocupação do Iraque pelos EUA e seus aliados, no desrespeito da própria Carta das Nações Unidas, pode ter sérias consequências na evolução duma situação explosiva em toda aquela zona e mesmo no plano mundial. Sabe-se bem que a anunciada “transferência de poderes“, a 30 de Junho, é uma farsa forjada pelas forças de ocupação, que continuarão no terreno com todo o seu poderio militar e policial, a comandar e defender a estratégia de uma Administração Bush cada vez mais desacreditada no seu próprio País. Depois da denúncia das práticas criminosas, das torturas e outras sevícias que as forças de ocupação continuam a praticar nas prisões iraquianas, é inadmissível manter a ocupação do Iraque com cobertura de uma resolução do Conselho de Segurança da ONU, abrindo caminho a novos projectos militaristas do imperialismo americano. O que se impõe é o fim da guerra e da ocupação no Iraque e na Palestina e o regresso imediato do contingente da GNR. 3ª - O novo julgamento de mulheres em Setúbal, acusadas de práticas de aborto clandestino, depois dos julgamentos da Maia e de Aveiro, vem demonstrar que prossegue esta revoltante violência contra as mulheres, esta devassa da sua privacidade, esta humilhação que resulta de uma lei retrógrada, iníqua e ultrajante das mulheres. Sabe-se que o próprio Parlamento Europeu já aprovou uma Resolução a apelar aos Estados-membros que terminem com as leis que criminalizam práticas de aborto, quando decididas pela mulher e a pedido destas, no primeiro trimestre. É urgente pôr fim a esta situação que envergonha o País e que remete para a clandestinidade milhares de mulheres que precisam de recorrer ao aborto. Os resultados eleitorais de 13 de Junho demonstram que há uma posição maioritária no País favorável à resolução deste problema, na defesa da dignidade das mulheres e da saúde pública. É urgente alterar a lei.

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