&quot;O Homem da guitarra&quot;<br />Ruben de Carvalho no &quot;Diário de Notícias&quot;

A genialidade de Carlos Paredes é realidade universalmente reconhecida. Será, agora, com toda a justiça, de novo tornada presente.Igualmente se recordarão os traços ímpares da personalidade, do que um dia Manuel Jorge Veloso chamou a «desarmante postura (...) a humildade natural perante a música que cria», sublinhando com verdade que «Paredes pertence ao número dos artistas que menos falam de si, menos aparato criam à sua volta». Recordaremos todos as afectuosas histórias da sua proverbial distracção, das suas paixões quando abraçado à guitarra, da sua constante discrição.Mas será indispensável que essas narrativas não deixem a ideia de uma espécie de «génio louco», artista genial afastado da realidade, dela alheado, vivendo numa nebulosa apenas tornada coerente pela sonoridade única da sua música.Porque foi, também, uma forte, uma decidida personalidade, implantada no seu tempo, no País, no povo. Lúcido, consciente, determinado.Inventou uma nova guitarra, mas não enjeitou a necessidade da palavra quando sentiu que a busca que prosseguia na música dela necessitava. Por isso escreveu apaixonantes textos como os da suite O Oiro e o Trigo. Enfrentou as prisões e a tortura salazaristas não por acidente, mas pelo empenho político que jamais abandonou. O seu compromisso cívico e intelectual foi vertical e resoluto, é o paralelo real da genialidade da sua arte. Um revolucionário, não apenas na música.