&quot;O exemplo da Bombardier&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

Após uma visita que fiz, recentemente, à Bombardier/ex-Sorefame, na Amadora, propus à Comissão de Trabalhadores uma reunião no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, do Conselho Europeu da Bombardier. Os recentes acontecimentos mostraram a importância desta iniciativa para sensibilizar deputados dos vários países onde a Bombardier mantém fábricas, embora algumas estejam ameaçadas de paralisação total da produção, como em Portugal. No caso português, trata-se de um autêntico crime económico, dado ser a única empresa nesta área da produção de material circulante, de carruagens para comboios, e haver uma especialização tecnológica de alta qualidade que, assim, corre o risco de ser destruída, o que obrigaria a que, no futuro, se tivesse de comprar no estrangeiro o que podemos construir em Portugal, enquanto os nossos trabalhadores iriam para o desemprego. Foi assim que, a convite do grupo que integramos, o Grupo da Esquerda Unitária Europeia / Esquerda Verde Nórdica (GUE/NGL), esteve presente, esta semana, no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, uma delegação do Conselho Europeu de Empresa da "Bombardier", onde se incluíam dois portugueses, Amadeu Moreira e Paulo Félix (da ex-Sorefame), e ainda representantes do Reino Unido, Alemanha e Suécia. No debate, em que participaram deputados de diversos grupos políticos existentes no Parlamento Europeu, os representantes dos trabalhadores deram a conhecer a sua situação. Por um lado, responsabilizaram a multinacional canadiana pela sua falta de responsabilidade social e total incumprimento das directivas comunitárias sobre informação e consulta dos trabalhadores relativamente às reestruturações que está a fazer. Os objectivos da multinacional, em Portugal, são claros e transparentes: destruir a capacidade produtiva instalada, manter-se a vender para o mercado português, não permitir que outra multinacional reforce a sua posição no mercado e continuar a aumentar os seus lucros. Mas, por outro lado, os trabalhadores também responsabilizaram a Comissão Europeia e os Governos dos respectivos países por não assumirem uma estratégia clara na defesa da ferrovia e no acelerar dos investimentos públicos prometidos quanto às redes transeuropeias, além da crítica que fizeram às privatizações, seja em Portugal seja o caso dos caminhos de ferro no Reino Unido. Do debate, ficou claro que se houver vontade política e uma acção urgente, a decisão de encerramento pode ser superada, com a intervenção e a pressão da Comissão Europeia e dos Governos, mesmo no actual quadro legal, e dando viabilidade às fábricas através da utilização dos grandes investimentos na ferrovia. No dia seguinte, na sessão parlamentar sobre a recente Cimeira da Primavera, tive ocasião de exigir que a Comissão e o Conselho se comprometam a: - tomar medidas eficazes para travar as deslocalizações das multinacionais e reconhecer o direito de veto suspensivo às suas organizações de trabalhadores; - relançar investimentos públicos e sociais, designadamente nas ferrovias, saúde, ambiente, educação e investigação; - intervir na defesa do emprego, da produção e da coesão económica e social. Contando com o apoio de todos os deputados dos países ameaçados pelo encerramento de fábricas da Bombardier, iremos insistir no agendamento de um debate parlamentar, na próxima sessão de Estrasburgo, sobre esta situação. Mas a verdade é que as conclusões desta Cimeira da Primavera demonstram que os responsáveis governamentais teimam em prosseguir uma política de indiferença perante o agravamento da situação económico-social, cega perante níveis elevados de desemprego, de pobreza e exclusão social e de crescimento das desigualdades sociais, surda aos protestos dos trabalhadores ameaçados pelas deslocalizações e reestruturações de empresas multinacionais. A receita continua a ser a aposta na chamada competitividade, na promoção do que consideram a cultura empresarial, na flexibilidade e precariedade do trabalho, na redução dos custos salariais e na moderação salarial, no ataque aos serviços públicos, ou seja, na agenda neoliberal dos grupos económicos e financeiros, em vez de se preocuparem com as condições de vida e de trabalho, com um desenvolvimento sustentável, uma maior coesão económica e social, o relançamento dos investimentos públicos e sociais, designadamente nas ferrovias, na saúde, ambiente, educação e investigação. O que é urgente é rever as políticas económicas e monetárias, parar as liberalizações, rever o Pacto de Estabilidade para dar prioridade aos critérios sociais, ao emprego, à formação, educação e investigação, áreas essenciais para o desenvolvimento sustentado da Europa. O que se impõe é dignificar quem trabalha, colocar o bem-estar e o progresso social no centro das decisões políticas comunitárias.

  • União Europeia
  • Central