&quot;Dá cá as propinas e toma lá o ajuste directo...&quot;<br />António Abreu na &quot;Capital&quot;

1. Foram muitos mil os estudantes que, vindos de todo o País, venceram a barragem de opiniões dos muitos comentaristas do conformismo militante que vivem do limitar as perspectivas às audiências. Comentaristas que num passado recente lhes chamaram a “geração rasca” e que hoje os tratam por “filhos de família que gastam fortunas na noite e se arrastam, não estudando e esfumando os nossos impostos”… No princípio disseram que eram poucos, que acabariam por comer e calar. Não calaram. Discutiram uns com os outros. Convenceram-se. Evitaram ratoeiras que lhes foram armando. Procuraram convergir com professores e reitores. Empurraram a inércia. Quando partiram, sabiam que seria muito difícil. Mas na quarta-feira desaguaram em Lisboa como braços dum rio de vontades. Deram voz aos que estão perplexos e descontentes com a agonia a que sucessivos governos querem levar o ensino superior. Sim, porque muitos são os que não suportam o acumular de despesa para ter um filho a estudar, o sempre a somar de propinas, alimentação, transportes, material escolar e mesadas. E os que, apesar de ultrapassarem tudo isso, se vêem a braços com a falta de saídas profissionais. Quantos foram os jovens e as famílias que investiram o que tinham e não tinham? E que tiveram que defrontar a realidade dos “empregadores” pouco “empreendedores” que não querem investir, inovar, aumentar a qualificação dos seus quadros, a competitividade dos seus produtos, a qualidade dos serviços que oferecem. Que preferem mão-de-obra menos qualificada, mais barata. Da luta dos estudantes poderá dizer-se que é cíclica. Mas também é cíclica a oxigenação do sangue que em nós circula. E cíclicos são também os atavismos de empresários, grupos económicos e governos quanto ao valor intrínseco da juventude, do saber, da cultura e do espírito científico e do impacte disso na nossa qualificação média, da nossa produtividade e competitividade. Poderão alguns não achar graça à sua irreverência e até assinalar o efeito de boomerang de algumas “números” feitos para TV dar mas que sempre querem bloquear. Poderão até pensar que, em contraste com dificuldades e silêncios de muitos que sofrem a ponto de não terem voz ou dos que receiam perder algo, os estudantes seriam privilegiados na capacidade de expressão e na mediatização das suas lutas, quando eles estão condenados ou se condenam ao silêncio. Importa que fique claro que são estas e outras expressões cíclicas de inconformismo, nas ruas, no remar contra a corrente na procura de um rumo desejado, no trabalho criador, na solidariedade social militante, que nos garantem a capacidade de nos continuarmos a questionar, de querermos ser melhores, de não nos habituarmos às genuflexões e decúbitos a que esta globalização nos quer condenar. Mesmo quando, embaraçados por contradições, lhes procuramos dar resposta, estamos a procurar as nossas soluções. Tomar o partido da demagogia populista para lhes dizer não é meio caminho andado para quando outros nos baterem à porta só sabermos baixar os braços. Eles que paguem. Não há dinheiro – diz-se…2. Mas o Dr. Santana Lopes arranjou milhões para um ajuste directo com Frank Gehry . Arranjou? Há-de arranjar…E sabe-se lá como! Sim, porque o que interessa é estar na notícia mesmo sem ser com dentadas nos cães. Mesmo que o final da estória vá ziguezagueando de versão em versão como os locais onde o Casino se foi acolhendo… Sempre se poderá dizer que as obras de autor têm uma individualidade que, quanto mais conceituada for a obra do autor mais suscita o gosto da sua fruição pública, mais valoriza a cidade, mais atrai o visitante e gera sinergias. Por isso a lei criou situações de excepção na regra do concurso público. Mas a aplicação desta excepcionalidade tem sido muito elástica. As obras de arquitectura não podem confrontar tão violentamente o princípio do concurso público. Qual não seria a cidade que não gostaria de ter um Le Corbusier, um Guggenheim, mesmo que não se submetessem a concurso público? Mas as cidades também compreendem que a vaidade tem os seus limites quanto tão mal se continua a viver em alguns bairros, quando tantas são as casas degradadas. E quando tanto se fala do endividamento herdado do município…Mesmo quando se tenta a finta da EPUL. Quando é sabido que quem não tem dinheiro (mesmo dos outros) deve conter os vícios. E que também na arquitectura não devemos remeter para plano secundário os nossos profissionais, em diferentes fases de carreiras, por vezes muito promissoras. A reacção às declarações de Helena Roseta, quer se olhe para ela como exercendo o inquestionável direito de cidadania ou intencionalmente se confunda ( o que obviamente é confundível…) com o rosto visível dos arquitectos é desproporcionada. E tanto mais quando quem a faz tem visto a sua candidatura presidencial feita de borla a pretexto do comentário político e desportivo.

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