&quot;Caminhos europeus&quot;<br />Ilda Figueiredo no &quot;Semanário&quot;

É com natural expectativa que se esperam as conclusões desta última Cimeira da Presidência Italiana, o Conselho de Bruxelas, quando se vive uma preocupante e prolongada estagnação económica e altos níveis de desemprego. No entanto, essa expectativa não se refere à tão necessária modificação das políticas capitalistas neoliberais, causa da actual crise económica e social. Pelo contrário. Vai reafirmá-las: a concretização da "Estratégia de Lisboa", a abertura dos mercados (serviços postais, transporte de passageiros, céu único europeu), maior flexibilização dos mercados de trabalho. E não serão os portos, porque se conseguiu rejeitar, no Parlamento Europeu, a proposta de directiva que visava a sua liberalização. A prioridade continuará a ser dada ao reforço da competitividade das empresas assente na prossecução das liberalizações e privatizações, na baixa dos custos salariais e na flexibilidade, em vez da resolução dos problemas do desemprego e da pobreza e exclusão social. Não é difícil adivinhá-lo tendo em conta a composição dos governos de direita e social-democrata da União Europeia, com posições muito semelhantes nestas áreas do neoliberalismo. Mesmo a denominada "iniciativa para o crescimento", não terá êxito enquanto se mantiverem as limitações que a política monetária impõe, correndo-se ainda o risco de o financiamento dos grandes projectos ficar dependente dos critérios dos mercados financeiros. O Pacto de Estabilidade está moribundo. É preciso enterrá-lo para, finalmente, dar prioridade ao emprego, à educação, à formação e ao desenvolvimento sustentável. A expectativa também não se refere à política criminalizadora e repressiva da imigração, à chantagem sob os países do alargamento de, em caso de não adopção da legislação comunitária, serem penalizados nos fundos, o apoio à actual situação no Iraque, ocupado militarmente, a militarização da União Europeia, sem afectar a NATO. Sabemos que há a ambição de reequilibrar as relações com os EUA, respondendo ao que consideram "reais interesses comuns e capacidades das partes", entenda-se, dos grandes grupos económico/financeiros. É relativamente ao projecto de novo Tratado que pode haver alguma expectactiva, apenas graças à Espanha e à Polónia que querem partilhar o poder de decisão dos outros quatro maiores. Mas é preocupante o que tem sido divulgado, designadamente a inadmissível chantagem financeira exercida por certos Estados membros que ameaçam bloquear o orçamento comunitário para obter um acordo, tendo por base a dita constituição europeia. A verdade é que está na calha a mais profunda e perigosa alteração dos Tratados da União Europeia, visando abrir caminho para um reforço do papel decisivo dos "grandes" países, a exemplo do que ainda há dias aconteceu com o Pacto de Estabilidade. Cada vez de forma mais vincada, clara e arrogante se confundem os interesses dos quatro maiores com os interesses da União Europeia. É cada vez mais preocupante o que se passa com o desenrolar da CIG, que mostra uma clara tendência para a manutenção dos aspectos centrais que a Convenção aprovou, e que contestamos: a consagração e aprofundamento do modelo económico-social do capitalismo neoliberal, o desenvolvimento da militarização da União Europeia e a sua consagração institucional como bloco político militar, o avanço institucional federalista. Significativo disso é o compromisso alcançado entre a França, a Alemanha e a Grã-Bretanha, sob a batuta dos EUA, quanto à militarização da União Europeia, alicerçando as suas bases institucionais como pilar mais ou menos autónomo da NATO. Igualmente preocupante e inaceitável é a afirmação do "primado" da dita "constituição europeia" e do direito comunitário sobre o direito e as Constituições de cada país. Caberá aos povos e às forças progressistas dos Estados-membros da União Europeia, combater este projecto que é construído à medida dos interesses dos grupos económico-financeiros europeus e das ambições das elites que, em cada país, servem objectivamente tais interesses.

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