&quot;A tortura americana (I)&quot;<br />Ruben de Carvalho no &quot;Diário de Notícias&quot;

Para os portugueses hoje com mais de 50 anos a tortura não é uma realidade distante. Estava presente entre nós, directa, ali ao Chiado. Mas entrou nas nossas consciências de muitas formas. A Batalha de Argel e La Question de Henri Alleg, o «pau de arara» e afogamentos dos generais brasileiros de 64, as mãos esmagadas de Vítor Jara no Chile de Pinochet, os torcionários de Ngo Din Diem em Saigão. A Guerra de Espanha, a II Guerra estavam perto. Abu Ghraib trouxe de novo o devastador voyeurismo da foto, do filme, algo que só o nazismo fizera e nos esforçáramos por esquecer. Há outro aspecto surpreendente: a constante, insistente, deliberada componente de violação e humilhação sexual. A tortura conhecida baseava-se sobretudo na dor no limite suportável. Todo o restante cortejo de violências estava presente, humilhação, privação e, graças a manuais sofisticados como o infame Kubark da CIA em 63, passou-se para metódicas tentativas de destruição directa da resistência psicológica: privação do sono, manipulação de ambientes térmicos, acústicos, da alimentação dos presos. Espancamento, murro, pontapé, cavalo-marinho, choques eléctricos, queimaduras de cigarro, golpes com lâminas de barba, sal nas feridas, eram essencialmente universo do torcionário. Humilhação e violência sexual directa não deixavam de estar presentes, mas não tinham o iniludível carácter sistemático, organizado, fomentado agora revelado. (Conclui amanhã)

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