Propostas de alterações ao OE para 2002 - Conferência de Imprensa do Grupo Parlamentar do PCP na AR

No momento da apresentação e do debate na generalidade da proposta de Orçamento de Estado para 2002 o Grupo Parlamentar do PCP teve já oportunidade de a analisar e de sublinhar as múltiplas razões que justificaram a sua recusa e o respectivo voto contra.

Em resumo, o PCP recusou a proposta de Orçamento de Estado por três grandes motivos: por constituir uma clara e desequilibrada cedência às pressões e interesses do sistema financeiro e de grandes grupos económicos, especialmente no que se refere ao recuo numa questão nuclear da reforma fiscal, a tributação das mais valias; por, em contraste, impor uma política salarial, traduzida nas despesas com pessoal, que implica que, pelo terceiro ano consecutivo, os trabalhadores da administração pública sejam altamente penalizados com perda do poder de compra e as consequências inevitáveis para toda a contratação colectiva; pelo seu irrealismo que faz correr o sério risco de transformar o OE numa peça de ficção, por razões de mera engenharia previsional condicionada pelo Pacto de Estabilidade e como tentativa de impor cenários que condicionem, à partida, as negociações salariais.

O debate que tem vindo a ser travado na discussão na especialidade só tem confirmado as razões do PCP.

Apesar desta análise rotundamente crítica o PCP não se demite de apresentar e bater-se, na especialidade, por propostas que minimizem (ou, se possível, anulem) os aspectos mais negativos do Orçamento e permitam defender os direitos dos trabalhadores e dos sectores mais carenciados como os pensionistas e reformados bem como os interesses da economia nacional e do País, designadamente dos sectores produtivos.

As propostas que apresentamos centram-se fundamentalmente nas áreas da fiscalidade, dos direitos salariais, pensões e reformas e direitos sociais, designadamente dos emigrantes, da educação e ainda na área das finanças locais.

FISCALIDADE

 

O Grupo Parlamentar do PCP votará, na especialidade, contra todas as alterações propostas que signifiquem um recuo em relação à reforma fiscal recentemente aprovada o que significa, só por si, se eventualmente o nosso voto obtiver vencimento, o regresso aos textos actuais dos Impostos sobre o Rendimento.

Sem prejuízo disto apresentamos propostas que expressamente visam eliminar o articulado mais expressivo inscrito no OE referente a alterações ou anulação e suspensão da tributação das mais valias, designadamente em matéria de

a) Aumento do valor da isenção, em IRS, de 200 000$00 para 500 000$00 na tributação das mais valias apuradas na venda de acções e outros instrumentos financeiros derivados;

b) Alteração da tributação das mais valias realizadas em operações de bolsa e que beneficiam os movimentos especulativos de curto prazo;

c) Suspensão, com efeitos retroactivos, da suspensão, em IRS, da tributação das mais valias e alteração do regime de tributação dos dividendos que só beneficiam os mais elevados rendimentos;

d) Alargamento ao activo imobilizado incorpóreo para efeitos de benefício na determinação do lucro tributável em IRC da obrigação de reinvestimento do saldo das mais valias apuradas na venda de activos. Isto é, com tal proposta inscrita no Orçamento, qualquer grupo económico poderá vender património produtivo que cria riqueza e substituí-lo por compra de acções na bolsa que tal operação seria considerada, à mesma, como reinvestimento, situação que, aliás, não era aceite mesmo antes da reforma fiscal;

e) Possibilidade das empresas ou grupos económicos poderem incluir o saldo das mais valias obtidas antes de 1 de Janeiro de 2001 na base tributável de qualquer exercício anterior ao daquela alienação e, ainda por cima, sem exigência de reinvestimento;

f) Alargamento às mais valias dos benefícios em IRS e IRC concedidos às SGPS instaladas no off-shore da Madeira bem como ao facto do OE propor que fiquem dispensadas da comprovação da qualidade de não residente das entidades com quem se relacionam;

Propomos ainda na área da fiscalidade:

a) Que até 31 de Março de 2002 o Governo fique obrigado a publicar legislação complementar à reforma fiscal quanto à definição das regras de comunicação à administração fiscal dos movimentos transfronteiriços de transacções não comerciais; à definição dos critérios de imputação de custos e proveitos às sucursais financeiras exteriores e ao estabelecimento dos indicadores objectivos de base técnico-científica para os diferentes sectores de actividade económica para efeitos de aplicação do regime simplificado bem como para a imputação aos agricultores rendeiros;

b) Que as deduções aos rendimentos de trabalho dependente passe dos 72% propostos no OE para 80% de doze vezes o valor mensal do salário mínimo mais elevado, tendo em vista a aproximação do valor da dedução ao valor anual do SMN;

c) O aumento, na dedução à colecta, para 30% dos encargos com lares e outras instituições de apoio à terceira idade para quem não possua rendimentos superiores ao salário mínimo nacional com o limite de 160% ajustando este benefício propostos aos critérios propostos pelo Governo para o mecenato familiar;

d) Eliminar, no Estatuto dos Benefícios Fiscais, os benefícios para os dividendos de acções adquiridas no âmbito das privatizações;

e) Isentar de IRC as Assembleias e Conselhos Directivos dos Baldios que, nos termos da Constituição, gerem os meios de produção comunitários;

f) Conceder o direito à dedução do IVA suportado nas despesas profissionais de alojamento e de alimentação;

g) Aumentar as transferências, a título de IVA, para as Regiões e Juntas de Turismo seguindo o critério geral do OE;

DIREITOS SALARIAIS E SOCIAIS

 

a) Que os aumentos salariais para a Administração Pública garantam um aumento mínimo da remuneração mensal de 7 600$00;

b) Que as pensões de invalidez e velhice do regime geral para os pensionistas e reformados com menos de 15 anos de carreira contributiva (os mais prejudicados nos incrementos havidos nos últimos anos) sejam fixadas em 64% do salário mínimo nacional mais elevado líquido, o que significa, para cerca de 700 mil pensionistas e reformados um aumento da pensão em 10,4% passando dos actuais 36 000$00 para 39 741$00 (tendo já em conta o valor do SMN definido para 2002 - 69 770$00);

c) Que o complemento por dependência atribuído aos pensionistas de invalidez, velhice e sobrevivência passe para 70% e 100% da pensão social do regime não contributivo consoante se trate do 1.º e 2.º grau de dependência, aumentando dos actuais 11 820$00 e 13 130$00 (1.º grau de dependência) e 22 320$00 e 23 630$00 (2.º grau - grandes dependentes) - conforme o regime - para, respectivamente, 21 252$00 (1.º grau) e 30 360$00 (2.º grau), sem distinção de regimes;

d) Que seja garantido o aumento progressivo das comparticipações previstas no regime geral do Serviço Nacional de Saúde para as próteses, ortóteses e ajudas técnicas de forma a aproximá-las das comparticipações previstas no âmbito da ADSE, acabando-se com a escandalosa diferença hoje existente e que já levou, no OE 2001, à aprovação de uma norma idêntica mas que o Governo não executou.
e) Inscrição de verbas para se proceder ao recenseamento da população portuguesa e luso-descendentes residentes no estrangeiro e para o funcionamento do Conselho das Comunidades;

f) Reforço da verba destinada ao apoio às Organizações Não Governamentais da área da igualdade e dos direitos das mulheres;

g) Reforço da verba destinada ao apoio às associações de imigrantes dada a exígua previsão inscrita, em contraste com o aumento do número de associações;

h) Reforço do apoio directo ao associativismo juvenil, tendo em conta a diminuição real existente na proposta de orçamento.

EDUCAÇÃO

 

a) O reforço em 12,5 milhões de euros da verba prevista para as instituições de ensino superior público visando garantir, pelo menos, um nível mínimo de recursos necessários a evitar a ruptura financeira destas instituições em 2002;

b) O reforço de 6,6 milhões de euros para a acção social escolar do ensino superior de forma a permitir o pagamento de 11 mensalidades (e não 10 como actualmente sucede) nas bolsas atribuídas aos estudantes que delas beneficiam;

c) O aumento para 1,75 milhões de euros da verba destinada à acção social escolar para o ensino especial, área extremamente carenciada e que sofre na proposta de orçamento para 2002 um corte nominal de 4,6%.

FINANÇAS LOCAIS

a) Inscrição de uma verba de 2,5 milhões de euros destinada à instalação das onze novas freguesias criadas pela Assembleia da República em 2001;

 

b) Eliminação da autorização pedida pelo Governo para alterar a Lei das empresas municipais, intermunicipais e regionais e para legislar em matéria do endividamento dos municípios, questões que constituem competência reservada da Assembleia da República;

c) Inscrição de uma verba de 2,5 milhões de euros para compensação aos municípios de isenções e reduções nas contribuições e impostos que constituam receita municipal;

De referir, finalmente, que dos custos destas propostas não resultará qualquer aumento do défice uma vez que elas não podem ser desligadas da maior arrecadação de receitas como consequência das propostas que fazemos para a anulação da suspensão da tributação das mais valias e para a eliminação de alguns benefícios fiscais não produtivos. Pelo contrário, da resultante destes dois movimentos resultaria até uma diminuição do valor do défice.

 

As propostas que avançamos (para além de outras no quadro do PIDDAC) permitiriam um Orçamento mais justo, o regresso a uma maior justiça tributária, a arrecadação de mais receita fiscal, a melhoria do poder de compra dos trabalhadores e dos reformados e pensionistas mais carenciados, uma melhor e mais justa distribuição do rendimento nacional, uma nova dinâmica para a própria economia nacional e a resolução de gritantes carências nalgumas políticas sociais.

Está nas mãos do PS a sua viabilização confirmando, se o quiser, o seu alegado empenhamento (bem como do Governo) num processo que conduza a um Orçamento que melhor sirva os interesses do País.

Assembleia da República, em 15 de Novembro de 2001
O Grupo Parlamentar

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