Intervenção de João Oliveira na Assembleia de República

Proposta de lei n.º 90/XIII/2ª- Procede à quadragésima terceira alteração ao Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 400/82, de 23 de setembro, à quinta alteração ao Código da Execução das Penas e Medidas Privativas de Liberdade

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr.ª Ministra da Justiça,

Esta proposta de lei trata, de facto, de algumas das questões mais melindrosas, digamos assim, do ponto de vista do direito penal e do sistema prisional, porque, no fundo, elas mexem com as opções que devem ter como fundamento o objetivo de ressocialização, que tem de ser o objetivo primeiro, central, de qualquer sistema penal.

Portanto, Sr.ª Ministra, quando estamos a discutir a natureza das penas privativas ou não privativas da liberdade, a forma como, do ponto de vista legal e das opções do aplicador da lei ao caso concreto, essas opções se adequam aos objetivos de prevenção geral e especial, quando estamos a discutir as condições de ressocialização que os reclusos encontram no sistema prisional, em função da natureza da pena que lhes é aplicada, estamos a discutir questões centrais do sistema penal e do sistema prisional e que são aspetos fundamentais para podermos alcançar, com sucesso, os objetivos de ressocialização dos arguidos que são condenados pela prática de crimes.

Estas são matérias complexas, mas queria, ainda assim, Sr.ª Ministra, referir quatro ou cinco aspetos que nos parecem essenciais, esperando que, desta vez, a nossa intervenção possa ser compreendida pelo CDS, já que, há bocado, não conseguiram compreender exatamente aquilo que dissemos.

Sr.ª Ministra, queria começar por dizer o seguinte: a determinação da natureza das penas e as condições de funcionamento do sistema prisional são matérias distintas.

Não nos parece que as questões que têm a ver com a sobrelotação dos estabelecimentos prisionais ou com as suas condições de funcionamento, que não asseguram condições de ressocialização aos reclusos, ou outros problemas que vão surgindo do ponto de vista do funcionamento do sistema prisional devam ter como consequência alterações do ponto de vista da natureza das penas que são consideradas nesta ou naquela circunstância.

De resto, temos uma iniciativa apresentada relativamente a um plano de investimentos no sistema prisional que permita adequar as condições de funcionamento do sistema a esses objetivos maiores da ressocialização dos reclusos para que essa matéria seja tratada devidamente no espaço em que deve ser tratada. Julgamos que esses são critérios que devem ser reservados para aí e não em relação ao resto.

Relativamente às alterações que a proposta de lei aponta, ou seja, para a natureza das penas privativas e não privativas da liberdade e as condições em que podem ser aplicadas, da parte do PCP, acompanhamos, no essencial, essas propostas que o Governo adianta.

Felizmente, o Governo considera hoje a reversão de algumas opções que foram feitas no passado com prejuízo para o nosso funcionamento penal, nomeadamente uma opção feita em 2007 relativamente ao período de suspensão de execução da pena de prisão entre um e cinco anos.

Todas as evidências apontavam para a necessidade de a rever e de a adequar em função da experiência, o que veio, de facto, a confirmar as preocupações que, na altura, foram suscitadas. Portanto, saudamos o Governo por isso.

Também saudamos o Governo pela opção de manter, com caráter absolutamente subsidiário, a aplicação das penas privativas da liberdade e, mesmo assim, dentro dessas, apontar preferencialmente para as que não implicam a reclusão do condenado num estabelecimento prisional, optando por outras soluções, do ponto de vista não só da reinserção social mas também da reinserção do recluso, que se têm manifestado, de facto, mais adequadas.

Julgamos que, ainda assim, é preciso ter em consideração algumas preocupações que aqui foram manifestadas — preocupações que acompanhamos sem alarmismos —, nomeadamente, relativas às considerações de prevenção geral que, em muitas circunstâncias, algumas destas opções podem suscitar e que, julgamos, devem ser ponderadas com todo o rigor.

Também acompanhamos a perspetiva de que, em relação ao combate ao racismo e à xenofobia, se há necessidade de alteração no tipo de ilícito no artigo 240.º do Código Penal, então que se trabalhe nesse sentido, não numa lógica que seja securitária e punitiva, como tantas vezes acaba por acontecer, mas numa lógica de adequação do tipo de ilícito penal para que, nos tribunais, a justiça possa ser feita com essa segurança de que a lei prevê, sem margem para dúvidas, a cobertura desse tipo de comportamentos.

  • Justiça
  • Assembleia da República
  • Intervenções