Projecto de Lei

Proposta de Lei nº 125/VII e Projecto de Lei nº 385/VII

Proposta de Lei nº 125/VII,
que criminaliza os mais graves atentados dolosos contra a liberdade de circulação
de transporte rodoviário, ou por ar, água ou caminhos de ferro que não cheguem
a criar perigo para a vida, integridade física ou bens patrimoniais de valor
elevado
Projecto de Lei nº 385/VII,
do PSD, que introduz alterações na legislação penal, em particular no respeitante
aos crimes sexuais contra menores e aos crimes contra a liberdade de circulação.

Senhor Presidente,
Senhor Ministro da Justiça,
Senhores Deputados,

Governo erigiu como prioridade da sua política criminal:

  • O combate aos trabalhadores com salários em atraso
  • O combate a todos os que lutarem contra despedimentos abusivos
  • O combate aos que protestarem contra a insegurança nas escolas
  • O combate aos que reivindicarem extinção de portagens
  • O combate a todos aqueles que, em desespero de causa, se manifestem através
    de cortes de vias de circulação, publicitando graves problemas sociais

A apresentação desta Proposta de lei Penal extravagante, desinserida do Código
Penal, prova à evidência que o Governo quer erigir a lei criminal em arma de
combate contra os problemas sociais.

Arrefecido o fogacho de adolescente que fazia bramar o Partido Socialista na
oposição contra os desígnios do núcleo duro do P.S.D. de criar um Código Penal
da Ponte, tiradas as boinas e todos os sinais meramente exteriores de contestação
à política de direita, o Partido Socialista adopta um discurso jurídico-penal
que criticou no passado, visando encobrir através da intimidação, através de
uma prevenção geral pura, a indignação das populações relativamente a graves
problemas sociais.

E se isto é grave, mais grave é que os objectivos se escondam sob ternos balidos
de cordeiro, mais convincentes se a pele de que se reveste se apresentar como
autenticamente genuína.

É isso que o Governo e o Partido Socialista fazem pretendendo extrair da Constituição
a justificação da neocriminalização de condutas que o P.S.D. só agora tem coragem
de apoiar cedendo, tardiamente para o ex-ministro Dias Loureiro, a exigências
de repressão que formaram tendência no seu anterior Governo.

O P.S. ( quem diria! ) e o P.S.D. sofrem da síndroma da Ponte e provam-no com
as iniciativas legislativas que hoje discutimos.

Por mais que se esforcem por demonstrar que pretendem garantir o direito à
liberdade de circulação, o Governo e Partido Socialista falham porque está bem
claro que o Governo transforma a lei penal num exercício do Poder contra grupos
determinados, contra pessoas que não são criminosas, contra pessoas angustiadas,
desesperadas e indignadas.

A neocriminalização de condutas só pode encontrar justificação quando desencadeiem
consequências comunitariamente inaceitáveis. O que não é o caso.

Porque todos compreenderam a revolta e a angústia dos trabalhadores da Marinha
Grande perante os salários em atraso e o encerramento de empresas. A revolta
dos trabalhadores da Grundig. Foi generalizado o buzinão da Ponte, o repúdio
da violenta carga policial.

E perante a benção do Partido Socialista ao bloqueio da Ponte 25 de Abril,
todos entendem que debaixo da hoje tão abusada palavra liberdade se esconde
a funcionalização da Lei penal aos objectivos do Partido Socialista e não da
comunidade, o uso da Lei penal como instrumento político de direcção social,
como promotora da segurança interna que erige cidadãos que reclamam como inimigos
públicos. Todos compreendem que a lei penal não é aqui reduto de protecção,
em última instância, dos valores fundamentais da comunidade. Funcionando não
como garante do direito à liberdade, mas como rolha no engarrafamento de direitos
por efectivar.

Estamos perante uma proposta que configura um novo crime de perigo mas de perigo
presumido, não de um perigo abstracto, e muito menos de um perigo abstracto
- concreto, como acontece com os artigos do Código Penal relativos a atentados
contra a liberdade de circulação. Que hoje já são punidos, desde que se prove
que dos mesmos resultou perigo para a vida, integridade física ou bens patrimoniais
de valor elevado, de pessoas concretamente determinadas.

Para cometer o crime previsto na proposta de lei, não é preciso provar que
determinada, ou determinadas pessoas viram cerceado o seu direito à liberdade
de circulação.

Assim, o arguido seria condenado com base em meras presunções de perigo. Ora,
nos crimes de perigo presumido, como são os configurados na Proposta de Lei,
a distância entre a conduta e uma eventual lesão de bens jurídicos tutelados
é de tal forma grande, que fica provado que a tutela penal visa, não a salvaguarda
de um perigo, mas a imposição de condutas que interessam ao Governo.

Debalde o P.S. e o P.S.D. confluem na criação de um novo crime de perigo presumido.
Sendo que este último Partido o adoptou entre outras propostas relativas, nomeadamente
a crimes contra as pessoas, que o Ministério da Justiça preteriu em favor de
propostas do Ministério da Adminsitração Interna. Tudo isto é em vão. Porque,
nascendo deslegitimada a proposta, transforma-se em proposta simbólica.

E, como disse um ilustre penalista estrangeiro (W. Hassemer ) o Direito Penal
simbólico a curto prazo mitiga, a longo prazo destrói.

Disse.

 

 

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