Projecto de Resolução

Projecto de Resolução n.º 170/X - Região Demarcada do Douro

Desenvolver o Douro, proteger a região demarcada

 

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Nos 250 anos da Região Demarcada do Douro

1. Comemoraram-se no ano que findou os 250 anos da criação da Região Demarcada do Douro por Alvará Régio sob o patrocínio do Marquês de Pombal. O que marca desde essa data a região do Alto Douro Vinhateiro e a sua evolução em dois séculos e meio - a demarcação (geográfica) pombalina, com marcos de granito, a criação de um cadastro com classificação de parcelas, castas e vinhos, e um complexo mecanismo institucional de regulação da produção - é a sua especificidade, a sua diferença face a outras regiões vitícolas do País e de outros países. Diferença que a tornou pioneira e percursora da demarcação das regiões vitivinícolas em todo o mundo. Marca, especificidade, diferença que se desenvolveu, acentuou e se tornou pelo trabalho de escultor do trabalhador rural e pequeno viticultor duriense numa paisagem única, feita pela UNESCO, Património da Humanidade em 14 de Dezembro de 2001. Marca, especificidade, diferença, carácter e natureza única que se tornou não apenas um ex-libris da região e do próprio País, como constituía e constitui a sua principal mais valia económica, social, ambiental e cultural.

2. Ora as políticas de direita de sucessivos governos do PS e PSD, com ou sem a cumplicidade activa do CDS/PP, procuram com afã, há pelo menos 20 anos, destruir, desfazer, apagar essa marca distintiva, diferença, especificidade, carácter e natureza única.

A arquitectura institucional e económica, consolidada em 250 anos e a que o 25 de Abril deu uma dimensão democrática com o direito dos seus quase 40 000 pequenos viticultores na eleição directa dos órgãos da Casa do Douro e a participação das Adegas Cooperativas e outras estruturas associativas num conselho da viticultura regional, foi subvertida. A uma primeira tentativa falhada em 1986 (Governo do PSD/Cavaco Silva), seguiu-se a criação da CIRDD (Comissão Interprofissional da Região Demarcada do Douro) em 1994 (Governo PSD/Cavaco Silva) e uma nova alteração em 2002/2003 (Governo PSD/CDS-PP/Durão Barroso) com a inserção do Interprofissional no Instituto do Vinho do Porto, IVP, que se passou a chamar Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, IVDP. Assim se retiraram atribuições e competências, inclusive funções de natureza pública (a regularização do mercado de vinhos, por exemplo), à Casa do Douro e o direito de eleição directa dos viticultores, e abriram brechas na propriedade do seu inalienável património que é o Cadastro. Processos que simultaneamente deram uma pesadíssima contribuição para a degradação económico financeira da Casa do Douro.

Os argumentos, diga-se, maus e em geral falsos argumentos, foram as regras decorrentes da adesão à CEE, das reformas da PAC, da globalização económica e da Organização Mundial do Comércio, OMC. Em vez de utilizar como instrumento político a diferença e a especificidade da Região Demarcada do Douro, à semelhança de outros, para defender o Douro e a produção vitivinícola regional, copiaram, subservientes, as regras que se diziam obrigatórias e comuns, para decepar as suas "vantagens", servindo os interesses nunca saciados das Casas Exportadoras de Gaia (multinacionais de bebidas) e até interesses estrangeiros do sector (Que altos "critérios vitivinícolas" podem explicar a manutenção até hoje da "chaptalização" (correcção do grau alcoólico com açúcar de beterraba) na França ou das ajudas estatais ao álcool de cereais na Alemanha!?!?).

Ainda não conseguiram destruir o que resultou do trabalho da natureza e do homem do Douro - a admirável "arquitectura" patrimonial e paisagística - apesar da indiferença, deixa andar, inactividade e permissividade de sucessivos governos anunciando sucessivos e faraónicos projectos nunca concluídos. Mas cinco anos passados sobre a decisão da UNESCO, está em risco o galardão atribuído. O poder político do PS e do PSD não conseguiu concretizar nestes cinco anos, algo tão comezinho, como a sinalização do Alto Douro Vinhateiro com Património da Humanidade!

3. Quase dois anos de Governo PS são passados e o balanço é fácil: dois anos de confrangedora inactividade, na resposta aos principais problemas da Região Duriense, apesar das inúmeras visitas governamentais.

Em vez de retomar como prática governativa o que durante os 3 anos de governação PSD/CDS-PP, foi o discurso do PS na AR e fora dela, inclusive através de deputados que hoje são ministros, secretários de Estado ou outra vez deputados, o Governo PS, repete a mesma política para o Douro, com argumentos e por vezes os mesmos textos (ipsis verbis) de governos anteriores. Com o argumento de que "As respostas são iguais porque não podiam ser outras. São históricas."

Nas medidas do Governo há o projecto de uma milagrosa "concentração" das adegas cooperativas para responder às suas dificuldades; a complacência pela usurpação em Bruxelas e na OMC de denominações tradicionais do Vinho do Porto por outros países e por um Regulamento do IVDP sobre a Denominação de Origem Porto, que considera facultativa no rótulo da garrafa de vinho do Porto a referência à Região Demarcada do Douro; a não aprovação em 2005 do Plano Zonal do Douro ao abrigo das Medidas Agro Ambientais e a declarada assumpção de não responder à situação económico-financeira da Casa do Douro, não cumprindo sequer os diversos Protocolos firmados entre aquela, o Estado português e diversas entidades.

Avulta, entre todas, a Resolução do Conselho de Ministros 116/2006 de 20 de Setembro, que cria a Estrutura de Missão para a Região Demarcada do Douro. Para lá do nome pomposo, a Resolução esvai-se num projecto centralista e fortemente governamentalizado, com o principal responsável e estruturas executivas da estrita dependência e confiança do governo, subordinado à estratégia e funcionamento da CCDR do Norte, sobejando para as entidades regionais a presença no órgão consultivo. Um projecto com objectivos vagos e insuficientes e sem uma clara definição do suporte financeiro da Missão, a que acresce uma tecnocrática segmentação e visão da Região de Trás-os-Montes e Alto Douro.

A vinda da Comissária Europeia da Agricultura à Região Demarcada do Douro, sem se encontrar com os viticultores durienses e a sua principal Organização, a Casa do Douro, quando está em curso uma indiciada reforma da Organização Comum de Mercado do Vinho, com gravosas intenções, é um simbólico exemplo das políticas do Governo para o Douro!

4.O Douro não precisa mais de fotografias nem radiografias económico-sociais mas que cumpram prometidos investimentos públicos numa visão de desenvolvimento integrado, centrado na sua principal riqueza - a magnificência dos seus vinhos - sem alienar todas as suas outras, reais ou potenciais valias, turismo, produções agrícolas, etc. Mas sem fazer destas valias a miragem ou cobertura cúmplice da ruína de milhares de viticultores e da destruição da seu principal esteio, a sua Casa. O que significa uma Casa Douro com competências e atribuições recuperadas, eleita directamente pelos viticultores, saneada económica e financeiramente, voz participada e representativa da viticultura duriense.

Precisa que lhe entreguem a iniciativa e os meios. Que não lhe vendam a especificidade no altar da globalização. Que haja vontade política e clareza estratégica, que não desprezando o investimento e investidores privados, não subordine a estratégia do seu desenvolvimento aos grandes interesses capitalistas do vinho ou do turismo. Estratégia que tenha por único objectivo defender todos os que construíram e continuam a construir a paisagem duriense, os pequenos e pequeníssimos viticultores, os já poucos trabalhadores rurais, as gentes durienses sofridas de muito trabalho.

Anexam-se ao presente Projecto de Resolução, dois documentos que, não compartilhando o PCP todas as suas análises e propostas, são uma importante contribuição para a definição dessa estratégia.

- O Manifesto "Douro: o Futuro não pode esperar mais" com data de 13 de Fevereiro de 2005 e subscrito por "um conjunto plural (de muitas dezenas) de durienses", e o conjunto das Câmaras Municipais da Região Demarcada do Douro, que estranhamente o Partido do Governo silencia;

- O texto "Comemorando os 250 anos da Região Demarcada do Douro - Perplexidades e Preocupações" subscrito por 12 párocos da Zona Pastoral I da Diocese de Vila Real, que analisa os problemas actuais da Região, as suas causas e os caminhos para lhes responder, identificando-se com aqueles que "se levantam de noite com receio do míldio e deitam mãos à cabeça quando pressentem trovoada".

Face às muitas análises e propostas avançadas em 2006, no decurso das Comemorações dos 250 anos da criação da Região Demarcada do Douro, a Assembleia da República delibera, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, aprovar as seguintes RECOMENDAÇÕES ao Governo, para "DESENVOLVER O DOURO, PROTEGER A REGIÃO DEMARCADA:

1. A DEFESA DA ESPECIFICIDADE DA REGIÃO DEMARCADA DO DOURO e da sua natureza única em todas as instâncias nacionais e internacionais, salvaguardando inclusive a especificidade da sua produção vitivinícola na demarcação e disciplina produtiva e o "benefício" com elemento nuclear, bem como a promoção e protecção do estatuto do Alto Douro Vinhateiro como Paisagem Cultural Evolutiva Viva, Património da Humanidade;   

2. A REFORMULAÇÃO DA RESOLUÇÃO DO CONSELHO DE MINISTROS 116/2006 de 20 de Setembro que cria a Estrutura de Missão para o Douro, revendo a sua estrutura orgânica no sentido da descentralização, autonomização da CCDR Norte e confiança nas entidades regionais, estabelecendo um quadro financeiro apropriado à Missão, redefinindo e precisando os seus objectivos, nomeadamente para garantir a elaboração e execução de um Plano Integrado de Desenvolvimento do Douro, e dois objectivos principais, (i) a reorganização institucional da Região Demarcada dos Vinhos do Douro e Porto e (ii) o saneamento económico-financeiro da Casa do Douro em profunda articulação com os agentes do sector;

3. A DEVOLUÇÃO AOS VITICULTORES DURIENSES E À CASA DO DOURO DOS SEUS DIREITOS HISTÓRICOS, através da reavaliação e correcção, após debate público, da organização institucional da Região Demarcada. Em particular são elementos centrais dessa correcção, a retoma da eleição directa da Direcção da Casa do Douro pelos vitivinicultores durienses, a atribuição das compensações decorrentes da perda de competências e funções, a indemnização por prejuízos desses processos, a recuperação da sua capacidade de regularização, em situações de excedentes, dos mercados vínicos, o cumprimento rigoroso de todos os Protocolos assinados pelo Estado e a normalização do estatuto laboral de todos os seus trabalhadores;

4. ORIENTAÇÕES ESPECÍFICAS DEVEM SER ESTABELECIDAS NA APLICAÇÃO DOS FUNDOS COMUNITÁRIOS DO QUADRO DE REFERÊNCIA ESTRATÉGICA NACIONAL (QREN) E PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO RURAL (PDR) no período 2007/2013, nomeadamente com a fixação da repartição dos fundos segundo critérios objectivos - inversamente proporcional ao PIB/capita e carências estruturais - assegurando-se um volume de verbas disponíveis para o Douro, conforme os objectivos definidos para a Missão. Na elaboração do QREN, PDR e futuros Orçamentos do Estado, devem ser criadas condições para realizar e concluir um importante conjunto de infra-estruturas regionais e os investimentos necessários para suportar uma estratégia de desenvolvimento sustentável para a Região. Os planos e programas sectoriais da responsabilidade central devem concorrer de forma integrada para esses objectivos;

5. AS DIVERSAS POLITICAS SECTORIAIS DO GOVERNO (económica, agro-florestal, ambiental, de educação e científica, etc.) DEVEM ATENDER E INTEGRAR COM FLEXIBILIDADE AS ESPECIFICIDADES E NECESSIDADES REGIONAIS. A reorganização da Administração Pública e Serviços Públicos, sendo guiada pela preocupação da eficiência e boa utilização dos dinheiros públicos, e os processos de reestruturação de grandes empresas públicas ou com participação do Estado (EDP, CTT, PT, GALP, etc.) fornecedoras de bens e serviços essenciais, não podem deixar de ter em consideração o direito dos cidadãos do Douro à proximidade dos serviços públicos e outros, e os riscos de aceleração da desertificação económica e humana de áreas regionais decorrente do encerramento de serviços, delegações e postos de abastecimento. Em particular, o Alto Douro Vinhateiro necessita de uma estrutura institucional única para o acompanhamento e desenvolvimento da actividade turística, que pode resultar da criação de uma Associação das actuais Regiões de Turismo com o âmbito da Região Vinhateira ou a sua fusão numa única Região de Turismo. A esta entidade deveria competir o acompanhamento e a execução do Plano de Desenvolvimento Turístico do Vale do Douro. Devem ainda ser criadas, apoiadas na massa crítica científica e associativa regional (Universidade e Politécnicos, associações empresariais e organizações sindicais, etc.) a constituição de pólos tecnológicos ou estruturas destinadas a promover o bom aproveitamento das diversas potencialidades regionais.

6. A CONSIDERAÇÃO NA REGIÃO DO DOURO COMO OBRAS E PROJECTOS ESTRUTURANTES:

A requalificação integral da Linha Ferroviária do Douro (Porto - Régua - Barca d´Alva e recuperação das linhas afluentes do Corgo, Tua e Sabor);

O IP3, o IP2, o IC5, o IC26 e as suas ligações aos concelhos da Região;

A implementação do Plano Intermunicipal de Ordenamento do Território;

O Museu do Douro e o Museu do Côa;

A aprovação e execução do Plano de Desenvolvimento Turístico do Douro;

A construção da Escola de Hotelaria e Turismo de Lamego;

A concretização do programa das "Aldeias Vinhateiras";

A execução do programa "Caminhos Durienses";

A execução do Plano Zonal do Alto Douro Vinhateiro;

A execução do Plano de Sinalização do Douro Património Mundial;

A constituição de uma só Comissão Regional de Turismo do Douro;

O desenvolvimento da Rede de Cais Fluviais;

A construção do novo Hospital de Lamego;

A dinamização da Rota do Vinho do Porto;

O desenvolvimento do programa "Trás-os-Montes - Digital" - UTAD;

A criação do Centro de Estudos do Alto Douro Vinhateiro (UTAD).

 

Assembleia da República, 3 de Janeiro de 2007

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