Projecto de Lei

Projecto de Lei n.º 377/X - Acesso ao direito e aos tribunais

Garante o acesso ao direito e aos tribunais revogando o regime jurídico existente

 

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Exposição de motivos

I - O Direito fundamental do Acesso ao Direito e aos Tribunais

O artigo 20.º da Constituição da República consagra o acesso ao Direito e aos Tribunais. Ninguém, por insuficiência de meios económicos pode ser privado do acesso à Justiça.

Estamos perante um direito fundamental, inserido na Parte I da Constituição da República Portuguesa - Direitos e Deveres Fundamentais.

Entretanto, nos últimos anos, foram tomadas medidas legislativas, nomeadamente através da Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, e da Portaria n.º1085-A/2004, de 31 de Agosto (entretanto remendada pela Portaria n.º 222/2005, de 21 de Março) que constituem a denegação daquele direito, reduzindo a aplicação do mesmo a cidadãos em situação de extrema pobreza.

Para a grande maioria dos cidadãos, em situação de carência económica, a lei constitui uma autêntica denegação da justiça por motivos económicos. Nomeadamente, quando através de alterações às Custas Judiciais, estas se tornaram excessivamente onerosas.

II - As insuficiências e limitações do actual regime

Cumpre, porém, salientar que já anteriormente, através da Lei n.º 30-E/2000 de 20 de Dezembro, se tinha descaracterizado a garantia do acesso ao direito e aos tribunais.

Na verdade, a atribuição à Segurança Social da competência para decidir sobre a pretensão dos cidadãos é a consagração do acesso ao direito e aos tribunais como uma prestação social e não como um direito entre aqueles classificados pela Constituição como Direitos Liberdades e Garantias de primeira geração.

Por outro lado, a atribuição ao poder executivo da competência para decidir nesta matéria, quando é o próprio poder executivo quem decide das verbas a orçamentar para a atribuição deste direito, não deixa o sistema imune a eventuais ameaças à realização do acesso à Justiça.

A garantia deste acesso é, também, a efectivação do direito à igualdade.

O grupo Parlamentar do Partido Comunista Português discordou desde o início desta solução. Foi o único grupo parlamentar a mostrar a sua discordância na votação final global do diploma.

Os tempos foram demonstrando a justeza da posição do PCP.

As normas burocráticas impostas para a apreciação da pretensão dos cidadãos constituíram o primeiro filtro que afastou muitos do exercício de um direito fundamental, pela floresta de complicadas perguntas inseridas num formulário para muitos indecifrável que requereu, quantas vezes, o recurso a técnicos de direito.

A Recomendação do senhor Provedor de Justiça nº 2/B/2005 de 12-10 é o espelho das restrições graves à concessão do benefício de apoio judiciário.

No sentido de melhorar o regime constante da Lei n.º 34/2004 e da Portaria n.º 1085-A/2004, fez o senhor Provedor diversas recomendações, constando na informação da Provedoria que a Recomendação foi acatada.

Contudo, têm-se sucedido os protestos relativamente ao regime constante da Lei n.º34/2004 e Portarias de aplicação.

São emblemáticas as considerações aduzidas no Acórdão n.º 654/2006 do Tribunal Constitucional que veio julgar inconstitucional, por violação do nº 1 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa, o Anexo à Lei nº 34/2004, de 29 de Julho, conjugado com os artigos 6º a 10º da Portaria nº 1085-A/04, de 31 de Agosto, na parte em que impõe que o rendimento relevante para efeitos de concessão do benefício do apoio judiciário seja necessariamente determinado a partir do rendimento do agregado familiar, independentemente de o requerente de protecção jurídica fruir tal rendimento.

Tal como temos vindo a afirmar, relativamente à limitação do direito fundamental de acesso ao Direito e aos tribunais através do diploma que ora se pretende alterar, "outra coisa não se faz que não seja delimitar o direito de acesso ao Direito e aos tribunais, pois tal acesso depende de uma situação de insuficiência económica, cujos critérios de apreciação são fixados/tabelados, inclusive por recurso a uma fórmula matemática. (...) O que era antes uma norma aberta à ponderação do caso concreto passou a ser uma norma fechada, ponderando estritos aspectos económico-financeiros, como resulta claro da adopção de uma fórmula matemática. Sendo pressuposto da concessão do beneficio do apoio judiciário uma situação de insuficiência económica, ao tabelarem-se os critérios de apreciação dessa situação, inclusive com recurso a uma fórmula matemática como resulta dos artigos 6° a 10° da Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto, é manifesto que se procedeu a uma delimitação do direito de acesso ao Direito e aos tribunais".

É ainda referido no Acórdão supracitado que "A questão é que a aplicação do Anexo à Lei n.º 34/2004 que remete a apreciação da insuficiência económica para o rendimento relevante do agregado familiar e da fórmula matemática previstas nos artigos 6° a 10° da Portaria n.º 1085-A/04, conduzem, no caso concreto, a um resultado que não se mostra conforme o direito fundamental de acesso ao Direito e aos tribunais, quer por que implica uma restrição intolerável de tal direito - violação do princípio da proporcionalidade em sentido restrito, que significa que os meios legais restritivos e os fins obtidos devem situar-se numa "justa medida", impedindo-se a adopção de medidas legais restritivas desproporcionadas, excessivas, em relação aos fins tidos em vista - quer por que se traduz numa violação do principio da igualdade - que obriga à diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica ou cultural (Gomes Canotilho e Vital Moreira, in CRP Anotada, 3ª edição, pág. 127)."

De acordo com o recente Relatório n.º 50/06, 2ªS, do Tribunal de Contas relativo a um processo de auditoria aos sistemas de gestão e controlo do Financiamento do acesso ao Direito e aos Tribunais, em Portugal o valor per capita desse encargo directo para o Estado apenas alcança 32% da média dos países europeus. Também de acordo com este Relatório conclui-se que, relativamente aos anos de 2003 a 2005, os dinheiros utilizados foram mal geridos, com falta de transparência e o Estado não organizou, como devia, o sistema de acesso ao direito e aos Tribunais, dando, mais uma vez, razão às propostas do PCP nesta matéria.

Assume também especial relevância a queixa apresentada na Provedoria pela Confederação Geral de Trabalhadores Portugueses.

Afectando, muito especialmente, a Justiça Laboral, a Lei inviabilizou para muitos trabalhadores o recurso aos Tribunais, o exercício de elementares direitos fundamentais na área do Direito ao Trabalho.

A CGTP denunciou mesmo alguns exemplos, dos quais decorre que efectivamente o regime aprovado em 2004 denegou a justiça por motivos económicos. Transcrevem-se alguns desses exemplos que constam da queixa apresentada pela CGTP na Provedoria.

Exemplo 1

Casal com 2 filhos menores em idade escolar.

Cada um aufere 730 euros/mês de salário ilíquido (aproximadamente o salário médio).

São proprietários de uma casa adquirida por 60.000 euros, pela qual pagam 250 euros/mês de prestação ao banco.

Têm carro próprio com valor de mercado de 5.000 euros.

Rendimento relevante para efeitos de protecção jurídica = 2,1 vezes o salário mínimo nacional, o que significa que qualquer requerente nesta situação não se encontra em situação de insuficiência económica para efeitos de protecção jurídica.

 

Exemplo 2

Casal com 2 filhos menores em idade escolar e um idoso.

 Um dos membros do casal aufere 700 euros/mês, o outro 400 euros/mês (salários ilíquidos).

 O idoso recebe 154,88 euros de pensão social/mês.

 Vivem numa casa arrendada pela qual pagam 300 euros/mês.

 Não têm carro próprio.

 Rendimento relevante para efeitos de protecção jurídica = 1,4 vezes o salário mínimo nacional, o que significa que um requerente nesta situação suporta os custos da consulta jurídica e tem apoio judiciário na modalidade de pagamento faseado - na prática não tem direito a este benefício já que o acaba por pagar na totalidade."

Assim, é urgente a revogação do regime jurídico existente.

A Proposta de Lei apresentada pelo Governo nesta matéria não vem resolver o problema da limitação do acesso ao direito por parte das pessoas com poucos recursos. Esta proposta, vem, outrossim, manter a lógica matemática do actual regime, garantindo a protecção jurídica apenas a agregados familiares com rendimentos muito baixos, excluindo do direito à justiça e aos tribunais milhares de cidadãs e cidadãos.

Esta Proposta altera ainda o sistema de acesso ao Direito permitindo a "escolha" dos profissionais que dele possam fazer parte numa limitação inaceitável do exercício das profissões forenses. Assim, o actual Governo não só afasta quem menos recursos têm, como selecciona quem integra o sistema de acesso ao direito.

III - Um novo regime

O PCP, através deste Projecto de Lei, pretende revogar o regime existente, substituindo-o por um novo regime que garantirá o acesso à Justiça.

Na verdade, muito embora se tenham considerado as críticas e as recomendações do Senhor Provedor de Justiça, entendemos que seria preferível reformular todo o regime, pois as intermináveis e complicadas fórmulas constantes nomeadamente da Portaria são de difícil reparação.

Resulta deste projecto de lei que apresentamos que a Segurança Social deixa de ter intervenção na apreciação e decisão sobre o requerimento de apoio jurídico, voltando a decisão ao juiz, o que constitui, desde já, uma primeira e fundamental salvaguarda do Direito. Resulta ainda das propostas ora apresentadas, o retomar das presunções de insuficiência económica, com um mais amplo e justo rol de situações abrangidas (considerando, nomeadamente, as vítimas de tráfico para fins de exploração sexual na prostituição e as vítimas de violência doméstica).

As propostas apresentadas pelo PCP, desde as alterações ao regime jurídico do acesso ao direito introduzidas em 2000, basearam-se em primeiro lugar na garantia do acesso de todas e todos a um direito fundamental elementar, na garantia do acesso ao direito, na garantia da possibilidade da defesa dos direitos de cidadãs e cidadãos sem que motivos de ordem económica impedissem o seu exercício. Este é o compromisso primordial do PCP a que agora se dá corpo.

IV - Transposição da Directiva 2002/8/CE do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003

Dando cumprimento à Directiva 2002/8/CE do Conselho, de 27 de Janeiro de 2003, relativa à melhoria do acesso à justiça nos litígios transfronteiriços, através do estabelecimento de regras mínimas comuns relativas ao apoio judiciário no âmbito desses litígios, introduzimos neste Projecto algumas das disposições que consideramos ainda não inseridas na legislação nacional. Assim, prevê-se que o apoio judiciário concedido inclua sempre que necessário ou quando se trate de uma situação com carácter transfronteiriço a interpretação, a tradução de documentos e as despesas de deslocação a suportar pelo requerente. Por outro lado, ressalvamos as situações em que é necessário ter em conta que os limites definidos para aceder ao apoio judiciário têm de salvaguardar as diferenças de custo de vida entre os Estado do foro e de domicílio ou residência habitual. 

V -  Resumo do presente Projecto

Sumariamente, o presente Projecto de Lei consagra o seguinte, relativamente às questões mais controversas:

  • Devolve ao juiz a competência para a decisão sobre a concessão do apoio judiciário;
  • Suprime do leque das medidas de apoio judiciário o pagamento faseado das custas judiciais, que redundava no pagamento efectivo de taxas por quem não as podia pagar;
  • Reformula as presunções de insuficiência económica constantes da lei de 2000, entre as quais se destaca, por exemplo, como forma de resposta às novas escravaturas do século XXI, a presunção de insuficiência económica das vítimas de tráfico de seres humanos e das vítimas de exploração através da prostituição, ainda que se trate de estrangeiras na situação de clandestinidade, bem como das vítimas de violência doméstica;
  • Restringe a possibilidade de tomar em consideração os rendimentos do agregado familiar;
  • Garante no benefício de apoio judiciário, a gratuitidade dos actos de registo comercial, predial e automóvel decorrentes da acção ou da decisão, das certidões judiciais que tenham obrigatoriamente que ser requeridas para dar início ou seguimento ao processo e ainda das certidões necessárias à execução das sentenças proferidas;
  • Estabelece normas claras para apuramento do rendimento a tomar em consideração, nomeadamente de taxas de esforço para as necessidades básicas e para a habitação;
  • Faz, no entanto, depender a concessão do benefício de apoio judiciário da complexidade e do valor da causa;
  • Garante o apoio judiciário no âmbito de litígios transfronteiriços, de acordo com a Directiva 2002/8/CE, de 27 de Janeiro;
  • Define o conceito de agregado familiar, restringindo-o, para efeitos de consideração dos rendimentos a ponderar;
  • Consagra a gratuitidade da Justiça Laboral para os Trabalhadores do sector privado e da Administração Pública, nos processos de maior relevância;
  • Contém normas específicas para efectivar o acesso ao Direito e aos Tribunais por parte dos menores na área da Lei Tutelar educativa;
  • Revoga disposições do Código das Custas Judiciais que restringiam direitos dos Trabalhadores;
  • Regula a tramitação do pedido de apoio judiciário.

Nestes termos, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta o seguinte Projecto de Lei:

CAPÍTULO I

Concepção e objectivos

Artigo 1º

(Finalidades)

1 - O sistema de acesso ao direito e aos tribunais destina-se a promover e assegurar que ninguém seja dificultado ou impedido de conhecer, fazer valer ou defender os seus direitos, em razão da sua condição social ou cultural, ou por insuficiência de meios económicos.

2 - Para concretizar os objectivos referidos no número anterior desenvolver-se-ão acções e mecanismos sistematizados de informação jurídica e de protecção jurídica.

Artigo 2º

(Promoção)

1 - O acesso ao direito compreende a informação, a protecção, o apoio e consulta jurídicos.

2 - O acesso ao direito e aos tribunais constitui uma responsabilidade do Estado, a promover, designadamente através de dispositivos de cooperação com as instituições representativas das profissões forenses.

Artigo 3º

(Funcionamento)

1 - O sistema de acesso ao direito e aos tribunais funcionará por forma que os serviços prestados aos seus utentes sejam qualificados e eficazes.

2 - O Estado garante uma adequada remuneração aos profissionais forenses que intervierem no sistema de acesso ao direito e aos tribunais.

CAPÍTULO II

Informação jurídica

Artigo 4º

(Dever de informação)

Incumbe especialmente ao Ministério da Justiça realizar, de modo permanente e planeado, acções tendentes a tornar conhecido o direito e o ordenamento legal, através de publicação e de outras formas de comunicação, incluindo audiovisual, por forma a proporcionar um melhor exercício dos direitos e o cumprimento dos deveres legalmente estabelecidos.

Artigo 5º

(Serviços de informação jurídica)

No âmbito das acções referidas no artigo anterior serão gradualmente criados serviços de acolhimento nos tribunais e serviços judiciários.

CAPÍTULO III

Protecção jurídica

Artigo 6º

(Protecção jurídica)

A protecção jurídica é concedida para questões ou causas judiciais concretas, ou susceptíveis de concretização, em que o utente tenha um interesse próprio e que versem sobre direitos directamente lesados ou ameaçados de lesão nas áreas cível, penal, laboral, administrativa, social, comercial, fiscal ou contra-ordenacional.

Artigo 7º

(Âmbito)

A protecção jurídica reveste as modalidades de consulta jurídica, apoio jurídico e apoio judiciário.

Artigo 8º

(Âmbito pessoal)

1 - Têm direito a protecção jurídica, nos termos da presente lei, os cidadãos nacionais e os cidadãos nacionais de qualquer país membro da União Europeia que demonstrem encontrar-se em situação de insuficiência económica, definida nos termos da presente lei.

2 - O regime previsto na presente lei é ainda aplicável nos termos do número anterior:

a) Aos nacionais de países terceiros e aos apátridas que residam habitualmente num dos Estados-Membros ou em território nacional e gozem do direito a protecção jurídica;

b)Aos estrangeiros não residentes em Portugal a quem seja reconhecido o direito a protecção jurídica, na medida em que este seja atribuído aos portugueses pelas leis dos respectivos Estados.

3 - Aos estrangeiros sem título de residência e aos requerentes de asilo é reconhecido o direito a protecção jurídica nos termos da legislação aplicável.

4 - As pessoas colectivas e sociedades têm direito a apoio judiciário, quando façam a prova a que alude o n.º 1.

5 - As sociedades e os comerciantes em nome individual nas causas relativas ao exercício do comércio e os estabelecimentos individuais de responsabilidade limitada têm direito à dispensa, total ou parcial, do pagamento da taxa de justiça e demais encargos com o processo quando o respectivo montante seja consideravelmente superior às suas possibilidades económicas, aferidas designadamente em função do volume de negócios, do valor do capital ou do património e do número de trabalhadores ao seu serviço.

6 - Beneficiam também do direito à protecção jurídica todos os cidadãos e entidades que, por lei, estejam dispensados do pagamento das taxas de justiça e demais encargos com o processo, os que exerçam o direito de acção popular e ainda os que proponham acção contra uma actuação ou norma discriminatória, ou se defendam em processo cujo fundamento seja uma medida discriminatória.


Artigo 9º

(Interesses colectivos ou difusos)

Lei própria regulará o regime de tutela dos interesses colectivos ou difusos e dos direitos só indirecta ou reflexamente lesados ou ameaçados de lesão.

Artigo 10º

(Proibição de acumulação de honorários)

É vedado aos advogados, advogados estagiários e solicitadores ou outras pessoas com formação jurídica bastante que prestem serviços de protecção jurídica em qualquer das suas modalidades auferir, com base neles, remuneração diversa daquela a que tiverem direito nos termos da presente lei.

CAPÍTULO IV

Consulta Jurídica

Artigo 11º

(Gabinetes de consulta jurídica)

1 - Em cooperação com a Ordem dos Advogados e outras entidades públicas e privadas que, no âmbito da sua actividade, promovam informação jurídica, o Ministério da Justiça instalará e assegurará o funcionamento de gabinetes de consulta jurídica, com vista à gradual cobertura territorial do País.

2 - Os gabinetes de consulta jurídica referidos no número anterior poderão abranger a prestação de serviços por solicitadores, em moldes a convencionar entre a respectiva câmara e a Ordem dos Advogados.


Artigo 12º

(Remuneração)

Os serviços forenses prestados nos gabinetes de consulta jurídica são remunerados nos termos fixados pelo Ministério de Justiça, através de portaria, ouvida a Ordem dos Advogados e a Câmara dos Solicitadores.

Artigo 13º

(Âmbito)

1 - A consulta jurídica pode compreender a realização de diligências com vista à resolução judicial, caso não haja mandatário constituído ou defensor nomeado, pré-judicial ou extrajudicial ou comportar mecanismos informais de conciliação, conforme constar dos regulamentos dos respectivos gabinetes.

2 - Cabe ao Ministro da Justiça homologar por portaria os regulamentos previstos no número anterior.

CAPÍTULO V

Apoio judiciário

Secção I

Modalidades, condições e requisitos

Artigo 14º

(Modalidades)

O apoio judiciário compreende as seguintes modalidades:

a) Dispensa, total ou parcial, de taxa de justiça e demais encargos com o processo;

b) Nomeação e pagamento de honorários de patrono;

c) Pagamento de honorários a solicitador de execução.


Artigo 15º

(Encargos com o processo)

1 - Estão isentos de impostos, emolumentos e taxas os requerimentos, certidões e quaisquer outros documentos pedidos para fins de apoio judiciário.

2 - A concessão de apoio judiciário, nos termos da alínea a) do artigo anterior, determina ainda a gratuitidade dos actos de registo comercial, predial e automóvel decorrentes da acção ou da decisão, das certidões judiciais que tenham obrigatoriamente que ser requeridas para dar início ou seguimento ao processo e ainda das certidões necessárias à execução das sentenças proferidas.

Artigo 16º

(Encargos relacionados com o carácter transfronteiriço do litígio)

O apoio judiciário concedido incluirá, sempre que necessário:

a) Interpretação;

b) Tradução de documentos exigidos pelo tribunal ou pela autoridade competente;

c) Despesas de deslocação a suportar pelo requerente, na medida em que seja exigida pelo tribunal a presença física das pessoas a serem ouvidas e que       provenham de outro Estado.

Artigo 17º

(Âmbito de aplicação)

1 - O regime de apoio judiciário aplica-se em todos os tribunais e nos julgados de paz, qualquer que seja o tipo, a forma ou fase do processo, incluindo recursos, incidentes e providências cautelares.

2 - O regime de apoio judiciário aplica-se também, com as devidas adaptações, aos processos de contra-ordenações e aos processos de divórcio por mútuo consentimento cujos termos corram nas conservatórias de registo civil.


Artigo 18º

(Oportunidade do apoio Judiciário)

1 - O apoio judiciário é independente da posição processual que o requerente ocupe na causa e do facto de ter sido já concedido à parte contrária.

2 - O apoio judiciário pode ser requerido em qualquer estado da causa, mantém-se para efeitos de recurso, qualquer que seja a decisão sobre a causa, é extensivo a todos os processos que sigam por apenso àquele em que essa concessão se verificar, sendo-o também ao processo principal, quando concedido em qualquer apenso.

3 - Declarada a incompetência relativa do tribunal mantém-se, todavia, a concessão do apoio judiciário, devendo a decisão definitiva ser notificada ao patrono para se pronunciar sobre a manutenção ou escusa do patrocínio.

4 - No caso de o processo ser desapensado por decisão com trânsito em julgado, o apoio concedido manter-se-á, juntando-se oficiosamente ao processo desapensado certidão da decisão que o concedeu, sem prejuízo do disposto na parte final do número anterior.

5 - O apoio judiciário mantém-se ainda para as execuções fundadas em sentença proferida em processo em que essa concessão se tenha verificado.

Artigo 19º

(Legitimidade)

1 - O apoio judiciário pode ser requerido:

a) Pelo interessado na sua concessão;

b) Pelo Ministério Público em representação do interessado;

c) Por advogado, advogado estagiário ou solicitador, em representação do interessado, bastando para comprovar essa representação as assinaturas conjuntas do interessado e do patrono;

d) Por patrono para esse efeito nomeado pela Ordem dos Advogados, a pedido do interessado.

2 - Às pessoas referidas nas alíneas c) e d) do número anterior incumbe também, em princípio, o patrocínio da causa para que foi requerido o apoio judiciário.

Secção II

Insuficiência económica

Artigo 20º

(Definição)

Encontra-se em situação de insuficiência económica aquele que não disponha de meios bastantes para custear, total ou parcialmente, os encargos normais de uma causa judicial e para suportar os honorários dos profissionais forenses, devidos por efeito da prestação dos seus serviços.

Artigo 21º

(Prova da insuficiência)

1 - A prova de insuficiência económica pode ser feita por qualquer meio idóneo.

2 - As declarações do requerente sobre a sua situação económica bem como sobre a verificação dos factos em que assentam as presunções referidas no artigo seguinte devem ser acompanhadas dos documentos comprovativos de que o requerente disponha.

Artigo 22º

(Presunções)

1 - Para além do disposto em legislação especial, goza da presunção de insuficiência económica:

a) Quem estiver a receber alimentos por necessidade económica;

b) Quem reunir as condições exigidas para a atribuição de quaisquer subsídios em razão da sua carência de rendimentos;

c) Quem estiver a receber subsídio de desemprego ou subsídio social de desemprego ou tiver pendente decisão sobre a sua atribuição;

d) Quem estiver inscrito num centro de emprego;

e) Quem estiver a receber pensões ou reformas iguais ou inferiores a uma vez e meia o salário mínimo nacional;

f) Quem beneficiar apenas de rendimentos mensais provenientes do trabalho, iguais ou inferiores a uma vez e meia o salário mínimo nacional;

g) Os filhos menores, para efeitos de investigar ou impugnar a sua maternidade ou paternidade;

h) Os menores, nos processos instaurados nos termos da lei tutelar educativa;

i) Os requerentes de alimentos;

j) Os titulares de direito a indemnização por acidentes de viação;

l)Os funcionários ou agentes da Administração que, nos termos da lei do Tribunal de Contas, possam ser demandados para efectivação de responsabilidades financeiras;

m) Quem, ainda que estrangeiro ou em situação de clandestinidade, for vítima de tráfico de seres humanos ou de utilização na prostituição;

n) Quem for vítima de violência doméstica.

Artigo 23º

(Determinação do rendimento líquido mensal)

No apuramento do rendimento mensal serão tomados em consideração, mediante informação prestada pelo requerente, os seguintes elementos relativos à sua situação económica ou, sendo caso disso, dos membros do agregado familiar cujo rendimento releve para apreciação do pedido:

a) O vencimento mensal auferido no momento da apresentação do pedido;

b) Os activos patrimoniais;

c) Os passivos patrimoniais;

d) As despesas com necessidades básicas, e com a habitação;

e) Os montantes devidos por contribuições ou impostos e por contribuições obrigatórias para a segurança social;

f) Quaisquer outros elementos que possam servir de ponderação na determinação do rendimento.


Artigo 24º

(Necessidades básicas)

1 - O montante dispendido com a satisfação das necessidades básicas a deduzir ao rendimento bruto, não poderá ser inferior a 42% desse rendimento, e será tomado em consideração caso o requerente não indique ou não apresente prova do mesmo.

2 - Será tomado em consideração o montante provado pelo requerente se for superior ao obtido nos termos do número anterior.

Artigo 25º

(Valor dos encargos com a habitação)

1 - O valor dos encargos com a habitação não poderá ser inferior ao apurado nos termos do número seguinte, e será tomado em consideração caso o requerente não indique ou não apresente prova do mesmo.

2 - Para efeito do disposto no número anterior, o valor dos encargos com a habitação será obtido aplicando-se a taxa de esforço de 20% ao rendimento líquido a considerar para a apreciação do pedido.

3 - Será tomado em consideração o montante provado pelo requerente se for superior ao obtido nos termos do número anterior.

Artigo 26º

(Critérios de elegibilidade de rendimentos de membros do agregado familiar)

1 - Na determinação do rendimento mensal só poderão ser tomados em consideração os rendimentos do agregado familiar quando na lide para que se requer o apoio judiciário não exista colisão de interesses entre o requerente do benefício e qualquer dos membros do agregado familiar, sem prejuízo do disposto no número seguinte.

2 - Só poderão ser tomados em consideração os rendimentos daqueles membros do agregado familiar que com a demanda possam beneficiar directa e imediatamente ou que, com a mesma, possam sofrer prejuízo directo e imediato.

3 - Em qualquer caso, não poderão ser tomados em consideração os rendimentos dos membros do agregado familiar que beneficiariam da presunção de insuficiência económica se interviessem como partes na demanda.

4 - Também não serão tomados em consideração os rendimentos dos membros do agregado familiar que possam ser chamados à demanda em qualquer incidente de intervenção de terceiros.

Artigo 27º

(Conceito de agregado familiar)

Para os efeitos previstos na presente lei, constituem o agregado familiar do requerente, os parentes ou afins no 1º grau da linha recta, e no 2º grau da linha colateral que com ele habitem em economia comum.

Artigo 28º

(Valor e complexidade da causa)

Além do rendimento a considerar, apurado nos termos das disposições antecedentes, a decisão tomará sempre em consideração o valor e a complexidade da causa.

Artigo 29º

(Exclusão do direito de concessão)

O apoio judiciário não pode ser concedido:

a) Às pessoas que não reúnam as condições legais para o requerer;

b) Às pessoas a respeito das quais haja fundada suspeita de que alienaram ou oneraram todos ou parte dos seus bens para se colocarem em condições de o obter;

c) Aos cessionários do direito ou objecto controvertido, ainda que a cessão seja anterior ao litígio, quando tenha havido fraude.


Artigo 30 º

(Condições relativas aos requerentes cujo Estado do foro e da residência sejam diferentes)

Os limites definidos em conformidade com o artigo 23º não podem impedir que seja concedido apoio judiciário aos requerentes que se situem acima dos limiares, desde que estes apresentem provas de que não podem fazer face aos encargos do processo, nomeadamente devido às diferenças de custo de vida entre os Estados-Membros do foro e do domicílio ou residência habitual.

Secção III

(Tramitação do pedido de apoio judiciário)

Artigo 31º

(Competência)

A decisão sobre a concessão de apoio judiciário compete ao juiz da causa para a qual é solicitada, constituindo um incidente do respectivo processo e admitindo oposição da parte contrária.

Artigo 32º

(Pedido de apoio judiciário)

1 - O pedido de apoio judiciário para a dispensa, total ou parcial, de taxa de justiça e demais encargos com o processo é formulado nos articulados da acção a que se destina ou em requerimento autónomo quando for posterior aos articulados ou a causa os não admita.

2 - O pedido de nomeação de patrono e pagamento dos respectivos honorários ou de pagamento de honorários a solicitador de execução é formulado em simples requerimento no qual se identifique a causa a que respeita.

3 - O pedido deve especificar a modalidade de apoio judiciário pretendida ou, sendo caso disso, quais as modalidades que se pretende cumular.

Artigo 33º

(Requisitos do pedido de apoio judiciário)

1 - O requerente deve alegar sumariamente os factos e as razões de direito que interessam ao pedido, oferecendo logo todas as provas.

2 - Na petição o requerente mencionará os rendimentos e remunerações que recebe, os seus encargos pessoais e de família e as contribuições e impostos que paga, salvo caso de presunção previsto no artigo 22.º

3 - Dos factos referidos na primeira parte do número anterior não carece o requerente de oferecer prova, mas o juiz mandará investigar a sua exactidão quando o tiver por conveniente.

4 - Nenhuma entidade, pública ou privada, poderá recusar-se a prestar, com carácter de urgência, as informações que o tribunal requisitar sobre a situação económica do requerente de apoio judiciário.

5 - Os documentos destinados a instruir o pedido de apoio judiciário devem referir expressamente o fim a que se destinam.

Artigo 34º

(Efeitos do pedido de apoio judiciário)

1 - O procedimento de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite, não tendo qualquer repercussão sobre o andamento desta.

2 - Exceptuam-se do disposto no número anterior os casos em que:

a) O procedimento tenha carácter urgente ou ocorra outra razão de urgência;

b) For requerida a citação nos termos do artigo 478º do Código de Processo Civil;

c) No dia da apresentação em juízo faltarem menos de cinco dias para o termo do prazo de caducidade do direito de acção;

d) Esteja pendente recurso da decisão relativa à concessão de apoio judiciário e o autor pretenda beneficiar deste para dispensa total ou parcial da taxa de justiça.

3 - Nos casos previstos no número anterior, o autor deve efectuar o pagamento da taxa de justiça inicial no prazo de 10 dias a contar da data da notificação da decisão que indefira, em definitivo, o pedido de apoio judiciário, sob a cominação prevista no n.º 5 do artigo 467º do Código de Processo Civil.

4 - Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento.

5 - O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior reinicia-se, conforme o caso:

a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação;

b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono.

Artigo 35º

(Prescrição e caducidade)

1 - No caso de indeferimento do pedido de apoio judiciário, a contagem dos prazos de caducidade da acção inicia-se de novo com a notificação da decisão de indeferimento.

2 - No caso previsto no número anterior, o prazo de prescrição suspende-se, retomando-se a sua contagem com a notificação da decisão de indeferimento.

3 - Havendo impugnação do despacho de indeferimento, e pretendendo o requerente beneficiar da dispensa de pagamento da taxa de justiça, deverá juntar à acção prova da apresentação da impugnação.

4 - Aplica-se o disposto no n.º 4 do artigo anterior se a impugnação for julgada improcedente.

Artigo 36º

(Tramitação do pedido)

1 - Se o apoio judiciário for requerido no articulado ou requerimento inicial, a citação à parte contrária para contestar faz-se pela secretaria do tribunal competente juntamente com a citação para a acção ou procedimento.

2 - A citação ou notificação não se efectuará enquanto a acção ou procedimento não admitir a intervenção do requerido.

3 - No pedido de nomeação prévia de patrono não há lugar a citação ou notificação.

Artigo 37º

(Contestação)

1 - A contestação é deduzida no articulado seguinte ao do pedido; não o havendo, sê-lo-á em articulado próprio, no prazo de dez dias.

2 - Com a contestação são oferecidas todas as provas.

Artigo 38º

(Ministério Público)

Se não for o requerente, o Ministério Público terá vista do processo, a fim de se pronunciar sobre o pedido de apoio judiciário.

Artigo 39º

(Diligências probatórias)

O juiz ordenará as diligências que lhe pareçam indispensáveis para decidir o incidente de apoio judiciário.

Artigo 40º

(Prazo para a decisão)

1 - A decisão deve ser proferida no prazo de dez dias.

2 - A decisão que conceder o apoio judiciário especifica a modalidade e concreta medida do apoio judiciário.

3 - Na decisão o juiz ponderará da repercussão que a eventual condenação em custas poderá vir a ter para o património do requerente.

4 - A decisão que indefira o pedido de apoio judiciário importa a obrigação do pagamento das custas e encargos devidos nos termos do Código das Custas Judiciais, bem como o pagamento pelo requerente da nota de honorários que o patrono nomeado nos termos do nº 3 do artigo 34º lhe apresente em razão dos serviços que tenha prestado.

5 - Verificando-se que no momento em que deva ser efectuado o pagamento das custas e encargos do processo judicial a que se refere o pedido de apoio judiciário não é ainda conhecida a decisão final quanto a este, proceder-se-á do seguinte modo:

a) No caso de não ser ainda conhecida a decisão da entidade competente, fica suspenso o prazo para proceder ao respectivo pagamento até que tal decisão seja comunicada ao requerente;

b) Tendo havido já decisão negativa, o pagamento é devido desde a data da sua comunicação ao requerente, de acordo com o disposto no Código das Custas Judiciais, sem prejuízo do posterior reembolso das quantias pagas no caso de procedência do recurso interposto daquela decisão.

Artigo 41º

(Nomeação de patrono)

1 - Concedido o patrocínio, o juiz da causa solicita a nomeação de advogado, advogado estagiário ou solicitador, de acordo com a sua competência estatutária e em razão da natureza da causa.

2 - A nomeação é solicitada pelo juiz da causa ao conselho distrital da Ordem dos Advogados ou à secção da Câmara dos Solicitadores territorialmente competentes e por estes comunicada ao tribunal no prazo de 10 dias.

Artigo 42º

(Notificação da nomeação)

A decisão de nomeação do patrono ou solicitador é notificada a este e ao interessado, com menção expressa, quanto a este, do nome e escritório do patrono, bem como do dever de lhe dar colaboração.


Artigo 43º

(Solicitação de substituição de patrono nomeado)

1 - O beneficiário do apoio judiciário pode, em qualquer processo, requerer à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a substituição do patrono ou solicitador nomeado, fundamentando o seu pedido.

2 - Deferido o pedido de substituição, aplicam-se, com as devidas adaptações, os termos do artigo 41º e seguintes.

Artigo 44 º

(Prazo para propositura de acção)

1 - O patrono nomeado para a propositura da acção deve intentá-la nos 30 dias seguintes à notificação da nomeação, comunicando tal facto à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores, no caso de não instauração da acção naquele prazo.

2 - O patrono nomeado pode requerer à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a prorrogação do prazo previsto no número anterior.

3 - Quando não for apresentada justificação, ou esta não for julgada satisfatória, o conselho distrital da Ordem dos Advogados ou o conselho regional da Câmara dos Solicitadores procede à apreciação de eventual responsabilidade disciplinar e à designação de novo patrono ao requerente nos termos previstos nos artigos 41º, 42º e 43º.

4 - A acção considera-se proposta na data em que for apresentado o pedido de nomeação de patrono.

Artigo 45º

(Pedido de escusa)

1 - O patrono nomeado pode pedir escusa, mediante requerimento dirigido ao presidente do conselho distrital da Ordem dos Advogados ou ao presidente da secção da Câmara dos Solicitadores, no qual contenha a alegação dos motivos da escusa.

2 - O pedido de escusa, formulado nos termos do número anterior e apresentado na pendência de acção judicial, interrompe o prazo que estiver em curso, aplicando-se o disposto no nº 5 do artigo 34º.

3 - A Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores apreciam e deliberam sobre o pedido de escusa no prazo de 10 dias.

4 - Sendo concedida a escusa, a Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores procedem imediatamente à nomeação e designação de novo patrono.

5 - No caso de haver três pedidos de escusa, apresentados sucessivamente e sempre com o fundamento da manifesta inviabilidade da pretensão, a Ordem dos Advogados ou a Câmara dos Solicitadores devem recusar nova nomeação para o mesmo fim.

6 - O disposto nos n.ºs 1 a 3 aplica-se aos casos de escusa por circunstâncias supervenientes.

Artigo 46º

(Substabelecimento para diligência processual)

1 - O patrono nomeado pode substabelecer, com reserva, para diligência determinada, indicando logo o seu substituto ou pedindo à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores que procedam à sua nomeação.

2 - O patrono nomeado deve comunicar à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores a realização do substabelecimento.

Artigo 47º

(Cessação do apoio judiciário)

1 - O apoio judiciário é retirado:

a) Se o requerente adquirir meios suficientes para poder dispensá-lo;

b) Quando se prove por novos documentos a insubsistência das razões pelas quais o apoio judiciário foi concedido;

c) Se os documentos que serviram de base à concessão forem declarados falsos por decisão com trânsito em julgado;

d) Se o beneficiário que seja funcionário ou agente da Administração for condenado por acção dolosa em sede de efectivação de responsabilidades financeiras;

e) Se, em acção de alimentos provisórios, for atribuída ao requerente uma quantia para custeio da demanda.

2 - No caso da alínea a) do número anterior, o requerente deve declarar, logo que o facto se verifique, que está em condições de dispensar o apoio judiciário, sob pena de ficar sujeito às sanções previstas para a litigância de má fé.

3 - O apoio judiciário pode ser retirado oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, da parte contrária ou do patrono nomeado.

4 - O requerente do apoio judiciário é sempre ouvido.

5 - Sendo retirado o apoio judiciário concedido, a decisão é comunicada à Ordem dos Advogados ou à Câmara dos Solicitadores, conforme os casos.

Artigo 48º

(Caducidade do apoio judiciário)

O apoio judiciário caduca pelo falecimento da pessoa singular ou pela extinção ou dissolução da pessoa colectiva a quem foi concedido, salvo se os sucessores na lide, no incidente da sua habilitação, o requererem e o mesmo lhes for deferido.

Artigo 49º

(Agravo)

Das decisões proferidas sobre apoio judiciário cabe sempre agravo, independentemente do valor, com efeito suspensivo, quando o recurso for interposto pelo requerente, e com efeito meramente devolutivo nos demais casos.

Artigo 50º

(Encargos decorrentes da concessão do apoio judiciário)

Os encargos decorrentes da concessão do apoio judiciário são levados a regra de custas a final.


CAPÍTULO VI

Disposições especiais sobre processo penal

Artigo 51º

(Nomeação de defensor)

1 - A nomeação do defensor ao arguido e a dispensa de patrocínio, substituição e remuneração são feitas nos termos do Código de Processo Penal e em conformidade com os artigos seguintes.

2 - A nomeação é antecedida da advertência ao arguido do seu direito a escolher e constituir defensor ou a requerer a concessão de apoio judiciário e que, não constituindo defensor, nem requerendo a concessão de apoio judiciário, ou este não lhe sendo concedido, é responsável pelo pagamento dos honorários que o defensor apresentar para remuneração dos serviços prestados, bem como das despesas em que este incorrer com a sua defesa.

3 - O requerimento para a concessão de apoio judiciário não afecta a marcha do processo.

Artigo 52º

(Procedimento para a nomeação de defensor)

1 - A autoridade judiciária a quem incumbir a nomeação de defensor solicita ao conselho distrital da Ordem dos Advogados territorialmente competente para o efeito a indicação de defensor, consoante a sua competência estatutária em razão da natureza do processo.

2 - O conselho distrital da Ordem dos Advogados procede à indicação no prazo de cinco dias.

3 - Na falta atempada de indicação, pode a autoridade judiciária proceder à nomeação do defensor segundo o seu critério.


Artigo 53º

(Tramitação)

1 - Para a assistência ao primeiro interrogatório de arguido detido ou para audiência em processo sumário ou outras diligências urgentes previstas no Código de Processo Penal, a nomeação recai em defensor escolhido independentemente da indicação prevista no artigo anterior.

2 - A Ordem dos Advogados pode, para os efeitos da nomeação prevista no número anterior, organizar escalas de presenças de advogados ou advogados estagiários, comunicando-as aos tribunais.

3 - No caso previsto no número anterior, a nomeação deve recair em defensor que, constando das escalas, se encontre presente.

4 - O defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo, salvo se este prosseguir em comarca diversa, caso em que o defensor nomeado pode requerer a sua substituição, nos termos do artigo 43º.

Artigo 54º

(Dispensa de patrocínio)

1 - Quando o advogado ou advogado estagiário nomeado defensor pedir dispensa de patrocínio invocando fundamento que considere justo, o tribunal ouvirá a Ordem dos Advogados e, ouvida esta, decidirá.

2 - Enquanto não for substituído, o defensor nomeado para um acto mantém-se para os actos subsequentes do processo.

3 - Se o fundamento invocado para pedir a dispensa for a salvaguarda do segredo profissional, proceder-se-á em termos análogos aos do artigo 45º.

4 - Verificada a hipótese prevista no número anterior, o tribunal pode, em caso de urgência, nomear outro defensor até que a Ordem dos Advogados se pronuncie.


Artigo 55º

(Constituição de mandatário)

1 - Cessa a nomeação do defensor sempre que o arguido constitua mandatário.

2 - O defensor nomeado não pode aceitar mandato do mesmo arguido, salvo se após a sua nomeação vier a ser recusada a concessão de apoio judiciário, implicando a aceitação do mandato a renúncia ao pagamento pelo tribunal de qualquer quantia a título de honorários ou reembolso de despesas efectuadas.

CAPÍTULO VII

Honorários

Artigo 56º

(Honorários)

1 - Os advogados, os advogados estagiários e os solicitadores têm direito a receber honorários pelos serviços prestados, assim como a ser reembolsados das despesas realizadas que devidamente comprovem.

2 - O pagamento dos honorários fixados nos termos da tabela prevista no artigo 57º, bem como o reembolso das despesas é feito pelo Instituto de Gestão Financeira e de Infra-Estruturas da Justiça, I.P., devendo ser processado até ao termo do mês seguinte àquele em que é devido.

3 - No caso do benefício de apoio judiciário não ser concedido, em processo penal, cabe ao arguido realizar o pagamento dos honorários do defensor nomeado, bem como das despesas em que este deva ser reembolsado, sem prejuízo adiantamento ao defensor quantia igual à que resultaria da aplicação da tabela prevista no artigo 57º, ficando o Estado com o consequente direito de regresso.

5 - É igualmente aplicável ao processo penal o disposto no artigo 50º.

6 - O pagamento dos honorários e o reembolso das despesas pelos serviços prestados nos termos do artigo 54º não aguardam o termo do processo.

Artigo 57º

(Tabelas de honorários)

1 - Os honorários dos advogados, advogados estagiários e solicitadores pelos serviços que prestem no âmbito do apoio judiciário constam de tabelas propostas pela Ordem dos Advogados e pela Câmara dos Solicitadores e aprovadas pelo Ministro da Justiça.

2 - Nas tabelas referidas no número anterior pode estar fixado o montante dos honorários ou ser inscrita margem entre um mínimo e um máximo de remuneração.

3 - Na quantificação dos honorários inscritos nas tabelas ter-se-ão em conta os critérios usualmente adoptados nas profissões forenses.

4 - As tabelas são anualmente revistas.

CAPÍTULO VIII

Justiça laboral

Artigo 58º

(Isenção subjectiva)

No âmbito dos tribunais de trabalho, ficam isentos do pagamento de custas:

a) Os trabalhadores em qualquer processo do foro laboral, seja qual for a sua posição processual e ainda que constituam mandatário;

b) As associações sindicais nos casos em que detenham legitimidade para exercer o direito de acção nos termos da lei;

c) Os familiares dos trabalhadores a quem, nos termos legais, caiba o exercício do direito de acção, nos termos referidos na alínea a).

Artigo 59º

(Patrocínio judiciário e custas)

1 - Verificando-se as condições previstas na presente lei, as pessoas que beneficiem da isenção de custas, podem requerer o pagamento de honorários a patrono nomeado ou escolhido, sem prejuízo da legitimidade do Ministério Público para o exercício do patrocínio nos termos legais.

2 - Mantêm-se em vigor, para aplicação apenas às entidades não abrangidas pela gratuitidade estabelecida no presente capítulo, as disposições do Código das Custas Judiciais relativas à justiça laboral.

CAPÍTULO IX

Justiça administrativa e fiscal

Artigo 60º

(Isenção subjectiva)

No âmbito dos tribunais administrativos e fiscais, ficam isentos do pagamento de custas:

a) Os trabalhadores, agentes e funcionários da Administração Pública que aufiram uma remuneração inferior a duas vezes o salário mínimo nacional, quaisquer que sejam os rendimentos do respectivo agregado familiar.

b) As associações sindicais nos casos em que detenham legitimidade para exercer o direito de acção nos termos da lei;

c) Os familiares dos trabalhadores a quem, nos termos legais, caiba o exercício do direito de acção, nos termos referidos na alínea a).

CAPÍTULO X

Protecção jurídica no âmbito da Lei Tutelar Educativa

Artigo 61 º

(Âmbito)

Têm direito a protecção jurídica, nos termos da presente lei, os menores com idade compreendida entre os 12 e os 16 anos que tenham praticado acto que, nos termos da legislação em vigor, dê lugar à aplicação de medida tutelar educativa.


Artigo 62º

(Nomeação de defensor)

1 - No âmbito do processo tutelar educativo, todas as diligências, incluindo as que visam o início do processo, terão a presença obrigatória de defensor nomeado oficiosamente.

2 - Para tal, através de meios expeditos, nomeadamente por via telefónica, fax, ou correio electrónico, a entidade que proceder à identificação do menor comunica à Ordem dos Advogados a necessidade de nomeação urgente de defensor.

3 - Através dos mesmos meios a Ordem dos Advogados comunicará o despacho em que nomear o defensor, e procederá simultaneamente à notificação deste.

4 - O defensor assim nomeado será o defensor para todo o processo, sem prejuízo da constituição de outro defensor.

Artigo 62º

(Especialização dos defensores)

A nomeação recairá preferencialmente em advogado com especialização no ramo de direito de menores, ou em advogado estagiário que frequente curso de especialização daquele ramo de direito como parte integrante do seu estágio.

Artigo 63º

(Quadro de defensores especializados)

A Ordem dos Advogados indicará um defensor pertencente ao quadro específico, organizado por Conselho Distrital, de defensores especializados no ramo de direito de menores.

Artigo 64º

(Permanência)

Ouvidos os defensores constantes do quadro especializado de cada círculo judicial, a Ordem dos Advogados organizará escalas de permanência em cada círculo, por forma a que possa ser prestada consulta e apoio jurídicos adequados, aos menores, aos pais, aos representantes legais ou às pessoas que tenham a guarda de facto daqueles.

CAPÍTULO XI

Disposições finais e transitórias

Artigo 65º

(Aquisição de meios económicos suficientes)

1 - Caso se verifique que o requerente do apoio judiciário possuía à data do pedido ou que adquiriu no decurso da causa ou após o termo desta, meios suficientes para pagar honorários, despesas, custas, imposto, emolumentos, taxas e quaisquer outros encargos de cujo pagamento haja sido declarado isento, é instaurada acção para cobrança das respectivas importâncias.

2 - A acção a que se refere o n.º 1 segue sempre a forma sumaríssima.

3 - As importâncias cobradas revertem para o Cofre Geral dos Tribunais.

4 - O disposto nos números anteriores não prejudica a instauração de procedimento criminal se, para beneficiar do apoio judiciário, o requerente cometer crime previsto na lei penal.

5 - O disposto nos números anteriores não é aplicável quando em virtude da causa venha a ser fixada ao requerente indemnização para o ressarcir de danos ocorridos.

Artigo 66 º

(Disposições aplicáveis)

O disposto no artigo anterior aplica-se, com as necessárias adaptações, aos serviços prestados no âmbito da consulta jurídica nos termos da presente lei.


Artigo 67º

(Norma revogatória)

São revogadas a Lei n.º 34/2004, de 29 de Julho, a Portaria n.º 1085-A/2004, de 31 de Agosto, a Portaria n.º 288/2005, de 21 de Março e as disposições das alíneas e) e f) do artigo 2º do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27 de Dezembro.

Artigo 68º

(Entrada em vigor)

1 - Entram imediatamente em vigor as normas do presente diploma que não tenham incidência orçamental.

2 - As disposições constantes da presente lei que tenham incidência orçamental entram em vigor com a aprovação do Orçamento de Estado subsequente à sua publicação.

 

Assembleia da República, em 26 de Abril de 2007

 

 

 

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