Projecto de Lei

Projecto de lei n.º 124/X - Área Protegida da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos

 

Classificação da Área Protegida da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos 

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A Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos é um sistema lagunar costeiro que resulta da confluência das águas da Ribeira de Rio Maior e da Ribeira de Maceda, ambas fortemente poluídas por efluentes domésticos e industriais. Este sistema situa-se a Norte do Distrito de Aveiro, ocupando uma área com cerca de 396 hectares .

A primeira referência à sua existência é do ano 897, sendo então designada como Lagoa de Ovil, tendo servido de coutada no século XII, devido à abundância em caça e pesca.

Nos terrenos adjacentes apresenta, a Sul e a Sudoeste uma zona de dunas fixas com vegetação arbórea e arbustiva, em alguns locais, muito densa, fortemente degradada pelo avanço da frente urbana; a Oeste situa-se a praia e o cordão dunar litoral, cujo estado de degradação é bastante preocupante, em especial na sua parte mais a Norte ; a frente Este é constituída essencialmente por terrenos agrícolas, enquanto que a parte Norte da Lagoa é limitada por antigos fundos com vegetação rasteira, onde estão implantados um aeródromo e instalações militares.

As lagunas costeiras representam, pelas suas características de zona de transição entre meio terrestre e marinho, ecossistemas de grande riqueza e biodiversidade. Podem observar-se, em função dos gradientes de salinidade, meios diversos com tipos particulares de vegetação que albergam toda uma teia alimentar composta por insectos, anfíbios, répteis, mamíferos e aves.

A situação geográfica da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos, precisamente na zona fronteira entre os concelhos de Espinho e Ovar tem ocasionado indefinições e confusões quanto às entidades que devem assumir a administração e a responsabilidade pelas acções de recuperação e preservação desta laguna costeira.

Esta indefinição é agravada pelo facto daqueles dois concelhos pertencerem a regiões-plano diferentes e, consequentemente, a responsabilização pela Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos pode ser imputável a diferentes organismos desconcentrados da Administração Central, sejam as Direcções Regionais do Ambiente do Norte e do Centro, sejam as Comissões de Coordenação Regional do Norte e do Centro.

Esta situação provoca e potencia situações pouco claras quanto à assunção de competências e de responsabilidades, o que, na prática, tem gerado uma evidente desresponsabilização quanto à solução integrada dos problemas colocados pela recuperação e preservação dos incalculáveis valores de biodiversidade que esta lagoa encerra.

A Barrinha de Esmoriz/lagoa de Paramos ganha ainda especial importância quando constitui o único sistema lagunar costeiro a Norte da Costa Ocidental da Península Ibérica, estando classificada como prioritária na directiva Habitat. Alberga inúmeras espécies de grande importância, muitas das quais protegidas, como é o caso do abetouro galego. Apresenta igualmente outros habitats prioritários, merecendo destaque a existência de Jasione lusitanica, cuja população é única na região mediterrânica.

No que diz respeito ao anexo I da Directiva Habitat (Directiva 92/43/CEE transposta pelo Decreto-Lei nº 226/97, de 27 de Agosto), a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos contabiliza no seu seio 11 habitats protegidos: lagunas costeiras, vegetação anual das zonas de acumulação de detritos pela maré, prados de Spartina (Spartinion maritimae), dunas móveis embrionárias, dunas móveis do cordão litoral com Ammophila (“dunas brancas”), dunas fixas com vegetação herbácea (“dunas cinzentas”), dunas fixas descalcificadas atlânticas (Calluno-Ulicetea), dunas com Salix repens spp, Argêntea (Salicon arenariae), comunidades de ervas altas higrófilas das orlas basais e dos picos montano e alpino, e florestas aluviais de Alnus glutinosa excelsior (Alno-Padion, Alnon incanae, Salicon albae).

Quanto a espécies de aves de interesse ecológico, foram já contabilizadas na Barrinha de Esmoriz cerca de 190 espécies de aves, com destaque para o já referido abetouro galego, a garça real, a cegonha negra, o maçarico, a andorinha do mar, o milhafre preto, o pato real, o pato marreco, o mergulhão, a galinha de água e muitas outras espécies, na sua esmagadora maioria, parte integrante do anexo A1 do Decreto-Lei nº 140/99, referente a espécies de aves de interesse comunitário, cuja conservação requer a designação de zonas de protecção especial.

Sublinhe-se que a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos constitui uma das últimas zonas húmidas da costa litoral Norte que as aves migratórias, nomeadamente limícolas, marinhas e passeriformes, têm como ponto de escala dos seus trajectos migratórios.

As principais ameaças que pairam hoje sobre a Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos são a poluição a montante das ribeiras de Rio Maior e de Maceda, as deficiências no ordenamento do território e o assoreamento da lagoa.

Ambas as ribeiras percorrem zonas de grande densidade populacional e de significativa presença de indústria fortemente poluidora (papel e cortiça), o que as carrega com níveis de poluição preocupantes. O caos urbanístico presente nas áreas circundantes da Barrinha de Esmoriz, aliado ao uso indevido e descontrolado de todo aquele meio (depósitos de lixo, passeios de jipe nas dunas, etc.) têm também provocado fortes estragos naquela área. O assoreamento da Barrinha representa uma consequência natural da deposição de areias transportadas pelas ribeiras, mas o que é agravado com o facto de a laguna ser artificialmente fechada no Verão para preservar a qualidade das águas balneares.

O Estatuto de Reserva de Interesse Regional ou Local (de acordo com o POOC Ovar – Marinha Grande) não tem permitido uma real e ampla abordagem dos complexos problemas ligados a esta laguna, sendo que, no concreto, não existe nenhuma entidade responsável pela gestão deste património.

Refira-se que a concessão do processo de despoluição da Barrinha à empresa SIMRIA representa um passo importante na recuperação ambiental daquele meio, mas continua a deixar em aberto a questão de se saber qual o organismo ou entidade que vai preservar, valorizar e potenciar aquele espaço e com que meios.

Assim, o Partido Comunista Português tem vindo a defender que o Governo deveria criar um programa de requalificação ambiental da Barrinha de Esmoriz. Um programa que deveria articular investimentos e coordenar a intervenção dos vários níveis da Administração, potenciando a concretização de um conjunto de medidas destinadas à resolução dos problemas de poluição existentes e a implementação de soluções de descontaminação de solos e águas subterrâneas.

Foi exactamente com o objectivo de vincular o Governo à criação de um programa dessa Natureza que o Grupo Parlamentar do PCP apresentou, na VIII legislatura, o projecto de resolução nº 166/VIII. No entanto, se a despoluição constitui uma condição necessária para a recuperação da Barrinha de Esmoriz, é também verdade que não é o bastante para garantir a sua valorização e posterior protecção. Consideramos, por isso, necessário que seja criada a área de paisagem protegida da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.

Na passada legislatura, o Partido Comunista Português assumiu a responsabilidade política de avançar com as soluções institucionais que entendia serem adequadas para resolver a situação da Barrinha. Porque consideramos que a resolução do Conselho de Ministros que veio a substituir a intenção desse projecto de lei, não tem dado a necessária resposta para a recuperação ambiental, consideramos que se mantém necessária a criação da área de paisagem protegida da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.

Aquele que já constituiu um espaço de lazer, contemplação e orgulho para as populações da região é agora mais um exemplo do abandono a que estão sujeitas muitas áreas de interesse ambiental do País. Um espaço com um valor incalculável, quer do ponto de vista ecológico, quer do ponto de vista do valor público da área, não deve continuar a ser alvo de desprezo político ou de desarticulação e falta de vontade políticas.

É importante que seja levado a cabo o desassoreamento da Barrinha com precaução e articulada com as medidas necessárias também à remoção dos detritos que tendem a acumular-se no sistema lagunar. É prioritário recuperar e proteger os diferentes biótipos existentes na laguna, impedindo novas agressões aos mesmos. É ainda de extrema importância que se fiscalize e proceda à ligação de todas as fontes poluidoras das inúmeras indústrias, bem como de todos os esgotos domésticos clandestinos que persistem em poluir as ribeiras de Rio Maior e Maceda e que desaguam na Barrinha de Esmoriz.

Ainda que tenha sido dado um conjunto de passos positivos no funcionamento orgânico e na articulação de entidades para a despoluição da Barrinha, consideramos que continua a fazer todo o sentido que se aprofundem as medidas de protecção da região da Barrinha. Assim, e tendo em conta que a lagoa constitui um ecossistema de enorme valor, o Partido Comunista Português considera que se justifica criar aí uma área protegida de interesse nacional com o modelo de gestão de reserva natural.

Por tudo o que ficou referido, entende o Grupo Parlamentar do PCP que, no âmbito do previsto pela Lei de Bases do Ambiente e reunindo esta área as características previstas no Decreto-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro, ela deverá ser classificada como Área de Paisagem Protegida de interesse nacional. Assim, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam, nos termos constitucionais e regimentais aplicáveis, o seguinte Projecto de Lei:

Artigo 1.º

Classificação

É classificada a Área de Paisagem Protegida de interesse nacional da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos.

Artigo 2.º

Âmbito

Sem prejuízo das competências previstas no artigo 27º do Decreto-Lei nº 19/93, de 23 de Janeiro, ouvidos os municípios abrangidos e as associações de defesa do ambiente com actividade local reconhecida, a Área de Paisagem Protegida Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos sertã de âmbito nacional.

Artigo 3º

Designação

A Área protegida da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos, ouvidos os municípios abrangidos, designar-se-á Reserva Natural da Barrinha de Esmoriz/Lagoa de Paramos. 

Artigo 4.º

Limites

A Área Protegida tem os limites que correspondem aos definidos pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 76/2000, de 15 de Junho, publicada no Diário da República n.º 153, I-Série B, de 5 de Julho de 2000.

Artigo 5.º

Objectivos

Sem prejuízo do disposto no artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro, constituem objectivos específicos da criação da Área Protegida:

a) A recuperação e preservação de valores naturais e culturais através da conservação dos seus aspectos paisagísticos, florestais e faunísticos;

b) A conservação e melhoria de aptidões para a educação ambiental e o lazer, para a defesa da diversidade ecológica, e para a valorização do património histórico e cultural;

c) A promoção da melhoria da qualidade de vida das populações, compatibilizando-a com um desenvolvimento sustentável.

Artigo 6.º

Regulamentação

Cabe ao Governo, através do Ministério do Ambiente, Ordenamento do Território e Desenvolvimento Regional, proceder à regulamentação nos termos e para os efeitos do artigo 27º do Decreto-Lei n.º 19/93, de 23 de Janeiro.

Artigo 7º

Actos e actividades condicionadas

Até à publicação da regulamentação prevista no artigo anterior, ficam impossibilitadas as seguintes acções:

a) Alterações do relevo natural ou no uso do solo;

b) Operações de loteamento e de urbanização sem prejuízo da aplicação dos planos directores municipais (PDM) respectivos;

c) Depósitos de lixos ou entulhos;

d) Extracção e recolha de areias;

e) O derrube de árvores em maciço e a recolha de espécies vegetais que não sejam provenientes de explorações agrícolas ou florestais permitidas;

f) A caça e outras actividades que possam constituir ameaça à avifauna;

g) A plantação de novas espécies florestais;

h) Demolições ou novas construções com excepção das que forem determinadas em execução estrita dos planos directores municipais de Espinho e de Ovar;

i) Circulação de veículos.

 

Assembleia da República, em 30 de Junho de 2005

 

 

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