Projecto de Lei N.º 1012/XIV/3.ª

Procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de junho, eliminando o cartão do adepto e as zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos

Exposição de motivos

A Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, veio estabelecer o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança.

A mais recente alteração a este regime, feita pela Lei n.º 113/2019, de 11 de setembro, introduziu um conjunto de alterações que o PCP então contestou.

No momento dessa discussão o PCP deixou clara a sua posição quanto aos fenómenos de violência, de racismo e de xenofobia, quer estes tenham lugar em contexto desportivo ou não. A violência no desporto não é um fenómeno isolado e todo e qualquer comportamento dessa índole deve merecer firme combate, não só numa perspetiva punitiva, de vigilância ou de fiscalização, mas sobretudo numa perspetiva preventiva e de acompanhamento próximo destes fenómenos, algo que é uma responsabilidade do Estado e que deve ser assumido de forma prioritária e transversal. Quer isto também dizer que compete ao Estado agir sobre as causas que levam ao recrudescer de tais ideias e manifestações aberrantes numa democracia, não esquecendo que a falta de respostas aos problemas estruturais da sociedade e o avolumar das desigualdades são terreno fértil para quem dissemina e beneficia com tais ideias.

Sobre as soluções introduzidas pela proposta de lei, o PCP manifestou desde início as suas preocupações: o desaparecimento total do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ) nestas matérias e consequente substituição pela Autoridade para a Prevenção e o Combate à Violência no Desporto; o reforço do papel da segurança privada neste âmbito; a criação de zonas específicas de acesso e permanência de adeptos que passam a ser praticamente as únicas zonas autorizadas nos recintos desportivos a ter um conjunto de materiais de apoio aos próprios clubes desportivos e a criação de um cartão de acesso identificativo do adepto.

Inaceitável é ainda a equiparação de mensagens de teor racista, xenófobo ou de incitamento à violência às “manifestações de ideologia política”, num total atentado à liberdade de expressão que se soma à desconsideração quanto à liberdade de associação que toda a lei encerra.

Note-se que esta lei, focada apenas na realidade das grandes competições desportivas, se aplica indiscriminadamente a uma realidade heterogénea, a qualquer nível competitivo ou âmbito de espetáculo desportivo, a quaisquer acontecimentos relacionados com o desporto e praticados em locais que lhes estão associados. Ou seja, as mesmas “soluções” são adotadas para diferentes realidades, diferentes modalidades desportivas e diferentes tipologias de instalações. No fundo, a Lei nº 113/2019, de 11 de setembro, ignora a multiplicidade de realidades do desporto nacional e ignora as condições objetivas que os clubes desportivos ou os proprietários das instalações desportivas possam ou não ter para acompanhar os seus desígnios.

Para o PCP, existe uma premissa que não pode ser esquecida ao abordar o problema da violência e discriminação praticada em contexto desportivo: um ato de vandalismo, violência, xenofobia ou racismo é crime; apoiar um clube desportivo, uma equipa ou até um atleta não é crime. Portanto, puna-se o crime cometido, mas não se sacrifiquem direitos dos cidadãos a pretexto de supostas medidas de segurança.

Infelizmente, a posterior publicação da Portaria n.º 159/2020, de 26 de junho, que definiu as normas aplicáveis à requisição, emissão, funcionamento e utilização do cartão de acesso a zona com condições especiais de acesso e permanência de adeptos (ZCEAP), confirmou e reforçou as preocupações manifestadas então pelo PCP e pelos adeptos.

A visão incorporada pela atual redação da lei assume a suspeição como princípio e a criação de diferentes zonas para vários adeptos são também uma forma de estigmatizar e segmentar os adeptos.

O Cartão do Adepto depende do registo na Autoridade para a Prevenção e Combate à Violência no Desporto mediante a cedência de diversos dados pessoais que vão desde o nome, morada e diferentes contactos aos promotores de espetáculos desportivos que apoia. Tudo isto com um custo de 20 euros, tornando ainda mais inacessível a fruição dos espetáculos desportivos.

Nas ZCEAP só podem estar adeptos com o Cartão do Adepto, ou seja, menores de 16 anos não podem ingressar nas referidas áreas, sendo que apenas na ZCEAP está prevista a inteira manifestação do adepto.

Fica assim condicionada também o acesso a jogos que se realizem “fora de casa”.

Refira-se que estas mesmas medidas foram adotadas em diversos países e em todos eles se revelaram ineficazes, como aconteceu na Bélgica ou na Polónia onde já se reverteu a medida, tendo contribuído até com efeitos negativos, com o decréscimo de adeptos aos estádios, caso da Itália ou Turquia. O próprio Conselho da Europa já observou que estas medidas não resolvem quaisquer problemas de segurança, podendo até agravá-los.

Assim, ouvidos vários agentes desportivos, adeptos de vários clubes desportivos e modalidades desportivas e a Associação Portuguesa de Defesa do Adepto (APDA), o PCP considera que as alterações que foram propostas no momento da aprovação da lei hoje em vigor mantêm pertinência e reforçam a sua razão.

Assim, ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP apresentam o seguinte Projeto de Lei:

Artigo 1.º

Objeto

A presente lei procede à quarta alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.ºs 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019, de 11 de setembro que estabelece o regime jurídico do combate à violência, ao racismo, à xenofobia e à intolerância nos espetáculos desportivos, de forma a possibilitar a realização dos mesmos com segurança.

Artigo 2.º

Alteração à Lei n.º 39/2009, de 30 de julho

Os artigos, 3.º, 7.º, 8.º, 13.º, 14.º, 15.º, 16.º, 17.º, 22.º, 23.º, 24.º, 25.º, 35.º, 39.º, 39.º-A, 39.º-B, 40.º, 42.º e 46.º-A Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.ºs 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019, de 11 de setembro, passam a ter a seguinte redação:

“Artigo 3.º

[…]

[…]:

  1. […];
  2. […];
  3. […];
  4. […];
  5. […];
  6. […];
  7. […];
  8. […];
  9. […];
  10. […];
  11. […];
  12. […];
  13. […];
  14. […];
  15. […];
  16. […];
  17. Revogada;
  18. Revogada;

Artigo 7.º

Regulamentos de segurança e de utilização dos espaços de acesso público

  1. […].
  2. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. […];
    4. […];
    5. […];
    6. […];
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. […];
    11. […].
  3. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. Revogada;
    4. Revogada.
  4. […].
  5. […]:
  6. […].
  7. […].

Artigo 8.º

[…]

  1. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. […];
    4. […];
    5. […];
    6. […];
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. […];
    11. […];
    12. […];
    13. […];
    14. Revogada;
    15. […];
    16. Revogada;
    17. Revogada;
    18. Revogada;
    19. […];
    20. […];
    21. […].
  2. […].
  3. […].

Artigo 13.º

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. […].
  5. […].
  6. […].
  7. […].
  8. Revogado.
  9. […].
  10. […].

Artigo 14.º

[…]

  1. Revogado.
  2. Revogado.
  3. (…).
  4. Revogado.
  5. É proibido o apoio a grupos organizados de adeptos que dotem sinais, símbolos e expressões que incitem à violência, ao racismo, à xenofobia, à intolerância nos espetáculos desportivos, ou a qualquer forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política.
  6. A concessão de facilidades de utilização ou a cedência de instalações a grupos de adeptos constituídos nos termos da presente lei é da responsabilidade do promotor do espetáculo desportivo, cabendo-lhe, nesta medida, a respetiva fiscalização, a fim de assegurar que nestas não sejam depositados quaisquer materiais ou objetos proibidos ou suscetíveis de possibilitar ou gerar atos de violência, racismo xenofobia, intolerância nos espetáculos desportivos, ou qualquer outra forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política.
  7. […].
  8. […].
  9. […].
  10. […].

Artigo 15.º

[…]

Revogado.

Artigo 16.º

[…]

  1. Revogado.
  2. […].
  3. […].
  4. Revogado.
  5. Revogado.
  6. […].

Artigo 16.ºA

Zona de condições especiais de acesso e permanência de adeptos

Revogado

Artigo 17.º

  1. Os recintos desportivos nos quais se realizem competições desportivas de natureza profissional ou não profissional consideradas de risco elevado, sejam nacionais ou internacionais, são dotados de lugares sentados, individuais e numerados, equipados com assentos de modelo oficialmente aprovado, sem prejuízo de o promotor do espetáculo desportivo poder definir áreas de assistência com lugares em pé, individuais e numerados, nas zonas com condições especiais de acesso e permanência de adeptos, equipadas com mecanismos de segurança de modelo oficialmente aprovado, que previnam o efeito de arrastamento de espetadores.
  2. […].
  3. […].

Artigo 22.º

[…]

  1. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. […];
    4. […];
    5. […];
    6. Não praticar atos violentos ou que incitem à violência, ao racismo, à xenofobia, à intolerância nos espetáculos desportivos, a qualquer forma de discriminação ou que traduzam manifestações de ideologia política, incluindo a entoação de cânticos;
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. […].
  2. […].
  3. […].
  4. […].
  5. […].
  6. Sem prejuízo do disposto no artigo 16.º-A, no acesso aos recintos desportivos integrados em competições desportivas de natureza profissional ou em espetáculos desportivos integrados nas competições desportivas de natureza não profissional considerados de risco elevado, é vedado aos espetadores do espetáculo desportivo a posse, transporte ou utilização de:
    1. […];
    2. […].
  7. […].

Artigo 23.º

[…]

  1. […]:
    1. Não ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, violentas, de carácter racista ou xenófobo, intolerantes, nos espetáculos desportivos, que incitem à violência ou qualquer forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política;
    2. […];
    3. Não praticar atos violentes, que incitem à violência, ao racismo ou à xenofobia, à intolerância nos espetáculos desportivos, a qualquer outra forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política;
    4. […];
    5. Não entoar cânticos racistas ou xenófobos ou que incitem à violência, à intolerância nos espetáculos desportivos, a qualquer forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política;
    6. […];
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. […];
    11. […];
    12. […];
    13. […];
    14. […].
  2. […].
  3. […].
  4. Salvo em casos expressamente autorizados pelo promotor do espetáculo desportivo, nos recintos desportivos integrados em competições desportivas de natureza profissional ou em espetáculos desportivos integrados nas competições desportivas de natureza não profissional considerados de risco elevado, é vedado aos espetadores do espetáculo desportivo a posse, transporte ou utilização de:
    1. […];
    2. […].
  5. […].

Artigo 24.º

[…]

  1. Nos recintos desportivos onde se realizem espetáculos desportivos não abrangidos pelo disposto no artigo 16.º-A, os grupos organizados de adeptos podem excecionalmente, utilizar megafones e outros instrumentos produtores de ruídos, por percussão mecânica e de sopro, desde que não amplificados com auxílio de fonte de energia externa.
  2. […].
  3. […].
  4. […].

Artigo 25.º

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. Revogado.

Artigo 35.º

[…]

  1. […].
  2. Revogado.
  3. 3 - […].
  4. […].
  5. […].
  6. […].
  7. […].
  8. […].

Artigo 39.º

[…]

  1. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. […];
    4. […].
    5. […];
    6. […];
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. A introdução, posse, transporte ou utilização de megafones e outros instrumentos produtores de ruídos, por percussão mecânica e de sopro, bem como bandeiras, faixas, tarjas e outros acessórios, de qualquer natureza e espécie, de dimensão superior a 1 metro por 1 metro, passíveis de serem utilizados em coreografias de apoio aos clubes e sociedades desportivas, que não sejam da responsabilidade destes últimos, em violação do disposto no n.º 4 do artigo 23.º ou do artigo 24.º, bem como a sua utilização sem a devida aprovação, em violação do previsto no n.º m9 do artigo 16.º-A;
    11. […];
    12. […].
  2. […].

Artigo 39.º-A

[…]

  1. […]:
    1. […];
    2. […];
    3. […];
    4. […];
    5. […];
    6. […];
    7. […];
    8. […];
    9. […];
    10. […];
    11. […];
    12. […];
    13. […];
    14. Revogada;
    15. Revogada;
    16. Revogada;
    17. Revogada;
    18. Revogada;
    19. […];
    20. […];
    21. […].
  2. […].
  3. […].

Artigo 39.º-B

[…]

  1. […]:
    1. Revogada;
    2. Revogada;
    3. […];
    4. Revogada;
    5. Revogada.
  2. […]:
    1. Revogada;
    2. A atribuição de qualquer apoio a grupos organizados de adeptos que adotem sinais, símbolos e ou expressões que incitem à violência, ao racismo, à xenofobia, à intolerância nos espetáculos desportivos, ou a qualquer outra forma de discriminação, ou que traduzam manifestações de ideologia política, em violação do disposto no n.º 5 do artigo 14.º;
    3. […];
    4. […];
    5. […];
    6. Revogada;

Artigo 40.º

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. […].
  5. […].
  6. Constitui contraordenação, punida com coima entre 5000 (euro) e 200 000 (euro), a prática dos atos previstos nas alíneas a), b), c), e), g), j), l), m), n), o), p), q), r), s) do n.º 1 do artigo 39.º-A, no n.º 2 do mesmo artigo por referência ao disposto na alínea j) do n.º 1, bem como dos previstos nas alíneas a), c), e) e f) do n.º 1 e a), b), c), d) e f) do n.º 2 do artigo 39.º-B.
  7. […].
  8. […].
  9. […].

Artigo 42.º

[…]

  1. […].
  2. […].
  3. […].
  4. […]:
    1. Da prática de contraordenação prevista nas alíneas n) a q) do n.º 1 do artigo 39.º-A e nas alíneas a) do n.º 1 e b) a e) do n.º 2 do artigo 39.º-B;
    2. […].

Artigo 46.º-A

Sanções disciplinares

  1. O incumprimento dos deveres previstos nas alíneas a), b), d), f), g), h), i), j), k), l), n) e p) do n.º 1 do artigo 8.º por parte de clubes, associações e sociedades desportivas é punida, conforme a respetiva gravidade, com as seguintes sanções:
    1. […];
    2. […];
    3. […].
  2. […].

Artigo 3.º

Norma Revogatória

  1. São revogadas:
    1. As alíneas q) e r) do artigo 3.º, a c) e d) do n.º 3 do artigo 7.º, n), p), q) e r) do n.º 3 do artigo 8.º, o n.º8 do artigo 13.º, os n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 14.º, o artigo 15.º, os n.ºs 1, 4 e 5 do artigo 16.º, o artigo 16.º -A, o n.º 4 do artigo 25.º, o n.º 2 do artigo 35.º, as alíneas n), o), p), q) r) do n.º 1 do artigo 39.º- A, as alíneas b), c), e) e f) do n.º 1 e a alínea a) do n.º 2 do artigo 39.-B da Lei n.º 39/2009, de 30 de julho, alterada pelo Decreto-Lei n.º 114/2011, de 30 de novembro, e pelas Leis n.ºs 52/2013, de 25 de julho, e 113/2019, de 11 de setembro;
    2. A Portaria 159/2020, de 26 de junho.
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