Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

Por uma política pública de crédito para o relançamento da economia

(projeto de resolução n.º 848/XII3.ª)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
A situação sobre o acesso ao crédito das empresas portuguesas é um debate recorrente para um problema, infelizmente, também ele recorrente e cada vez mais grave. Há seis meses atrás, fizemos este debate e, na altura, o que aqui afirmámos mantém-se com redobrada atualidade.
De acordo com os dados mais recentes do Banco de Portugal, que se reportam ao final do mês de julho passado, o crédito às empresas voltou a cair em número de empréstimos e, sobretudo, em valor.
Em julho do ano passado, apresentava já uma queda de 5,4% em termos homólogos face ao ano anterior, mas daí para cá o garrote ainda ficou mais apertado com uma quebra de 6,3% registada agora. O que os mesmos dados nos permitem verificar é que esse acesso ao crédito é profundamente desigual entre a situação das micro, pequenas e médias empresas e a das grandes empresas.
A desigualdade é, nada menos, do que esta: para as micro, pequenas e médias empresas é de menos 8,6% de crédito concedido, quando há um ano atrás já havia uma quebra de 8,4%, uma queda em cadeia. Para as grandes empresas, há mais crédito disponível do que havia antes, Srs. Deputados: mais 2,6% em julho, em termos homólogos, e mais 8,1% em julho do ano anterior, em termos homólogos face ao ano de 2011.
É o aprofundar do fosso na tão propalada concorrência e é o asfixiar, cada vez mais grave, das micro, pequenas e médias empresas quando, afinal, para as grandes empresas não se verifica o tal problema do sistema financeiro que os Srs. Deputados aqui colocavam. Para as grandes empresas não há nenhuma das dificuldades que aqui foram colocadas. Portanto, temos de saber para que queremos os bancos. Para que servem os bancos num País? Qual o papel do sistema financeiro e qual o papel da Caixa Geral de Depósitos?
Nós apresentámos, reiteradamente — e não vamos deixar de apresentar — propostas no sentido de que a utilização, pelo Governo, do remanescente dos 12 000 milhões de euros do empréstimo para a recapitalização da banca privada, para reforçar os rácios da Caixa Geral de Depósitos, deveria ser para garantir as necessárias condições para disponibilizar o crédito às micro, pequenas e médias empresas, para o seu relançamento e manutenção da sua atividade económica.
Propusemos e voltaremos a defender o acionamento de medidas junto do setor financeiro para a fixação administrativa, se necessário for, dos limites máximos dos spreads, porque aquilo a que assistimos é a um roubo do ponto de vista dos spreads e dos custos de financiamento para as micro, pequenas e médias empresas.
O que propomos é que o Estado assuma um papel efetivo no setor, impedindo a tomada de posições do capital estrangeiro em setores estratégicos da banca nacional. Defendemos a intervenção do Estado português, por via da Caixa Geral de Depósitos e das suas participações noutras instituições, para que haja rapidamente concessão de crédito às micro, pequenas e médias empresas.
Há propostas concretas que temos vindo a defender que não perderam atualidade nem razão de ser, Srs. Deputados. Continua a ser uma urgência nacional que, do ponto de vista do financiamento, se corrija, se resolva e se combata esta assimetria, este fosso entre tudo cada vez mais difícil para as micro empresas e tudo cada vez mais fácil para as grandes empresas deste País e estrangeiras.
Reiteramos uma questão central deste debate: não vale a pena pedir dinheiro emprestado para depois não ter dinheiro para pagar os empréstimos. As micro empresas, as pequenas empresas deste País têm o garrote cada vez mais apertado no acesso ao crédito, é verdade, mas o grande problema, a questão central, o problema de fundo neste debate é a questão do poder de compra. Não se pode vender o que os salários não podem comprar, o que as pensões de reforma não podem comprar. E o verdadeiro crime social, o terrorismo social e a sabotagem económica que está a ser feita com este Orçamento do Estado e com esta política, retirando cada vez mais poder de compra às populações, é uma sentença de morte para as micro, pequenas e médias empresas, para os mais de 60% da economia que dependem do mercado interno e da procura interna, que está a ser massacrada por esta política, por este Governo e por este pacto de agressão com a troica.

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