Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

A política económica e a política industrial de que o País precisa

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Srs. Membros do Governo,
Sr. Ministro,
O PCP propôs que este debate fosse agendado para o Plenário da Assembleia da República e consideramos que esta é uma oportunidade importante para um debate sério sobre a política económica e, designadamente, sobre a política industrial de que o País precisa e de mais alguma concretização além das abordagens tão genéricas e tão redondas que o Sr. Ministro tem vindo a fazer ultimamente sobre os desígnios da reindustrialização.
Já o temos confrontado com esta matéria e o Sr. Ministro e o Governo falam em reindustrializar o País, mas ao que temos vindo a assistir, infelizmente, é à desindustrialização do País. Os senhores estão a desindustrializar o País, e isso verifica-se, inclusivamente, em setores e em áreas que são da vossa direta tutela governamental.
Estivemos esta semana, mais do que uma vez, em unidades da EMEF (Empresa de Manutenção de Equipamento Ferroviário). A indústria portuguesa de manutenção ferroviária está no topo, a nível mundial, em matéria de inovação. O que é que os senhores vão fazer? Vão alienar a unidade de inovação da EMEF, vão vendê-la aos ingleses.
Sr. Ministro, é inexplicável que o potencial tremendo, a capacidade tecnológica, a inovação de ponta, a nível mundial, sejam desta forma alienados para uma empresa inglesa que fica com a maioria do capital quando os senhores vêm depois falar em reindustrializar. Os senhores não precisam de criar do zero, basta que não destruam! Mas é isso que está a acontecer na indústria nacional, em vários setores e fileiras.
Era também importante que o senhor trouxesse aqui notícias sobre a perspetiva para o setor automóvel, por exemplo. No distrito de Setúbal, não apenas na Autoeuropa, mas no respetivo parque industrial, onde de um lado se vai criando uma encomenda é trabalho que falta na outra empresa. A situação de asfixia que está colocada para os próximos tempos, a chantagem e a ameaça colocadas àqueles trabalhadores exige que, neste momento, neste e em outros setores, de Norte a Sul do País, haja uma resposta concreta sobre as situações que são colocadas a estas empresas na indústria nacional.
É preciso que haja uma resposta do Governo sobre o que está a ser feito relativamente ao futuro da indústria nacional, não para a sua destruição, nem para que depois venha alguém dizer que é preciso reindustrializar aquilo que existiu e aquilo que tinha — e tem! — potencial que era preciso defender.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro,
Vamos ao concreto, por favor.
O que é que o Governo tem a dizer aos trabalhadores e às empresas do setor da indústria e do tecido económico português em geral, que se debatem com dificuldades que nunca, até hoje, tinham encontrado?
O que é que o senhor tem a dizer aos trabalhadores das oficinas do Barreiro da EMEF, que estão sob sua tutela, relativamente ao futuro da unidade e ao futuro da empresa? Como é que o senhor explica que a unidade de inovação da EMEF vá para os ingleses? O que é que o senhor tem a dizer aos trabalhadores do parque industrial da Autoeuropa e daquela unidade? O que é que o senhor tem a dizer às micro e pequenas empresas que, desculpe que lhe diga, «têm a corda na garganta» em relação aos custos de fatores de produção, como a energia, e ao acesso ao crédito? Não vale a pena referir parangonas de números redondos, a nível nacional! O que é que está a ir para as empresas? É que as empresas estão a fechar, estão em processos de insolvência e os trabalhadores, que geralmente são o elo mais fraco destes processos, não são os culpados pela situação das empresas.
E não é baixando os salários, os custos com o fator trabalho que se resolve o problema gravíssimo da economia nacional. Substituir importações por produção nacional não se consegue aumentando a exploração dos trabalhadores e deixando ao abandono as empresas nas questões fundamentais. Ora, é isso que o Sr. Ministro está a fazer, sem dar resposta a estas matérias fundamentais.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Ministro da Economia e do Emprego,
O senhor não veio aqui fazer uma palestra nem jogos florais, o senhor está num debate em Plenário para abordar as questões que são colocadas. Nós não substituímos o debate sério pelo sound bite e é politicamente significativo que não tenha sequer pronunciado os nomes dos problemas com que foi confrontado. Nem uma palavra sobre o crime económico da Cimpor; nem uma palavra sobre a EMEF; nem uma palavra sobre o parque industrial da Autoeuropa. O Sr. Ministro voltou a falar do sector mineiro e nem uma palavra sobre a valorização do minério em Portugal. É caso para dizer «a questão é transformá-lo», Sr. Ministro — parafraseando o velho Marx.
Falou em 22 empresas recuperadas com a vossa iniciativa. No ano passado, o total de insolvências foi de 6281 empresas. É uma razia no tecido económico que os senhores estão a prosseguir! Ou o senhor não sabe que, com as novas regras da faturação, nomeadamente as relativas às caixas registadoras, há hoje, sexta-feira, milhares de microempresários do pequeno comércio, da restauração, que fecham a porta pensando que na segunda-feira já não a abrem?! Quantas insolvências e encerramentos estarão na calha para a próxima semana, com as novas regras que os senhores impuseram de uma forma cega?!
Encerramentos que ocorrerão para sempre!
O Sr. Ministro escusa de pedir sugestões para a vossa política industrial e económica, porque o que é preciso e urgente é uma outra política. Não vamos lá com acertos nem com retoques. O que é preciso é uma outra política e, já agora, um outro Governo que a execute, porque o que dizemos é que é preciso uma visão estratégica de desenvolvimento integrado que valorize a produção nacional e os nossos recursos!
É nesse sentido que apresentaremos um projeto de resolução, num debate, num trabalho e numa luta que vamos continuar. Mas é preciso sublinhar que a nossa luta e a nossa intervenção é por uma outra política: derrotar este pacto de agressão, antes que ele derrote o País!
É por isso que reafirmamos que, nesta Assembleia e fora dela, de Norte a Sul do País, a nossa luta é por uma outra política, uma política que vença e derrote esta linha de destruição e de definhamento que os senhores têm para o País. E vão ser derrotados pelo povo português!

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