Nas últimas décadas, a produção agrícola nacional foi definhando, em consequência de erradas opções políticas de sucessivos governos. Centenas de milhares de explorações agrícolas foram encerradas, contribuindo de forma decisiva para o despovoamento e desertificação de muitas regiões do interior do país e para o agravamento do défice da balança agroalimentar, principalmente de um conjunto de bens estratégicos. O propalado sucesso recente da agricultura é acima de tudo o aumento da produção agrícola de cariz industrial e o desenvolvimento do agronegócio.
É possível e é necessário aumentar a produção agrícola nacional, tal como o PCP vem há muito tempo reclamando. Mas este objetivo só pode ser atingido com uma inversão de política, definindo a produção primária como prioritária para o futuro do país, e com um governo empenhado em promover e dinamizar a produção agrícola nacional.
Com este Projeto de Resolução, o PCP, propõe a adoção de medidas de apoio e estímulo à cultura da figueira-da-índia, promovendo e fomentando o desenvolvimento de uma fileira associada ao figo-da-índia.
A figueira-da-índia é uma planta arbustiva perene, suculenta e ramificada, de porte variável, desde rasteiro até arbóreo, podendo alcançar até quatro metros de altura. Muitas vezes descrita como “um tesouro por baixo de espinhos”, é uma cultura resistente à seca e de elevada eficiência no uso da água, adaptando-se a zonas áridas e semiáridas onde as limitações edafoclimáticas para a agricultura são mais acentuadas. Existem em Portugal, de norte a sul, diversas espécies de figueiras-da-índia subespontâneas e dispersas, assumindo as mesmas maior relevância no Algarve e Alentejo.
A figueira-da-índia (Opuntia Ficus Indica) é uma planta que tem um potencial de aproveitamento quase integral. Os cladódios (palmas) são utilizados para a alimentação do gado e para a produção de sumos, compotas, picles e conservas, ou ainda de corantes naturais ou espessantes. Os cladódios jovens (com 30 a 60 dias) podem ser usados para consumo humano, frescos ou cozinhados, tal como as hortaliças. No que respeita ao fruto – figo-da-índia – a sua utilização mais difundida é como fruto fresco, podendo, no entanto, ser consumido na forma de sumo, néctar ou polpa ou utilizado para a produção de compotas, geleias, xaropes, adoçantes, produtos desidratados, vinhos, licores e mesmo vinagre ou ainda para a produção de corantes alimentares naturais. Da semente é extraído um óleo utilizado na indústria cosmética, podendo do processo de extração obter-se um subproduto para a alimentação animal. Por fim, a flor é utilizada, depois de seca, para produção de infusões com diversos usos terapêuticos.
A região mediterrânica tem condições edafoclimáticas propícias à cultura da figueira-da-índia. Na Europa, o maior produtor de figo-da-índia é a Itália, onde existem 3.000 hectares de plantações intensivas com uma produção média de 70.000 toneladas anuais de fruta. A maior parte da produção é destinada ao consumo em fresco, embora também seja usada para doces, gelados, licores e vinagretes de fruta. Na Tunísia, a figueira-da-índia está mais associada a campanhas de combate à erosão e à desertificação, sendo a principal utilização ligada às forragens animais.
Em Portugal, há alguns anos, a cultura da figueira-da-índia começou a suscitar interesse, existindo já algumas plantações, definitivas ou a título experimental. Existente um pouco por todo o país, é no Algarve que assume maior expressão ao nível de área plantada, seguindo-se Castelo Branco, Évora, Portalegre, Beja, Santarém, Leiria, Bragança, Viseu, Setúbal, Lisboa e Guarda.
Em abril de 2012, foi constituída a APROFIP – Associação de Produtores de Figo da Índia Portugueses, que disponibiliza apoio técnico e jurídico aos seus associados, no âmbito da implementação, manutenção, exploração e comercialização da figueira-da-índia e produtos derivados. A convite da APROFIP e da COOPÊSSEGO – Cooperativa Agrícola de Rega do Pessegueiro, uma delegação do PCP visitou uma plantação experimental de figueiras-da-índia, na localidade do Pessegueiro, na freguesia de Martim Longo do concelho de Alcoutim. O PCP visitou também outras explorações na Serra de Serpa e uma unidade de transformação em Vila Nova de S. Bento que utiliza o figo-da-índia para produção de doces e de gomas. Nessas visitas, que contaram com a participação de diversos produtores nacionais de figo-da-índia, as delegações do PCP puderam inteirar-se das grandes potencialidades da cultura da figueira-da-índia.
Cerca de um terço do território português apresenta elevada suscetibilidade à desertificação. As alterações climáticas poderão vir a agravar os efeitos das secas, acelerar a degradação dos solos e, consequentemente, a desertificação do território, condicionando severamente o desenvolvimento de extensas áreas rurais. A cultura da figueira-da-índia pode dar um contributo relevante para a revitalização dessas áreas rurais e para a dinamização das economias locais, combatendo o processo de despovoamento que as afeta. Permite aos proprietários de terras incultas ou subaproveitadas obter um rendimento significativo e sustentável, além de estimular um conjunto de atividades económicas a montante e a jusante.
Contudo, a cultura da figueira-da-índia enfrenta, em Portugal, diversos fatores limitantes, como sejam a escassez de conhecimentos técnicos dos métodos de produção e processamento e inexistência de serviços de apoio agrícola especializado; o baixo conhecimento do produto no mercado nacional; as dificuldades no acesso ao crédito por parte de jovens agricultores e novos produtores; e as limitações no acesso à terra para jovens agricultores. Urge ultrapassar estas limitações, criando condições para o desenvolvimento de uma fileira associada ao figo-da-índia.
Pelo exposto, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, nos termos regimentais e constitucionais aplicáveis, propõem que a Assembleia da República adote a seguinte resolução:
Resolução
A Assembleia da República recomenda ao Governo que:
1. Reconheça as enormes potencialidades da cultura da figueira-da-índia e a existência de vastas regiões do território nacional com condições edafoclimáticas excecionais para esta cultura;
2. Reconheça que a cultura da figueira-da-índia pode dar um contributo relevante para a revitalização de extensas áreas rurais do nosso país afetadas por fenómenos de desertificação e despovoamento, permitindo aos proprietários de terras incultas ou subaproveitadas obter um rendimento significativo e sustentável;
3. Adote medidas de apoio e estímulo à produção de figo-da-índia e seus derivados;
4. Promova, apoie e fomente o desenvolvimento de uma fileira associada ao figo-da-índia.
Assembleia da República, em 4 de junho de 2015