Intervenção de Agostinho Lopes na Assembleia de República

PCP contra o aumento dos preços dos combustíveis e do gás natural

Declaração política contra a política de regulação do preço dos combustíveis

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr.as Deputadas:
O Sr. Ministro da Economia, ontem, além de preocupado, disse desconhecer as razões pelas quais, em Portugal, são tão elevados os preços dos combustíveis. Prometeu investigar (supõe-se, via Autoridade da Concorrência), aliás, como Manuel Pinho, em 2008.
Espantosa declaração e enorme desfaçatez de um Governo que tem arrumado simplisticamente as causas na subida do preço do petróleo, se tem mostrado completamente relapso na resposta ao problema e completamente mouco face às medidas que lhe foram sendo avançadas, inclusive pelo PCP. Mas, fundamentalmente, o Governo, pela voz de Vieira da Silva, recusa assumir, como outros, as consequências do processo de privatização e liberalização do sector energético português, responsáveis pelos preços especulativos da energia — combustíveis, electricidade e gás natural — e que incapacitaram o Estado na resposta adequada a problemas externos, como o da subida do preço do petróleo. Não querem ver que os elevados preços da energia, em Portugal, são a outra face, são inseparáveis da escandalosa acumulação de lucros das empresas do sector energético.
É numa situação claramente desfavorável para a economia e para a população que, desde o início do ano, a gasolina, o gasóleo, o fuel e o gás registaram aumentos, respectivamente de 8,5%, 10,7%, 8,2% e 7,9%. A acrescentar, a Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) anunciou aumentos nas tarifas de gás natural para consumidores residenciais e pequenas empresas que entrarão em vigor a partir do mês de Julho.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
Uma desculpa muito invocada para o diferencial face a preços europeus é a dos impostos. Mas os preços dos combustíveis em Portugal (antes de impostos) são dos mais elevados da União Europeia.
Em Fevereiro de 2010 (último mês com dados disponíveis), o preço da gasolina sem chumbo 95, valor que entra directamente para as receitas das empresas petrolíferas, era 4,7% superior à média europeia, e o preço do gasóleo (também sem impostos) era 6,6% superior a essa média. Em ambos os casos, os preços são mais altos do que os praticados na esmagadora maioria dos 27 países da União Europeia. Naquele mês de Fevereiro, de acordo com a Direçcão-Geral de Energia, apenas dois países (Finlândia e Grécia), no gasóleo, e apenas cinco (Chipre, Dinamarca, Espanha, Itália e Malta), na gasolina 95, tinham preços superiores, sem taxas e impostos.
Se estas diferenças se mantiverem em 2010, os portugueses pagarão mais de 250 milhões de euros do que pagariam se os preços fossem os dos valores médios da União Europeia.
Sr. Presidente,
Srs. Deputados:
No debate destas questões, as entidades reguladoras (Autoridade da Concorrência e ERSE), se não afirmam taxativamente que os preços e tarifas nada têm a ver com os lucros das empresas do sector, andam lá bem perto.
De facto, os preços praticados são o outro lado dos lucros, melhor se dirá, dos sobrelucros, das empresas monopolistas da energia. Enquanto milhares de empresas estão sujeitas ao garrote dos custos financeiros e energéticos, os lucros da GALP, entre 2005 e 2009, ascenderam a mais de 2648 milhões de euros. A GALP, a EDP e a REN acumularam 8690 milhões de euros. Mais do que qualquer «eficácia de gestão», estes lucros representam a descapitalização do sector produtivo, o esbulho aos orçamentos familiares e a fragilização da competitividade do País.
Trata-se de lucros que, por via da elevada presença de capital estrangeiro nestas empresas, saem em grande parte do País. Lucros que a Autoridade da Concorrência diz que não analisa e que o PS nunca quis ver discutidos na Assembleia da República.
Denunciamos a enorme mistificação das entidades reguladoras, que servem apenas, como ainda ontem se viu com Vieira da Silva, para que o poder político «sacuda a água do capote», a pretexto da pretensa independência dessas entidades!
A vida confirmou como era falso o argumento de que a liberalização do sector traria a baixa de preços. Aquilo a que continuamos a assistir é à cartelização monopolista de preços, já que os preços praticados são idênticos e as empresas acompanham-se umas às outras.
Questionado no ano passado sobre este escândalo, o Governo apontou para um relatório da Autoridade da Concorrência, que pouco ou nada adiantou. As respostas são conhecidas: placas nas auto-estradas a evidenciar o que já todos sabíamos, os mesmos preços, a colusão tácita dos operadores, mais postos nos hipermercados.
Face à situação existente, a Autoridade da Concorrência veio dizer que «não é um regulador sectorial de combustíveis» e não tem competências de regulação e fixação de preços, escondendo-se por detrás da inócua monitorização diária do sector. O Governo desresponsabiliza-se com a Autoridade da Concorrência e esta, afinal, diz que não tem competências. Com a ERSE, os problemas da electricidade e do gás não são diferentes.
O problema não é das entidades reguladoras, nem de qualquer outro sistema de nomeação dos seus responsáveis, como propõe o PSD e o CDS. Pelo contrário, só poderia acentuar a irresponsabilidade dos governos e tornar mais justificáveis, naturais e inevitáveis preços e tarifas subordinados, aparentemente, a uma ordem económica que o poder político não controla!
O País precisa, pode e deve ter preços de energia mais baixos. O PCP defende a imediata acção do Governo para impedir a subida do preço do gás natural nos consumidores domésticos e preços da energia semelhantes às médias da União Europeia.
O PCP apresentará um projecto de resolução que recomende ao Governo o estabelecimento, pelo período de vigência do PEC 2010-2013, de um sistema de preços regulados dos combustíveis, da energia eléctrica e do gás natural, que, tendo em conta a viabilidade económica das empresas abrangidas, estabeleça um mecanismo de preços máximos, que tenha como referência os respectivos preços médios antes de impostos na zona euro, corrigidos, tendo em conta o diferencial de produtividade português face à zona euro!
Há que assegurar a competitividade da economia nacional sem ser à custa do factor trabalho. Não estamos a propor a subsidiação do Estado, nem que as empresas do sector energético não tenham lucros. Propomos, pura e simplesmente, a eliminação dos seus sobrelucros! Ao mesmo tempo, deve ser garantido que, na oscilação dos preços do petróleo em curso, não se concretize um novo processo de manipulação de stocks e de preços.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Jorge Seguro Sanches,
Agradeço a questão que colocou.
No passado, propusemos algumas vezes a vinda do Sr. Presidente da Autoridade da Concorrência para esclarecer este problema. E veio bastantes vezes — até já tive oportunidade de dizer aqui hoje que fez bastantes relatórios —, mas não resolveu absolutamente nada, porque, tal como disse, o problema está para lá da Autoridade da Concorrência, desta ou de qualquer outra, está numa estrutura monopolista no sector e na Europa, que não é ultrapassada pela intervenção da Autoridade da Concorrência, que, inevitavelmente, conclui sempre o seguinte: «Não há demonstração objectiva de concertação de preços». E os preços vão subindo, os portugueses vão pagando e a economia portuguesa vai pagando um elevadíssimo preço na sua competitividade por causa da factura energética.
Há uma concertação a nível nacional e há um problema europeu, a que o Governo português, por exemplo, também não quer responder e a que a Autoridade da Concorrência, naturalmente, também não responde. Como é que são fixados os índices de Roterdão? A partir do registo numa editorial sedeada em Londres — uma editorial privada — das informações dadas pelas principais petrolíferas da Europa. Como é que são definidos os preços em Portugal? A partir desses índices de Roterdão.
Diz o Sr. Presidente da Autoridade da Concorrência que os preços em Portugal nem podem ser mais altos nem mais baixos do que esses valores de referência. Que mercado é este, Srs. Deputados?! Que concorrência é esta?!
Que medidas é que podem ser tomadas? As medidas que estamos a sugerir para responder a uma situação de urgência: o comando administrativo dos preços, não só viabilizando as empresas energéticas mas também assumindo preços que permitam à economia portuguesa ter uma competitividade idêntica à dos outros países da União Europeia.
(…)
Sr. Presidente,
Sr. Deputado Pedro Filipe Soares,
Naturalmente, continuaremos a apoiar todas as medidas que possam contribuir para uma factura energética mais baixa, que permita a sobrevivência das empresas e a melhoria do poder de compra dos portugueses.
Gostaria de aproveitar esta resposta para dizer que, mesmo as soluções que aparentemente iriam no bom sentido, como o reforço da produção das energias renováveis, estão transformadas, pela política de energia do Governo do Partido Socialista, num novo factor de extorsão de rendimentos aos sectores produtivos e aos portugueses, através de uma subsidiação dos produtores privados destas energias a valores manifestamente inaceitáveis.
Sabe-se que a energia eólica está a ser paga três vezes acima do valor de mercado!
Esses produtores têm um incentivo que é duas vezes mais do que o preço do mercado! Quem paga este incentivo?! Os portugueses e a generalidade das empresas portuguesas. Isto não é aceitável, mesmo sendo justo o objectivo de que o País aproveite os seus recursos endógenos e avance na produção de energias renováveis.
A questão que se coloca é sobretudo esta: o País vive uma situação económica e social absolutamente extraordinária. Julgo que o Pacto de Estabilidade e Crescimento, independentemente das críticas que teve, é uma imagem desta situação.
É justificado ou não, relativamente a um bem que hoje é absolutamente central na vida das sociedades, central do ponto de vista da competitividade da economia nacional, que sejam tomadas medidas extraordinárias?!
Ou as medidas extraordinárias servem só para salvar bancos, para salvar o sector financeiro?!
E se são necessárias medidas extraordinárias, avancemos para preços regulados, que são compatíveis mesmo com o actual ordenamento comunitário. Os preços regulados existiam até que um governo do Partido Socialista, o do Eng.º António Guterres, acabou com eles e liberalizou o mercado. Avancemos para preços regulados, que tenham por referência, de facto, os preços médios antes de impostos na zona euro, e que, inclusive, possam ser corrigidos através de um factor que tenha em conta o diferencial de produtividade da economia portuguesa face às restantes economias.

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