PCP apresenta 90 propostas de alteração - Conferência de Imprensa do Grupo Parlamentar do PCP

O debate do Orçamento do Estado para 2004, tanto na generalidade como ao longo das reuniões da Comissão de Economia e Finanças, confirmou que a Proposta de Lei apresentada pelo Governo é um exercício de uma gritante falta de rigor, com projecções manipuladas, que introduz novos e preocupantes factores de injustiça social, feito para servir os mais poderosos, desresponsabilizante do Estado em matéria das funções sociais que lhe cumpre assegurar, que não constitui um instrumento para ajudar o País, a economia e as empresas a saírem da crise.

E de tal modo é assim que o Governo já se viu, apesar das múltiplas contradições em que navegou, obrigado a recuar em duas das suas opções orçamentais: enquanto o Ministro da Economia afirmava a sua insensibilidade perante o fim dos incentivos ao investimento nas áreas do interior do País a Ministra das Finanças e a maioria PSD/CDS-PP foram obrigados a prometer a reposição, para aqueles casos, do regime revogado de uma tributação mais baixa de IRC. E apesar da Ministra das Finanças ter anteriormente afirmado, em resposta ao PCP, estar a cumprir a Lei das Finanças Locais a verdade é que, a fazer-se fé nas conclusões da reunião que teve com a ANMP e relatada por esta, foi igualmente obrigada a prometer alterar a proposta de lei do OE aumentando as transferências para os municípios e freguesias e modificando a discricionariedade em que pretendia envolver as autorizações para os municípios portugueses poderem recorrer ao crédito para fazerem face às suas contrapartidas em projecto de investimento apoiados por fundos comunitários. Mesmo em relação ao combate à fraude e à evasão fiscal a Ministra das Finanças foi igualmente obrigada a reconhecer, no quadro da interpelação que foi alvo pelo PCP que, da parte do Governo não tinha havido nenhum esforço para concretizar o cruzamento de dados entre a Administração Tributária e a Segurança Social.

Sendo um Orçamento que não serve o País, o que justificou o voto contra do PCP, nem por isso nos demitimos de apresentar propostas procurando diminuir o impacto das negativas opções do Governo designadamente em matéria de agravamento da tributação fiscal em IRS e de um mais justo aumento das tabelas salariais dos trabalhadores da Administração Pública.

Apresentamos assim (sem contar com as propostas de alteração à distribuição regional do PIDDAC) 90 propostas de alteração ao articulado e mapas do Orçamento do Estado para 2004, de que destacamos as seguintes:

Na Educação

  • 9 milhões de euros da dotação provisional para o ensino do Português no estrangeiro;
  • reforço de 29,6 milhões de euros para o Ensino Superior Público Universitário e de 16,2 milhões de euros para o Ensino Superior Politécnico, para evitar a sua ruptura financeira.

Na Investigação Científica

  • Reforço de 2 milhões para 10 milhões de euros das dotações para os onze Laboratórios do Estado cuja situação é de ruptura devido aos cortes orçamentais;
  • Reforço de 1,3 milhões de euros das verbas afectas ao Laboratório Nacional de Engenharia Civil;
  • Reposição do regime de autonomia financeira para os seguintes Laboratórios do Estado: LNEC; INETI; INIAP; LNIV; IGP; IM; IICT; ITN e MNCT.

Política de juventude e Movimento Associativo

  • Reforço das verbas para o movimento associativo no âmbito do Instituto Português da Juventude, no apoio a equipamentos e colectividades desportivas;
  • Reforço de 7 milhões de euros bem como nos incentivos ao arrendamento jovem, repondo os valores inscritos no OE 2003;
  • Criação de uma linha de crédito jovem para a habitação.

Cidadãos com deficiência

  • Criação de dois programas específicos para remoção das barreiras arquitectónicas no acesso aos espaços públicos e para a adaptação de postos de trabalho na Administração Pública.

Comunidades Emigrantes

  • Reforço das dotações para o funcionamento do Conselho das Comunidades Portuguesas, em 70 mil euros;
  • Reforço das dotações para o recenseamento eleitoral e para o recenseamento da população portuguesa no estrangeiro;

Combate aos Fogos Florestais e Protecção Civil

  • Aquisição de um segundo hospital de campanha para os serviços de protecção civil;
  • Reforço de 3,5 milhões de euros para a Escola Nacional de Bombeiros;
  • Mais 7,5 milhões de euros para reequipamento e reposição de viaturas acidentadas;
  • 5 milhões de euros para a melhoria da actividade dos bombeiros no combate aos fogos florestais de acordo com as acções elencadas no Livro Branco sobre os Fogos Florestais;
  • 5 milhões de euros para a renovação dos sistemas de comunicações das corporações dos bombeiros;
  • Criação do Observatório Nacional Permanente para os Incêndios Florestais, estrutura prevista no Livro Branco mas ausente da proposta de Orçamento do Estado;
  • Criação de novos centros de produção de bio-massa para ajudar à retirada de material combustível das florestas;

Capacidade de fiscalização das fronteiras marítimas

  • Reforço dos meios de fiscalização do mar territorial e da zona económica exclusiva do País para fazer face às decisões de Junho de 2003 do Conselho Europeu da Agricultura e Pescas de abertura das chamadas águas ocidentais e aos acordos bilaterais assinados entre os governos português e espanhol;

Aproveitamento da capacidade instalada da indústria nacional

  • Garantir a transferência das verbas necessárias ao exercício dos direitos de opção detidos pela CP e pelo Metropolitano de Lisboa referentes à construção de material circulante ferroviário pela indústria portuguesa de modo a impedir a ruptura da empresa Bombardier (ex-Sorefame).

Nas Finanças Locais e quanto às Regiões Autónomas

  • Cumprimento da Lei de Finanças Locais no que se refere à inclusão de mais 41,9 milhões de euros nas verbas a transferir a título da participação dos municípios e freguesias nos impostos do Estado referente ao valor da receita fiscal arrecadada no âmbito do perdão fiscal de 2002 (1 026 milhões de euros) e cujo cálculo foi inicialmente furtado ao conhecimento da ANMP;
  • Excepcionar do limite ao endividamento municipal dos valores referentes ao financiamento de projectos com comparticipação de fundos comunitários, de programas para a construção de habitação social e ainda para fazer face à reconstrução e reabilitação de infraestruturas, habitações e edifícios de apoio às actividades económicas afectadas pelos incêndios florestais de 2003;
  • Compensar os municípios, até ao final do primeiro trimestre de 2004, dos valores do imposto municipal de sisa, nos termos da Lei n.º 14/2003 de 30 de Maio;
  • Aumento de 20 milhões de euros para 25,2 milhões de euros da verba a transferir para o Governo Regional dos Açores para reconstrução das habitações afectadas pelo sismo de 1998 nas Ilhas do Faial e do Pico;
  • Excepcionar do limite de endividamento das Regiões Autónomas dos empréstimos e respectivas amortizações destinados a programas de habitação social, ao financiamento de projectos com comparticipação de fundos comunitários e à comparticipação regional na reconstrução das Ilhas do Faial e do Pico.

Na Segurança Social

  • Alteração do quadro de escalões e respectiva percentagem para as pensões mínimas de invalidez e velhice de modo a acelerar o processo de convergência das pensões mínimas com o salário mínimo. Assim, os pensionistas com menos de 15 anos de carreira contributiva passariam desde já a ter um valor de pensão igual a 65% do SMN, adequando-se todos os restantes valores a esta progressão;
  • Fixar, respectivamente, em 50% e 60% do valor do SMN os valores da pensão social e da pensão do regime especial das actividades agrícolas;
  • Fixação de novos montantes para o subsidio familiar a crianças e jovens e para a respectiva bonificação por deficiência, garantindo apoios mais justos para as famílias de menores rendimentos e com mais filhos;
  • Fixar em 2 pontos percentuais do valor correspondente à quotização dos trabalhadores por conta de outrem, nos termos da lei, a transferência para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social o que representa um aumento dos 120 milhões de euros previstos para 614,8 milhões de euros;
  • Reforço de 30 milhões de euros para o subsidio de doença e de 9 milhões de euros para o Rendimento Social de Inserção;

Trabalhadores da Administração Pública

  • Em 2004 nenhum aumento da tabela salarial deverá ser inferior à diferença registada nos últimos três anos entre os incrementos verificados e a inflação registada.

IRS – Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares

 

  • Não incidência do IRS sobre as bolsas atribuídas aos praticantes de alta competição;
  • Não incidência do IRS sobre os rendimentos de trabalho dependente dos trabalhadores estudantes desde que os rendimentos colectáveis não excedam o valor anual do SMN;
  • Criação de uma nova tabela dos rendimentos anuais colectáveis para efeitos de IRS beneficiando os rendimentos mais baixos e criando-se dois novos escalões para os rendimentos mais elevados, entre 53 mil e 100.000 euros (taxa de 40%) e superior a 100.000 euros (taxa de 45%), acentuando-se a progressividade do imposto;
  • Actualização dos abatimentos e deduções à colecta em 2,5% (intervalo superior da variação da taxa de inflação prevista pelo Governo para 2004), valor mais adequado a todas projecções conhecidas;
  • Introdução, como dedução à colecta, de 25% das despesas suportadas com o pagamento de rendas de habitação suportadas por estudantes, desde que fora da sua área de residência normal, com o limite de 100 euros;
  • Reposição da tributação das mais valias.

IRC – Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas

  • Reposição dos incentivos ao investimento como instrumento de apoio ao combate à desertificação e de recuperação do desenvolvimento nas áreas do interior, abrangendo as áreas e sectores deprimidos definidos no PRASD – Programa para a Recuperação das Áreas e Sectores Deprimidos. Assim, a taxa de IRC é fixada em 20% para as entidades cuja actividade principal se situe no âmbito do PRASD e de 15%, nos primeiros cinco exercícios de actividade, para o caso de instalação de novas entidades, sendo obrigatório para efeitos de acesso a estes benefícios que os investimentos previstos dêem lugar à criação liquida de postos de trabalho sem termo;
  • Fixação de uma taxa reduzida de IRC – 15% - para as micro-empresas;
  • Pagamento Especial Por Conta: Diminuição do limite mínimo do PEC para € 498,80 (colocando-o ao nível de 2002) com reembolso do excedente, no máximo, no exercício seguinte ao montante apurado na declaração periódica de rendimentos;
  • Regime Simplificado de Tributação: Reposição do limite mínimo num montante igual ao valor anual do Salário Mínimo Nacional, em vez dos € 6250 fixado no OE 2003;
  • Publicação, até 31 de Março de 2004, da legislação complementar à reforma fiscal visando o estabelecimento dos indicadores objectivos de base técnico-científica para os diferentes sectores da economia para efeitos de aplicação do regime simplificado e das médias dos rácios de rentabilidade das empresas para efeitos de reembolso do PEC;
  • No que se refere às instituições bancárias determinação de limites para as provisões bem como para a determinação dos custos dos fundos utilizados no financiamento de carteiras de títulos beneficiados por isenções fiscais; eliminação da isenção de Contribuição Autárquica para os prédios afectos às sucursais de instituições de crédito instaladas nas zonas francas; definição de normas fixando limites aos custos financeiros debitados pela sede às sucursais de instituições bancárias, entre outras, com vista a regulamentar as possibilidades de deduções aos lucros que vigorando no sistema fiscal permite que os bancos tenham taxas de tributação efectiva muito inferiores à generalidade das empresas e à taxa nominal de IRC;

IVA – Imposto sobre o Valor Acrescentado

  • Possibilidade de dedução para efeitos de IVA do imposto pago em despesas profissionais de alojamento e de alimentação contratualizadas com agências de viagens ou empresas de hotelaria e restauração;
  • Reposição da taxa reduzida de 5% para o gás de cidade e para o gás de “garrafa” que o Governo pretende passar para a taxa máxima de 19%;
  • Inclusão os instrumentos musicais na taxa reduzida do IVA;

Estatuto dos Benefícios Fiscais

  • Actualização em 2,5% dos benefícios fiscais para os cidadãos deficientes e contas poupança-habitação, poupança-educação e poupança-reformados que o Governo não actualiza;
  • Eliminação dos benefícios fiscais nos planos poupança-acções;
  • Revogação dos benefícios fiscais para as actividades financeiras sediadas na zona franca da Madeira e que não se têm traduzido em nenhuma mais valia nem para a Região nem para o País, como ainda recentemente foi revelado pela auditoria da Inspecção Geral de Finanças e segundo a qual 50% das empresas são empresas-fantasma (não declaram qualquer volume de negócios para efeitos de IVA) e 42,5% não apresentam declaração periódica de rendimentos para efeitos de IRC;
  • Aumento de € 50 para € 100 da possibilidade de dedução à colecta do IRS do IVA suportado nas despesas de alimentação e bebidas, reparações de equipamentos domésticos e reparações de veículos;
  • Revogação dos benefícios fiscais concedidos aos dividendos de acções adquiridas em processos de privatizações e OPV’s;
  • Antecipação para 31 de Dezembro de 2003 da cessação dos benefícios fiscais às sociedades de gestão e investimento imobiliário previstos até 31/12/2005 (IRC reduzido e isenção de sisa na aquisição de bens imóveis e de contribuição autárquica);

Sigilo Bancário

  • Definição, até 31 de Março de 2004, das regras necessárias para que a Administração Tributária tenha acesso às informações protegidas por sigilo bancário.

Combate à fraude e evasão fiscal

  • Até 31 de Março de 2004 determinação para que o Governo proceda ao cruzamento de dados entre a Administração Tributária e a Segurança Social, subordinado a parecer prévio da Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais.

Esta última proposta, feita no Orçamento do Estado tem como finalidade contribuir para a aceleração de uma medida que é essencial para o combate à fraude e evasão fiscal. Caso, entretanto, a opção seja a de se legislar através da aprovação de uma lei específica, então o Grupo Parlamentar do PCP apresenta também, e desde já, um Projecto de Lei visando o mesmo fim.

Com este projecto de lei propomos a criação de duas bases de dados, da Segurança Social e da Administração Tributária (sob a responsabilidade, respectivamente, do Presidente do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social e do Director-geral dos Impostos) com a finalidade de acompanhar e fiscalizar o cumprimento das obrigações dos contribuintes. Todos os dados dos contribuintes da Segurança Social e com deveres tributários serão integrados naquelas bases de dados, preenchendo-se uma lacuna existente no sistema contributivo em Portugal e que, apesar das promessas públicas e de algumas tentativas em curso nos respectivos serviços, estão longe de corresponder às necessidades de combate à evasão fiscal e de contribuições para a Segurança Social que estima-se que montem a cerca de 10 mil milhões de euros no primeiro caso e a cerca de 2,5 mil milhões de euros quanto à Segurança Social.

No que se refere à Base de Dados da Segurança Social a Administração Tributária enviará, no final do segundo trimestre de cada ano e referente ao ano anterior, a listagem completa das pessoas colectivas com, entre outros dados, a informação das remunerações constantes da declaração anual entregue por cada um com vista ao cruzamento de informação com os valores declarados pelo contribuinte à Segurança Social. A Administração Tributária informará também a Segurança Social, nos trinta dias seguintes ao evento, do início de actividade de qualquer pessoa singular ou colectiva.

Por sua vez todos os organismos da Administração Pública com incidência tributária ficam obrigados a fornecer à Base de Dados da Administração Tributária todos os dados e informações relevantes em matéria fiscal e patrimonial.

As duas bases de dados, que serão acompanhadas e fiscalizadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados Pessoais terão âmbito nacional e integrado e um campo comum com a indicação do número de identificação fiscal através do qual se procede ao cruzamento de informações. Anualmente serão apresentados à Assembleia da República relatórios sobre a execução da lei.

Com estas propostas o PCP está em condições, desde já no Orçamento do Estado ou num agendamento com carácter de urgência das iniciativas legislativas existentes, de participar e contribuir positivamente para medidas que atacando o escandaloso volume de evasão e fraude fiscal alarguem a base tributária interrompendo assim os sucessivos pretextos do Governo para penalizar o investimento público e os salários dos trabalhadores como forma de equilíbrio das contas públicas. Ao contrário do que afirma a Ministra das Finanças o País tem, claramente um problema de receita. E pode resolvê-lo com as propostas que apresentamos.

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