Intervenção de Paulo Sá na Assembleia de República

Pacto das Tróikas: espoliação dos direitos e dos rendimentos dos trabalhadores

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Sr.ª Presidente,
Srs. Deputados,

Na sua mensagem de Ano Novo, o Presidente da República reconheceu que a execução do Orçamento do Estado para 2013 se irá traduzir numa redução do rendimento dos cidadãos. Mas equivocou-se quando, logo a seguir, afirmou que todos serão afectados. Não é verdade que todos os portugueses estejam a ser afectados pelas políticas resultantes da aplicação do Programa da Tróica, verdadeiro Pacto de Agressão contra Portugal e os portugueses. Há um grupo de portugueses, um grupo muito reduzido, que é beneficiário directo desta política. Estamos, claro, a referir-nos aos senhores do grande capital, aos banqueiros, aos especuladores financeiros e aos grandes accionistas dos grupos económicos. Para estes, 2013 não será um ano de sacrifícios. Será mais um ano em cheio; um ano em que, mais uma vez, com a cumplicidade activa do Presidente da República, se apropriarão da riqueza produzida por quem vive do seu trabalho.

E se sobre isto dúvidas houvesse – e parece que o Sr. Presidente da República tem algumas dúvidas – bastaria olharmos para o escandaloso negócio que o Governo está a cozinhar com o Banif. Embora os detalhes possam ser mais ou menos complexos, tudo se resume ao seguinte: o Governo injecta 1.100 milhões de euros no Banif, tornando-se o Estado no maior accionista, mas os accionistas privados continuam a deter o controlo do banco. Deste modo, o Governo, despudoradamente, coloca os dinheiros públicos – o dinheiro de todos nós – ao serviço dos grandes interesses privados.

Esta operação de injecção de dinheiros públicos no Banif segue-se a outras semelhantes, realizadas em 2012 com o BCP e o BPI, tendo o Governo usado, para o efeito, 5.600 milhões de euros dos 12.000 milhões reservados no Pacto de Agressão para a banca privada. A isto poderíamos somar os milhares de milhões de euros enterrados no BPN e no BPP, os 35.000 milhões de euros de garantias estatais à banca, bem como os 8.000 milhões de euros de juros agiotas pagos anualmente por uma dívida pública externa que não para de crescer.

A política de direita garante que não falta dinheiro para a satisfazer o apetite dos banqueiros e demais parasitas do sistema do capitalista em que vivemos. Mas este apetite é insaciável. Querem mais! Querem também a “refundação” do Estado, que nada mais é do que uma profunda redução das funções sociais do Estado, na educação, na saúde e na segurança social, liquidando aquilo que foi arduamente conquistado pelo povo português com a Revolução de Abril.

O rio de dinheiro que corre abundantemente dos cofres do Estado para o sector financeiro é dinheiro roubado aos portugueses por via da imposição de brutais medidas de austeridade, contidas no Orçamento do Estado para 2013, que o Governo preparou, a maioria PSD/CDS aprovou e o Presidente da República promulgou. São estes os responsáveis – sem esquecer o PS que também subscreveu o Pacto de Agressão da Tróica – pelas tremendas dificuldades que o povo português irá sentir durante o novo ano. São estes os responsáveis pelo empobrecimento da esmagadora maioria dos portugueses, pelo afundamento da economia nacional, pelo crescimento galopante do desemprego e pelas falências de inúmeras pequenas empresas. São estes que, para bem servir os interesses dos grupos económicos e financeiros, querem roubar aos portugueses a esperança de um futuro melhor.

Para tentar justificar o injustificável, o Governo e os partidos que o suportam, acolitados pelos habituais comentadores de serviço, repetem até à exaustão que os portugueses viveram acima das suas possibilidades e, por isso, são os únicos responsáveis pela difícil situação que o País atravessa. Esta vergonhosa tentativa de transferir a culpa da crise para os trabalhadores e o povo português não encontra qualquer sustentação na realidade dos factos.

Lembramos que a crise financeira que deflagrou nos Estados Unidos da América em 2008 e rapidamente se espalhou por todo o mundo é o culminar de um processo de globalização financeira, que desmantelou todas as estruturas e mecanismos de regulação e de controlo da actividade financeira e de movimento de capitais, permitindo uma vaga sem precedentes de concentrações, fusões e aquisições de empresas financeiras e a subalternização das empresas não-financeiras ligadas à economia real. A aceleração do processo de financeirização do sistema capitalista acabou por desembocar numa crise financeira devastadora, que rapidamente degenerou em crise económica e social. Para salvar os lucros do sistema financeiro e as suas actividades especulativas, os Estados montaram operações de salvamento com o dinheiro dos contribuintes, que tiveram como consequência imediata o agravamento dos défices orçamentais e das dívidas públicas. Em Portugal, por exemplo, o défice saltou de 3,2% em 2007 para 10,2% em 2009, enquanto a dívida pública cresceu, no mesmo período, de 68% para 83% do PIB. Mordendo a mão de quem os salvou, as instituições financeiras especularam contra as dívidas soberanas, para imporem, logo a seguir, programas draconianos destinados a confiscar os direitos e os rendimentos dos trabalhadores.

A factura da crise não está a ser paga por quem a provocou e com ela lucrou. Está a ser paga pelos trabalhadores, com a redução dos salários e das pensões, o roubo dos subsídios, o aumento brutal de impostos, a redução das prestações e apoios sociais e os cortes na saúde e na educação. Cada euro entregue pelo Governo à banca é um euro que sai dos bolsos dos trabalhadores e do povo português. É este o objectivo do Pacto de Agressão da Tróica, subscrito pelo PS, PSD e CDS: espoliar os direitos e os rendimentos dos trabalhadores para garantir as principescas rendas de uma classe parasitária.

Só com a rejeição do Pacto de Agressão é que será possível pôr fim ao escandaloso favorecimento dos interesses do grande capital nacional e estrangeiro, aos brutais sacrifícios impostos aos trabalhadores, reformados e pensionistas, à recessão económica e ao aumento do desemprego, à asfixia das micro e pequenas empresas, ao aprofundamento das desigualdades e injustiças sociais e à alienação da soberania nacional. Reafirmamos a necessidade de uma política patriótica e de esquerda que valorize o trabalho, melhore os salários, pensões e reformas e, em geral, eleve o nível de vida dos trabalhadores e do povo português, colocando Portugal no caminho do crescimento económico, do progresso e justiça social.

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