Intervenção de

Ordenamento do Território - Intervenção de José Soeiro na AR

Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território

Sr. Presidente,
Sr. Ministro do Ambiente, do Ordenamento do Território
e do Desenvolvimento Regional,

O Grupo Parlamentar do PCP congratula-se por ter, finalmente, um instrumento para apreciar e poder pronunciar-se sobre o mesmo. Aguardámo-lo no passado e aguardámo-lo com este Governo durante dois anos, na medida em que em 2005, como o Sr. Ministro deve estar recordado, numa Comissão de Economia, foi aberta esta perspectiva.

Já tínhamos tido conhecimento do núcleo duro do PNPOT através de uma sessão em que tivemos oportunidade de participar com o Sr. Professor Jorge Gaspar. Naturalmente, ao longo deste processo, fomos questionando o Sr. Ministro, e voltamos agora a fazê-lo, sobre três questões que consideramos da maior pertinência para qualquer política de ordenamento do território e que nos preocupam.

Primeira questão: desenvolvimento rural. Está em discussão e em fase de conclusão um PDR.

As apreciações feitas pelas organizações de agricultores sobre este PDR são que ele vai no sentido  e contribuir para agravar as difíceis condições em que já se encontra hoje o interior do País e o mundo rural. Daí que a pergunta, Sr. Ministro, seja a seguinte: como é que este PDR se compagina com aquilo que se diz ser a estratégia de coesão territorial da competitividade que se pretende atribuir aos diferentes territórios? E como é que se pretende que as pessoas possam subsistir no interior do País sem terem a mínima garantia das condições mínimas para lá continuarem?

A segunda questão, Sr. Ministro, tem a ver com o turismo.

O Governo arvorou a bandeira do turismo como uma das grandes bandeiras do desenvolvimento. Nós temos a opinião de que, sem dúvida, o turismo em Portugal é uma aposta a fazer, mas o que perguntamos, Sr. Ministro, é qual é a coerência entre a política que o Ministério da Economia tem vindo a anunciar sucessivamente, isto é, de forma casuística, com os chamados PIN? Se fizermos uma avaliação aos mesmos facilmente constatamos que, mais uma vez, se trata de exercer uma carga sobre o litoral, quer o litoral algarvio, quer o litoral alentejano, quer mesmo a norte do Tejo. Portanto, como é que se compagina a estratégia de dar coesão, dar equilíbrio ao território como um todo e, simultaneamente, afunilarmos, efectivamente, o investimento nesta direcção?

A terceira questão, Sr. Ministro, prende-se com os transportes, na medida em que, sendo embora uma questão estratégica também para a estruturação do próprio território, o que vemos nesta matéria é o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações ir anunciando medidas atrás de  medidas, pouco fundamentadas, pouco estudadas, mas, procurando apresentá-las como factos consumados, e não vemos, na estratégia até hoje apresentada, uma linha coerente com aquilo que também se diz no PNPOT, que é a necessidade de uma aposta maior nos transportes ferroviários, no seu alargamento a outros pontos do território. Na verdade, o Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações do que é que fala? Do novo aeroporto da Ota/TGV, do TGV/novo aeroporto da Ota!

Como é que isto se compagina com uma estratégia de investimento sério na linha convencional ferroviária, na sua modernização e no seu alargamento, para garantir o acesso a este meio de transporte por parte de toda a população?

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Sr.as e Srs. Deputados:

O Grupo Parlamentar do PCP regista como positiva a abertura do Governo para uma discussão na especialidade do PNPOT. Faremos, pela nossa parte, tudo o que estiver ao nosso alcance para que o País seja dotado de um instrumento estratégico com a importância que deve ter um Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território.

Naturalmente, o documento que nos foi agora entregue tem um conjunto de elementos importantes compilados e traduz um pouco a realidade nacional. Não é uma realidade nova, é uma realidade que podemos encontrar em muitos documentos anteriores. Podíamos mesmo ir buscar a resolução do Conselho de Ministros que decide pela elaboração do PNPOT para vermos que já aí eram apontadas muitas das questões que o relatório que acompanha esta proposta de lei materializa e consagra: desde as concentrações urbanas nas grandes metrópoles de Lisboa e do Porto à «litoralização» do País e à desertificação do interior, à falta de coesão social, que tem vindo a aprofundar-se, à falta de uma política estratégica que preserve não apenas os solos, como bem escasso e finito, como os recursos hídricos, as políticas das florestas e de urbanismo.

Portanto, podíamos falar de todas elas, mas estão vistas, toda a gente as conhece. Qualquer pessoa que tenha acompanhado as discussões que se tem feito no nosso país pode interrogar-se como é que isto acontece depois de tantos anos e de tanto investimento. Esgotámos três quadros comunitários de apoio em investimentos, sempre a declarar que iríamos contrariar estes objectivos, que iríamos garantir aos cidadãos portugueses melhor qualidade de vida, maior coesão social, maior coesão territorial, que iríamos fazer um País mais moderno, mais competitivo, que iríamos acompanhar os países mais evoluídos da Europa. Tudo isto podemos encontrar em discursos de sucessivos governos ao longo quase dos últimos 30 anos.

A verdade é que, feito este diagnóstico e assumido que temos tido um modelo de desenvolvimento errado, porque os resultados estão à vista, não se compreende que sejamos agora confrontados com um Programa Nacional da Política de Ordenamento do Território que no seu objectivo mais longínquo dá-nos a «litoralização» ainda mais acentuada do País, a concentração em quatro grandes áreas ou eixos metropolitanos: Lisboa, o Noroeste (para não se dizer Porto), o arco entre Coimbra, Aveiro e Leiria, a que, talvez por iniciativa do Sr. Deputado José Junqueiro, juntaram Viseu, e o Algarve. E o resto do País? O que é que se faz ao resto do País? É o deserto? É para a biodiversidade? Para os passarinhos? Para os cogumelos? Isto é que temos de perguntarnos, porque não basta colocar no papel que vamos ter coesão territorial, que vamos ter combate às assimetrias e que vamos conseguir esta gestão com equidade do todo nacional.

Este quadro que temos na mesa não garante isto, e é assumido. Aliás, não é por acaso que os mapas que mostravam que iríamos ter uma concentração demográfica no litoral, uma concentração de produção do produto interno bruto no litoral, não acompanham esta versão final. Mas são uma realidade!

As perspectivas que se nos apontam vão no sentido de concentrarmos em Lisboa e no Porto 75% do produto interno bruto. Sr. Ministro, isto é uma barbaridade! Diga-me outro país da Europa, moderno, desenvolvido, que não aponte exactamente no sentido inverso, que não procure efectivamente a coesão territorial com medidas e incentivos concretos que não conseguimos encontrar nas políticas sectoriais e territoriais que estamos a discutir neste momento.

O que questionamos, Sr. Ministro, é qual a correspondência entre os programas sectoriais que se vão desenvolvendo no terreno, que vão definindo um determinado tipo de ordenamento do território, e, depois, as boas intenções, que podemos plasmar num bom documento. E até podemos dizer que pode ser um bom documento para o País, mas a realidade já está de tal forma «desconformada» com o mesmo que restar-nosá, então, retomar a revisão do PNPOT e fazer um outro PNPOT qualquer que corresponda à anarquia que tem sido imposta no nosso território, com projectos que podem dizer-se de interesse nacional mas, muitos deles, o que têm sido é chorudos negócios para alguns à custa da delapidação de recursos estratégicos para o País.

E este é que é o problema que temos de acertar na discussão na especialidade e vermos até onde vai a bondade. Não basta o Sr. Ministro do Ambiente dizer-nos que tem intenções de fazer, é preciso que os Srs. Ministros da Economia e da Inovação, da Agricultura, do Desenvolvimento Rural e das Pescas, das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, nos planos sectoriais que estão a andar no terreno, efectivamente se conformem àquilo que vier a ser este projecto. E isto não vai acontecer com decisões precipitadas de construção de novos aeroportos. E não temos nada contra os TGV, temos, sim, contra a aplicação de todos os recursos em TGV, deixando para trás os recursos que são necessários para o resto do País. É disto que discordamos!

 

 

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