Sem prejuízo de outros elementos que aqui não se adiantam e de outros que a discussão na especialidade pode vir a revelar, apresentam-se aqui – sítio do PCP na internet - alguns dos eixos essenciais que marcam o Orçamento do Estado para 2012.
Estamos perante um instrumento essencial para a concretização do Pacto de Agressão que está em curso. Proposto pelo Governo PSD/CDS esta proposta merece o apoio e compromisso do PS, confirmando que estes três partidos estão unidos no caminho de desastre nacional e ao serviço do grande capital.
Pelo seu conteúdo, pelo que poderá representar de agravamento da exploração, de desemprego, de recessão económica, de empobrecimento, de saque e delapidação dos recursos do país, de perda de soberania nacional, este OE merece a recusa dos trabalhadores e do povo português, o crescimento e ampliação da luta de massas, a realização de uma grande Greve Geral no próximo dia 24 de Novembro.
Um orçamento de destruição nacional
Um roubo aos trabalhadores e reformados de dimensões gigantescas
Continuação da injustiça fiscal e na distribuição da riqueza
Destruição de serviços públicos e sectores sociais
Ataque ao poder local, às autonomias regionais e à coesão territorial
Um orçamento de destruição nacional
A proposta de orçamento para 2012 apresentada pelo Governo constitui um profundo ataque à economia nacional e ao desenvolvimento do país. Acentuando a política de direita que tem décadas, dá novos passos no sentido da destruição do aparelho produtivo, do agravamento dos défices da nossa economia e da dependência externa do país.
Sendo que o próprio Governo prevê para 2012 uma recessão de 2,8%, na realidade as medidas incluídas na proposta de orçamento - na concretização do pacto de agressão ao país assinado por PS, PSD e CDS - levarão certamente a um valor muito superior, traduzindo-se numa contracção brutal da actividade económica. Trata-se de um orçamento e de uma política económica que não causarão apenas uma agravada recessão, mas uma verdadeira catástrofe económica do país.
A proposta de corte dos subsídios de férias e de natal, de aumento do trabalho não pago, de diminuição dos valores das horas extraordinárias, bem como o agravamento da carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho, a par de um significativo aumento do custo de vida (bem patente no nível da inflação, 3,1% previsto pelo Governo), para lá do agravamento da exploração que comportam, são um factor de fortíssima contenção no consumo interno e portanto de enorme pendor recessivo. Da mesma forma o ainda previsto crescimento das exportações ficará certamente aquém das previsões do Governo, tendo em conta a degradação da situação económica nas principais economias para onde se exporta.
A par disso, o Governo prepara um novo e substancial corte no investimento público, já reduzido nos últimos anos a níveis irrisórios, que será de 14% em termos nominais mas poderá ser, segundo aliás dados do FMI, de mais de 25% em termos reais.
Este Orçamento constitui mais um impulso a um aumento do desemprego, prevendo-se uma taxa de desemprego para 2012 de 13,4%, a que se terá de somar a margem adicional de desemprego real não contabilizada nesta taxa.
Em simultâneo, este Orçamento avança no programa de privatizações que o Governo já iniciou em 2011 e que deu seguimento às políticas no mesmo sentido praticadas pelo Governo anterior do PS. Prevê-se executar privatizações, tal como previstas pelo pacto de agressão assinado por PS, PSD e CDS com o FMI e a UE, no valor de 4000 milhões de euros em 2012.
Trata-se de um Orçamento de execução e aprofundamento do pacto de agressão que, tal como o PCP tem vindo a afirmar, para além de afundar a economia e de constituir um ataque violento aos trabalhadores, aos reformados, às pequenas empresas, não resolve realmente a questão da dívida. Para além dos juros agiotas que vão ser cobrados ao país, com o insustentável valor de 34400 milhões de euros de juros sobre o empréstimo da UE/FMI durante os próximos anos, só para 2012 estão inscritos cerca de 9000 milhões de euros de juros a pagar pelo Estado à banca. Valor que é acrescido pela extorsão por via de comissões pelo dito empréstimo externo que atingirão até 2014, 655 milhões de euros e serão em 2011 e 2012 respectivamente, no montante de 335 e de 211 milhões de euros. A dívida pública continuará a aumentar, designadamente com a perspectiva de novas injecções de capital na banca.
Um roubo aos trabalhadores e reformados de dimensões gigantescas
O Orçamento do Estado para 2012 constitui um verdadeiro e gigantesco roubo aos trabalhadores e aos reformados. Um roubo que vai muito para além dos brutais cortes dos subsídios de férias e natal de trabalhadores da administração pública e de reformados do sector público e privado.
O Governo pretende impor (após o corte de 50% do subsídio de natal em 2011 a milhões de trabalhadores), o não pagamento do 13º e 14º meses aos trabalhadores da administração pública, aos aposentados e aos reformados (pelo menos em 2012 e 2013), preterindo direitos adquiridos e procurando abrir caminho à retirada destes direitos conquistados com Abril. Serão atingidos 2 milhões e 600 mil trabalhadores e reformados com estas medidas. No caso da administração pública em 2012 existirá, só com a diminuição salarial, um corte de 18,4%.
Para além dos cortes já anunciados, os porta-vozes do Governo e do grande capital tentam abrir caminho à eliminação definitiva destes salários seja no sector público, seja no sector privado. Estima-se que o valor deste corte em 2012, se traduza em 2016 milhões de euros, o que compara com várias benesses dadas ao grande capital, designadamente no sector financeiro. Por exemplo, o Estado até agora já gastou no buraco do BPN 2350 milhões de euros.
Mas o ataque aos salários e reformas não se reduz ao corte dos subsídios de férias e natal. Desde logo mantém-se os cortes efectuados aos salários em 2011, ainda pelo Governo PS, que ameaçam tornar-se definitivos. Por outro lado avançam no Orçamento do Estado ataques aos salários dos trabalhadores da administração pública, como seja a diminuição para metade do valor das horas extraordinárias, da diminuição da remuneração por dia e por hora, da proibição do descanso compensatório, ou da acrescida redução dos vencimentos em situações de mobilidade especial.
Trata-se de uma ofensiva que corre em paralelo e de forma articulada com as propostas que o Governo tem vindo a apresentar para a lei laboral geral, não só as relativas à facilitação e embaratecimento do despedimento já em vigor, mas igualmente ao nível da redução do valor das horas extraordinárias, dos dias de descanso e feriados ou do ataque às contratações colectivas. Só o aumento de mais meia hora no horários de trabalho diário significará uma perda salarial média de cerca de 10% para os trabalhadores do sector privado.
Todos os trabalhadores, sejam do sector público ou do privado estão sujeitos a um ataque aos seus direitos mais fundamentais, a um saque aos seus salários e à imposição de regimes de trabalho mais penosos com menor retribuição. Trata-se de estabelecer um regime onde uma parte substancial do trabalho efectuado não é paga.
Mas os trabalhadores e os reformados são igualmente fortemente penalizados no plano fiscal (IRS). Desde logo o congelamento da dedução específica para os trabalhadores, que diminui drasticamente para os reformados, o que significará um corte real bastante significativo todos os meses na respectiva reforma.
Por outro lado preparam-se restrições significativas à possibilidade de deduzir despesas com a habitação, a saúde e a educação. Para além de um limite global às deduções para cada escalão de rendimentos acima de 530 euros mensais, são drasticamente diminuídos os montantes dedutíveis em despesas de saúde e habitação. Trata-se de um corte que levará a que estes benefícios fiscais aos trabalhadores sejam reduzidos de 2011 para 2012 em cerca de 40%, o que significa uma aumento substancial do imposto pago e consequentemente um corte no salário efectivamente auferido.
No que toca ao IMI, o agravamento da carga fiscal para quem tem casa própria pode vir a corresponder ao corte de mais um salário. Trata-se do efeito do aumento das taxas aplicáveis e da reavaliação matricial dos imóveis durante o ano de 2012
Os bens e serviços essenciais sofrem novos agravamentos fiscais, particularmente graves no IVA, com numerosos produtos alimentares a passarem para a taxa de 23%, e na introdução de um novo imposto sobre a electricidade nos impostos especiais sobre o consumo.
A par deste fortíssimo ataque aos salários e às reformas, acentua-se a diminuição das prestações sociais, que sofrem um corte que, a juntar às pensões, se cifra em mais de 2000 milhões de euros. Isto significa que o tão propagandeado Programa de Emergência Social, ao qual serão atribuídos até 200 milhões de euros da receita adicional de IVA, é dez vezes menos do que o corte real.
De facto, mesmo em relação às pensões mínimas (e sem que esteja clarificado se são abrangidas todas as pensões mínimas do regime da segurança social e da Caixa Geral de Aposentações), ao contrário do que o Governo anuncia, não haverá qualquer aumento mas sim um mero congelamento uma vez que se restringe ao valor da inflação prevista.
Continuação da injustiça fiscal e na distribuição da riqueza
Para além do atrás referido em relação aos rendimentos do trabalho e às reformas, a profunda injustiça fiscal e a crescente desigualdade na distribuição da riqueza continuam a ser um traço dominante neste orçamento.
No IRC, apesar de algumas medidas, de resto na sua maioria há muito propostas pelo PCP, mantém-se a protecção dos grupos económicos e das transacções financeiras e o ataque às micro, pequenas e médias empresas. Assim, ao mesmo tempo que se aumenta a taxa para empresas com lucros superiores a 1,5 milhões de euros (sobretaxa de 3%) e com lucros superiores a 10 milhões de euros (sobretaxa de 5%), aumenta-se o período em que se admite o reporte de prejuízos de 4 para 5 anos, contrariando um caminho de redução progressiva deste privilégio nos últimos anos, com forte intervenção do PCP, e até o compromisso com a troika que apontava para a redução para três anos.
Mantém-se a possibilidade de utilização extensiva do off-shore da Madeira (onde se prevê uma despesa fiscal de 1200 milhões de euros), em particular pelo sector financeiro, bem como de outros regimes fiscais mais favoráveis na União Europeia, como é o caso da Holanda, sede fiscal da maioria das empresas do Psi-20. Em particular quanto à zona franca da Madeira, o Governo, em conluio com o PSD e o CDS da Região, prepara-se para contornar o fim do regime de privilégio fiscal aprazado para 31 de Dezembro de 2011 e assim prolongar um dos mais importantes instrumentos de fuga ao fisco.
No caso do IVA e para além dos sérios prejuízos para as populações do aumento do IVA em diversos bens e serviços essenciais, as alterações de taxas aplicáveis terão graves consequências em muitos sectores económicos, como é o caso da restauração que passa a cobrar 23% de IVA.
Institui-se um novo imposto sobre a electricidade a somar aos aumentos das tarifas. Impõe-se um aumento muito forte do imposto sobre veículos, para além de outras alterações. Quanto aos bens de luxo, regista-se um tímido agravamento das taxas em relação a alguns deles (7,5%), muito aquém do que o PCP tem vindo a propor (100%).
Entretanto confirma-se a transferência de fundos públicos para a banca em montantes astronómicos, incluindo os 12 mil milhões de euros decorrentes do pacto de agressão e outras garantias ao dispor do sistema financeiro. Registe-se ainda que está em curso uma nova alteração ao memorando no sentido de acomodar os interesses da banca em matéria de dívida das empresas públicas. Certamente mais uma suculenta fatia de dinheiros públicos.
Destruição de serviços públicos e sectores sociais
Com o ataque à administração pública e aos seus serviços, em particular nas áreas sociais, visam-se, não só objectivos economicistas, mas sobretudo uma alteração de fundo na actuação e no papel desempenhado por estes serviços. Trata-se de fazer com que deixem de ser garantes de direitos fundamentais do povo português – que ficam reservados aos que têm condições económicas suficientes -, ficando apenas restritos a um papel assistencialista e ao serviço dos interesses do grande capital.
Na saúde aplica-se um corte de 1000 milhões de euros na despesa do Orçamento do Estado que a acrescer à política dos governos anteriores, se traduzirá numa enorme destruição das capacidades de resposta do Serviço Nacional de Saúde, com o aumento das listas de espera e dos utentes sem médico de família, o encerramento de unidades – incluindo serviços hospitalares e hospitais inteiros – e a degradação da qualidade. Muitos milhares de portugueses deixarão com estas medidas de ter acesso aos cuidados de saúde em tempo útil.
As medidas previstas constituem para além disso mais uma substancial transferência de custos para as populações. Desde logo porque se mantém todas as medidas aplicadas pelo Governo PS, como as diminuições de comparticipações nos medicamentos e os aumentos de taxas moderadoras. Mas também porque se preparam novas medidas nesse sentido, com o novo aumento das taxas moderadoras, anunciado como significativo, a diminuição das isenções e novas revisões em baixa das comparticipações.
Na educação o orçamento acentua a orientação de desresponsabilização do Estado e de restrição financeira, mas constitui sobretudo um novo avanço na estratégia de degradação do acesso de toda a população à formação e ao conhecimento, criando uma crescente elitização do saber. O corte de verbas, para além dos cortes salariais, a redução de pessoal docente (12 500 em 2011 e o dobro no próximo ano lectivo) e de pessoal não docente, o aumento do número de alunos por turma, o empobrecimento dos currículos, entre outras medidas, constituem um sério ataque à escola pública e à sua função na sociedade.
Na proposta de Orçamento o corte de verbas para o ensino não superior entre 2011 e 2012 é de 600 milhões de euros e entre 2010 e 2011 é de 1600 milhões de euros (quase 1% do PIB). Em simultâneo avançam reduções de 200 milhões de euros, que irão certamente provocar encerramentos, fusões e diminuição de oferta de ensino, para além de um ainda maior enfraquecimento dos recursos da acção social escolar.
Para além do corte nas pensões e reformas, o Governo pretende diminuir a duração do subsídio de desemprego e alargar ainda mais a condição de recursos a novas prestações, excluindo assim mais beneficiários que a elas têm agora direito. As prestações sofrem também o efeito da continuação do congelamento do IAS.
Com estas medidas assiste-se a uma cada vez mais clara transformação de direitos em assistencialismo, cortando cada vez mais no acesso aos primeiros e remetendo cada vez mais para mecanismos de acção social a intervenção junto dos mais carenciados, o que constitui uma profunda alteração em relação aos princípios constitucionais nesta área.
Ataque ao poder local, às autonomias regionais e à coesão territorial
O poder local vê novamente reduzidas as verbas no Orçamento para 2012, sem prejuízo de continuarem a ser transferidas competências. Trata-se no que diz respeito aos municípios de um corte de 6,4% em relação ao ano em curso, o que põe as verbas a um nível inferior ao de 2008. Também as Freguesias têm uma redução de financiamento directo de cerca de 5%.
No que diz respeito às regiões autónomas e mesmo sem estarem reflectidas no orçamento as medidas especiais a aplicar à Madeira, o corte é, na maioria das rubricas de 5%, o que agravará a situação da população naquelas regiões.
Em paralelo, o Governo pretende limitar fortemente a autonomia quer das Regiões, quer das autarquias locais, condicionando grande parte das suas decisões, incluindo no que diz respeito ao pessoal, à autorização do ministro das finanças.
Com os cortes no investimento público, a introdução de portagens, os cortes às autarquias e investimento público, a destruição de capacidade produtiva, agravar-se-ão as assimitrias regionais e o abandono e desertificação de parte do país.