Na declaração política do PCP na Assembleia da República, Agostinho Lopes sobre as novas medidas anunciadas para o OE, afirmou que vamos continuar a travar a batalha de denúncia, de protesto, de propostas, contra as decisões do Governo PSD/CDS-PP, inclusive no debate do Orçamento do Estado.
Declaração política insurgindo-se contra os anunciados agravamentos fiscais previstos no orçamento do Estado do próximo ano
Sr.ª Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
O Governo aprovará hoje o Orçamento do Estado para 2012. Entre as más notícias — contenções e reduções de salários, pensões e reformas, encarecimento dos custos do acesso à saúde, agravamento do IRS, etc., etc. —, continuam presentes possíveis alterações da taxa do IVA e também do imposto especial sobre o consumo (IEC). É sobre estes possíveis agravamentos fiscais que, hoje, gostaria de tocar o sino a rebate, ainda em sinal de alerta, de
alarme vermelho. Trata-se de um alerta e de prevenção para esta Assembleia da República que,
proximamente, irá debater o Orçamento do Estado e que terá toda a capacidade e soberania para alterar o que julgar errado.
São conhecidas as preocupações e as denúncias que várias estruturas associativas e empresariais vêm fazendo contra os riscos económicos e sociais da concretização do aumento das taxas do IVA previsto no «pacto de agressão» da tróica. São estruturas representativas de dezenas de milhar de micro, pequenas e médias empresas, de sectores de bens transaccionáveis, destacando-se os sectores agro-alimentar (agricultura e indústria), o turismo e a restauração, bem como o comércio de retalho. Prevêem-se alterações que poderão atingir importantes fileiras produtivas, como as do leite e do vinho e, relativamente a este último, sinaliza-se também a notícia da possível abrangência pelo IEC, o que, além de nova penalização fiscal de um
produto estratégico da agricultura nacional, arrastaria dificuldades burocráticas, porventura inultrapassáveis para a sua comercialização pelos pequenos e médios produtores. O IEC, como tudo indica, vai ser igualmente responsável por novo agravamento, em dois pontos percentuais, da factura da energia eléctrica, já vítima antecipada, com o gás natural, da subida da taxa do IVA para 23%!
Srs. Deputados, a concretização de tais perspectivas orçamentais terá efeitos directos e indirectos — que algumas daquelas estruturas associativas avaliaram, quantitativa e qualitativamente, por meio de estudos técnicos independentes — e são devastadores. A concretizarem-se, estaremos perante um verdadeiro tsunami fiscal.
Teremos uma nova e brutal punção sobre o poder de compra dos portugueses, especialmente os de maior debilidade económica, com consequências directas sobre um sector, o do comércio retalhista tradicional, que não precisa, sequer, deste golpe para acabar de desfalecer!
Ocorrerá a inviabilização económica e financeira de milhares de empresas, incapazes de fazer repercutir a subida do IVA na factura dos consumidores e sem margens para a absorver, a grande parte já — passe o pleonasmo — a sobreviver no limiar da sobrevivência.
Dar-se-á mais um profundo golpe na competitividade de empresas e sectores, já a braços com handicaps negativos, no caso de maiores taxas do IVA e preços de energia, face aos seus principais concorrentes, principalmente face às empresas e sectores de espanhóis.
Agravar-se-á a já imensa injustiça fiscal pelo crescimento da desproporção entre impostos directos e indirectos na fiscalidade portuguesa.
O resultado é fácil de adivinhar e ninguém tem dúvidas sobre esse desfecho: falências e dificuldades para milhares de pequenas empresas, mais desemprego e agravamento do défice da balança comercial — pelo favorecimento das importações e pelas dificuldades criadas às exportações.
O Governo e os partidos que o suportam nesta Assembleia não podem vir com o argumento — desculpa habitual nos dias que correm e «pau para toda a obra» — do buraco ou dos buracos herdados da governação PS/Sócrates e também PSD/Jardim pela seguinte ordem de razões.
Primeiro, porque há muito conhecem o buraco, ou buracão, até por experiência própria! Ou andaram enganados estes seis anos por Sócrates e os seus ministros?
Segundo, porque o PSD e o CDS-PP andaram seis anos a dizer que o aumento de impostos não era a solução. Votaram contra várias propostas do PS nesse sentido, negociaram o não aumento de algumas taxas do IVA, que agora são referidas — o caso do vinho —, e o líder do PSD e actual Primeiro-Ministro, quando acabou de dar o dito por não dito na matéria dos PEC, até veio pedir desculpa aos portugueses.
De aumento de impostos não falaram na campanha eleitoral.
Terceiro, porque este é um filme, triste filme diga-se, bem conhecido em várias reprises, sempre fazendo o contrário do que dizem na oposição: contra o aumento de impostos. Por causa do buraco do PS/Guterres, PSD/CDS (Durão e Portas) aumentaram o IVA e deixaram um buraco por causa do qual o PS/Sócrates aumentou o IVA, que deixou um buraco que agora, provavelmente, dará direito a um novo aumento do IVA — e etc.
Quarto, porque estas são medidas que, a serem concretizadas, vão alargar e não reduzir o buraco. O Governo sabe e todos os partidos sabem que as consequências são inevitáveis: mais economia paralela, mais fuga fiscal, mais desemprego, menos receita fiscal, mais despesa da
segurança social, maior défice comercial e dívida externa, menos actividade económica, menos receita fiscal.
No início, no meio e no fim um buraco maior!
Não há uma só razão económico-financeira para fazer subir as taxas do IVA e também para alterar os IEC (impostos especiais sobre o consumo). Se é para trocar receitas do IVA por despesas da TSU (taxa social única) concluam, se ainda não concluíram, que a asneira é dupla. A única razão, completamente inaceitável, é a de que é uma imposição da tróica.
O PCP vai continuar a travar a batalha de denúncia, de protesto, de propostas contra estas possíveis decisões do Governo PSD/CDS, inclusive no próximo debate do Orçamento do Estado. Mas se estas ou algumas destas medidas avançarem e os Deputados do PSD e do CDS não as rechaçarem, então fazia-lhes um pedido: por razões de pudor político e de decência parlamentar, não falem mais, na Assembleia da República, em micro, pequenas e médias empresas, na competitividade da economia nacional e no apoio à produção nacional, nomeadamente agro-alimentar.
(…)
Sr.ª Presidente,
Sr.ª Deputada Catarina Martins,
Agradeço-lhe as questões que colocou, que considero ter abordado de forma suficiente na intervenção que fiz.
É, sem dúvida alguma, uma questão central o problema da perda de poder de compra dos portugueses e de competitividade da economia nacional em sectores transaccionáveis e em alguns dos principais produtores de bens não transaccionáveis — os casos da indústria agro-alimentar, o principal contribuinte nos sectores de bens transaccionáveis para o valor acrescentado bruto do País, e do turismo e restauração, com um peso brutal na percentagem da exportação de serviços do País.
Portanto, todas essas consequências são conhecidas. O Governo e o PSD conhecem-nas muito bem e, certamente, não é por acaso que é feito este «silêncio de chumbo» relativamente a esta abordagem.
É que ela contradiz tudo o que andaram a dizer durante anos nesta Assembleia. Tudo!
Ainda não há muito tempo, há cerca de três anos, o PSD apresentou nesta Assembleia um projecto de resolução de apoio às micro, pequenas e médias empresas, propondo a criação de mecanismos de compensação fiscal nas zonas fronteiriças a fim de diminuir a discriminação face aos nossos vizinhos espanhóis.
Como estas coisas se esquecem por quem conhece exactamente o problema, mas não o quer enfrentar!
Esta será, talvez, a nova forma de fazer política nesta Casa, que é uma velha forma de fazer política do PSD, do CDS e também do PS: a de dizerem uma coisa quando são oposição e fazerem exactamente o contrário quando estão no poder.
Aliás, o PS também está calado porque sabe que esta matéria tem a responsabilidade da sua assinatura, ao ter subscrito um acordo onde esta questão está prevista. E fê-lo sem sequer ter um breve sobressalto relativamente a um problema que vai penalizar tão gravemente milhares de pequenas empresas e aumentar significativamente o desemprego no nosso País.