Intervenção de

Orçamento do Estado para 2009 - Intervenção de Honório Novo na AR

 

 

Orçamento do Estado para 2009 (discussão e votação, na especialidade)

Sr. Presidente,

Há dias, no encerramento do debate na Comissão do Orçamento do Estado para 2009  (proposta de lei n.º 226/X), o Sr. Ministro das Finanças produziu aqui uma declaração muito grave - solene, é verdade -, em que dizia claramente que, desde o dia 15 de Outubro, isto é, no último mês e meio, sensivelmente, a situação económica e financeira a nível mundial e nacional se tinha deteriorado significativamente.

Não são palavras textuais, mas é uma ideia clara dessa declaração produzida pelo Sr. Ministro das Finanças na semana passada.

Desde quinta-feira até hoje, todos tomámos conhecimento das últimas previsões da OCDE, que agravam, de uma forma previsional, o quadro macroeconómico para Portugal, afastando-o completamente, drasticamente, daquilo que são as previsões do Governo.

Sabemos também - o País tem assistido a isso - que a posição do Sr. Ministro das Finanças sobre esta matéria tem sido uma posição reservada, uma posição cautelosa, ao contrário daquela que tem sido a postura do Sr. Primeiro-Ministro, que sorri de uma forma - não entendemos bem como a devemos classificar, mas ocorre-me uma única expressão - «pouco irresponsável» em relação às previsões de estagnação, de queda do produto interno português ou do desemprego para o ano que vem.

Portanto, Sr. Presidente, a questão que tem de colocar-se é esta, e para isso lhe peço a sua intervenção: como o Sr. Ministro das Finanças é que é o responsável pelo Orçamento do Estado, gostaríamos de saber se, por acaso, na Mesa terá dado entrada qualquer proposta de alteração do Governo retirando o quadro macroeconómico e substituindo-o por outro ou, caso isso não tenha acontecido, se o Governo, antes de começar este debate, quer dizer alguma coisa sobre isto e, eventualmente, anunciar uma modificação do quadro macroeconómico do Orçamento ou dizer que, finalmente, está disposto a utilizar a margem orçamental de segurança que tem, o que é permitido pelo Pacto de Estabilidade e Crescimento, pois, nos últimos dias, foi explicitamente dito pela própria Comissão Europeia que poderia, e deveria - sublinho, poderia e deveria - ser usado pelos governos nacionais para lutar contra os efeitos e as consequências económicas e sociais da crise financeira que se abate sobre a Europa e o mundo.
 
(...)

Sr. Presidente,

Acabámos de assistir a uma intervenção do Deputado Afonso Candal que pretende abordar a justiça fiscal em sede de IRS neste Orçamento.

Mas, quando falamos do reforço das deduções com as despesas de saúde para os rendimentos mais baixos, quando falamos do reforço das deduções com as rendas de casa para os rendimentos mais baixos, quando falamos nas deduções para os passes sociais, o senhor esquece a justiça fiscal e manda a sua bancada votar contra.

É a sua resposta! O senhor nem sequer está disponível para tributar todos os rendimentos que os portugueses têm em Portugal. Nem sequer esses quer tributar! Sabe porquê? Porque o senhor isenta de tributação os ganhos com as vendas de acções e com os resultados das vendas de obrigações ou da alienação de obrigações. Isto é um escândalo!

Em plena crise, quando aquele Governo que está na minha frente pede sacrifícios renovados aos portugueses, continua a haver portugueses que têm rendimentos de mais-valias que não são tributadas em Portugal, apesar de serem tributadas na Europa!

Em qualquer país da Europa são tributadas, em Portugal não são!

O Governo e a sua maioria, Sr. Deputado Afonso Candal, agem pior do que os banqueiros portugueses.

O senhor bem sabe que há, pelo menos, um banqueiro em Portugal, o Dr. Fernando Ulrich, que, recentemente, juntou a sua voz à nossa ao defender, como nós aqui fazemos há anos, a tributação das mais-valias.

Pior, Sr. Deputado: quando apresentamos aqui, em plena crise, um pacote de tributação extraordinária dos altos rendimentos, da riqueza escandalosa neste País em sede de IRS, de IMI, de IMT, de IA para tributar os barcos e as aeronaves particulares, os senhores votam contra!

Sr. Deputado Afonso Candal, não é possível falar em justiça social, andar com discursos pungentes por altura do Natal a dizer que estão escandalizados com os grandes rendimentos de algumas pessoas deste País e, depois, votar contra estas propostas e praticar, de facto, injustiça fiscal!

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

Há algum tempo, o Sr. Deputado Afonso Candal gastou aqui 35 minutos para nos tentar mostrar que este Orçamento era justo fiscalmente, mas nem que gastasse o triplo do tempo conseguiria transformar em justo aquilo que é, de facto, profundamente injusto.

Mas também aqui foi assinalado - e eu repito - que o Governo parece estar neste debate completamente silencioso.

Sobre IRS, disse nada; sobre IRC, foi convidado a falar sobre a taxa efectiva dos grandes grupos económicos e da banca, e nada disse; como nada disse também sobre uma nova taxa de IRC de 30% para matéria colectável superior a 50 milhões de euros - também aqui se manteve calado e silencioso (passe a expressão) «como um rato».

Mas, por falar em injustiça, vou falar também em injustiças ao nível das empresas.

Para as microempresas e para as pequenas empresas, o Sr. Secretário de Estado e o Governo querem terminar com o regime simplificado.

São cerca de 20 000 empresas que podem sair prejudicadas. Nós entendemos que o regime simplificado deve ser melhorado, deve ser eliminada a colecta mínima para essas empresas e não suspensa ou eliminado o regime.

Quanto ao pagamento especial por conta, também entendemos que é justo que ele seja eliminado para as empresas com menos de 2 milhões de euros de volume de negócios anual.

E para aquelas que continuarem a fazer o pagamento especial por conta é justo que os créditos fiscais relativamente a essas empresas não fiquem na bolsa do Estado, não fiquem na bolsa da administração fiscal, que, ao menos, esses créditos fiscais sejam devolvidos automaticamente, sem inspecções, sem burocracia, e, se forem pagos tarde, que sejam pagos com juros, exactamente com juros.

As inspecções, se forem necessárias, devem ser feitas, mas não à custa do sujeito passivo, que tem direito a receber os créditos, Sr. Deputado!

Quer dizer: o sujeito passivo tem direito a receber o que a administração fiscal lhe deve e o Sr. Deputado quer que ele pague as inspecções para receber esses créditos.

Isso é injusto!!

O Sr. Deputado Afonso Candal tem de gastar mais 37 minutos, que é o tempo que lhe sobra, para provar também que é justo aquilo que é profundamente injusto.

 

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Secretário de Estado,

Espanta-me que o senhor se mostre surpreendido por aqui se fazer um debate que atravessa o País de norte a sul e que o atravessa, sobretudo, em todas as empresas deste País.

Por que é que o Sr. Secretário de Estado está surpreendido?

Está surpreendido por as pessoas não quererem entregar ao Estado aquilo que ainda não receberam para entregar a esse mesmo Estado?

É isto que o surpreende, Sr. Secretário de Estado?!

O que me parece importante dizer a propósito desta matéria é que o PCP volta, hoje, a propor o mesmo IVA de caixa para as relações económicas com a Administração Pública, local e central. Não é nada difícil fazê-lo! Propusemo-lo no ano passado, ninguém nos acompanhou - é verdade, nem no PSD! -, fazemo-lo hoje e temos a certeza de que, hoje, vamos estar mais acompanhados do que no ano passado.

Mas vamos propor mais, Sr. Secretário de Estado: vamos propor que o IVA de caixa possa ser aplicado também às microempresas, às pequenas empresas com volume de negócios inferior a 2 milhões de euros/anual.

E o Sr. Secretário de Estado não tem desculpa! É que se é possível para a construção civil, se é possível para os transportadores, ninguém percebe porque não é possível para a Administração Pública, nem por que é que não é possível para a generalidade das empresas.

Esta é a questão que, por mais tempo que perca, o senhor não é capaz de explicar.

(...)

Sr. Presidente,

Srs. Deputados:

Já sabemos que o Governo não quis e não quer resolver o problema dos encargos das famílias com a habitação, o problema dos empréstimos para habitação.

Se o Governo quisesse ter resolvido este problema, bastava ter limitado as margens de lucro da banca.

Propusemos isso e o Governo rejeitou-o duas vezes, durante o ano de 2008.

Era lá possível limitar as margens de lucro à «querida» banca, em Portugal!

Isso era impossível!

De maneira que o Governo, para tapar os olhos, «tirou um coelho da cartola» e inventou os fundos de investimento imobiliário para arrendamento, que são nem mais nem menos do que um outro «paraíso fiscal», em Portugal. Já tínhamos o «paraíso fiscal» da Madeira, com os benefícios fiscais; agora, temos um «paraíso fiscal» multiplicado não sei quantas vezes, tantas quantos os fundos que vierem a ser criados.

Mas, Sr. Ministro, o senhor não se pode gabar de que o PCP não promoveu e não propôs alterações à sua proposta.

Assim sendo, apresentamos uma proposta que cria as seguintes obrigações: primeiro, o valor da alienação ao fundo é, sempre e obrigatoriamente, superior ao da dívida; segundo, o valor da renda resulta da aplicação de uma taxa de rendibilidade inferior à taxa média dos juros à habitação aplicado ao valor da alienação; e, terceiro (e mais importante ainda), o valor da recompra não é a preços de mercado, não pode ser superior ao valor da alienação ao fundo.

Não queremos «paraísos fiscais», em Portugal. Por isso, desafiamos o Sr. Ministro a limitar a isenção total de todos os impostos a estes fundos a um tecto de 25%.

Oiça, Sr. Ministro, oiça, se quiser ver que há justeza e equidade fiscal e vontade de colaborar nesta proposta!

Esta seria uma maneira de limitar a um tecto de 25% o completo regabofe de isenções fiscais que os senhores propõem nestes fundos.

Se aceitarem estas propostas, votaremos a favor da criação destes fundos de investimento.

Mas, para isso, é necessário que o senhor dê hoje uma resposta às nossas propostas.

 

(...)

Sr. Presidente,

Se me permite, pretendo fazer uma interpelação à Mesa.

Sr. Presidente, embora a minha interpelação seja um pouco deslocada, gostaria que, através da Mesa, o Sr. Deputado Maximiano Martins ficasse a saber que a proposta do PCP, relativa ao aumento do endividamento, em primeiro lugar, não é da Madeira, é das duas regiões autónomas e, em segundo lugar, foi uma proposta comunicada a este Parlamento pela Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira, onde a mesma foi aprovada por unanimidade, ou seja, com o apoio de todos os grupos parlamentares aí representados.

Pensava que o Sr. Deputado Maximiano Martins, sendo originário da Madeira, sabia disto, mas, não sabendo, não me importo de esclarecer.

 

 

  • Assuntos e Sectores Sociais
  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Regime Democrático e Assuntos Constitucionais
  • Assembleia da República
  • Intervenções