Intervenção de

Orçamento do Estado para 2009 - Intervenção de Eugénio Rosa na AR

 

Orçamento do Estado para 2009 (discussão e votação, na especialidade)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

O problema do desemprego é o problema social mais grave que o País enfrenta neste momento.

No entanto, parece que o Governo está cego e surdo, pelo menos em actos, perante esta realidade.

Se olharmos para o que é orçamentado para 2009 (proposta de lei n.º 226/X) concluímos que estão orçamentados menos 400 milhões de euros do que em 2007 e menos 200 milhões de euros do que em 2008. O Governo publicou, em 2006, um decreto-lei que restringe o apoio aos desempregados.

Os números do próprio Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social confirmam-no.

Em Janeiro de 2006, existiam 313 000 desempregados a receber subsídio de desemprego e, em Julho deste ano, apenas 243 000, ou seja, menos 70 000.

Por isso, apresentámos uma proposta para acabar com estas restrições ao subsídio de desemprego que tem determinado que milhares e milhares de desempregados deixem de receber subsídio de desemprego.

O PCP apresenta uma proposta de alargamento de subsídio de desemprego que varia entre três e seis meses, dependente da idade dos reformados, e uma majoração do subsídio de desemprego para aqueles que têm carreiras contributivas mais elevadas.

Para além disso, propomos que o subsídio social de desemprego deixe de ser calculado com base no Indexante dos Apoios Sociais (IAS) e passe a ser calculado com base no salário mínimo nacional, como este Governo estabeleceu, mas, depois, numa lei seguinte, acabou por anular esta decisão.

(...)

Sr. Presidente,
Sr. Ministro das Finanças,

No final de quatro anos de Governo, 85% dos reformados continuam a receber, em Portugal, pensões inferiores ao salário mínimo nacional - e estes são dados fornecidos pelo Ministério do Trabalho e da Solidariedade Social.

Ora, esta é uma situação inaceitável. Os senhores publicaram duas leis, uma das quais impede a melhoria das pensões de reforma mais baixas e outra que espolia os reformados com pensões de 400 € em cerca de 55 €/dia, o que já resultou numa espoliação de 28 milhões de euros.

A lei de actualização das pensões é uma lei perversa, uma lei segundo a qual, enquanto o crescimento económico, em Portugal, for inferior a 2%, nenhum reformado terá qualquer melhoria na sua pensão.

A situação ocorrida em 2008 é paradigmática: os reformados com pensões mais baixas tiveram um aumento de apenas 2,4% e a inflação foi de 2,9%.

Apresentámos uma proposta que permite a recuperação, pelo menos, desta parte perdida.

Já a proposta do Governo para o aumento das pensões de reforma não permite isso.

A nossa proposta determina aumentos das pensões de reforma entre 4% e 2,5%, permitindo essa recuperação. Isto determinaria um aumento de despesa de apenas 100 milhões de euros, o que é extremamente suportável para uma segurança social que, nos primeiros 10 meses deste ano, acumulou 1900 milhões de euros.

Para além disso, os senhores publicaram uma lei de cálculo da pensão de reforma que está a determinar que pensões mais baixas tenham cortes significativos.

Durante meses e meses, o Partido Comunista Português protestou contra esta espoliação dos reformados com baixas pensões.

Os senhores sempre disseram que isso era mentira. Vieram, agora, reconhecer essa injustiça, corrigindo-a, mas só parcialmente, só com efeitos a partir do início do próximo ano.

Nós apresentámos uma proposta com o objectivo de fazer essa correcção desde a entrada em vigor da lei que criou essa injustiça e que determinou uma espoliação, até este momento, de cerca de 28 milhões de euros.

O que está a acontecer na segurança social é a tentativa de se acumular saldos positivos elevados, à custa dos desempregados e dos reformados, com o objectivo de reduzir o défice orçamental.

(...)

Sr. Presidente,

Srs. Ministros,

Em Portugal os salários e as pensões têm tido aumentos insuficientes e, por isso, sofrido o efeito corrosivo não só da inflação mas também da política fiscal deste Governo.

O Governo tem, sistematicamente, ignorado o artigo 103.º da Constituição, que estabelece que a política fiscal tem também como objectivo uma repartição mais justa dos rendimentos e da riqueza.

Em 2008, os escalões do IRS foram aumentados apenas em 2,1%, o que determinou que muitos trabalhadores que tiveram aumentos salariais inferiores à subida da inflação saltassem de escalão e vissem a sua carga fiscal agravada.

Em 2009, a injustiça fiscal vai aumentar, porque o peso dos impostos indirectos, que são impostos mais injustos, passará de 57,7% das receitas fiscais em 2008 para 58,9% das receitas fiscais em 2009.

Os reformados, cujas pensões o Governo pretende aumentar em 2009 apenas 11 €, o que corresponde, em média, a 37 cêntimos por dia, continuam a suportar um aumento da carga fiscal resultante da redução da dedução específica decidida pelo Governo em anos anteriores.

Em 2009, os trabalhadores da Administração Pública verão uma parte da subida dos seus vencimentos ser «comida» pelos impostos, porque os escalões vão aumentar menos do que a subida dos seus vencimentos.

É por tudo isto que apresentamos um conjunto de propostas que têm como objectivo inverter e até fazer cumprir o que está estabelecido na Constituição.

Destacamos, dessas nossas propostas, a actualização dos escalões do IRS em 3,3%, o aumento das deduções pelo rendimento do trabalho de 72% para 76%, a majoração das deduções das despesas de saúde, a criação de uma nova dedução para passes sociais.

É, portanto, um conjunto de medidas com objectivos a nível fiscal e também social.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Membros do Governo,
Srs. Deputados:

O Sr. Deputado Afonso Candal, numa das suas múltiplas intervenções, referiu, penso que num sentido crítico, o facto de em Portugal quem tem dinheiro e as grandes empresas, através de um planeamento fiscal agressivo, conseguirem reduzir significativamente os impostos, o que não acontece com a maioria dos contribuintes.

Era bom que o Sr. Deputado Afonso Candal passasse das palavras aos actos.

E coloco-lhe esta questão: temos apresentado e vamos apresentar agora novamente uma proposta que visa combater isso que o Sr. Deputado critica, que é o que chamamos a norma-travão, pela qual nenhuma empresa poderá pagar menos do que 20% do seu lucro efectivo.

O PS, particularmente o Sr. Deputado Afonso Candal, está disponível para aprovar esta norma?

Temos levantado sempre o problema da banca, porque achamos que ela é um caso paradigmático.

Relativamente a 2007, calculamos, com base em dados da Associação Portuguesa de Bancos, que a taxa efectiva tenha sido apenas de 14%, mas o Ministério das Finanças e o Governo contestaram.

Ora, nós pedimos essa informação, já a recebemos, mas ela nada nos esclarece, nada! Tenho aqui o mapa recebido do ministério - e posso fornecer-lho - que diz que, em 2007, a matéria colectável corrigida é apenas de 2236 €.

Penso que isto é um erro técnico.

Mas, admitindo mesmo que não são 2236 € mas, sim, 2236 milhões de euros, se os comparar com os valores da Associação Portuguesa de Bancos, constato que há uma diferença para menos de 600 milhões de euros.

Pergunto: como é que isto desapareceu?

Isto é cada vez menos transparente.

Fiz algumas perguntas ao Ministério das Finanças que não me respondeu.

Perguntei-lhe, por exemplo, qual era o volume de prejuízos de empresas do grupo que a banca conseguia deduzir nos seus lucros e o Ministério das Finanças não respondeu.

Perguntei-lhe também qual era o valor das mais-valias que a banca deduzia nos seus lucros e o Ministério das Finanças mais uma vez não me respondeu.

Portanto, a questão que deixo ao Governo é a de saber se está disponível para esclarecer aqui totalmente este problema.

A segunda questão prende-se também com uma proposta que apresentámos, que tem a ver com a criação de um terceiro escalão a nível do IRC, com uma taxa de 30%, que incidiria apenas sobre a matéria colectável superior a 50 milhões de euros.

Há banqueiros que até defenderam uma taxa desta natureza uma altura de crise. Aqueles que conseguem maiores lucros devem contribuir mais.

Por exemplo, a GALP, nos nove primeiros meses, teve 700 milhões de euros.

Pergunto se não acha justo que contribua. Estas nossas duas propostas dariam um aumento de receita suficiente para financiar as medidas que apresentámos aqui para apoiar aqueles que menos têm.

(...)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados,
Sr. Ministro,

O problema da injustiça fiscal é um problema grave, em Portugal, e os portugueses são-lhe muito sensíveis.

Mesmo a nível do IRS, mais de 80% dos rendimentos declarados são provenientes do trabalho e de reformados.

Se o Governo e o PS estão sensíveis à injustiça fiscal por que razão não aceitam as propostas do Partido Comunista, neste campo?

Por que razão não reduzem os benefícios fiscais, muitos deles escandalosos, e que vão determinar, só em 2009, uma perda da receita superior a 3 000 milhões de euros?

Por que razão não acabam com a isenção de dividendos de que continuam a gozar as empresas que foram privatizadas, há muitos anos, e que se encontram sob o controlo dos grandes grupos económicos?

Por que razão não acabam com o benefício fiscal de que gozam os PPR, que vai custar, em 2009, 110 milhões de euros e que beneficia apenas uma minoria de contribuintes?

Com a receita assim obtida, por que é que não apoiam aqueles que mais precisam, os contribuintes com rendimentos mais baixos?

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