Intervenção de

Orçamento do Estado para 2009 - Intervenção de Bernardino Soares na AR

 

Orçamento do Estado para 2009 (votação final global)

Sr. Presidente,
Srs. Deputados:

No último ano da Legislatura, perante uma cada vez mais grave crise económica e social, comprova-se que as políticas deste Governo não servem o País.

O debate orçamental e sobretudo a situação do País desmentem a propaganda do Governo e põem a nu a gravidade das suas opções políticas.

É claro que o Governo se tenta esconder atrás da crise internacional. Ela existe e afecta, de facto, a nossa economia.

Mas é preciso colocar algumas perguntas.

Quem foi que andou semanas e meses a dizer que a nossa economia era tão robusta - graças ao Governo, claro - que não ia sofrer com a crise que se avizinhava? E quem é responsável por uma política que castiga a economia e as pequenas e médias empresas com quebras brutais no investimento e severas limitações ao poder de compra dos trabalhadores, dos reformados, da maioria dos portugueses? Quem foi que, no seguimento de governos anteriores, enfeudou a economia nacional ao sector financeiro, aos grandes grupos económicos nacionais e estrangeiros? E como estava o nosso País antes de a dita crise internacional ter deflagrado?

Pois é, o Governo esconde-se, agora, atrás da crise internacional, mas a sua política já tinha levado o País a uma gravíssima situação económica e social: o mais alto nível de desemprego das últimas décadas; um crescimento económico raquítico sempre a tender para a estagnação; o agravamento das desigualdades sociais e da pobreza, a par de uma crescente concentração da riqueza. Um País dependente com gravíssimos défices estruturais que, comparados com o défice das contas públicas, o transformam numa pequena nota de rodapé na situação do País. Um País onde, ainda há meses, o Primeiro-Ministro inaugurou, com pompa e circunstância, a reabertura das minas em Aljustrel, dizendo que era destes investimentos que o País precisava! Mas o mesmo Primeiro-Ministro, agora, não dá a cara e não abre a boca para falar do encerramento da mesma mina e nem sabemos ainda quanto é que deu àquela empresa para reabrir a mina!

O Governo tenta disfarçar a situação com um cenário macroeconómico, neste Orçamento, completamente artificial.

Todos sabemos, e o Governo sabe ainda melhor, que não tem qualquer credibilidade prever um crescimento em disparidade com todas as previsões internacionais e em contradição com o comportamento previsto para as economias das quais a nossa mais depende; não tem qualquer credibilidade prever a manutenção do desemprego ao mesmo nível com a economia estagnada ou em recessão; não tem qualquer credibilidade prever uma subida da receita fiscal em contramão com a situação económica.

Este Orçamento (proposta de lei n.º 226/X) vai ser, também quanto ao quadro macroeconómico, um verdadeiro «macrofracasso».

Mas, para além de fazer más previsões, o Governo também toma más decisões.

Este Governo criou e mantém a absurda indexação das actualizações das reformas ao crescimento do PIB, que faz com que mesmo as mais baixas, e perante o brutal aumento dos bens essenciais, em particular dos medicamentos, nunca se valorizem, tendo em conta os fracos ou nulos crescimentos do PIB!

Este Governo, cuja política promove o aumento do desemprego, é o mesmo que diminui o acesso ao subsídio de desemprego, poupando milhões à custa dos que não têm emprego!

Este Governo é o mesmo que promove a diminuição dos salários na Administração Pública e no sector privado, penalizando o consumo interno, e que nem sequer cumpriu o compromisso e a promessa, assumidos pelo Primeiro-Ministro e pelo Ministro de Estado e das Finanças, de repor o poder de compra perdido em 2008. E isso não aconteceu nem em 2008 nem vai acontecer em 2009.

Perante a gravíssima situação económica e social o Governo diz-nos: «felizmente, fizemos sacrifícios durante os últimos anos para que agora tenhamos margem para ajudar os portugueses».

O problema é que nem os sacrifícios foram para todos, nem as vantagens o vão ser. Os portugueses já perceberam que a margem orçamental não é para os ajudar, é para ajudar a banca e os grandes grupos económicos.

O Governo diz não haver dinheiro para aumentar os apoios às pequenas e médias empresas, nem para aumentar salários e reformas ou para melhorar a vida dos portugueses.

Só há dinheiro para encaixar 4000 milhões de euros na banca; para acrescer a avales mais 20 000 milhões de euros; para criar um regime para fundos habitacionais de imposto zero, destinado a limpar passivos da banca e do sector imobiliário; para socializar os prejuízos do BPN, deixando aos seus accionistas os activos da Sociedade Lusa de Negócios! Já para as PME não houve disponibilidade nem para alterar regras do pagamento especial por conta; nem para considerar o não pagamento do IVA dos fornecedores a quem o Estado deve; nem para nenhuma outra medida das que foram propostas pelo PCP, no sentido de minorar as enormes dificuldades deste importante sector.

E o Governo nem sequer teve a dignidade de, perante um erro que se viu obrigado a reconhecer, compensar os que foram injustamente lesados por ele. Falo da fórmula de cálculo das pensões e reformas.

Durante mais de um ano, o PCP apresentou repetidamente exemplos, alguns dos quais em debates com o Primeiro-Ministro, de pessoas que ao se reformarem viam amputada uma parte substancial do valor de reforma que tinham a expectativa e o direito de receber!

O Governo dizia que era mentira, que isso não podia acontecer! Mas tanto era verdade que nesta proposta de Orçamento o Governo vem corrigir parte do erro!

Mas, para o PS e o seu Governo, devolver dinheiro aos reformados é sempre gasto excessivo. Vai daí reconhece que errou, mas não paga a totalidade do erro! É como se nada se tivesse passado!

O Governo não conseguiu encontrar 28 milhões de euros, no meio dos milhares de milhões que está a dar à banca, para pagar o que deve a estes reformados!

É uma vergonha e uma insensibilidade gritante!

Este é um Orçamento que prolonga a injustiça fiscal que caracteriza o nosso país, por um lado, com o aumento do peso dos impostos indirectos, com actualizações de escalões e deduções insuficientes e, por outro lado, com a manutenção de elevados benefícios à banca, ao sector financeiro e às grandes empresas, com destaque para os 1800 milhões de euros para o offshore da Madeira e para a taxa efectiva de IRC da banca, metade da nominal.

Este é um Orçamento que penaliza o investimento!

O PIDDAC para 2009 é inferior ao de 2005 - início da Legislatura - em 48,2%, o que diz bem da quebra do investimento nestes anos!

Este é o Orçamento em que o Governo contrabandeou uma norma de alteração ao injusto regime da avaliação dos professores que, aliás, já antes de aprovada mandou aplicar nas escolas.

Foi o Governo que criou um estatuto da carreira, um modelo de gestão e um sistema de avaliação visando penalizar a classe docente, fragilizar a escola pública e economizar nos gastos com a educação pública!

E o mesmo acontece em matéria de antecipações com o que se passa nos CTT, empresa pública em que se pretende antecipar a aplicação do injusto Código do Trabalho que a maioria do Partido Socialista aprovou recentemente na Assembleia da República!

Já vale tudo!

A intransigência, a mentira e, agora também, a golpada orçamental!

No caso dos professores, o Governo teima em manter, contra tudo e contra todos, aquilo que já é insustentável.

Só que pode hoje haver uma maioria a revogar a norma que está em causa do regime de avaliação, mas essa maioria não conseguirá eliminar a luta dos professores que acabará por vencer!

A intransigência desta maioria e deste Governo ficou bem patente no chumbo sistemático das propostas apresentadas.

Foi assim com a proposta do PCP para baixar o IVA para 19%, mesmo quando por toda a Europa sopram ventos nesse sentido, e mesmo quando o Ministro de Estado e das Finanças louvou a baixa anterior - defendida, aliás, em primeiro lugar pelo PCP - e as suas vantagens para a economia.

A anterior era boa, esta parece que já não é!

E foi também esta maioria que rejeitou a proposta de tributação extraordinária sobre a riqueza elevada, apresentada pelo PCP, procurando ter mais receitas para as prestações sociais e para as reformas mais baixas.

Os portugueses podem confirmar com este Orçamento que com o Governo do PS quem mais tem pode aspirar a receber mais apoio e quem mais precisa não conta com este Governo!

Os portugueses podem confirmar que esta política, no seguimento da de governos anteriores, não serve o País, não serve os reformados e os trabalhadores, não serve o desenvolvimento económico!

Serve, sim, os grandes interesses que suportam e apoiam esta política e o Governo que a executa!

Os portugueses podem confirmar com este Orçamento, mas sobretudo pelas suas vidas, que com o Governo PS o País chega ao fim da Legislatura pior do que estava no início!

Por isso, votamos contra este Orçamento!

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