Intervenção de

Ofertas públicas de aquisição - Intervenção de Honório Novo na AR

Vantagens fiscais obtidas no contexto de ofertas públicas de aquisição 

Sr. Presidente,
Sr. Deputado Afonso Candal,  Nos
últimos dias tomámos conhecimento da publicação das perspectivas de
desenvolvimento económico e da execução orçamental para Portugal de
várias instituições. Há problemas, dizem elas, no cumprimento da
contenção orçamental do défice deste ano. A resposta e comentário do
Sr. Primeiro-Ministro e do Ministro das Finanças é uma só: se for preciso, vamos tomar medidas adicionais! Que
medidas adicionais são estas, Sr. Deputado? A resposta também é uma só:
conter despesas sociais, agravar a perda de poder de compra das classes
trabalhadoras e retirar direitos! O
Governo e os senhores, pelos vistos, não querem, corajosamente, olhar
para o problema das receitas fiscais, não querem olhar para a coluna
das receitas fiscais. Começo a ter dúvidas, Srs. Deputados. Mas, partindo do princípio de que o senhor ainda defende o princípio constitucional do englobamento de rendimentos,…(…)Ah! Já defendeu mais!Mas, como eu estava a dizer, partindo do princípio de que o senhor ainda defende o princípio
constitucional do englobamento de rendimentos, a questão é esta e é
simples: acha que as mais-valias bolsistas não são rendimentos, que não
podem, nem devem, ser englobados? Pensa que não devem ser tributadas?
Responda a esta pergunta. Sr.
Deputado, por favor, não invoque as palavras do Deputado Lino de
Carvalho em vão, porque, infelizmente, ele não está para se defender e
para o desmentir. E sabe porquê, Sr. Deputado Afonso Candal? Primeiro, a Lei n.º 30-G/2000, de 29 de Dezembro, tributava todas as mais-valias bolsistas; segundo, os senhores  suspenderam
e retiraram essa norma da lei; terceiro, o PCP, desde então, também
pela mão do Sr. Deputado Lino de Carvalho, apresentou aqui propostas
para reposição da tributação de mais-valias e que o senhor rejeitou. Portanto, Sr. Deputado Afonso Candal, isso fica-lhe mal, porque os senhores é quederam o dito por não dito. Peço-lhe, por favor, que não volte a fazer mais citações descontextualizadas.  (…)  Sr. Presidente,
Sr.as Deputadas e Srs. Deputados: Diz o Bloco de Esquerda, na sua exposição de motivos, que as OPA são  procedimentos
incontornáveis no mercado de capital, que espelham a evolução dos
mercados especulativos e a estratégia de concentração de empresas. É bom, é certamente clarificador, abordar então esta realidade incontornável. Perceber
se é ou não possível conformar esta realidade, se é ou não possível
regulá-la, submetê-la aos interesses colectivos nacionais, à estratégia
e às prioridades do desenvolvimento próprio do nosso país é certamente
um imperativo e uma obrigação que no PCP valorizamos, sublinhamos e
colocamos como primeira prioridade política na análise que fazemos do boom especulativo a que assistimos no mercado mobiliário. A
verdade é que, mesmo antes dos benefícios fiscais, que estão à
disposição de quem procede à OPA, que importa obviamente eliminar e a
que o projecto de lei do Bloco de Esquerda procura dar resposta, é
fundamental, antes disso, compreender e combater — também mas não só no
plano legislativo — os objectivos e as consequências políticas,
económicas e sociais que este tipo de operações visa alcançar. As
OPA pretendem em muitos casos liquidar o papel do Estado em sectores
estratégicos, criando as condições e o ambiente político propícios a
que direitos especiais de decisão que o interesse público ainda detém
em empresas fundamentais de serviço público sejam anulados. As
OPA visam, assim, colocar certos sectores estratégicos nacionais na
dependência completa e exclusiva de interesses privados, criando as
condições accionistas para que, em fase ulterior, o controlo executivo
e as orientações empresariais passem igualmente a ser comandadas por
grupos internacionais. As
OPA buscam desmembrar grupos empresariais fortes cujas orientações
estratégicas ainda têm influência predominante do Estado, lesando
directamente os trabalhadores e ameaçando os seus postos de trabalho,
provocando danos irreparáveis nas potencialidades empresariais quanto à
prestação de umserviço público de qualidade, universal e a preços baixos. Foi neste contexto e com estas características que se apresentou a OPA da Sonae de Belmiro de Azevedo sobre o Grupo da PT. Mas
tanto esta como a OPA do BCP sobre o BPI mostram como as estratégias
que presidem a estas OPA visam acelerar processos de concentração de
capital, em notória e absoluta contradição com o tão propalado aumento
da concorrência que enganosamente se dizia ser um dos principais
objectivos das privatizações. Também
no sector bancário a concentração de capital não se vai traduzir por
melhores e mais aceitáveis serviços — bastando lembrar os altíssimos
níveis de comissões e taxas que hoje são cobradas sem qualquer
plafonamento, ou sublinhar as tentativas, ou mesmo concretização, de
novas e diversificadas comissões, seja nas operações de multibanco ou
na simples manutenção de contas bancárias com valores médios inferiores a um determinado valor. Também
nas OPA do sector financeiro se anuncia o «emagrecimento dos custos com
pessoal», isto é, se pré-anuncia o despedimento de milhares de pessoas
atiradas para a rua do desemprego, «por obra e graça» das economias de
escala que a concentração de capital exige e a competitividade permite. Entretanto,
as falsidades que envolvem as OPA são diversas e procuram também
distrair a opinião pública do essencial, tentando «vender» imagens
delicodoces dos seus promotores e agentes, muitas vezes em articulação
e com a colaboração de uma panóplia diligente de opinion-makers. Para
além de inqualificáveis campanhas mediáticas de promoção pessoal, tenta
fazerse passar para a opinião pública a ideia de que as OPA são o
melhor sinal da revitalização da economia nacional. Esta
é porventura a maior mistificação associada às OPA, mas que serve às
mil maravilhas o Governo de José Sócrates apostado este, como está, em
fomentar todas as operações de propaganda que ajudem a mistificar a
estagnação ou o crescimento económico medíocre em que as suas obsessões
orçamentais continuam a lançar o País, ou que o ajudem a esquecer
números aterradores do desemprego a superarem, muito provavelmente, a
média europeia. Com
as OPA, Srs. Deputados, não há economia que se relance, pela singela
razão de que, sejam quais forem os seus destinos, delas não sairá um
único grama a mais de riqueza produzida. Sr. Presidente,
Srs. Deputados: É
esta a realidade que tem de ser contornável em Portugal. É a economia
de casino que importa combater em Portugal. São as prioridades próprias
e o interesse colectivodo País que têm de ser salvaguardados. É o regabofe especulativo que tem de ser combatido e eliminado. O
projecto de lei do BE centra atenções na componente fiscal associada às
OPA, isto é, centra atenções no combate e na eliminação de vantagens
fiscais que a lei permite obter no momento em que as  ofertas
públicas de aquisição estão já a concretizar-se, com o seu cortejo de
concentração de capital, de quebra de concorrência, de consequências
perversas ao nível da degradação dos serviços e emprego. Este
é certamente um objectivo defensável, que apoiamos e também defendemos
porque é absolutamente inaceitável que, depois de tudo o que dissemos
sobre as estratégias antinacionais das OPA, os seus promotores, ainda
por cima, possam deduzir os empréstimos destinados a financiar as
aquisições bolsistas nos lucros tributáveis das empresas que anunciam
essas mesmas OPA. Como
também certamente defendemos a intenção manifestada pelo Bloco de
Esquerda de, a propósito das OPA, se repor a tributação fiscal de
mais-valias resultantes da venda de acções, norma esta que, como já
aqui foi recordado, existiu sob forma de lei, que nunca chegou a ser
aplicada por suspensão determinada pelo então Ministro Pina Moura e que
foi liminarmente revogada pela então Ministra Manuela Ferreira Leite. Esta
sanha das sucessivas maiorias governamentais contra a tributação das
mais-valias bolsistas fez também no passado recente que propostas de
alteração apresentadas pelo PCP, ano após ano, em sede do debate
orçamental, para repor exactamente a tributação que o BE vem agora
apresentar no seuprojecto de lei, tenham sido rejeitadas pelo voto conjunto da direita de jure e da direita de facto representada pelo Governo do Eng.º Sócrates. Os
objectivos de eliminação das duas vantagens fiscais que o BE pretende
eliminar com o seu projecto de lei merecem o nosso acordo. Mas
importa dizer que, no que respeita às OPA, consideramos ser necessário
ir mais além do que abordar apenas as respectivas vantagens fiscais
imorais e indevidas. Esperamos
igualmente esse apoio para iniciativas que abordam as OPA de um outro
ângulo e que, aliás, o Grupo Parlamentar do Partido Comunista já
anunciou nas suas mais recentes jornadas parlamentares.  (…) Sr. Presidente,
Sr. Deputado António Pires de Lima, Começo
exactamente pelo fim. Espero que, com os seus desejos de diminuição
desta bancada, não se esteja a ver ao espelho e esteja aqui a ver o
«táxi» em que vocês foram e a que, certamente, serão remetidos num
próximo futuro por vontade do povo português… Mas
devo reconhecer que o senhor tem completa razão quando diz que esta
questão divide ideologicamente essa bancada, a direita, desta bancada à
esquerda. A
única questão que neste debate surpreende é que o Partido Socialista,
que geograficamente está deste lado,se situe, em matéria de tributação
e de justiça fiscal, exactamente ao vosso lado, aí, nessa direita deste
Hemiciclo. Sr. Presidente,
Sr. Deputado António Pires de Lima,  As
ofertas públicas de aquisição são caracterizadamente e no fundamental
actos — e isso é visível pelos exemplos que temos, que estão na calha,
basta ver a catadupa de notícias sobre a matéria — que vão envolver,
pelo menos, três ou quatro consequências: a diminuição da concorrência
anunciada, a perda de milhares de postos de trabalho, a desarticulação
empresarial de grupos potencialmente relevantes ao nível nacional e ao
nível internacional, onde o Estado mantinha papel preponderante, e,
naturalmente, propiciar a passagem para o controlo internacional de
centros de decisão nacional. Nós,
Sr. Deputado António Pires de Lima — fique tranquilo —, não estamos de
acordo com isso. Eu sei que os senhores estão de acordo com isso, mas
não contem connosco «para este peditório». Porventura,
contem com o PS, pelos vistos, mas connosco não!! Pelo nosso lado, o
que defendemos é um papel relevante e importante da participação do
Estado na economia e uma estratégia de desenvolvimento português
própria, que seja no interesse colectivo e não apenas no interesse de
meia dúzia de grupos privados.

  • Economia e Aparelho Produtivo
  • Assembleia da República
  • Intervenções