Intervenção de

OE para 2004 e Grandes Opções do Plano (encerramento na especialidade) - Intervenção de Honório Novo

Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras e Senhores Deputados

Rebentaram há poucos dias duas bombas que destruíram por completo as bases em que o Governo sustenta as suas opções orçamentais.

Só que essas bombas não estavam escondidas algures no Iraque. Estavam aqui bem perto, saíram do relatório do Banco de Portugal e dos últimos dados relativos à cobrança fiscal do mês de Outubro.

Afinal o Governo que tanto preza e cultiva uma imagem de rigor e competência técnica não acerta nem uma das suas próprias previsões. É o boletim económico do Banco de Portugal que o vem agora confirmar!

Tal como, aliás, o PCP há muito dizia, e de forma insistente sublinhou ao longo de todo o debate orçamental, em 2003 e em 2004, o Governo errou nas suas previsões de crescimento do PIB, nas projecções do investimento, da inflação, do desemprego, das exportações. Errou em todas as previsões macroeconómicas que sustentaram o actual exercício orçamental. E os números há dias divulgados pelo Banco de Portugal vêm dizer que a realidade é ainda pior do que aquela que o Governo já começara a admitir.

É que, afinal, o produto vai diminuir ainda mais do que o Governo já começara a reconhecer!

É que a inflação vai ficar em torno de 3,4% e não de 2%!

É que o investimento não vai diminuir apenas 7%, como o Governo já o admitira, vai ainda ser pior, o investimento no final de 2003 vai ficar em 90% do investimento em Portugal no ano de 2002!.

Mas se os indicadores do Banco de Portugal mostram a dimensão do completo fracasso da política orçamental do Governo, os dados relativos à cobrança fiscal no final do mês de Outubro confirmam quanto são virtuais as bases em que o Governo sustenta a verdadeira ficção a que chamou Orçamento de Estado para 2004.

É que o Governo começou por anunciar que em 2003 iria cobrar cerca de 29.500 milhões de euros de receita fiscal!

Depois baixou a fasquia para 27.500 milhões de euros, fazendo logo aí desaparecer 2.000 milhões de euros!

Agora, a cobrança real mostra que mesmo este número não vai ser atingido pois que para isso suceder teriam que ser cobrados ainda 6.200 milhões de euros em apenas dois meses.

Fazem-se já apostas sobre a dimensão do rombo final da receita fiscal. Será de mil milhões, dizem os mais optimistas, poderá ultrapassar os três mil milhões, segundo os mais pessimistas.

Mas seja qual for o rombo que se venha a verificar na cobrança da receita fiscal em 2003, o que é totalmente inaceitável (e completamente ficcionista) é que o Governo projecte para 2004 um valor para a receita fiscal 3,5% superior à receita fiscal esperada em 2003, quando esta última base para cálculo está óbvia e completamente errada.

O que mostra, tal como o PCP sempre disse ao longo do debate orçamental, que o acréscimo de receita fiscal que o Governo está a prever para 2004 pode na realidade ser cerca de 6% superior à cobrança efectiva de 2003. Valor em que nem a Senhora Ministra das Finanças certamente acreditará!

Dito doutra forma: a receita fiscal prevista pelo Governo e inscrita por este no Orçamento de Estado para 2004 é uma fraude técnica e política.

É por coisas como esta que o deficit em 2003, sem contar com os truques de contabilidade resultantes da venda de património, da cedência de créditos ao Citigroup e da transferência do fundo de pensões dos CTT, vai ser de facto 5%, ainda maior do que os de 2002 e 2001!

É por coisas como esta que, nestas circunstâncias, ninguém (nem sequer Deus) saberá ao certo qual o deficit orçamental em 2004, nem quais serão os novos anéis (ou serão já dedos?) que a Senhora Ministra das Finanças irá então alienar.

Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhoras e Senhores Deputados

 

Os últimos indicadores económicos mostram bem que, ao contrário do que o Governo afirma, a questão orçamental em Portugal não é só um problema de despesa mas antes e muito um problema de receita. É um problema que tem a ver com o alargamento da base de incidência, com o combate firme à fraude e à evasão fiscal, que tem a ver com a eliminação de benefícios fiscais imorais e ofensivos para o País e para os Portugueses.

A consolidação orçamental que tanto obsessiona o Governo pode e deve fazer-se (também) pelo lado da receita. Mqs isto é a opção de que o Governo foge como “o diabo da cruz”.

A consolidação orçamental não pode nem deve continuar a fazer-se – como pretende o Governo com este orçamento – à custa do sacrifício do investimento público reprodutivo, à custa da diminuição dos salários reais, à custa dos reformados e pensionistas (a quem os partidos da maioria prometeram mel e estão agora a dar fel), à custa do sacrifício dos trabalhadores e do aumento record e insustentável do desemprego e dos níveis de pobreza.

Os resultados da pseudo consolidação orçamental do Governo são bem visíveis, tem duas faces: de um lado, o agravamento da carga fiscal para os rendimentos do trabalho, a completa discriminação das pequenas e micro empresas, o abandono de qualquer ideia de coesão territorial interregional; do outro lado a protecção dos sectores financeiros e a panóplia de proteccionismo fiscal que aliás volta a subir em 2004!

Os resultados da pseudo consolidação orçamental do Governo são bem visíveis na estagnação e na recessão económica, estão bem patentes no drama social de mais de 440 mil desempregados que existem hoje em Portugal!

É verdade, Senhor Secretário de Estado do Orçamento. Há hoje em Portugal mais 100 mil desempregados que em 2002, é o próprio Governo que admite que os encargos com o subsídio de desemprego aumentaram quase 40%!

A forma como decorreu o debate do Orçamento de Estado não alterou nenhuma destas conclusões.

O endividamento sobe para mais de 8.244 milhões de euros, quase 6% do PIB.

O fundo financeiro florestal, com que em si concordamos, é financiado exclusivamente pelo aumento do preço dos combustíveis (que o Governo quis esconder) deixando de fora as indústrias florestais.

Mesmo o cruzamento de dados entre a Administração Tributária e a Segurança Social, para combate à evasão fiscal, que o PCP sempre tem defendido e a que o Governo aderiu à última hora, sai desta Assembleia ferido pelas manobras e negócios de gabinete que precederam a sua aprovação e que podem pôr em causa o largo consenso que é necessário obter nesta matéria.

Senhor Presidente Senhores Membros do Governo Senhores Deputados

O Orçamento de Estado para 2004 vai continuar a agravar a crise económica e social em Portugal. É um instrumento que não procura ajudar o País a sair da estagnação económica, antes promove a recessão.

É um instrumento que serve os grandes interesses e os grandes negócios, que vai agravar a injustiça social, que vai debilitar ainda mais as camadas mais frágeis da população, que vai continuar a gerar cada vez mais desemprego, desigualdades sociais e pobreza. É um instrumento que inexoravelmente vai continuar a provocar o afastamento de Portugal dos níveis de crescimento europeu, cavando ainda mais o fosso que nos separa da média comunitária.

Mas ao contrário do que o Governo diz, existem alternativas a este orçamento e às políticas que ele serve.

São as alternativas de justiça e progresso social, de melhores salários e prestações sociais, das condições para o acesso à educação e à saúde, são as alternativas que se baseiam na defesa e no apoio à estrutura produtiva portuguesa, que não se ajoelham e vergam perante os interesses dos grandes grupos económicos e financeiros, mas que privilegia Portugal e os Portugueses.

São as alternativas da justiça e do progresso social, de melhores salários e prestações sociais, do acesso à educação e à saúde, de defesa da economia nacional e do apoio à sua estrutura produtiva, de uma política que não se ajoelhe perante os interesses dos grandes grupos económicos e que privilegie Portugal e os Portugueses.

 

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