Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Conferência «Direitos sociais e trabalho com direitos»

A União Europeia não deu uma resposta adequada à situação de pandemia e às suas consequências sociais e económicas, como a instrumentaliza para atacar direitos laborais e sociais

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Saúdo os participantes nesta Conferência sobre os «Direitos Sociais e trabalho com direitos», assim como todos aqueles que, denunciando os problemas com que se confrontam os trabalhadores e o povo e apontando as soluções para assegurar os seus direitos e aspirações, estão a levar cabo, durante toda esta semana, as Jornadas «Em defesa do emprego e dos direitos dos trabalhadores, contra a exploração – Não às imposições da União Europeia», com a realização de dezenas de iniciativas – conferências, audições, encontros e visitas –, nos distritos de Braga, Bragança, Lisboa, Porto, Viana do Castelo e Vila Real.

Este conjunto de iniciativas, que o PCP promove, assume uma tão maior importância e significado quando, neste momento, a União Europeia – fingindo esquecer décadas de falaciosas proclamações quanto ao combate ao desemprego, à desigualdade ou à pobreza –, realiza uma chamada Cimeira Social, no Porto, com que de novo procura branquear e mistificar os reais objectivos das suas políticas e imposições – operação a que, uma vez mais, o Governo português dá cobertura.

Se o cariz desta Cimeira fosse realmente social, naturalmente que teria que colocar em causa as políticas e imposições plasmadas no próprio Tratado da União Europeia, e os instrumentos que lhe dão suporte, como o Euro, o Pacto de Estabilidade, o Tratado Orçamental ou o Semestre Europeu.

Políticas e imposições que, sendo determinadas pelas suas grandes potências e subordinadas aos interesses dos grupos económicos e financeiros, estão na origem do agravamento da exploração, da acumulação e concentração da riqueza, das desigualdades sociais, do empobrecimento, das assimetrias de desenvolvimento.

No entanto, as boas intenções que a União Europeia pela enésima vez anuncia, para além de não serem acompanhadas das correspondentes políticas e meios que efectivamente as concretizem, escondem e mistificam o real objectivo de impulsionar novos retrocessos sociais.

Saliente-se, que a União Europeia não só não deu uma resposta adequada à situação de pandemia e às suas consequências sociais e económicas, como a instrumentaliza para incrementar a sua agenda de ataque aos direitos laborais e sociais.

Na verdade, o que a União Europeia procura é levar ainda mais longe a precariedade laboral, a desregulação do horário de trabalho, a pressão sobre os salários, as reformas e as pensões, o aumento da idade de reforma, o desinvestimento nos serviços públicos e a sua privatização.

O que podemos constatar é que, por detrás da falaciosa retórica social, se esconde a insistência nas mesmas políticas e imposições que, desde há décadas, são responsáveis pelo ataque aos direitos laborais e a outros direitos sociais, procurando impor ainda mais gravosos patamares de exploração, de degradação das condições de vida, de empobrecimento.

É a própria realidade da União Europeia que desmonta o autêntico embuste que constitui a chamada Cimeira Social e o chamado Pilar Europeu dos Direitos Sociais.

Os objectivos que anunciam comprovam isso mesmo, como exemplificam o abandono do objectivo do pleno emprego que, durante décadas, foi hipocritamente proclamado pela União Europeia, ou a proposta da Comissão Europeia de definição do método e dos critérios para a fixação do salário mínimo em cada país, que a ser aprovada constituiria um acrescido elemento de pressão no sentido da contenção do necessário aumento do Salário Mínimo Nacional.

Como o PCP tem defendido, a chamada Cimeira Social deveria constituir um momento para afirmar a necessidade de uma real elevação dos direitos laborais e sociais, o que exige a ruptura com as políticas e imposições da União Europeia e do Euro que os atacam e degradam.

Impõe-se a ruptura com a política de liberalização das relações laborais, de generalização da precariedade e do trabalho temporário, incluindo por via das plataformas digitais; de desregulação do horário de trabalho; de banalização do teletrabalho; de desvalorização dos salários; de ataque à contratação colectiva; de liberalização dos despedimentos; de aumento da idade da reforma; de desresponsabilização do Estado no assegurar do cumprimento dos direitos laborais – propósitos que a União Europeia prossegue.

Há que romper com a política de liberalização e privatização dos serviços públicos – como a saúde ou a educação – e dos sistemas públicos de segurança social.

Uma política de efectiva convergência no progresso social é inseparável da valorização do trabalho e dos trabalhadores, da promoção dos direitos laborais e sociais, de uma efectiva relação de cooperação que respeite a soberania e promova o desenvolvimento económico de cada país, os seus sistemas produtivos e o emprego com direitos.

O PCP considera que a realização da chamada Cimeira Social deve constituir um momento para afirmar a necessidade de romper com a política de intensificação da exploração e de agravamento das desigualdades sociais promovida pela UE.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando o direito ao trabalho com direitos, a erradicação da precariedade, a defesa da contratação colectiva.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando a valorização dos salários, incluindo do Salário Mínimo Nacional, a redução do horário de trabalho sem perda de salário.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando serviços públicos, como na saúde e educação, assim como sistemas públicos de segurança social universais e de qualidade.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando a igualdade de direitos entre homens e mulheres, no trabalho e na vida.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando a adequada resposta às necessidades específicas e as condições de vida das crianças, dos idosos, das pessoas com deficiência.

Os direitos sociais cumprem-se assegurando o combate a todas as formas de discriminação, ao racismo e à xenofobia.

O que se exige é que o desenvolvimento científico e tecnológico seja colocado ao serviço da melhoria das condições de trabalho e de vida dos trabalhadores e dos povos, e a recusa da sua utilização para agravar a exploração, fragilizar direitos e degradar condições de vida.

O que se exige é a institucionalização do princípio de não-regressão social e a reversão do nivelamento por baixo das condições de trabalho e de vida actualmente em curso, de que o dito Pilar Europeu dos Direitos Sociais é expressão.

O que se exige é um Pacto de Progresso Social e pelo Emprego que vise o pleno emprego, a defesa e reforço dos direitos dos trabalhadores e de outros direitos sociais, a promoção da convergência social no progresso.

A dimensão de problemas que vários países enfrentam, entre os quais Portugal, exigem a adopção e implementação de medidas que, respeitando a soberania de cada país, assegurem as condições para o seu desenvolvimento económico e social, para superar défices estruturais, para repor capacidade produtiva, elevando os direitos e as condições de vida dos trabalhadores e dos povos que são condição de desenvolvimento e criação de emprego, de justiça e progresso social.

A realidade demonstra que uma Europa de efectiva cooperação entre Estados soberanos e iguais em direitos, de progresso social e de paz, passa pela ruptura com as políticas e imposições da União Europeia, alicerçadas no neoliberalismo, no federalismo e no militarismo.

Continuamos convictos e determinados neste justo combate. Um combate no qual largas massas de trabalhadores estão empenhados e que amanhã estarão no Porto, na importante manifestação nacional promovida pela CGTP-IN, pelos direitos e por uma Europa dos Trabalhadores e dos Povos e que contam com toda a nossa solidariedade!

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