Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Homenagem aos assassinados no Campo de Concentração do Tarrafal

Homenagem aos heróis caídos na luta

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Comemoramos este ano o Centenário da fundação do Partido Comunista Português.

Criação dos trabalhadores portugueses, sempre ligado às massas populares e à vida, acompanhando o seu pulsar, o PCP é o Partido da resistência ao fascismo, é o Partido da luta pela liberdade e a democracia, é o Partido da Revolução de Abril, é o Partido da resistência à contra-revolução, da luta pela ruptura com a política de direita e pela concretização de uma alternativa patriótica e de esquerda, é o Partido que luta por uma democracia avançada, vinculada aos valores de Abril, parte integrante da luta pelo socialismo e o comunismo.

São 100 anos de vida e luta determinada e confiante que se enraíza no passado, se actualiza no presente e se projecta no futuro.

Nos 48 anos de ditadura fascista, foi o PCP que conduziu de forma organizada, permanente e contínua a luta em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País, o único a travar a luta sem tréguas pela liberdade e a democracia.

Os comunistas pagaram a sua dedicação com pesados sacrifícios: milhares de homens e mulheres perseguidos, torturados, presos durante longos anos. Muitos assassinados nas prisões, através da tortura ou derrubados pelas balas assassinas das forças policiais fascistas.

Homens, mulheres e jovens que perderam a vida para que a esperança de vivermos num país de liberdade se tornasse uma realidade. Uma esperança que, coroando décadas de luta, chegou finalmente com a Revolução de Abril.

Depois do 25 de Abril, quer no processo revolucionário, quer perante a ofensiva contra-revolucionária desencadeada por sucessivos governos, os comunistas mantiveram-se à altura das suas responsabilidades. Foi o PCP o único partido que sempre esteve com os trabalhadores e o povo, defensor da revolução e das suas conquistas, o real defensor do regime democrático e da soberania nacional.

Também após o 25 de Abril houve comunistas assassinados quando cumpriam o seu dever, na frente da luta em defesa das liberdades conquistadas, contra a reacção e o terrorismo bombista, em defesa das conquistas da revolução e pelos direitos dos trabalhadores.

O preço desta intervenção foi pesado: a lista de comunistas assassinados é extensa, atingindo quase uma centena de camaradas, exemplos de heroicidade, de firmes convicções, de enorme confiança na justeza e no triunfo dos ideais que abraçaram.

Estamos hoje aqui, junto ao Monumento à memória das vítimas do Tarrafal, como estamos, também, na estrada de Bucelas, onde foi assassinado Alfredo Dinis (Alex), em Alcântara, onde foi assassinado José Dias Coelho, em Baleizão, onde foi assassinada Catarina Eufémia e no Escoural, onde foram assassinados Caravela e Casquinha, para, nesta cerimónia singela determinada pelos constrangimentos impostos pela situação sanitária que o País está a viver, mas que não deixa de ser de grande significado político e histórico, simbolicamente, prestar a nossa homenagem a todos os homens e mulheres – heróis caídos na luta – contra a opressão e o terror, na resistência à contra-revolução e à política de direita, pela liberdade e a democracia, pelo progresso social e o socialismo.

A grave situação a que foi conduzido o País, hoje agravada pela epidemia e pelo aproveitamento que o grande capital dela faz, para servir os seus interesses imediatos de acumulação e maximização do lucro, aprofundando a exploração e as desigualdades com o aumento do desemprego, os cortes de salários e a desregulação dos horários de trabalho, com os encerramentos compulsivos de actividades, ampliando problemas sociais que atingem os trabalhadores e as mais diversas camadas da população, não se ultrapassa com as falsas alternativas das diversas variantes da política de direita.

A solução para os graves problemas do País não se encontra dando retoques no mesmo modelo que conduziu ao retrocesso e ao atraso, mantendo o País amarrado aos mesmos constrangimentos e condicionamentos externos de submissão à União Europeia e ao Euro, aos interesses e critérios do capital monopolista.

É preciso outra política que rompa com a política de direita que Governos de PS, PSD e CDS prosseguiram anos a fio e que o actual Governo do PS não abandonou nas suas opções essenciais, inviabilizando as respostas necessárias à solução dos problemas do País.

Uma situação que as forças políticas mais reaccionárias instrumentalizam, na tentativa de branquear as suas responsabilidades e relançar o seu retrógrado e antidemocrático projecto de destruição das realidades que permanecem de Abril, e impor um brutal retrocesso na vida dos portugueses.

É esse projecto que as forças reaccionárias têm na mira, como sobressai da acção revanchista do PSD e do CDS e dos seus sucedâneos Chega e Iniciativa Liberal, os novos pontas de lança do grande capital que põe pressa e pressão na concretização desse projecto antigo.

Projecto que visa a subversão da Constituição da República e a revisão das leis eleitorais que o PSD já prepara, esta para formar maiorias eleitorais artificiais, ao mesmo tempo que exploram todos os pretextos para a criação do caldo de cultura social onde fervilha a suspeição generalizada sobre a política e o próprio regime democrático, se fomentam medos irracionais, tensões racistas e xenófobas.

Ao mesmo tempo que se desenvolve uma sistemática campanha de revisionismo histórico, de recuperação de figuras fascistas e absolvição dos seus crimes, se procura denegrir o papel da resistência e em particular o papel único dos comunistas na luta pela liberdade, rasurar a preservação da memória da resistência e ocultar o papel dos comunistas na conquista da liberdade e da construção do regime democrático.

No momento actual temos de continuar a lutar sem hesitações nem desfalecimentos em defesa da democracia, pelos direitos dos trabalhadores, pelo emprego com direitos, por melhores salários e condições de vida, pelo direito à saúde, ao bem-estar, por serviços públicos de qualidade, pela educação e pela cultura, pela libertação de Portugal do poder dos grupos económicos e da submissão às imposições da União Europeia.

Lutar num momento em que, a pretexto da epidemia da Covid-19, o grande capital avança – mais uma vez – com uma poderosa ofensiva com vista à retirada de direitos e salários. Centenas de milhar de trabalhadores estão confrontados com situações de frágil segurança sanitária nos transportes públicos e nos locais de trabalho. Outros, através do teletrabalho, obrigados a acompanhar o estudo dos filhos, decorrente do encerramento das escolas, num impossível equilíbrio entre a vida profissional e familiar. Milhares de micro e pequenos empresários estão obrigados a permanecer de porta fechada. A cultura agudiza a sua situação, sem a adequada resposta do Governo.

Sob pretexto de dificuldades económicas criadas pela epidemia, aí está a chantagem sobre a manutenção dos postos de trabalho, a ameaça do desemprego, a pressão sobre os salários, num enquadramento de generalização da precariedade, fruto de décadas de política de favorecimento do patronato e das opções do Governo do PS, mas também aí está a vontade e disponibilidade dos trabalhadores para combater esta ofensiva, com coragem e determinação como ficou patente na recente jornada nacional de luta da CGTP-IN.

A situação que o País vive com a epidemia da Covid-19, torna mais actual, mais necessária ainda, a política alternativa que o PCP propõe, uma política patriótica e de esquerda, que será possível com a força e a luta dos trabalhadores e do povo português, com a convergência de todos os democratas e patriotas, das forças e sectores que verdadeiramente se disponham a assumir a ruptura com a política de direita e com o alargamento da influência do PCP e dos seus aliados e é inseparável da intensificação e alargamento das lutas, pequenas e grandes, da classe operária, dos trabalhadores e de todas as camadas antimonopolistas, a questão decisiva para apressar o momento da sua concretização!

Temos pela frente tarefas difíceis. Mas honrando a memória dos nossos heróis, seguindo o exemplo de gerações de comunistas que, firmes nas suas convicções, confiantes na justeza e no triunfo do ideal comunista, estiveram à frente das lutas por um País melhor enquanto construíam um Partido indestrutível, cumpriremos o nosso dever.

48 anos de ditadura fascista ficaram marcados por sucessivos crimes que os portugueses não esquecem e as novas gerações têm o direito de saber!

O Campo de Concentração do Tarrafal permanece como o mais odioso símbolo da repressão fascista, do seu carácter desumano e assassino. Inspirado nos métodos nazis e por eles assessorado, foi concebido e construído para aniquilar, longe da vista e do conhecimento público, os mais destacados combatentes na luta contra o fascismo: os comunistas, mas também anarquistas e outros democratas, que se destacaram na Jornada do 18 de Janeiro, na Revolta dos Marinheiros, na solidariedade internacionalista em defesa da República espanhola, na longa luta contra o fascismo. Para lá foi enviada a maior parte dos mais destacados dirigentes do PCP à época, como o seu Secretário-geral Bento Gonçalves, Militão Ribeiro, Alfredo Caldeira, Alberto Araújo, Manuel Rodrigues da Silva, Sérgio Vilarigues, Francisco Miguel e muitos outros.

O regime prisional em vigor no Campo de Concentração do Tarrafal assentou na violência sistemática e organizada, nos trabalhos forçados, nos castigos. Um sistema que, muito justamente, levou os presos do Tarrafal a classificá-lo de Campo da Morte Lenta.

O balanço daquele regime prisional é trágico: centenas de presos com a saúde arruinada e 32 assassinados cujos restos mortais se encontram depositados neste Memorial desde 18 de Fevereiro de 1978, acto que constituiu uma das mais grandiosas manifestações realizadas depois de Abril, expressão do reconhecimento das massas populares pelo seu contributo para a conquista da liberdade.

A transladação dos restos mortais dos mártires do Tarrafal e a edificação do Memorial resultado da acção popular e da acção dos ex-tarrafalistas, com papel activo do camarada Francisco Miguel e do nosso Partido, deu cumprimento ao compromisso de quem vivesse até ao derrube do fascismo tudo faria para que os restos mortais dos companheiros assassinados repousassem em solo pátrio. Os seus nomes aí estão para que não sejam esquecidos, porque, como diz a inscrição: «Na longa noite fascista / foram portadores da chama da liberdade / e pela liberdade morreram / no Campo de Concentração do Tarrafal.»

Aqui queremos afirmar que o PCP não esquecerá as suas vidas sacrificadas em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e da pátria, e saberá honrar a sua memória e o seu exemplo, assumindo o seu legado, com dedicação, militância, coragem, confiança e com uma imensa alegria, tudo fazendo para que Portugal não conheça mais o fascismo, para que se retomem os valores de Abril.

Falando sempre verdade, sem capitular nem ceder a pressões e ameaças, lutando com coragem e determinação, aprendendo com a vida e a experiência, dando respostas novas a novas situações, o PCP continuará a ser digno do seu heróico passado de luta, firme e convicto na luta presente, de olhos postos no futuro, sempre com a classe operária, os trabalhadores e o povo.

Assim é o PCP e assim continuará a ser, imprescindível e decisivo na luta pelos direitos e pela melhoria das condições de vida, no processo de transformação social pela democracia e o socialismo. O futuro tem Partido!