Intervenção de Albano Nunes, Membro da Comissão Central de Controlo, Conferência do PCP «Engels e a luta na actualidade pelo socialismo»

O papel e ensinamentos da actividade de Engels na organização do movimento operário, no plano internacional e nacional

Ver vídeo

''

O papel de Engels na organização do movimento operário no plano internacional e nacional comporta um manancial de experiências e ensinamentos inesgotável, na nossa luta, na actualidade pela superação revolucionária do capitalismo, pelo social novo e o comunismo.

A sua primeira e fundamental contribuição foi a elaboração em conjunto com Marx dos princípios do socialismo científico, dotando a classe operária da teoria revolucionária que faltava para guiar a sua luta contra a burguesia. O “Manifesto do Partido Comunista” ficará a assinalar o nascimento do marxismo. Esse “pequeno livrinho” que, como afirmava Lénine, “vale por tomos inteiros”, continua a ser uma fonte de inspiração para os dias de hoje.

Em Engels o trabalho de investigação científica e de elaboração teórica esteve sempre acompanhado de uma intensa intervenção prática. Engels não foi apenas um observador atento das grandes batalhas revolucionárias e de libertação nacional do seu tempo foi um participante activo dessas batalhas, como aconteceu com a sua participação com armas na mão na revolução de 1848 na Alemanha.

O empenho de Engels na organização dos democratas revolucionários e dos comunistas alemães foi sempre acompanhado com uma ajuda incansável ao movimento operário noutros países. Disso é expressão a sua adesão, em 1847, à Liga dos Justos e a sua transformação na Liga dos Comunistas historicamente o primeiro partido comunista, do mesmo modo que o “Manifesto” foi o primeiro programa consequentemente comunista.

A revolução de 1848/49 em França e na Alemanha e noutros países da Europa a “Primavera dos povos como passou à história” foi uma revolução em que a classe operária intervém com as suas próprias reivindicações mas que, na ausência do seu próprio partido de classe, acabou por “marchar a reboque da burguesia”. Da análise crítica desta revolução resultaram preciosos ensinamentos para o desenvolvimento da teoria marxista e, em particular, para a teoria da revolução democrática burguesa e da revolução proletária. A obra de Engels “Revolução e Contra-Revolução na Alemanha” é um exemplo notável de concretização e desenvolvimento das teses fundamentais da concepção materialista da História.

Na sequência da revolução de 1848/49 a repressão aos comunistas foi particularmente violenta o que não impediu que o movimento operário e as ideias socialistas continuassem a difundir-se. Foi para articular as diferentes expressões do movimento operário nos vário países que em 1864 na grande reunião internacional de St. Martin’s Hall, em Londres, foi criada a Associação Internacional dos Trabalhadores (a I Internacional) de que Engels foi destacado protagonista. Uma organização em que respondendo às concretas exigências do tempo participavam organizações políticas, sindicais e outras de orientação política e ideológica muito diversa.

O papel da AIT foi muito importante para a difusão do marxismo e a união do socialismo com o movimento operário, o que exigiu uma firme luta contra o trade-unionismo reformista, contra o proudhonismo, contra o anarquismo que influenciou particularmente o movimento operário dos países do sul da Europa. Tal influência atrasou a penetração do marxismo em Portugal, apesar das ligações da Secção Portuguesa da AIT com Paul Lafargue, e mesmo com Engels, que foi o seu correspondente no Concelho Geral e representou no Congresso de Haia de 1872.

A Comuna de Paris em 1871, revolução em que Engels e Marx se empenharam profundamente, exerceu grande influência no desenvolvimento do movimento operário, incluindo em Portugal, e na expansão do marxismo.

Apesar de os communards marxistas serem minoritários na Comuna, a verdade é que o desenrolar dos acontecimentos, com a intervenção criadora das massas populares, confirmaram, não as concepções blanquistas sobre o papel de minorias aguerridas, nem as posições reformistas dos seguidores de Proudhon, mas teses fundamentais elaboradas por Engels e Marx. A necessidade do partido revolucionário de vanguarda e o papel do Estado como questão central da revolução, impuseram-se pela própria dinâmica da revolução. Os trabalhos de Marx – como “A Guerra Civil em França” - e também de Engels, representaram um novo contributo para o enriquecimento da teoria do socialismo científico.

A Comuna de Paris foi afogada em sangue e a Europa conheceu um dos períodos mais duros de reacção. A perseguição aso internacionalistas foi impiedosa. Mas quando em 1876 foi dissolvida, a AIT tinha já cumprido a sua missão fundamental: difundir o marxismo e enraizá-lo no plano nacional.

Nos anos 70 surgem partidos comunistas (na altura designados “social democratas”) com crescente influência em que o Partido Operário Social Democrata Alemão, o primeiro partido proletário organizado à escala nacional, tem posição particularmente destacada. Engels participa activamente na sua construção a sua luta para assegurar ao partido um programa efectivamente marxista e contra perigosas cedências às teses oportunistas de Lassalle estão bem expressas no seu Prefácio à edição da importantíssima obra de Marx “Crítica do Programa de Gotha”.

O crescimento do movimento operário colocou uma vez mais na ordem do dia a cooperação internacionalista dos seus diferentes destacamentos nacionais e em 1889, Engels assumia uma posição particularmente destacada na direcção e fundação da II Internacional cuja primeira grande iniciativa foi a comemoração do 1º de Maio. A II Internacional teve um importante papel nos combates da classe operária contra o capital, mas após a morte de Engels, em 1895, pela mão de alguns dos seus mais destacados dirigentes (como Berstein e Kautsky) conheceu a degenerescência oportunista que impôs a ruptura conduzida por Lénine e a criação da Internacional Comunista.

Sim, a contribuição de Engels para a organização do movimento operário no plano nacional e internacional é gigantesca, quer pela sua intervenção directa na organização e na luta dos trabalhadores, quer na fundamentação científica da missão histórica do proletariado, na construção do seu partido independente e na elaboração do seu programa. A curiosidade de Engels pelos diversos ramos do conhecimento científico não conhecia limites. Desde os assuntos militares, às ciências da natureza, tudo era objecto da sua atenção e do seu interesse. Entretanto cabe sublinhar sobretudo a sua inspirada contribuição para a elaboração e defesa do marxismo, como nas suas obras Ludwing Feuerbach e Anti-Duhring das quais Lénine disse que “da mesma forma que o Manifesto Comunista são os livros de cabeceira de todo o operário consciente”.

Mas uma das maiores, senão a maior, de todas as contribuições de Engels para o movimento operário e a sua luta pela superação revolucionária do capitalismo é “O Capital”, a genial obra de Marx, que não teria sido inteiramente o que é se tivesse ficado pelo primeiro volume, que Marx finalizou, e não tivesse havido alguém – que só poderia ter sido Engels – alguém que organizasse e sistematizasse o valiosíssimo espólio de Marx e redigisse e publicasse os II e III volumes de “O Capital”.

Não devo terminar esta breve contribuição sobre a vida e a obra de Engels sem evocar um traço do seu carácter profundamente humanista: a modéstia. Este gigante do pensamento e da acção revolucionária que valorizando constantemente o papel de Marx a si mesmo se considerava apenas “segundo violino” deixa-nos um tocante exemplo de incalculável valor revolucionário.