Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

Nas empresas e nas ruas, é hora de dizer Basta!

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Procede à terceira revisão do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro (proposta de lei n.º 46/XII/1.ª)
Elimina os mecanismos de aumento do horário de trabalho(projeto de lei n.º 172/XII/1.ª)

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

Trabalhar mais para receber menos, tornar mais fácil e barato o despedimento e atacar os direitos de quem trabalha, eis, em síntese, os objetivos da proposta de lei do Governo que hoje se discute.

A presente proposta de alteração do Código do Trabalho, levando mais longe o ataque a quem trabalha, não é nem moderna nem necessária. A proposta de lei do Governo é, antes, um bafiento retrocesso na legislação laboral.

Unidos no pacto de agressão, PS, PSD e CDS apenas conhecem um caminho: o agravamento da exploração.

Importa referir que esta alteração à legislação laboral nada tem a ver com o défice ou com a dívida; é, antes, um projeto político que visa concentrar cada vez mais riqueza nos bolsos de quem explora à custa de quem trabalha.

Na verdade, a proposta de lei do Governo PSD/CDS pretende, entre muitas outras malfeitorias, eliminar um vasto conjunto de comunicações à Autoridade para as Condições do Trabalho com o objetivo de facilitar a violação da lei e permitir a «lei da selva» nas relações laborais. Só assim se percebe que, por exemplo, deixe de ser obrigatório o envio do mapa do horário de trabalho.

Não satisfeitos com o facto de já termos no nosso País mais de 1,2 milhões de trabalhadores desempregados, PSD e CDS querem tornar os despedimentos mais fáceis e mais baratos.

Violando de uma forma clara e chocante a Constituição, PSD e CDS querem liberalizar os despedimentos.

A alteração das regras do despedimento por inadaptação e por extinção do posto de trabalho visa alargar a subjetividade e a arbitrariedade, deixando nas mãos do patrão o poder para despedir quando quiser e quem quiser.

No despedimento por extinção do posto de trabalho, passa a ser a entidade patronal a escolher, por critérios escolhidos por si, quem quer despedir e deixa de ser obrigatória a colocação em posto de trabalho compatível, mesmo que ele exista na empresa.

No despedimento por inadaptação, passa a ser fundamento para despedir a redução da produtividade ou da qualidade do trabalho prestado. Tendo em conta que é a entidade patronal que avalia a dita quebra da produtividade ou da qualidade, facilmente se percebe que se trata de um despedimento por razões subjetivas e sem justa causa.

Mas como facilitar os despedimentos não chega, PSD e CDS dão de mão beijada ao patronato indemnizações por despedimento a preço de saldos.

Na verdade, o valor que os trabalhadores recebem de indemnização, em caso de despedimento, passa de 30 para 20 dias por cada ano de trabalho com o limite de 12 anos de casa. Isto é, um trabalhador com 30 anos de casa apenas recebe por 12 anos de trabalho e o Governo discute com o patronato e, mais uma vez, com a UGT, a possibilidade de a indemnização passar a ser, em vez de 20, 8 a 12 dias por cada ano de trabalho.

Ao facilitar os despedimentos o PSD e o CDS não aumentam o emprego como mentirosamente o mesmo Sr. Ministro pretendeu fazer crer. O que vai acontecer, como no passado aconteceu, é o aumento do desemprego.

Na verdade, com estas medidas, o Governo quer ir mais longe no gigantesco processo de substituição de trabalhadores com direitos por trabalhadores sem direitos.

Sr. Presidente, Srs. Deputados:

Além da vontade de poder despedir livremente, a desregulação dos horários de trabalho, a obrigatoriedade de trabalhar mais sem pagar mais um único cêntimo que seja é das mais velhas e rançosas aspirações do grande patronato português.

Assim, não é por acaso que o Governo PSD e CDS aposta no ataque à histórica conquista das 8 horas de trabalho por dia.

Com esta proposta de lei, pretende-se o alargamento e a generalização do banco de horas. Este, em vez de ser acordado com os sindicatos, passa a ser negociado entre o trabalhador e o patrão.

Assim, este banco de horas passa a ser imposto aos trabalhadores, que podem ser obrigados a trabalhar mais duas horas por dia, com o limite de 50 horas semanais, ou trabalhar ao sábado sem receberem qualquer vencimento adicional.

Se a este banco de horas juntarmos um intervalo de duas horas para almoço ou mais horas de trabalho à conta da adaptabilidade, então, facilmente, um trabalhador pode ser obrigado a trabalhar 12 horas por dia. No fundo, querem que se volte a trabalhar de sol a sol, ou ao sábado, sem receber mais um cêntimo que seja a título de trabalho extraordinário.

Hoje, já há muitos trabalhadores que trabalham para além das 8 horas por dia e que não recebem um tostão pelo trabalho que realizam.
O que o Governo pretende é tornar legal aquilo que hoje é ilegal.

O Governo PSD/CDS sabe muito bem que há abusos e ilegalidades, mas quer é permitir e levar mais além os abusos e a desregulação do horário de trabalho.
É esta a «modernidade» que nos querem impor, a modernidade do século XIX.

Importa referir que aumentar o horário de trabalho tem gravíssimos impactos na segurança dos trabalhadores. Dados de um estudo do próprio Ministério do Trabalho comprovam que mais meia hora de trabalho para além das 8 horas aumenta em 64% o risco de acidentes de trabalho.

Assim, não é exagerado dizer que o aumento do horário de trabalho é uma séria ameaça à saúde e à vida dos trabalhadores.

Não satisfeitos querem que as «pontes» sejam contabilizadas como férias, reduzir em 50% o valor pago a título de trabalho suplementar, eliminar quatro feriados e eliminar a majoração de três dias de férias aos trabalhadores que não faltam.

No fundo, o Governo, ao serviço do grande patronato, mais uma vez ao serviço do grande patronato, pretende mais trabalho por menos salário.

Dizem o Sr. Ministro, PS, PSD e CDS e o seu regimento de comentadores televisivos que Portugal precisa aumentar a sua competitividade e produtividade. Não dizem, porque querem enganar os portugueses, é que os portugueses, de acordo com dados da OCDE, trabalham, em média, mais horas que, entre outros, os espanhóis, franceses, ingleses, holandeses e alemães.

Também não dizem é que os portugueses recebem salários de miséria.

Hoje, o salário mínimo nacional, de 485 €, representa 432 € por um mês de trabalho, valor abaixo do limiar da pobreza que se encontra nos 434 €. Assim, em Portugal há mais de 400 000 trabalhadores cujo salário não chega para os tirar da pobreza.

Também não dizem ao País que os países mais competitivos da Europa, com mais produtividade, são os países em que os trabalhadores trabalham menos horas e ganham mais do que os trabalhadores portugueses, comprovando que aumentar as horas de trabalho e roubar os salários não resolve o problema da competitividade ou produtividade, apenas aumenta a exploração.

O caminho do Governo é o retrocesso. É regressar ao século XIX, onde os trabalhadores eram considerados como mais uma peça de uma engrenagem, como se de uma máquina se tratassem e não de seres humanos.

É por isso que o PCP apresenta hoje, em alternativa, e demonstrando que existem outros caminhos, um projeto de lei que visa eliminar os mecanismos de aumento do horário de trabalho e assim impedir os banco de horas, as adaptabilidades e outras formas de aumento do horário de trabalho.

Por fim, importa referir que esta proposta de lei do Governo PSD/CDS desfere, mais uma vez, um grave ataque à contratação coletiva e aos sindicatos, ao estipular, em vários direitos, a nulidade dos contratos coletivos de trabalho, livremente negociados pelas partes, se estes forem mais favoráveis para os trabalhadores.

Sr. Presidente, Srs. Deputados: Ao contrário do que PS, PSD e CDS querem fazer crer, os problemas do nosso País não são os direitos dos trabalhadores. Não vamos ser mais competitivos, não vamos sair da presente situação que a política de direita nos colocou, atacando quem trabalha.

A verdade é que alteração após alteração, para pior, do Código do Trabalho os trabalhadores e o País ficaram pior: mais desemprego, mais endividamento, mais dependência.

O que é urgente é criar mais e melhores empregos e não agravar a exploração de quem cria riqueza no nosso País — os trabalhadores.

Já temos demasiados trabalhadores que empobrecem enquanto trabalham. Já temos exploração que chegue. É hora de dizer «basta»!.

Os trabalhadores só têm um caminho. Depois da grande greve geral, importa continuar a lutar para derrotar este pacote laboral, o pacto de agressão, a troica e os seus partidos, PS, PSD e CDS, nas empresas e nas ruas, contra a exploração, contra a injustiça, contra o empobrecimento, por um País mais justo, mais solidário e sem a exploração do homem pelo homem.

Os trabalhadores podem continuar a contar com o PCP.

(…)

Sr. Presidente, Sr. Deputado Miguel Laranjeiro,

Nestas matérias de alteração da legislação laboral não há abstenções: ou se é contra, e vota-se contra, ou não se é contra e viabiliza-se o pacote de alteração à legislação laboral.

E importa aqui lembrar a história do Partido Socialista neste processo.

Primeiro, abriu o caminho com a negociação com a troica, a qual, depois, contou com a assinatura do PSD e do CDS-PP; depois, o Partido Socialista disse «Seguro dá luz verde ao pacote laboral do Governo»; agora, a recente evolução é uma das suas já famosas «abstenções violentas».

Com a abstenção fica provado, Sr. Deputado, que o PS continua de mãos dadas, coligado com o PSD e o CDS-PP na política de direita!

Importa aqui dizer que o Sr. Deputado falou de tudo, mas falou muito pouco das propostas em concreto. E gostaria de saber qual é a opinião do Partido Socialista, nomeadamente sobre as mais gravosas.

O que é o PS diz relativamente ao despedimento por inadaptação; ao despedimento por extinção do posto de trabalho, que é subjetivo, arbitrário e inconstitucional; à redução das indemnizações pagas aos trabalhadores; ao horário de trabalho; ao banco de horas; ao trabalho suplementar pago a metade do valor?!

Acha que os trabalhadores portugueses já ganham demais, Sr. Deputado?! Concorda que se trabalhe e se receba menos?! É essa a pergunta que queria deixar-lhe.

Falou ainda da valorização da concertação social. O que quero perguntar-lhe é se está de acordo com o ataque à contratação coletiva que este Código do Trabalho perpetua.

Mais: o PS coloca-se na posição habitual, ou seja, coloca-se em cima do muro e diz «Deus é bom, mas o diabo também não é mau rapaz». Portanto, dá «uma no cravo, outra na ferradura». Se, efetivamente, o Partido Socialista viabilizar a proposta de lei com a sua abstenção, está a dar aos portugueses um sinal de que, no essencial, faria exatamente a mesma coisa que o PSD e o CDS-PP estão a fazer.

(…)

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados, Sr. Ministro,

Ficamos a saber que esta proposta de lei do Governo não tem visto familiar — em bom rigor, não podia ter –, porque esta proposta de lei é contra as famílias, contra os trabalhadores, contra a qualidade de vida dos trabalhadores portugueses. Portanto, nunca poderia ter qualquer tipo de visto familiar, a não ser que fosse rodeada de uma profunda hipocrisia, como habitualmente este Governo nos contempla.

O Sr. Ministro refere um conjunto de mistificações, nomeadamente que a legislação do trabalho é um entrave à criação de emprego e, com a alteração à legislação, vai criar-se mais emprego.

Sr. Ministro, é uma mentira descarada, é uma fraude! Facilitar os despedimentos, aumentar a exploração de quem trabalha não cria um único posto de trabalho.

O Sr. Ministro veja as duas ou três últimas alterações à legislação laboral e o que aconteceu depois: após as sucessivas alterações da legislação laboral, para pior, o pico do desemprego aumentou consecutivamente. O que vai acontecer com este Código do Trabalho é, infelizmente, o aumento do desemprego, porque o patronato vai aproveitar-se, claramente, da facilitação e do embaratecimento do despedimento.

O Sr. Ministro diz que temos de ser mais competitivos, mas ser mais competitivo com a exploração de quem trabalha é uma fraude, é mentira, Sr. Ministro!
Os trabalhadores portugueses já trabalham mais tempo, em média, do que os de qualquer país da Europa.

Sabe qual é o único país em que os trabalhadores, em média, trabalham mais horas do que Portugal? São os gregos, e veja lá a situação em que se encontram!

Trabalhamos mais que os alemães, mais que os ingleses, que os espanhóis, que os franceses e, ainda recebendo menos salário, querem que a competitividade se atinja pelo agravamento da exploração do trabalho. Depois, com profunda hipocrisia, o Sr. Ministro vem falar de combate às desigualdades.
Sr. Ministro, não se combatem as desigualdades agravando a exploração de quem trabalha.

Esta proposta de lei, efetivamente, visa agravar a exploração de quem trabalha. É mais dinheiro para os bolsos de quem explora, em detrimento do empobrecimento dos trabalhadores, e essa medida é verdadeiramente inaceitável.

Sr.ª Presidente, Srs. Deputados:

Esta proposta de lei, além de violar a Constituição, é uma gravíssima ofensiva contra os trabalhadores e o seu movimento sindical e vai merecer a resposta do PCP nesta Assembleia da República e fora dela, porque este caminho de desastre nacional não resolve nenhum dos nossos problemas, Sr. Ministro.

Daqui a três, quatro, cinco anos, cá estaremos para fazer a avaliação desta alteração à legislação do Código do Trabalho e cá estaremos para ver, como no passado, que o que vamos ter é mais empobrecimento, mais exploração, mais desemprego, sem resolver os nossos problemas a nível nacional. Infelizmente, Sr. Ministro, o caminho que traça é o do agravamento da exploração.

Fala-se aqui de um conjunto de medidas para a economia. Quais medidas para a economia qual carapuça — permita-me a expressão, Sr. Ministro —, a única medida concreta que surge neste Parlamento é uma alteração, para pior, do Código do Trabalho, é o caminho que o PSD e o CDS-PP têm para o nosso País, o de aumentar a exploração e a injustiça, e esse caminho vai merecer o combate do PCP, quer queira, quer não queira.

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