Intervenção de Jerónimo de Sousa, Secretário-Geral, Encontro / Debate «Não à precariedade – pelo trabalho com direitos»

Não à precariedade pelo trabalho com direitos

Como aqui profusamente se evidenciou, um dos traços mais negativos e inquietantes da evolução da situação social portuguesa e que alguns balanços à actividade governativa propositadamente omitem é, sem dúvida, juntamente com o elevadíssimo desemprego, a crescente precarização do mercado de trabalho.

Não foi necessário esperar três anos para verificar que o grande problema da precariedade do trabalho, com múltiplas e nefastas consequências em todas as dimensões da vida dos trabalhadores, na própria qualificação e organização do trabalho, está a assumir contornos cada vez mais preocupantes no nosso país. Tal como a sua promoção e generalização era uma das linhas da ofensiva global do actual governo do PS visando o conjunto dos direitos dos trabalhadores e o direito à estabilidade do emprego.

Foi essa percepção que cedo se revelou e a evolução concreta do mercado de trabalho que nos impeliu a tomar em mãos, em vários momentos durante estes anos de governo do PS, o combate, com a denúncia e propostas concretas, contra esta praga social.

Isso foi evidente na centralidade que reservámos às questões da precariedade laboral nas Campanhas Nacionais do PCP e nas iniciativas legislativas e de debate que promovemos ao nível da Assembleia da República.

É no quadro desse combate que precisamos de prosseguir que aqui estamos, agora com razões acrescidas, já que, não só a situação do trabalho precário e sem direitos piorou, como a perspectiva é a do seu rápido agravamento se o governo conseguir concretizar a revisão para pior do Código do Trabalho que tem em curso.

As intervenções que aqui vieram confirmam a evolução extremamente negativa das diversas formas de precariedade em Portugal e o impacto do emprego criado na estrutura do emprego.

Portugal, de facto, com o Governo de José Sócrates tornou-se num dos países com a maior taxa de precariedade laboral da União Europeia. Hoje 22,4% dos trabalhadores assalariados, mais de um milhão e duzentos mil têm uma actividade profissional precarizada. Os contratos a prazo, os recibos verdes, a prestação de serviços, o trabalho temporário são as formas dominantes que servem para eternizar a situação de precariedade e acentuar a exploração de milhares e milhares de trabalhadores, muitos dos quais combinam um trabalho precário com longos períodos de desemprego.

O governo do PS apresenta-se com frequência ao país alardeando as suas marcas de modernidade com avanços na qualificação do emprego e com a alteração do modelo de desenvolvimento do país.

Também nesta matéria os factos não confirmam as marcas de modernidade. São as marcas da injustiça e da desigualdade do trabalho precário e sem direitos que permanecem e se aprofundam. Na verdade, a maior parte do emprego que se cria, no meio de uma imensa destruição de emprego, é precário e sem direitos. Nestes três anos de governo do PS não temos melhor emprego, como se anuncia na propaganda, mas pior emprego e mais mal pago que condena, particularmente os jovens a uma vida instável, insegura e sem perspectiva de futuro. Só contratos a prazo são mais 122 mil que há três anos atrás. Temos hoje mais emprego a tempo parcial, enquanto diminui o trabalho a tempo inteiro. Não é o trabalho qualificado que está a crescer é o trabalho pouco qualificado e não qualificado. Temos hoje menos 106 200 trabalhadores qualificados do que há três anos atrás, em contrapartida temos mais 177 100 trabalhadores não qualificados.

O impacto das mudanças que se estão a verificar na estrutura do mercado de trabalho são já efectivamente sentidas nos salários médios dos trabalhadores. A crescente precariedade levou já à desvalorização de cerca de um terço dos salários médios dos trabalhadores com um contrato precário.

Não é no sentido da mudança do nosso baixo perfil produtivo que se avança como apregoa a propaganda do “país no bom caminho”, mas no aprofundamento do modelo de desenvolvimento assente nos baixos salários e trabalho não qualificado, agravado agora com a precariedade.

Talvez não seja por acaso que o desemprego dos trabalhadores licenciados tenha duplicado nos últimos cinco anos e que pelo menos 43 mil licenciados estivessem a desempenhar em 2007 trabalhos não qualificados ou de baixa qualificação, como vendedores por telefone, estafetas, pessoal de limpeza entre outros.

Temo-lo dito, e é um facto indesmentível que o governo do PS, se assumiu com a sua política como o campeão da precariedade.

Alimentou sem cessar o desemprego e com ele o aumento da pressão para ampliação do trabalho precário.

Deu um péssimo exemplo com a generalização da precariedade na Administração Pública ao mesmo tempo que aprovava uma lei sobre o trabalho temporário que visava e visa legalizar a ilegalidade das empresas sem quadro de pessoal.

Fechou os olhos à utilização abusiva de trabalhadores precários em trabalho permanente.

Alimentou e alimenta uma sistemática campanha a favor da flexibilização das condições laborais e passou a secundar o discurso falacioso das organizações do grande patronato que, contra toda a evidência, continua a tocar o disco já gasto da rigidez do mercado de trabalho português. Tal como deu cobertura às principais teses do grande capital que afirmam que os direitos dos trabalhadores não são compatíveis com a globalização ou que não têm em conta a situação competitiva desfavorável do país. Teses que têm como objectivo promover a regulação por baixo das condições de trabalho e prosseguir sem constrangimentos o processo de acumulação de riqueza a favor do grande capital.

Uma intervenção do governo claramente incentivadora e impulsionadora da desregulamentação do mercado de trabalho e de redução dos custos de trabalho que se enquadra também na orientação do emprego e das normas de trabalho comunitárias também elas cada vez mais dominadas pela perspectiva da flexibilidade, nomeadamente da generalização do trabalho precário.

O impacto na vida pessoal e profissional do crescente estado de precariedade em que vivem cada vez mais trabalhadores há muito é conhecido. Instabilidade e desestabilização profissional permanentes que não deixam espaço, nem dão motivação à qualificação. Tendência para procurar compensar a redução salarial inerente à condição do trabalho precário, com actividades extra, ou um segundo emprego, em prejuízo da saúde, do equilíbrio pessoal e da estabilidade da família.

No plano pessoal é a degradação das condições de vida e a precariedade da própria vida também pela instabilidade na obtenção dos rendimentos do trabalho e a permanente perspectiva da perda de autonomia pessoal com os inevitáveis reflexos na afirmação dos direitos democráticos e de cidadania na empresa, na comunidade e na vida do país.

A independência dos jovens, a organização de vida própria são fortemente afectadas. Os filhos para os casais jovens nesta situação são uma opção difícil e muitas vezes adiada.

Toda esta situação se repercute também na produtividade e na competitividade da nossa economia.

Qualquer pessoa avisada sabe do efeito negativo da instabilidade da precariedade, particularmente quando se arrastam no tempo, sobre a produtividade, a qualidade do desempenho e particularmente a criatividade dos trabalhadores que estão nesta situação.

Trata-se de uma tendência retrógrada que urge também, em nome de um melhor desempenho da economia, parar, reduzir e eliminar.

O desenvolvimento de uma economia ao serviço do país e do povo pressupõe trabalho com direitos e emprego estável. O desenvolvimento do país tem que ser dirigido à criação de condições de vida melhor para quem trabalha. O país e o mundo do trabalho não podem ficar acorrentados aos interesses dos grupos económicos e financeiros, cujos lucros aumentam todos os anos, à custa dos sacrifícios da maioria do povo e do comprometimento do desenvolvimento do país.

Os trabalhadores, as novas gerações, são seres humanos com dignidade e direito a uma vida melhor e não peças descartáveis na engrenagem da exploração e do lucro.

Esta evolução negativa da precariedade do trabalho e a circunstância de estar em curso a mais brutal das ofensivas contra os direitos dos trabalhadores com a introdução da flexigurança à portuguesa na legislação laboral, exige que retomemos com novas iniciativas esta frente de combate.

Por isso o PCP irá desde já intensificar a sua intervenção com novas iniciativas no âmbito da nossa campanha «Basta de injustiças – Mudar de política para uma vida melhor».

Intervirá com uma nova iniciativa legislativa na Assembleia da República com a apresentação de um projecto de criação de um Programa Nacional de Combate à Precariedade do Trabalho e de iniciativas visando reforçar os meios para tornar mais eficaz a Inspecção Geral de Trabalho.

Reafirmando o direito dos jovens no acesso a um emprego estável, intervirá para alterar o Código de Trabalho impedindo que um jovem só pelo facto de estar à procura de um primeiro emprego fique como regra sujeito a um vínculo precário.

Da nossa parte não desistiremos, nem daremos tréguas àqueles que, como o PS, mas também o PSD e CDS-PP, querem transformar o mercado do trabalho na “lei da selva”, onde o mais forte dita as regras para seu próprio e exclusivo benefício.

Esta semana comemorando a passagem de três anos de tomada de posse, o governo PS veio apresentar o balanço da sua actividade, retomando o quadro idílico já apresentado por José Sócrates com novos exercícios de pura hipocrisia.

Mais uma vez querem que os portugueses tomem a sua propaganda por realidade. Querem transformar anos de violenta ofensiva contra os direitos e as condições de vida dos trabalhadores e do povo, em anos de sucesso da sua governação, manipulando e deturpando a realidade do país e as reais consequências da sua política na vida dos portugueses.

Comemoram e festejam três anos de governo, enquanto o país protesta e mostra a sua indignação e descontento em relação às suas principais políticas.

Não perceberam ou fazem de conta que não percebem que a vida não está para festejos e muito menos para dar vivas a um governo que piorou a vida dos portugueses.

Não perceberam ou fazem que não percebem que os três anos de governo do PS foram anos de aumento do custo de vida. Anos de aumento desmesurado dos preços dos bens e serviços essenciais e de ataque aos rendimentos do trabalho com a redução e o congelamento dos salários reais. Que Portugal continua a ser dos países da Europa com maior desigualdade na distribuição do rendimento e um dos países mais desiguais da Europa e onde é cada vez mais difícil viver quando apenas se tem um salário, uma pequena reforma ou um pequeno rendimento, agravado agora com o aumento dos juros e dos custos da habitação.

Não perceberam ou fazem que não percebem que não só nada fizeram para romper com as reformas de miséria, como com a sua contra-reforma da segurança social as vão eternizar e reduzir ainda mais, enquanto libertaram o capital de qualquer compromisso.

Não percebem ou fazem que não percebem que, com a sua política de restrição orçamental a ferro e fogo, a sua política de abandono do aparelho produtivo nacional, da sua política económica que abdicou das tarefas da promoção do desenvolvimento e do crescimento económico, sacrificados à diminuição do défice das contas públicas, não só agravaram o desemprego, como acentuaram o atraso do país.

Falam na criação de milhares de postos de trabalho, mas não há manipulação estatística que possa tornear esta evidência - com este governo do PS o desemprego atingiu um novo recorde tornando a vida um inferno para muitos milhares de trabalhadores.

Não perceberam ou fazem que não percebem que o “grande feito” que proclamam de diminuição das contas públicas foi concretizado à custa exclusivamente de uma maior exploração do trabalho, de mais injustiça social e do fomento de mais desigualdades. Foi à custa do exclusivo esforço dos salários dos trabalhadores, dos impostos maioritariamente pagos por quem trabalha, do IVA que pagam sempre e em última instância os mesmos do costume, do corte nos serviços públicos e do investimento que devia contribuir para relançar a economia e fazer sair o país do marasmo.

Não perceberam que a sua desastrosa política está a conduzir a mais dívida pública, mais défice comercial, maior endividamento externo, maior endividamento das empresas e das famílias.

Não perceberam ou fazem que não percebem que com a sua política de saúde de encerramento de serviços, de aumento das taxas moderadoras e dos custos dos medicamentos, de degradação do Serviço Nacional de Saúde, só há razões para protestar, como o têm feito milhares e milhares de portugueses por todo o país.

Não perceberam ou fazem que não percebem que com a sua política de educação contra a Escola Pública de qualidade e inclusiva, contra a profissão docente e os direitos dos professores e contra os princípios da autonomia e da gestão democrática não é para comemorar, mas para recusar, como o fizeram os professores nessa impressionante Marcha da Indignação que daqui saudamos.

Não perceberam que a situação que enfrentam os trabalhadores da administração pública, que esta semana estiveram justamente em luta e que daqui saudamos igualmente não têm razões para comemorar e festejar três anos de um governo que desencadeou a mais brutal ofensiva que há memória contra os seus direitos, os seus salários, as carreiras e o emprego.

Vivemos um momento alto de afirmação do nosso Partido como a grande força nacional de oposição à política de direita.

A magnífica Marcha da Liberdade e Democracia do PCP revelou e confirmou mais uma vez a vitalidade de um Partido que continua na primeira linha de combate pela democracia e pelo desenvolvimento do país.

Um Partido que continua na linha da frente no combate ao fatalismo e de cujo contributo o país não pode prescindir para a resolução dos problemas nacionais.

Partido portador de esperança e confiança que não desiste nem descansa de alcançar um país onde se viva melhor, com justiça, progresso, paz e democracia.

Aqueles que apostavam na resignação e no conformismo, dando como adquirida a inevitabilidade do prosseguimento do actual governo e da sua política por longos anos, têm hoje motivos para estarem preocupados.

Os seus planos que visam prolongar José Sócrates e o PS no poder, mais cedo do que imaginavam, são cada vez mais postos em causa pela forte, ampla e combativa luta de resistência dos trabalhadores e das populações.

Luta que prossegue já no próximo dia 28 de Março com a manifestação da juventude de trabalhadora aqui em Lisboa. Também eles com razões para protestar porque são eles que hoje sofrem de forma agravada as consequências da precariedade, do desemprego, do endividamento crescente, dos juros.

A política de direita deste governo do PS e a solução governativa que se anunciavam como as únicas viáveis são hoje questionadas por amplas massas e largas camadas do nosso povo.

É perante a falência dessa política e o crescente isolamento de um governo que nós afirmamos a premência da construção de um caminho novo alternativo e de uma solução nova com o PCP e na convergência com todos os que tenham como real propósito promover uma ruptura com tal política.

Caminho novo e solução que só é possível com o PCP e serão tanto mais próximos e viáveis quanto maior for o seu reforço.

Nós estamos preparados para assumir todas as responsabilidades como Partido de poder e de alternativa. Temos um Programa e uma política com propostas para assegurar um país com futuro.

Uma política que tem como grandes objectivos o aumento do bem-estar e da qualidade de vida das populações, através de uma justa repartição da riqueza, nomeadamente da revalorização dos salários e reformas, de uma adequada política fiscal e de segurança social e saúde e da elevação da qualidade dos serviços públicos em todo o território nacional.

Uma política que tem na concretização do pleno emprego e na melhoria da sua qualidade o primeiro e prioritário objectivo das políticas económicas e de valorização do trabalho e dos trabalhadores como condição determinante para o desenvolvimento.

Uma política que tem como desígnio a recuperação económica e o desenvolvimento do país, assente num sustentado crescimento económico, através da intensificação e significativo crescimento do investimento público, da ampliação do mercado interno e do aumento da produtividade e da competitividade.

Uma política que tem nos seus objectivos centrais o desenvolvimento e defesa de um sistema de ensino virado para a formação integral dos portugueses. Uma política que considera o ensino e a educação como um direito de todos, assegurado por uma Escola Pública, gratuita e de qualidade.

É nossa profunda convicção que com a luta é possível resistir, vencer e defender património de direitos sociais e laborais e que são o resultado da luta de gerações e gerações de trabalhadores!

A luta está a criar condições para pôr um travão à ofensiva do governo de José Sócrates e um decisivo contributo para o seu crescente isolamento social e político.

É esse caminho que é necessário prosseguir, porque só o caminho da luta pode trazer a mudança!

Quem queira olhar para a realidade nacional, comprova que o PCP é a grande força da oposição a esta política e a este Governo.

Oposição nas palavras e na acção. Força portadora de uma política e de um projecto alternativo para o futuro do País.

Partido que se afirma na sociedade portuguesa, com iniciativa, combatividade e determinação, com uma força mobilizadora sem igual.

Somos esta grande força, que hoje como em muitas outras épocas, contra ventos e marés, transporta a bandeira da esperança e protagoniza, com uma confiança e uma determinação sem limites, a luta difícil mas que vale a pena.

Perante a grave situação do país dirigimos aos trabalhadores, aos jovens, a todos os que crescentemente reconhecem no PCP o seu Partido, para que nos apoiem, para que juntem a sua força à nossa força, na construção de um PCP mais forte e mais influente para construir um país mais justo, mais democrático e mais desenvolvido.

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