Exposição de motivos
Ao Estado compete assegurar especial proteção às crianças, por qualquer forma privadas de um ambiente familiar adequado. É nesse sentido que o PCP tem acompanhado com particular atenção as Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) desde o momento da sua criação. Ao longo dos anos, temos vindo a acompanhar a aplicação da Lei n.º 147/99, a analisar os impactos do trabalho desenvolvido pelas CPCJ, os avanços registados, o universo da sua ação, as principais dificuldades e obstáculos, a tipologia de problemáticas sinalizadas, a exigência e complexidade dos processos, o contexto socioeconómico de fundo, as condições materiais e humanas de funcionamento.
Ao longo dos anos, os profissionais envolvidos têm vindo a identificar dificuldades, reiteradamente plasmadas nos sucessivos Relatórios anuais de avaliação da atividade das CPCJ:
- Crescente complexidade e exigência no acompanhamento dos processos;
- Significativa falta de técnicos a tempo inteiro nas comissões restritas, com prejuízo da salvaguarda da natureza multidisciplinar das equipas;
- Crescentes dificuldades para os serviços de origem disponibilizarem tempo aos respetivos profissionais que integram as comissões restritas, devido à diminuição de efetivos, designadamente no Ministério da Solidariedade e Segurança Social e no Ministério da Saúde;
- Prejuízo para os professores em serviço nas CPCJ, no âmbito da avaliação de desempenho docente;
- Escassez de meios técnicos, designadamente com disponibilidade de tempo para acompanhar de forma regular, efetiva e integrada cada processo, com prejuízos evidentes para a qualidade das avaliações diagnósticas e do acompanhamento na execução de medidas de promoção e proteção;
- Degradação e desadequação das condições materiais de alguns edifícios onde funcionam CPCJ;
- Falta de respostas sociais que permitam um trabalho integrado com as famílias de origem das crianças e jovens sinalizados, evidenciando a fragilidade atual das entidades que asseguram esta resposta social (seja ao nível da redução do financiamento dos projetos destas entidades, seja ao nível da diminuição dos meios humanos disponíveis);
- Grave carência de estruturas de acolhimento temporário e de emergência e falta de meios e financiamento;
- Crescente responsabilização das Câmaras Municipais na dinamização das comissões restritas;
- Falta de respostas de acolhimento temporário e de instituições para receber rapazes a partir dos 12 anos.
Não só não estão asseguradas as condições para o funcionamento das CPCJ, designadamente a nomeação dos técnicos, como ainda têm vindo a ser denunciados unilateralmente Protocolos de Cooperação entre a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção da Crianças e Jovens com Municípios, estabelecidos ao abrigo do artigo 20.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens, o que se traduziu na redução de técnicos nas respetivas CPCJ.
Os Relatórios Anuais da Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção das Crianças e Jovens, de avaliação do trabalho das diversas CPCJ têm vindo crescentemente a registar um aumento do número de crianças acompanhadas desde 2018. Mantém-se a tendência quanto às categorias de perigo que passam por situações de violência doméstica, de negligência e de comportamentos de perigo na infância e juventude.
O aumento do número de processos abertos e de crianças acompanhadas, bem como a complexidade e urgência de cada caso para cada criança, exige que a resposta do Estado seja célere, atenta, cuidada e de qualidade. O tempo das crianças não é igual ao dos adultos: o tempo para intervir junto de uma criança em risco é sempre curto e todas as crianças têm direito à proteção e a um projeto de vida digno.
Apesar do trabalho dedicado dos intervenientes nas CPCJ, e em particular dos membros que integram as Comissões Restritas, do trabalho realizado na área da prevenção e dos esforços para um trabalho coordenado e articulado com as instituições da comunidade, a situação económica e social e a falta de meios humanos tem esmagado a capacidade de intervenção efetiva de muitas CPCJ.
Nos termos da alínea b) do artigo 156.º da Constituição da República Portuguesa e da alínea b), do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados do Grupo Parlamentar do PCP propõem que a Assembleia da República adote a seguinte
Resolução
A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República, recomendar ao Governo que:
- Adote as medidas necessárias à resolução da carência de técnicos nas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens, e que os técnicos no âmbito da Segurança Social e da Saúde sejam designados a tempo inteiro.
- Universalize o sistema de formação oferecido às CPCJ que assegure formação básica a todos os membros e a correspondente atualização profissional, técnica e científica, para melhor competência.
- Invista na prestação de um serviço célere ao nível do diagnóstico das situações de perigo, que seja eficaz e colaborativo com as entidades competentes, designadamente através das Equipas Técnicas Regionais.
- Defina, em articulação com as CPCJ, as medidas necessárias para resolver com carácter prioritário as carências de estruturas de acolhimento temporário e de emergência.
- Defina, em articulação com as CPCJ, as medidas necessárias para assegurar a existência de condições para o trabalho integrado com as famílias de origem das crianças e jovens sinalizados.