Intervenção de Bruno Dias na Assembleia de República

A manutenção da autonomia de gestão dos portos portugueses

(projetos de resolução n.os 204/XII/1.ª e 227/XII/1.ª)
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Há pouco menos de três anos, quando o então governo PS trouxe ao Plenário da Assembleia da República as suas — felizmente! — defuntas propostas para as leis dos portos e da navegação comercial marítima, o PCP denunciou, a esse propósito, que era com um verdadeiro fervor fundamentalista que o PS (e, agora, acrescento o PSD e o CDS-PP) defendia o modelo neoliberal do famoso «landlord port». O que a vida já confirmou é que esse modelo não permite — muito menos num país como o nosso — a estratégia integrada de desenvolvimento do setor e da economia nacional de que o País precisa.
O que é urgente e indispensável é a definição e a aplicação de um modelo coerente de serviço público para o setor portuário. É esta a questão central, Srs. Deputados!
Enquanto alguns procuram erguer a vozearia, atiçando regiões contra regiões, os interesses privados dos gigantes económicos transnacionais do setor vão tomando conta do sistema portuário nacional, peça a peça, serviço a serviço. Desde a pilotagem até ao abastecimento de água, passando pelo reboque e a amarração, como dissemos em 2009, nada escapava.
Esse modelo landlord port, de gestão concorrencial, coloca à evidência, de uma forma mais clara e mais direta, que a estratégia dos sucessivos governos serve e segue o objetivo da entrega deste sector a esses interesses. E esse objetivo, tal como foi seguido durante anos com os negócios a serem conduzidos pelas administrações portuárias, com a Liscont, empresa do Grupo Mota-Engil, entre outros, poderá ser seguido agora com o desmantelamento e a privatização a serem conduzidos numa espécie de comissão liquidatária centralizada.
São etapas diferentes de um mesmo processo, e é esse processo que é urgente travar e inverter.
Há quem procure aparecer verbalizando uma suposta defesa das regiões, mas, como o PCP já sublinhou, a análise de uma questão tão importante como esta não é compatível com a repetição exaltada da suposta defesa regional, que, na verdade, apenas serve para disfarçar interesses privados na gestão de equipamentos públicos rentáveis.
Na defesa do interesse nacional e do desenvolvimento regional, o PCP considera que o sistema portuário nacional deve ser gerido de forma pública e integrada tendo em conta especificidades e potencialidades de cada região; assegurando a complementaridade e cooperação entre portos e nos investimentos, ao invés da competição e da concorrência; promovendo planos de investimentos integrados de material flutuante, como dragas, reboques, lanchas, salvádegos, obedecendo a uma política nacional de aquisições e considerando a
mobilidade entre portos para atividades sazonais; harmonizando direitos e condições de trabalho dos seus trabalhadores e dos trabalhadores das empresas fornecedoras de trabalho portuário; assegurando ganhos de eficiência com estruturas transversais, aproveitando o exemplo positivo da gestão integrada pública e nacional do sistema portuário.
Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados:
Não podemos concordar com uma gestão centralista distanciada da realidade local e nacional, contrária ao desenvolvimento integrado e da coesão territorial. Não podemos aceitar uma lógica incoerente, desarticulada, fratricida, de uns portos contra os outros, todos olhando para as realidades social, económica e ambiental que os rodeiam como se de obstáculos se tratassem. Não podemos aceitar que cada porto seja visto como uma espécie de cidade-Estado.
A defesa das várias regiões e do seu desenvolvimento económico e social não se faz com discursos pseudorregionalistas, mas com políticas concretas de investimento público.

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