Intervenção de Jorge Machado na Assembleia de República

Lei de Bases da Economia Social

(projecto de lei n.º 514/XI/2.ª)

Sr. Presidente,
Sr.ª Deputada Maria José Nogueira Pinto,
Queríamos, desde já, fazer uma afirmação de um profundo distanciamento relativamente ao PSD no que respeita à concepção, à natureza e ao papel que desempenha esta dita economia social.
Importa dizer que a economia social envolve realidades substancialmente diferentes, desde as IPSS às Misericórdias, passando pelo sector cooperativo, as associações que têm naturezas e papéis diferentes e que têm, na nossa opinião, de ser tratadas de forma diferente.
Gostaria, então, de dizer, Sr.ª Deputada, que uma ideia que está explanada no projecto de lei apresentado pelo PSD é a de que é a ausência de um quadro jurídico que determina a pouca visibilidade deste sector social.
Ora, nós não concordamos com esta ideia, primeiro, porque não temos ausência de um quadro jurídico, porque temos regras definidas na Constituição. Aliás, bem sabemos que o PSD pretende transferir para a lei o que está na Constituição, o que, de resto, se articula com o projecto de revisão constitucional do PSD que está em discussão. Portanto, esta é uma medida com a qual nós não concordamos!
Por outro lado, também sabemos que o dizer-se que ela não tem visibilidade não é verdade, porque pretende esconder-se a ausência de medidas concretas que visam dinamizar o sector social nas diferentes componentes, medidas essas que passam, naturalmente, e de acordo com a natureza das diferentes instituições, por acções concretas bem diferentes.
No que respeita ao sector cooperativo e às associações, os apoios tardam a existir e, aí, sim, temos um problema, porque o Estado devia apoiar mais o sector cooperativo, dar-lhe mais visibilidade e mais força na economia portuguesa — e esta era uma medida que fazia falta.
Mas temos um outro exemplo, que a Sr.ª Deputada também referiu, que é o das IPSS e das Misericórdias, ao qual não falta visibilidade. O que temos neste sector das IPSS e das Misericórdias é um fenómeno profundamente errado de desresponsabilização do Estado, em que o Estado atira responsabilidades de equipamentos sociais e valências para as IPSS e para as Misericórdias e, uma vez atiradas essas responsabilidades, volta a «sacudir a água do capote» e aperta o financiamento a estes sectores, deixando, nomeadamente as IPSS, sobretudo aquelas que estão inseridas em locais de maior vulnerabilidade do ponto de vista social, numa situação de «garrote» financeiro que não é aceitável!
Nesta perspectiva, temos uma dupla desresponsabilização do Estado: atiram-se responsabilidades, definem-se equipamentos e, depois, corta-se o financiamento, deixando as pessoas que voluntariamente, de forma abnegada e altruísta, se empenharam nestes projectos, numa situação muito complicada, que obriga, nomeadamente, à realidade de atirar cada vez mais custos para as famílias.
Portanto, a obrigação do Estado, de garantir equipamentos sociais, leva à consequência de serem as famílias a pagar cada vez mais para usufruir de equipamentos fundamentais para o seu dia-a-dia.
O PSD, quanto a isto, não tem resposta, não mexe uma vírgula que seja! Portanto, consideramos que não é este o caminho que deve ser seguido. Mas não responde o PSD nem o CDS-PP, diga-se de passagem, não obstante ter falado sobre o assunto. E o mesmo se diga em relação às questões do Código Contributivo…
Bem sei que não é aqui que devem ser referidas, mas importa aqui denunciar que, neste sector, também vão passar mais dificuldades, por causa do Código Contributivo, e o PSD e o CDS-PP já perderam uma belíssima oportunidade para corrigir o problema, em sede de discussão de um projecto de lei que o PCP apresentou e relativamente ao qual o PSD e o CDS estiveram de mãos dadas, mais uma vez, no seu chumbo.
Bem podem ficar preocupados, Sr. Deputado, porque, na prática, a abstenção significa darem as mãos ao PS no que diz respeito a este sector.
Mas, Sr.ª Deputada, quero chamar a sua atenção e fazer-lhe uma pergunta em concreto sobre o artigo 10.º, alínea b), onde concretamente se lê: «Fomentar a criação de mecanismos que permitam reforçar a auto-sustentabilidade económico-financeira das entidades da economia social». Sr.ª Deputada, se isto tem cabimento quanto às cooperativas e às IPSS, diga-me se é ou não o aprofundamento de um caminho em que se visa apertar o «garrote» financeiro das IPSS.

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