Intervenção de

Interven??o do deputadoAnt?nio Filipe<br />Sobre a situa??o da Justi

Senhor Presidente,Senhores Deputados,Senhores membros do Governo,A convic??o de que a Justi?a entrou em colapso ? hoje compartilhada pela generalidade dos cidad?os portugueses, n?o apenas na base de um qualquer sentimento difuso de que as coisas n?o funcionam, ou que funcionam devagar e mal, mas na base concreta de factos bem conhecidos que nos interpelam a todos.A decis?o judicial, cujo m?rito n?o est? aqui em discuss?o, de considerar prescrito o chamado ?processo do aquaparque? - e que se encontra ainda sob recurso - constituiu, para a generalidade da opini?o p?blica, um sinal de alarme quanto ao estado da Justi?a em Portugal, por raz?es que s?o bem compreens?veis. Est? em causa a morte de duas crian?as e ? insuport?vel pensar que o julgamento sobre eventuais responsabilidades por t?o tr?gico acontecimento n?o ocorra, por atrasos imput?veis ao funcionamento moroso, ou ? in?rcia, do aparelho judici?rio. Acresce ainda que, depois deste caso ter vindo a lume, chegou ao conhecimento p?blico a imin?ncia de novas prescri??es em catadupa, a somar a conhecidas situa??es de arquivamentos e de processos que se arrastam de recurso em recurso, sem fim ? vista, at? ? prescri??o final.O processo do ?aquaparque? reuniu circunst?ncias que geram justificada perplexidade entre os cidad?os quanto ao funcionamento da Justi?a. Uma morosidade que n?o se entende. Um pedido de acelera??o processual que foi recusado. Um Governo PSD que alterou o C?digo de Processo Penal em 1987 e n?o adequou o C?digo Penal ? nova estrutura do Processo, propiciando a corrente jurisprudencial que esteve na base da decis?o de considerar prescrito, este, e porventura muitos outros processos ocorridos entre 1987 e 1995.N?o propusemos este debate para dissecar nenhum caso em particular, embora pensemos que, em cada caso concreto, todos e cada um dos intervenientes devem ser chamados a assumir integralmente as suas responsabilidades.O que suscita a nossa maior preocupa??o e justifica plenamente este debate ? que n?o estamos perante um caso isolado. A prescri??o de processos, que deveria ser uma situa??o absolutamente excepcional e da qual deveria decorrer sempre a averigua??o de eventuais responsabilidades, aumentou de tal modo na ?ltima d?cada que amea?a tornar-se, se ? que n?o se tornou j?, uma rotina decorrente do mau funcionamento do sistema.Segundo dados vindos a p?blico, enquanto em 1992 prescreverem 569 processos, o n?mero de prescri??es em 1998 ter? sido de 11 920, culminando um aumento impressionante de ano para ano. Em cinco anos, entre 1993 e 1998, quase 40 mil processos ter?o ficado por julgar por terem sido ultrapassados os prazos legais.O problema n?o est? nos prazos de prescri??o, que nada t?m de absurdo ou desproporcionado. O problema est? num sistema que n?o consegue funcionar dentro de prazos minimamente razo?veis.Poderemos legitimamente interrogar-mo-nos sobre algumas das causas deste estado de coisas. N?o estar? o nosso sistema judicial demasiado dependente de um formalismo end?mico excessivo que permite eternizar processos com preju?zo para a realiza??o da Justi?a? N?o ser? o nosso sistema judicial demasiado perme?vel a chicanas processuais da parte de quem possui meios econ?micos para as suportar? A forma como s?o feitas as inspec??es no ?mbito do sistema judicial ser? a mais adequada?Estas s?o quest?es que podem, e do nosso ponto de vista, devem, ser debatidas.Mas o que n?o nos oferece qualquer d?vida ? que n?o h? sistema de Justi?a que funcione quando 132.000 processos crime est?o parados s? no distrito judicial de Lisboa, ? espera que sejam feitas notifica??es.N?o h? sistema de Justi?a que funcione quando os juizes trabalham sem as m?nimas condi??es de apoio t?cnico e administrativo e s?o obrigados a perder um tempo inimagin?vel com tarefas meramente burocr?ticas.N?o h? sistema de Justi?a que funcione quando a Pol?cia judici?ria continua a bra?os com um d?ficit reconhecido de centenas de funcion?rios e com um atraso injustificado de muitos anos na aprova??o da respectiva Lei Org?nica.N?o h? sistema de Justi?a que funcione quando o Laborat?rio de Pol?cia Cient?fica tem mais de 15.000 per?cias por fazer, solicitadas no ?mbito de processos criminais e n?o disp?e de meios nem de pessoal que evitem demoras de tr?s ou mais anos na realiza??o de uma per?cia.N?o h? sistema de Justi?a que funcione quando os Institutos de Medicina Legal de Lisboa e do Porto t?m pendentes mais de 6.000 relat?rios de aut?psias, havendo casos de aut?psias feitas h? quatro anos sem que os respectivos relat?rios tenham chegado aos magistrados.Como ? poss?vel, senhor Ministro da Justi?a, que estrangulamentos t?o graves n?o tenham sido resolvidos, nem estejam sequer em vias de resolu??o? Como ? poss?vel que em quest?es como estas, que dizem exclusivamente respeito aos meios que o Governo tem obriga??o de disponibilizar para a investiga??o criminal, o nosso pa?s tenha chegado ao ano 2000 numa situa??o impr?pria de um Estado de Direito que se preze?Os problemas de fundo que conduzem ao funcionamento moroso e ineficiente do sistema judicial n?o se resolvem com fogo-de-art?ficio medi?tico nem com uma deriva casu?stica destinada a pregar alguns remendos num tecido esburacado, como o actual Governo pretende fazer, a avaliar pela Proposta de Lei recentemente aprovada em Conselho de Ministros acerca do recrutamento extraordin?rio de magistrados judiciais.A Justi?a precisa de medidas estruturais. N?o ? com medidas casu?sticas e de excep??o, como estas, que se enfrenta a crise da Justi?a. O problema das pend?ncias acumuladas e do constante aumento de processos entrados nos tribunais n?o se resolve com a contrata??o transit?ria de mais alguns juizes, e ainda menos com medidas como as que retirariam ao Minist?rio P?blico compet?ncias na ?rea da defesa dos direitos dos trabalhadores, que s? enfraqueceriam o estatuto do Minist?rio P?blico e a defesa dos interesses que este, como defensor da legalidade democr?tica, representa.Mas o PCP tamb?m n?o vai atr?s daqueles que, a pretexto da crise da Justi?a, pela qual s?o tamb?m largamente respons?veis, n?o perdem a oportunidade para p?r em causa a independ?ncia do poder judicial que constitui uma verdadeira trave mestra do Estado de Direito democr?tico, fazendo at? por esquecer que o ?rg?o que preside ao alegado ?auto-governo? da magistratura judicial ? composto na sua maioria por representantes designados pela Assembleia da Rep?blica e pelo Presidente da Rep?blica.Senhor Presidente,Senhores Deputados,Senhores membros do Governo,O PCP, como Partido respons?vel que se preza de ser, n?o se exime a contribuir com as suas propostas para a resolu??o dos problemas cuja exist?ncia critica. Da? que, apelando ? contribui??o respons?vel de todos os intervenientes no sector da Justi?a para a supera??o da grave crise que este atravessa, o PCP manifeste o seu total empenhamento para, em sede legislativa, contribuir para que sejam encontradas as melhores solu??es.? com esta postura que o PCP acaba de apresentar na Mesa da Assembleia da Rep?blica um Projecto de Lei que visa dar concretiza??o a uma altera??o de fundo na org?nica do nosso sistema judici?rio, prevista na Constitui??o mas ainda n?o concretizada, que se traduz na cria??o dos Julgados de Paz.A consagra??o de uma Justi?a de proximidade para as pequenas causas, dotada de informalidade, c?lere, desburocratizada, economicamente acess?vel aos cidad?os, procurando em primeira linha obter a composi??o pac?fica dos conflitos, seria uma medida muito positiva e de enorme alcance, n?o apenas para o t?o necess?rio al?vio dos tribunais, mas acima de tudo para garantir aos cidad?os uma Justi?a r?pida e eficaz, no respeito pelos seus direitos, garantias e interesses leg?timos. N?o temos qualquer d?vida de que s?o muitos os milhares de processos que est?o hoje acumulados nos tribunais e que poderiam, com vantagem para todos, ser melhor resolvidos atrav?s de Julgados de Paz.Esta proposta do PCP n?o ? uma inven??o de ?ltima hora. Assenta no conhecimento de uma valiosa experi?ncia l? levada a cabo noutros pa?ses, alguns deles bem pr?ximos de n?s em termos culturais e de tradi??o jur?dica, e cuja aplica??o em Portugal s? peca por tardia.Mais do que solu??es provis?rias, transit?rias, ou de recurso, o que a Justi?a portuguesa precisa ? de medidas de fundo, t?o audaciosas quanto a gravidade da situa??o exige. ? esse o caminho que estamos dispostos e determinados a percorrer.Disse.

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