Intervenção de

Interven??o dadeputada Odete Santos<br />Garante uma maior igualdade de oportunidade

Senhor Presidente,Senhores Deputados,Senhores Membros do Governo,Conv?m recordar, at? porque nos encontramos pr?ximo do dia 8 de Mar?o e dada a natureza deste debate, que n?o pode consentir retratos desfocados, os motivos porque Mar?o foi e continua a ser o m?s em que se assinalam as lutas contra as discrimina??es.Conv?m record?-lo como dia simb?lico que n?o autoriza pompas nem circunst?ncias, e muito menos cosm?ticas. A morte das oper?rias da f?brica Triangle no dia 25 de Mar?o de h? muitos anos, aprisionadas e lan?ando-se do 9? andar como ?nica forma de fugir a um inc?ndio numa f?brica sem condi??es de seguran?a, o que significa a escolha de Mar?o para comemorar as lutas das mulheres, n?o autoriza que as mulheres sejam utilizadas para cosm?ticas de que alguns necessitam para se promoverem.Convir? recordar o dia 8 de Mar?o para que n?o se esque?a, e ressurja, a afirma??o de que a luta das mulheres se norteou sempre pelo derrube das barreiras criadas e sustentadas em nome das diferen?as biol?gicas.Para afirmar que um propalado direito ? diferen?a mais n?o serve sen?o para justificar discrimina??es.A cria??o das categorias em nome da biologia , ? um tremendo sinal de retrocesso.Se recordamos a luta das mulheres, veremos claramente que elas conseguiram quebrar a barreira biol?gica e afirmar que nenhuma identidade sexual as podia impedir de igual acesso ?s profiss?es ditas masculinas.Se a luta das mulheres derrubou a barreira das diferen?as em fun??o da biologia, ? errado chamar sexista ?s discrimina??es das mulheres... Porque ? mais e menos do que isso. ? menos porque as mulheres n?o s?o v?timas, todas elas, de igual maneira, dessa discrimina??o. ? mais , porque a discrimina??o das mulheres est? profundamente ligada ?s discrimina??es de classes de que tamb?m s?o v?timas os homens.A Proposta que o Governo nos traz, sob uma aparente capa de modernidade, faz a reconstru??o das diferen?as biol?gicas, assenta na reconstru??o de categorias sexuadas de cidad?os, cumprindo objectivamente a finalidade de fazer esquecer as profundas desigualdades econ?micas e sociais que tanto atingem as mulheres.Cumprindo, pelo menos objectivamente, o objectivo de atingir a solidariedade entre as v?timas de discrimina??o, mulheres e homens. Enquanto muito se fala da discrimina??o de g?nero, quer-se construir uma barreira de sil?ncio sobre os reais problemas das mulheres, cuja resolu??o ser? um importante contributo para a igualdade de oportunidades de todos os cidad?os, homens e mulheres, de cada cidad?o, de cada homem e de cada mulher.A hist?ria vai assinalar que desde que, nos fins da d?cada de 70, come?aram a surgir movimentos ditos parit?rios, os problemas das mulheres, no trabalho, na fam?lia, na sociedade, foram relegados para 2? plano. Porque tais movimentos assinalaram como importante e definitivo, a tomada do poder a qualquer pre?o. Mesmo que esse pre?o fosse o sil?ncio sobre as desigualdades salariais, as desigualdades no acesso ao emprego, o trabalho com sal?rio reduzido - o trabalho em part time - a luta contra o aborto clandestino pela despenaliza??o da interrup??o volunt?ria da gravidez.Mesmo que esse pre?o possa ser, aqui, no Parlamento Portugu?s, escamotear a situa??o real das mulheres portuguesas. Esconder que, neste momento, com o pacote laboral que j? c? temos na Assembleia, a igualdade real das mulheres est? amea?ada.Mesmo que o pre?o seja passar para segundo plano a den?ncia de que a grande maioria das mulheres portuguesas se situam entre os 80% dos cidad?os se ficam pelo ensino b?sico, e nem sempre completo. Que a taxa de analfabetismo ? preenchida sobretudo pelas mulheres. Que no n?mero dos trabalhadores a auferir o sal?rio m?nimo nacional, as mulheres s?o mais do dobro dos homens. Que elas ganham menos do que os homens, como acontece na Uni?o Europeia, em trabalhos iguais.Que elas s?o v?timas de discrimina??o por estarem gr?vidas, como acontece, por exemplo, com as trabalhadoras das grandes superf?cies comerciais, que n?o v?em os seus contratos a prazo renovados quando engravidam; que n?o s?o abrangidas por aumentos salariais aplicados pelas entidades patronais quando estas descobrem que v?o ter uma trabalhadora em licen?a de parto.Enquanto o Governo aqui vem falar da pretensa modernidade de reconstru??o de um conceito meramente biol?gico h? mulheres que sofrem em linhas de montagem. Vendo a sua sa?de desaparecer ainda na sua juventude, perante a in?rcia do Governo que n?o cumpre o dever de garantir ?s trabalhadoras das empresas do sector el?ctrico, nomeadamente ?s trabalhadoras da Ford Electr?nica- o caso mais gritante de cumplicidade do Governo com o poder econ?mico no desprezo com a sa?de de quem trabalha - que n?o cumpre o dever de garantir a sa?de no trabalho.N?o, senhores membros do Governo, o debate de hoje, n?o ? sobre a modernidade - que n?o o ? - da discrimina??o de g?nero, mas ?, e continuar? a ser sobre as gritantes exclus?es de mulheres que fazem do trabalho uma arma para a conquista da cidadania. Para romper o gueto da barreira biol?gica. Para afirmar a recusa de um conceito meramente biol?gico de discrimina??o do sexo feminino. N?o, senhor Presidente, senhores Deputados, senhores membros do Governo, o primeiro princ?pio de toda a emancipa??o ? a recusa de classificar os seres humanos segundo distin??es naturais. Princ?pio afirmado no artigo 13? da nossa Constitui??o.E se outro artigo da Constitui??o acentua a necessidade de promover a igualdade entre mulheres e homens, e se o artigo 109? fala da promo??o da igualdade de oportunidades entre mulheres e homens, o texto constitucional no seu conjunto n?o autoriza a que uma lei venha impor a divis?o dos portugueses em duas categorias, meramente fundadas na biologia.Porque essa n?o ? forma de promover a igualdade dos cidad?os, individualmente considerados, que n?o se diluem na dicotomia mulheres/homens.A proposta de lei n?o quer saber da igualdade de oportunidades para as mulheres, que v?timas de graves discrimina??es, limitadas na sua participa??o na vida pol?tica quotidiana, sabem que estas quotas se destinam a resolver um problema do Partido Socialista. Um problema das mulheres socialistas que julgam merecer, e seguramente merecer?o, um melhor lugar nas listas deste Partido, e n?o o t?m conseguido.Mas a luta ? feita da recusa das migalhas do banquete.A igualdade de oportunidades entre mulheres e homens, no quadro constitucional, e no quadro da realidade em que vivemos, da pol?tica demissionista do Governo no combate a todas as discrimina??es, n?o se compadece, nem ? constitucionalmente admiss?vel, a um conceito meramente biol?gico de mulher. E isso resulta desde logo do artigo 13? da Constitui??o da Rep?blica.Escreveram Vital Moreira e Gomes Canotilho em anota??o ao artigo 13? da Constitui??o da Rep?blica, a obriga??o de diferencia??o integrando o conte?do jur?dico - constitucional do princ?pio da igualdade, para se compensar a desigualdade de oportunidades, significa que o princ?pio da igualdade tem uma fun??o social, o que pressup?e o dever de elimina??o ou atenua??o pelos poderes pol?ticos, das desigualdades sociais, econ?micas e culturais, a fim de se assegurar uma igualdade jur?dico - material" E continuam os referidos autores:No que respeita ? fun??o da protec??o do princ?pio da igualdade, no sentido de obriga??o de discrimina??es positivas, ele constitui inequivocamente uma imposi??o constitucional de igualdade de oportunidades, cujo n?o cumprimento justifica a inconstitucionalidade por omiss?o".Ser? talvez por isso, que a p?ginas 56 do Livro que o Governo fez editar - Democracia com mais cidadania - consta que o professor Vital Moreira escreveu, acerca do cumprimento do artigo 109? da Constitui??o:" Uma terceira hip?tese ? a do estabelecimento directo de quotas por parte da lei, com car?cter vinculativo, com as consequ?ncias inerentes, nomeadamente a n?o aceita??o de candidaturas que n?o respeitassem as quotas legalmente estabelecidas e a penaliza??o noutros aspectos... ? aqui que podem come?ar os problemas de constitucionalidade. Na verdade, pode entender-se que um sistema de quotas desta natureza, legalmente definido e legalmente vinculante, pode infringir o princ?pio da igualdade de tratamento das pessoas, independentemente do sexo" ( fim de cita??o)N?o se reconhece aqui a proposta do Governo?Uma proposta que, como j? o dissemos, penaliza exclusivamente os partidos e desresponsabiliza outros intervenientes neste processo, nomeadamente o Governo.Saliente-se, porque esse ? mais um claro sinal de cosm?tica, que a proposta do Governo apenas quer instituir quotas para o Parlamento Europeu e para a Assembleia da Rep?blica ...Falando-se tanto, e fala-se justamente, da subrepresenta??o escandalosa de mulheres nos ?rg?os de poder local, a? onde o poder se exerce mais pr?ximo das popula??es, a? onde o universo dos eleitos ? de 40.000, pergunta-se por que motivo o Governo parou e n?o quis garantir quotas ?s mulheres? E por que ? que n?o quer instituir um sistema de quotas para o pr?prio Governo?A opera??o paridade ou partilha do poder atrav?s de quotas assenta para mais num outro dado falso. O de que a identidade sexual, a biologia, determina uma nova forma de fazer pol?tica. Mais humanizada. Mais atenta aos problemas sociais.Tamb?m aqui ? preciso dizer que n?o ? a biologia que forma as convic??es ideol?gicas. At? Freud sorriria com afirma??es que a tal respeito se produziram. Como disse Elisabete Badinter perante o Senado Franc?s, as posi??es pol?ticas s?o determinadas em fun??o da ideologia e n?o do sexo.Entre Gandi e Marl?ne Albright, optamos claramente por um homem. Entre Martin Luther King e Golda Meir optamos claramente por um homem.E n?o preferimos nem Golda Meir nem Moshe Dayan. Nem a mulher, nem o homem..Sejamos claros:As propostas que endeusam as mulheres enquanto tais, em vez de contribu?rem para a promo??o da igualdade, para o combate a todas as discrimina??es, para a luta dos povos pela sua emancipa??o, mais n?o fazem do que erguer novas barreiras, com a apar?ncia de que se vai fazendo alguma coisa.? que a Democracia, n?o est? zarolha apenas porque os dois sexos n?o est?o representados de forma equilibrada. A democracia est? zarolha e m?ope, poder? ser afectada de cegueira, enquanto se verificarem exclus?es aos mais diversos n?veis.As quotas, a paridade, n?o t?m nada a ver com igualdade.As quotas, a paridade, n?o s?o um valor de esquerda.O Partido Comunista Portugu?s n?o est? satisfeito com a percentagem de mulheres que tem acesso aos ?rg?os de poder pol?tico. Porque isso reflecte o atraso em que nos encontramos no combate ?s discrimina??es.Mas os n?meros indicam, apesar de tudo, que o PCP se situa ? frente no esfor?o de contribuir para uma maior participa??o pol?tica das mulheres.Mas n?o estamos satisfeitos. Por isso assumimos o compromisso p?blico de assegurar um significativo refor?o de mulheres nas nossas listas eleitorais.E desafi?mos os restantes partidos a assumirem compromissos similares.O refor?o da participa??o pol?tica das mulheres deve assentar no empenho volunt?rio dos Partidos Pol?ticos, tamb?m para que eles fiquem sujeitos ? san??o ou ao pr?mio eleitoral por parte de cidad?os, homens e mulheres.Entretanto, continuaremos a dar voz ?s lutas das mulheres. Das mulheres que n?o se v?em neste retrato desfocado apresentado pelo Governo.As mulheres para quem o combate continua. Pela igualdade. Pela justi?a.Disse.

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