Intervenção de

Interven??o da deputada<br />Programa especial e combate às listas de espera

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, As listas de espera para acesso ao Serviço Nacional de Saúde não são um problema de hoje. Já o eram há 10 anos. É inquestionável que se traduz num dos maiores problemas e que afecta milhares de cidadãos portugueses, apesar do esforço desenvolvido por muitos profissionais da saúde. A este facto também não é alheia a carência de profissionais de saúde e a falta de uma estratégia a médio e a longo prazo para que tenhamos o número de profissionais necessários à prestação de cuidados às populações. Com a aprovação da resolução apresentada pelo PCP sobre o aumento de formandos nas áreas da saúde todos os grupos parlamentares reconheceram que os anteriores governos não fizeram o suficiente e que é urgente um Plano Estratégico de Formação de Profissionais, com as inevitáveis repercussões orçamentais. Centrando-nos na matéria hoje em debate, os atrasos no atendimento e as situações em que foram excedidos os tempos de espera clinicamente aceitáveis constitui uma realidade absolutamente inadmissível. E lembramos que as políticas de saúde de inspiração neoliberal, particularmente desenvolvidas pelos governos do PSD, não são completamente alheias ao fenómeno de crescimento das listas de espera. Antes pelo contrário. Entre as consequências mais nocivas dessa política estão o subfinanciamento crónico do Serviço Nacional de Saúde, a centralização das tomadas de decisão, a falta de condições de trabalho, a precarização dos vínculos laborais, o agravamento das desigualdades no acesso aos cuidados de saúde, a promoção da promiscuidade entre sectores público e privado, entre outros. Uma política que transformou o Serviço Nacional de Saúde em terreno propício à manobra de grupos de interesses privados que se utilizaram das suas insuficiências e se apropriaram, e apropriam, de largos recursos públicos. O actuação do anterior Governo do PS não deu lugar a uma intervenção clara e inequívoca na defesa e melhoria do SNS, na sua regeneração. A anterior equipa do MS demonstrou sérias dificuldades em levar à prática as orientações que definiu, mostrando-se incapaz de contrariar a promiscuidade existente entre a prestação pública e a privada, e de afrontar os interesses vorazes de grandes grupos económicos que disputam e absorvem o grosso dos recursos públicos disponibilizados para o sector, transformando os recursos da saúde em puro e largo contrabando de dinheiros dos cidadãos. O PCP não põe em causa a legitimidade de existir um Sector privado de prestação de cuidados de saúde. O que defendemos é um sector não parasitário, com regras claras e transparentes de articulação com o sector público. Assumindo a necessidade de mobilização de todos os recursos existentes no SNS ( quer humanos quer equipamentos e instalações) para dar resposta a uma prioridade nacional da área da saúde, o PCP apresentou e a Assembleia da República aprovou o Programa Especial de Acesso aos Cuidados de Saúde que se encontra formalmente em vigor desde Maio de 1999, apesar da sua operacionalização só se ter concretizado, fundamentalmente, a partir de Setembro. Este Programa consagra o princípio do aproveitamento da capacidade do SNS, prevendo o recenseamento rigoroso dos utentes das listas de espera, a avaliação da capacidade instalada, a atribuição de uma dotação orçamental própria e adicional e o recurso a meios externos ao SNS ser só quando comprovada e fundamentalmente se verificar insuficiência ou esgotamento da capacidade instalada. Sabemos que este Programa tem virtudes que não estão devidamente exploradas e inexplicavelmente o Governo nunca apresentou a esta Assembleia os resultados da aplicação deste Programa. E aos requerimentos por nós enviados dá meias respostas. Foi proposta do Programa do anterior Governo tomar medidas com vista a melhorar o funcionamento e aumentar a eficiência das unidades de saúde, concretizar a descentralização na gestão dos serviços de saúde e facilitar o acesso. Nas diversas instituições deste país não há uma rentabilização eficaz do investimento efectuado em meios auxiliares de diagnóstico. A maioria dos Blocos Operatórios só funcionam durante uma parte do dia. De tarde e de noite os equipamentos ficam a descansar. As consultas são até às 14 ou 15 Horas. A maioria dos Centros de Saúde alargaram o período de funcionamento, mas não têm recursos para dar respostas locais. Para realizar um Exame Complementar de Diagnóstico os utentes têm de se deslocar às urgências. Não houve investimento na implementação de meios de comunicação e informação entre todos os hospitais e Centros de saúde por forma a facilitar a circulação de informação do utente. O que vai funcionando bem muito se deve à dedicação dos profissionais de saúde, mesmo com restrições ao gozo de direitos e ao aumento dos ritmos de trabalho. A todos os níveis só após três anos de legislatura é que o Governo publicou alguma da legislação necessária ao desenvolvimento sustentado das medidas que anunciou, publicando o Despacho sobre o Programa de Promoção do Acesso e assumindo o reforço financeiro de 6 milhões de contos, publicando a legislação dos Sistemas Locais de Saúde, dos Centros de Responsabilidade Integrados, dos Centros de Saúde de 3ª geração, do Regime Remuneratório Experimental que permitem às instituições envolvidas articular a resposta em cuidados de saúde e envolver os profissionais. Apesar da anunciada paixão do Governo e da Ministra da Saúde ter assumido que iriam " ...implementar medidas que tenham como resultado último uma melhoria significativa dos ganhos em saúde dos Portugueses...", o Governo, passados que são três meses desde a sua nomeação, continua sem apresentar qualquer estratégia, qualquer medida, qualquer linha condutora da sua política para a Saúde. A falta de definição do actual Governo e a não execução plena da lei em vigor criou as condições para que o PSD reapresentasse esta iniciativa legislativa. Até parece que o PS pretende dar sustentação aos argumentos do PSD que acabámos de ouvir. A ver pela "limpeza" verificada nos diferentes cargos de organismos sob a tutela do Ministério da Saúde algo nos faz prever que muita coisa pode mudar. E, infelizmente, para pior. A expectativa que está criada em torno do Orçamento de Estado para 2000 pode ser a desilusão de constatar que, afinal, o anunciado reforço financeiro da saúde apenas servirá para pagar dívidas. Será manter tudo na mesma. E não se verificará o tal "virar de página ". Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados, O PCP recusa firmemente um caminho que acentue a divisão dos portugueses em cidadãos de primeira e cidadãos de Segunda. Ou seja, naqueles que têm capacidade económica para usufruir do acesso à prestação de cuidados de saúde e os restantes, a maioria, que não tendo capacidade económica ficam condenados ao acesso a um sistema residual, caritativo e assistencialista. O PCP sabe, e todos sabemos, que a capacidade instalada no Serviço Nacional de Saúde não está devidamente aproveitada. E, ao contrário da perspectiva do projecto lei do PSD, a resolução das listas de espera não pode ser um pretexto para alimentar os apetites vorazes instalados no SNS ou daqueles que se querem aproveitar das suas fragilidades. Reafirmamos hoje, tal como sempre o temos feito que é urgente que o Governo concretize a separação do privado e do público. Ou seja, que adopte medidas que impeçam o desenvolvimento da medicina privada no interior dos estabelecimentos públicos; que adopte medidas que fomentem a exclusividade de funções; que permitam a fixação dos diferentes profissionais da saúde, que estabeleçam um código de conduta que torne ilícito aos médicos do SNS o desvio para consultórios privados e, acima de tudo, adopte medidas que garantam a gestão pública de todos os estabelecimentos públicos de saúde, alterando a organização e funcionamento dos Hospitais e Centros de Saúde potenciando novas formas de trabalho que possibilitem uma maior rentabilização dos recursos. E que, no âmbito da resolução das listas de espera ponha em plena execução a Lei aprovada nesta Assembleia. Termino como comecei: as listas de espera para acesso ao SNS não são um problema de hoje. Não esquecendo o esforço imediato que é necessário assumir, a sua resolução requer um trabalho estratégico para aplicação a médio e longo prazo, com medidas de intervenção aplicadas a montante e a jusante do problema, que envolvam todos os agentes que intervêm na saúde. (pedido de esclarecimento à Deputada Luísa Portugal - PS) Sr. Presidente, Sr.ª Deputada Luísa Portugal, gostaria de colocar-lhe três perguntas. Pode ser que a Sr.ª Deputada ou alguém da bancada do PS saiba responder-me, visto que o Grupo Parlamentar do PCP não tem todos os dados na mão mas, pelos vistos, os Deputados do PS têm. Como sabemos, no Serviço Nacional de Saúde há milhares de contos investidos em equipamentos que, muitas vezes, só funcionam até às 16 horas. Como é que alguém pode compreender que mais de 90% dos exames complementares de diagnóstico solicitados, por exemplo, nos centros de saúde sejam feitos no sector privado convencionado, ao qual o Estado paga milhões de contos, quando se sabe que, de acordo com a Carta de Equipamentos de Saúde - portanto, nada do que estou a dizer é inventado -, funcionando os serviços 8 horas por dia, 10 meses por ano, dariam resposta à quase totalidade das solicitações relativas a raios-x, electrocardiogramas, análises e ecografias? A lei que está em vigor estabelece que, para o Programa Especial de Acesso aos Cuidados de Saúde, seja atribuído 1% do Orçamento do Estado. Os dados que conhecemos são muitos mas poucos são provenientes do Ministério da Saúde; no entanto, são todos muito contraditórios. Sabemos que sobraram 3 milhões de contos da verba atribuída em 1999 para a execução do Programa e soube-se recentemente que o Ministério da Saúde vai atribuir um reforço de 3 milhões de contos para a recuperação das listas de espera. Pergunto: será que vamos ter para 2000 um reforço de 6 milhões de contos ou será que os 3 milhões de contos não passam de uma manobra publicitária em torno das sobras de 1999? Em resposta a um requerimento enviado por mim questionando sobre os resultados do Programa Especial de Acesso aos Cuidados de Saúde, o Ministério da Saúde, que é obrigado por lei a apresentar a esta Assembleia esses resultados, informou o seguinte: "Na sequência do pedido (…), informamos que foram tratados, no âmbito do Programa de Acesso no ano de 1999, 9351 doentes do Serviço Nacional de Saúde. No Hospital da Cruz Vermelha, por acordo estabelecido (...), foram tratados mais 2006 doentes. Para o ano 2000, está previsto afectar a este Programa uma verba correspondente a 1% do orçamento do Serviço Nacional de Saúde". Nada de novo! Esta resposta é uma vergonha, em nossa opinião! Em primeiro lugar, é inadmissível que só mediante a apresentação de um requerimento o Governo responda e, mesmo assim, com meias respostas. Em segundo lugar, o Governo tem obrigação de apresentar a esta Assembleia um relatório sobre a execução do Programa. Do que é que está à espera? Será que só os Deputados do PS têm acesso ao relatório? (resposta ao pedido de esclarecimento do Deputado Filipe Vital - PS) Sr. Presidente, Sr. Deputado Filipe Vital, a determinada altura, tive algumas dúvidas sobre se a pergunta era dirigida a mim ou se era dirigida ao PSD. Sr. Deputado, aquilo que eu disse, e repito, é que, tratando de uma proposta do PS, desde o anterior governo, no sentido de que este problema tinha de ser resolvido, o Governo demorou três anos para apresentar e colocar no terreno um conjunto de legislação que permita criar formas de envolver os profissionais e de dar resposta a esta situação. Foi preciso que o PCP apresentasse a esta Assembleia um projecto que, efectivamente, permitisse a concretização daquilo que estava no terreno, visto que o Governo andava à espera para ver quando é que haveria de publicar um normativo legal que permitisse às pessoas poder resolver este problema. Relativamente à questão do Orçamento, do que consta que terá sido transmitido pelo Sr. Ministro da Economia, os 9 milhões de contos, que aqui foram referidos há pouco, não chegam, sequer, a 1% do Orçamento do Estado.

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