Intervenção de Jerónimo de Sousa na Assembleia de República

«Há um mar de problemas que precisam de respostas»

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Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Tem grande atualidade ter trazido a debate as questões sociais.

Há um mar de problemas que precisam de respostas, mas há um problema de fundo na situação social portuguesa que precisa de ser considerado e não dado como adquirido.

Trata-se do enorme retrocesso verificado no domínio das relações laborais na última década e meia, que desequilibraram profundamente essas relações em desfavor da parte mais fraca, os trabalhadores.

Também a matéria de segurança social, com impacto nas prestações sociais e reformas, nos direitos sociais gerais, nomeadamente na saúde e na educação, exige uma atenção especial e deve ser, quanto a nós, motivo da sua preocupação.

Isto significa que não podemos aceitar como boa a situação que temos no País. Há dias, embora tendo passado como «cão por vinha vindimada», segundo o relatório global da OIT (Organização Internacional do Trabalho) sobre os salários, que reflete o retrocesso nos rendimentos do trabalho, Portugal é dos países onde o peso dos salários na economia mais diminuiu, é um dos países onde caiu a proporção dos salários no rendimento nacional, passando de 60% para 52%, em 2014.

Por isso, não estranhe que nos continuemos a bater pela valorização dos salários em Portugal, nomeadamente pelo aumento do salário mínimo nacional.

Este é o resultado da desregulação laboral, da precariedade dos vínculos laborais, da alteração, para pior, do Código do Trabalho prosseguidas nos últimos anos, do ataque à destruição da contratação coletiva, matérias que, do nosso ponto de vista, precisam de ser consideradas com urgência.

O que foi, por nós, antecipadamente anunciado deve ser cumprido. Por isso, a primeira questão que lhe queria colocar prende-se com o direito à reforma sem penalização dos trabalhadores com longas carreiras contributivas, com 40 anos de descontos, como temos defendido e voltamos a defender.

A proposta do Governo defrauda a generalidade dos trabalhadores nesta situação. Eles acreditaram, Sr. Primeiro-Ministro, que não iam ter de trabalhar até ao limite das suas forças e da sua vida, ou, se quiser, acreditaram nas suas palavras e posicionamentos em debates quinzenais anteriores.

Pode dizer-se que o interpretaram mal mas, e sei do que falo, constitui um sentimento de desilusão profunda a proposta que foi colocada.

E é por isso que perguntamos até onde é que o Governo está disponível para encontrar uma solução mais justa.

Falou, e bem, aqui, das crianças que não tiveram tempo de ser meninos, é verdade. Espero que o Governo permita àqueles que envelheceram ter uma velhice digna através de uma reforma sem penalizações.

2ª Intervenção

Sr. Presidente,
Sr. Primeiro-Ministro,

Faço-lhe um apelo: quando estiver a decidir sobre esta matéria pense, por exemplo, em alguém que começou a trabalhar aos 14 anos e que aos 60 já tem 46 anos de desconto para a segurança social.

É um exemplo concreto que nos deve levar à reflexão e à procura da solução.

Existem outros problemas sociais, como referi no início da minha pergunta, e permita-me que destaque aqui a questão do setor da saúde.

Há problemas sérios que resultam da forma como tem sido feita a gestão dos recursos humanos que atingem toda a Administração Pública, nomeadamente a questão dos vínculos, dos cortes nos salários, do congelamento das carreiras, da reposição do pagamento das horas extraordinárias no setor da saúde, é o não se ter avançado no reajustamento das listas de utentes dos médicos de família ou ainda não se terem reabilitado os edifícios.

Faltam médicos e profissionais de saúde, faltam condições de trabalho, faltam condições de atendimento e há carência nas urgências.

A primeira consequência é para os profissionais mas a consequência mais dura é para os próprios utentes do Serviço Nacional de Saúde.

Por isso, aumenta a conflitualidade e há consequências, como as que se vivem no Centro Hospitalar do Barreiro-Montijo, que trouxe recentemente à rua, numa marcha de protesto, mais de 1500 utentes, ou a que levou à paralisação dos enfermeiros da ACES (Agrupamentos de Centros de Saúde) de Lisboa Norte pela contratação de profissionais em falta ou a dos assistentes operacionais, de outros técnicos de saúde, da população de São João do Campo contra a perspetiva de encerramento da extensão de saúde e ainda o abaixo-assinado entregue em Espinho, com mais de 10 000 assinaturas, pela reabertura da urgência hospitalar.

É agora anunciada uma greve dos médicos. Também os trabalhadores dos museus vão recorrer a essa forma superior de luta.

É por isso que lhe pergunto, com sentido construtivo mas preocupado, Sr. Primeiro-Ministro: para quando uma intervenção decisiva na resolução dos problemas que afetam o acesso à prestação de cuidados de saúde no Serviço Nacional de Saúde? Temos grandes preocupações sociais, preocupações laborais, mas esta coisa da saúde diz muito ao povo português.

Está nas nossas mãos conseguirmos um forte e melhor Serviço Nacional de Saúde.

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