Intervenção de

As Grandes Opções do Plano para 2005-2009Intervenção de Agostinho Lopes

Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

Cinco grandes objectivos podem ser destacados nas GOP. São eles os seguintes: a redução das desigualdades sociais; a redução das assimetrias regionais; uma trajectória de crescimento sustentado; a elevação da qualidade da democracia e a valorização do posicionamento externo de Portugal. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

É sabido o papel central do salário na distribuição primária do rendimento nacional. É conhecido o decisivo significado do seu valor na gradação das desigualdades sociais. É, assim, admirável que as GOP possam gastar 70 páginas com a opção de reduzir as desigualdades sociais sem gastar uma linha com o esboço de qualquer política salarial sem utilizar, salvo erro de leitura, uma só vez a palavra «salário»! Isto no País mais desigual da União Europeia e onde predominam, como é sabido, os baixos salários! É igualmente admirável que consiga falar-se de pobreza, de «acabar com a pobreza associada ao trabalho», sem uma referência ao baixo nível salarial, principal responsável, a par do desemprego, por aqueles problemas sociais. Recentemente, o Sr. Primeiro-Ministro reagiu, ao que parece, com perplexidade à proposta avançada pelo Presidente do BPI de baixar os salários dos portugueses em 10% para resolver a actual situação das contas públicas. «Há banqueiros com cada ideia», terá dito o Sr. Primeiro-Ministro! Porém, depois de ler as GOP e, fundamentalmente, se nos ativermos às políticas e às práticas do Governo, não vemos razão para a perplexidade do Sr. Primeiro-Ministro. É que aquilo que o Governo tem em marcha, por omissão e por acção, é uma enorme máquina, inclusive de propaganda, para uma forte desvalorização dos salários dos portugueses: não actualização do salário mínimo nacional; congelamento dos salários e carreiras da função pública; não revisão do Código do Trabalho, em que avulta o risco da caducidade da contratação colectiva; a cumplicidade com o agravamento da precarização e segmentação do mercado de trabalho (chegando-se já ao cúmulo de segmentação para o mesmo posto de trabalho e para a mesma actividade laboral no mesmo trabalhador); pressão para a baixa dos salários decorrente do crescimento do desemprego e das deslocalizações. A não abordagem pelas GOP do problema central dos baixos salários da generalidade dos trabalhadores portugueses torna, depois, a abordagem de questões como o trabalho infantil, o abandono e o insucesso escolares, a formação e a qualificação da mão-de-obra meros exercícios de retórica, quando não farisaísmo político do pior. Os factos mostram que o Governo partilha as teses daqueles, como o Governador do Banco de Portugal e administradores de empresas públicas e não públicas, para quem, em matéria de cargos de topo, o valor dos salários, reformas e mordomias é uma questão relevante para assegurar as competências e as capacidades, sendo completamente irrelevante para a necessária progressão da produtividade o valor dos salários dos trabalhadores portugueses. As teses dos que não percebem que quem exerce um cargo público e político remunerado com quase 4000 contos mensais, ou seja, a massa salarial líquida de uma pequena empresa têxtil de 50 trabalhadores, não tem qualquer autoridade ética e política para aconselhar, em nome do Estado português, aos trabalhadores portugueses a moderação salarial e a poupança! Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados: A constatação pelas GOP da necessidade de combater as «disparidades existentes» não corresponde à definição clara de uma estratégia de coesão territorial e não se enxergam as medidas e as políticas para a redução das assimetrias regionais. Bem pelo contrário. Não há uma palavra sobre a regionalização e o conjunto das políticas apontadas, prosseguindo orientações de sucessivos governos, contribuirão inexoravelmente para prosseguir o seu agravamento. Não se enxerga como e em que medida os fundos comunitários, nos seus diversos programas, poderão contrariar a repetição do que sucedeu nos três quadros comunitários de apoio. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

Tendo a preocupação de um «crescimento sustentado», estranhamente as GOP não fazem nenhuma abordagem sistematizada e profunda dos problemas da produção nacional, da produtividade e competitividade da economia nacional. A balança comercial não é um problema nas GOP. O tecido produtivo, que devia ter um tratamento central, está ausente. Mesmo a agricultura e as pescas são apenas vistas como componentes da coesão territorial e o sector do comércio não existe, mas certamente a principal questão é a ausência da indústria transformadora, a inexistência das indústrias extractivas e a pouca atenção às micro, pequenas e médias empresas, com esmagadora presença no tecido empresarial português. Valerá a pena abordar a quarta e quinta opções das GOP e falar da qualidade da democracia, quando o Governo entende como objectivos da «modernização dos sistemas eleitorais» o estabelecimento de executivos municipais de um só partido e a criação de círculos uninominais nas eleições legislativas, afectando o pluripartidarismo e a participação directa dos cidadãos na escolha dos seus eleitos? Falar do objectivo de uma justiça «ao serviço de uma plena cidadania» quando não há uma palavra sobre as custas judiciais? Falar da «valorização do posicionamento externo de Portugal», quando o que se propõe é a manutenção do processo de ratificação do tratado que pretensamente estabelece uma Constituição para a Europa? É um tratado que subalterniza claramente Portugal e que consolida o peso decisório das grandes potências no comando e nas orientações da União Europeia! Sr. Presidente, Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

Portugal é viável? No decurso do debate das GOP, desenvolvendo, aliás, declarações de outros cidadãos, o Presidente do Conselho Económico e Social afirmou estar o País «perante uma situação em que está em causa a viabilidade da economia portuguesa». Também em recente período parlamentar tomámos conhecimento que a condução da política orçamental portuguesa tem que estar atenta às notações das agências internacionais de rating. E ficou a saber-se mais, que o salto das exportações em 2006, de que o País desesperadamente necessita, está dependente do sucesso no mercado de um descapotável, de uma única e grande empresa multinacional localizada no País. Como chegámos a esta situação, Srs. Membros do Governo e Srs. Deputados? Depois de dezenas de milhões e milhões de contos de fundos comunitários; depois de centenas de milhões de contos de privatizações; depois da liberalização dos mercados, inclusive do mercado de trabalho; depois do euro e das baixas taxas de juro; depois de quase 20 anos de integração europeia; depois da reconstituição de velhos e da constituição de novos grandes grupos económicos monopolistas, não será altura de mudar de política e de políticas?! A leitura, mesmo que fastidiosa, das sucessivas GOP apresentadas ao longo dos últimos anos mostra como objectivos e opções em geral correctos foram permanentemente frustrados pelas opções de política e pelas políticas que, sem apelo nem agravo, conduziram o País ao estado em que hoje nos encontramos. Um País onde se questiona a viabilidade da sua economia, não muito longe do questionar, por alguns, da viabilidade do próprio país. Srs. Membros do Governo, Srs. Deputados:

Na opinião do PCP, estas GOP não correspondem às necessidades do País e às expectativas dos portugueses que votaram pela mudança de política a 20 de Fevereiro. Parece-nos que bastaria a leitura atenta do parecer elaborado pelo Conselho Económico e Social, na generalidade e na especialidade, para que o Governo se sentisse obrigado a retirar as GOP, a submetê-las a profunda reflexão e a irrecusáveis correcções para, depois, as trazer novamente a esta Assembleia da República. Pela nossa parte, estas são umas grandes opções de política económica e social completamente inaceitáveis.

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