Intervenção de

Grandes investimentos públicos, em particular o TGV

 

Debate de actualidade sobre a inoportunidade dos grandes investimentos públicos, em particular do TGV

Sr. Presidente,
Sr. Ministro dos Assuntos Parlamentares,
Sr.as e Srs. Deputados:

Antes de mais, a primeira questão que importa clarificar é saber se estamos todos a falar da mesma coisa quando falamos de investimento público e, já agora também, quando falamos de alta velocidade ferroviária, até porque, recordo, TGV é uma marca comercial como qualquer outra e não será propriamente a designação mais rigorosa.

A questão central não pode ser reduzida a um problema de investir ou não investir, tem de se saber em que medida o sector público, o investimento público, o Estado, devem avançar para o desenvolvimento integrado, articulado, coerente, das redes e infra-estruturas de transportes e logística em todo o território nacional e de uma forma harmoniosa.

O que está em causa, como dizia alguém, não é a liturgia da obra nova, é o modelo de negócio que tem proporcionado, e proporciona, ao grande capital, aos grupos económicos, com milhões em lucros, em adjudicações, em parceiras público/privadas, que garantem sempre, mas sempre, a privatização da receita e do lucro e a nacionalização do prejuízo e da factura. É a estes modelos de financiamento e negócio, a estas estratégias de abandono do interesse nacional, de concessão da obra e do interesse nacional, que é preciso dizer «basta», Srs. Deputados.

A propósito desta matéria, devemos sublinhar que a isto não ouvimos o PS dizer «basta» e não podemos aceitar que, neste e noutros sectores, se transformem estratégias de investimento em estratégias de privatização, se transformem sectores públicos em monopólios privados - mas aqui, mais uma vez, PS, PSD e CDS estão de acordo.

Mas, Sr. Presidente, Sr. Ministro, Srs. Deputados, é particularmente significativo que este debate se realize hoje, após a decisão da CP, da REFER e do Governo, pela calada da noite, sem uma palavra de aviso, de encerrarem as linhas de caminho-de-ferro, de ferrovia convencional, do Corgo e do Tâmega, no norte do País.

É uma verdadeira falta de respeito pela própria dignidade nacional, regional, das populações, dos trabalhadores e dos utentes do caminho-de-ferro, é a demonstração do que está verdadeiramente em causa quando se trata de investimentos e obras públicas.

Enquanto nesta Casa se discute, nas palavras de VV. Ex.as, o TGV, está o Governo, por esse País fora, a encerrar linhas de caminho-de-ferro.

Também aqui a imagem e a memória que temos do cavaquismo têm eco nas políticas que hoje em dia são seguidas.

Apresentámos na Comissão de Obras Públicas um requerimento para que o Governo venha dar explicações sobre o que se está a passar neste processo verdadeiramente lamentável e o que queremos dizer, para já, Sr. Presidente e Srs. Deputados, é que de certeza que este debate vai ter de continuar, o Sr. Ministro Mário Lino e a sua equipa vão ter, seguramente, de dar aqui explicações e, acima de tudo, inverter o sentido das suas políticas e das suas opções.

(...)

Sr. Presidente,
Sr.as e Srs. Deputados,
Sr. Ministro Augusto Santos Silva,

Para quem tanto gosta de fazer perguntas aos Deputados e aos grupos parlamentares, permita-me sugerir-lhe que tome mais atenção às respostas que o seu Governo dá aos requerimentos e às perguntas ao Governo que, regimentalmente, o Grupo Parlamentar do PCP apresenta.

Neste debate, para além das questões essenciais e dos problemas de fundo suscitados pelo PCP relativamente ao modelo de negócio, ao modelo de financiamento, às parcerias público/privadas e às concessões que, de facto, são um modelo de privatização destes sectores públicos, estão em causa matérias de grande importância que são decisivas para a concretização destes projectos.

Tais matérias têm que ver com as tecnologias aplicadas - se é a de comboios pendulares, se é a da marca TGV, ou AVE, ou outra de alta velocidade -, com a questão dos corredores e dos traçados - margem esquerda ou margem direita -, com o faseamento da concretização das linhas, nomeadamente a sua articulação com a ferrovia convencional, questão determinante neste projecto, com o problema da inserção no quadro urbano de Lisboa, do Porto e de outras zonas metropolitanas e urbanas em que esta rede se vai integrar.

Sr. Ministro, recentemente, veio a público a questão sobre a localização do corredor na margem esquerda ou na margem direita, no troço Lisboa/Alenquer. Esta questão foi suscitada pelo PCP no dia 28 de Setembro de 2007, sob a forma de Requerimento ao Governo n.º 48/X (3.ª), que não obteve resposta.

Passados vários meses, o PCP reiterou as mesmas perguntas, num novo requerimento ao Governo, com o n.º 538/X (3.ª), até hoje sem resposta. Desde 2007, que nós, PCP, andamos a colocar ao Governo estas mesmas questões que, agora, aparecem com grande brado na praça pública e, Sr. Ministro, o Governo, de uma forma verdadeiramente lamentável e vergonhosa, não cumpre o que está estabelecido no Regimento da Assembleia da República e na Constituição, não responde às questões concretas que, quero reiterar, o PCP tem vindo a colocar desde 2007.

Assim, para quem não responde às perguntas que regimentalmente são feitas, o Sr. Ministro devia ser mais comedido quando vem fazer perguntas aos Deputados...

Mas, para já, sempre lhe dizemos o seguinte: nunca espere, da parte do PCP, que venhamos aqui assinar papéis em branco e não venha acenar-nos com marcas de TGV.

Não é de qualquer maneira que o interesse nacional é salvaguardado.

Neste caso, tendo em conta o interesse nacional, a ferrovia convencional do nosso país e o verdadeiro desenvolvimento integrado, harmonioso, coerente das redes de transportes e de logística de que o País precisa, que merece e que exige com urgência, não é isso que está a ser salvaguardado e acautelado com este modelo de negócio, este financiamento e esta articulação ruinosa de acordo com o projecto que, à semelhança dos anteriores governos PSD/CDS, este Governo continua a querer impor ao País e a querer oferecer aos grupos económicos.

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